Benedito Ruy Barbosa

24/2/1997
Um dos maiores autores de telenovela do país, fala do sucesso de suas obras, em particular da polêmica surgida com O rei do gado



Matinas Suzuki: Boa noite! Ele é autor de sucessos como Pantanal e o O rei do gado, mas diz que vai parar de escrever novelas. No centro do Roda Viva está Benedito Ruy Barbosa.

[Comentarista]: Será o Benedito? Se alguém perguntar quem é o mais bem sucedido autor de telenovelas no Brasil, certamente esta será a resposta: Benedito Ruy Barbosa. Ele já foi convidado do Roda Viva, em 1990, pela mesma razão: o sucesso de sua teledramaturgia. Jornalista e escritor, esse paulista da cidade de Gália, de 65 anos de idade, já soma 34 anos de telenovelas. Começou carreira nos anos 60, na antiga TV Tupi, com as novelas Somos todos irmãos [1966], O Anjo e o vagabundo [1966/7], Simplesmente Maria [1970], entre outras. Em 70, fez aqui na TV Cultura a primeira novela educativa da TV brasileira, Meu pedacinho de chão, onde o ator Canarinho interpretava um homem simples do campo que tanto podia ajudar na implantação de novas técnicas agrícolas quanto no aprendizado da história do Brasil. No início dos anos 80, foi a vez do público infantil. O Sítio do pica pau amarelo trouxe Monteiro Lobato para a TV em mais uma bem sucedida adaptação de textos literários feita por Benedito Ruy Barbosa. Em todos esses anos, ele escreveu de tudo e entrou para o horário nobre do brasileiro com personagens de todos os tipos, dramas de todos os tamanhos, espelhando relações humanas da diversificada vida brasileira. Em 93, recebeu da APCA [Associação Paulista de Críticos de Artes] o prêmio da melhor novela do ano, Renascer [1993]. O drama criado com o fim da lavoura do cacau na Bahia; um drama rural, de preferência retratando famílias dominadas por linhagens de patriarcas. Dramas que têm sido a marca registrada desse autor e que mais uma vez fizeram sucesso no O rei do gado, a novela em que Benedito acreditou ser possível ajudar o Brasil a conquistar a paz no campo e chamou de sua última novela.

Matinas Suzuki: Para entrevistar o dramaturgo Benedito Ruy Barbosa, nós convidamos, esta noite, o Eugênio Bucci, diretor de redação da revista Super Interessante e colunista de TV da revista Veja, Mônica Teixeira, diretora do SBT Repórter, do SBT; Mauro Alencar, consultor e pesquisador de novelas e professor de dramaturgia da oficina de atores da Rede Globo; José Graziano da Silva, professor de economia agrícola da Unicamp; Luiz Hafers, fazendeiro e presidente da Sociedade Rural Brasileira; a antropóloga Esther Hamburger, do Cebrap [Centro Brasileiro de Análise e Planejamento] e da Folha de S. Paulo e a Cristina Padiglione, colunista de TV do Jornal da Tarde. [Programa gravado, o que não permitiu perguntas de telespectadores] Boa noite Ruy Barbosa!

Benedito Ruy Barbosa: Boa noite!

Matinas Suzuki: Posso chamá-lo de Benedito?

Benedito Ruy Barbosa: Claro!

Matinas Suzuki: Benedito, você ficou feliz com o sucesso, com a repercussão da novela. Qual a sua avaliação?

Benedito Ruy Barbosa: A gente sempre fica, não é? É um trabalho estafante, não só do autor mas da equipe de produção, elenco, é uma estiva fazer novelas. E quando a gente começa, nunca sabe onde vai parar. Sempre há interrogação, porque ninguém tem a fórmula para o sucesso. Então, a gente torce do primeiro ao último capítulo. Graças a Deus, essa sustentou uma audiência cativa, muito boa, e apesar da temática ser um pouco fora do propósito para o normal da televisão, que é a novela, eu acho que o público de certa forma aplaudiu.

Eugênio Bucci: Benedito, qual foi a maior recompensa que você recebeu por ter escrito essa novela: foram os discos vendidos, o sucesso do Ibope, adeptos da reforma agrária, o que foi mas legal para você?

Benedito Ruy Barbosa: Olha, é uma soma. É evidente que a vida de um autor de novela depende muito de ibope, não é? Só é bom aquele que dá o ibope alto, senão está ferrado. Mas a grande... o que é mais gratificante é quando você sente a resposta do público. Quando você vê que a novela ganha as ruas, que você começa a receber cartas interessadas, cartas inteligentes, discutindo o assunto que a novela aborda. E a alegria que o povo tem também quando ele começa a se identificar com os personagens.

Eugênio Bucci: Essas cartas eram contra ou a favor da reforma agrária?

Benedito Ruy Barbosa: Olha, eu tinha dos dois lados, a maioria a favor. Eu recebi cartas de sem-terra, mesmo. Recebi muitas cartas de fazendeiros, algumas incentivando a continuar abordando o tema dos sem-terra, cobrando inclusive uma forma de apressar o governo a fazer a reforma. Fazendeiros preocupados com a sua propriedade, achando que se a coisa continuasse daquela forma, a propriedade produtiva seria realmente invadida como as não produtivas.

Esther Hamburguer: Quantas cartas você recebeu, mais ou menos?

Benedito Ruy Barbosa: Na novela toda, acho que umas 500 e poucas.

Mônica Teixeira: Isso é mais ou é menos do que outras novelas de sucesso?

Benedito Ruy Barbosa: Pantanal eu recebi duas mil. Mas Pantanal porque foi uma novidade. Então, foi uma coisa que pegou o público.

Mônica Teixeira: Mas com uma audiência muito menor, comparativamente a...

Benedito Ruy Barbosa: Considerando-se que nós estávamos na TV Manchete. Para a Manchete era uma grande audiência na época. Mas o que aconteceu com o Pantanal é que eu comecei a receber cartas de um tipo de público que nunca tinha escrito para mim antes, que estava assim... envolvido pela beleza do pantanal,  porque o cenário que a gente mostrava todas as noites... E pelo tema da novela também. Renascer, também recebi muitas cartas, mas as cartas que eu recebi dessa novela foram bem diferentes das demais, porque eram muito participativas. As pessoas escreviam não pedindo para fulano casar com beltrano, para acontecer isso... Não! Eles escreviam discutindo o que a novela estava discutindo, colocando seus pontos de vistas.

Cristina Padiglione: Em algum momento você chegou a se inspirar em uma dessas cartas para alterar o rumo da história, ou para confirmar: "É isso que eu estou querendo fazer"?

Benedito Ruy Barbosa: Não. As cartas me confirmaram coisas que eu sabia e que elas vieram justificar até o ponto de vista que eu estava abordando na novela. Eram muitas testemunhos, que me deixavam tranqüilos. Dos dois lados que estava... porque eu estava pisando em ovos.

Cristina Padiglione: E tinha fazendeiro aprovando a invasão de terras?

Benedito Ruy Barbosa: Tinha. Tinha alguns violentos.

Cristina Padiglione: Tinha fazendeiros iguais ao Mezenga [personagem da novela O rei do gado], ou não?

Benedito Ruy Barbosa: Tinha.

Cristina Padiglione: Você encontrou algum [risos]?

Benedito Ruy Barbosa: Até tem uma coisa engraçada que, um desses fazendeiros que me escreveu, eu botei o que ele me escreveu na boca do Berdinazzi [outro personagem da novela]. Porque o Berdinazzi, a certo momento da novela, ele fala que, quando eles vieram - o pai veio para o Brasil, imigrante italiano - que ele só conseguiu terra depois de labutar muito, de guardar muito dinheiro no colchão, para depois comprar terra, depois trabalhar na terra, para ter alguma coisa. E que, hoje em dia, os sem-terra, quer receber do governo a terra, o trator, dinheiro para a semente, querem tudo na mão.

Cristina Padiglione: Isso é a frase de um fazendeiro, que veio de carta?

Benedito Ruy Barbosa: Frase de um fazendeiro. E eu achei que o Berdinazzi poderia defender esse ponto de vista, entende? Então eu botei na boca do... [sendo interrompido]

Luiz Hafers: Você não se surpreendeu com o apoio que os fazendeiros deram à novela?

Benedito Ruy Barbosa: Não, não me surpreendi, porque a gente não pode julgar toda uma classe por meia dúzia que não tem entendimento para chegar à razão. As cartas que eu recebi de fazendeiros, a maioria foi de apoio. Realmente apoio. Só me pediam, por favor, que eu batesse na tecla que se respeitasse a terra que é produtiva. Muitos pecuaristas me falavam: explica para essa gente que duas mil cabeças num pasto, de repente parece que não é nada. Aquele negócio no começo da novela, que aquela fazenda foi invadida com 15 mil cabeças de gado. Isso aconteceu. Isso é verdade! Não chegaram a derrubar cerca, mas chegaram a ficar na porta, lá.

Cristina Padiglione: Mas os fazendeiros também não serviam um boi para as pessoas, como era o personagem?

Benedito Ruy Barbosa: Não, isso aí é um ideal que eu... [riso] Mas esse fazendeiro foi para Brasília, foi para o Senado, levou tapes da fazenda dele, fotografias e tudo, provando que ele tinha lá mais boi do que se esperava. Porque ele estava com o boi confinado. E os sem-terra não sabiam. Engraçado, porque isso também é verdade! Os sem-terra, do ponto de vista deles, onde eles estavam na estrada, eles não alcançavam o lugar onde estavam confinados os bois. Então, eles viram o pasto livre. E foi um erro do próprio Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária], que deu a terra como improdutiva também. Então, eles não estavam ali num ato de violência. Eles tinham sido industriados, porque eles iriam invadir aquela fazenda porque ela ia ser dada como livre para a reforma. Depois que viram o erro, então não teve nenhum problema. Mas ali eu já fiz o Mezenga prometer soltar 15 mil bois na Praça dos Três Poderes para ver se... [riso; sendo interrompido]

Mauro Alencar: Benedito, você não acha que justamente o ponto ideal da sua obra, e de tanto êxito, é você mesclar a realidade com o sonho, a ficção? Porque eu noto que, desde Meu pedacinho de chão, você procura educar o povo através da novela. Então, eu queria saber de ti se a novela é um instrumento para educar o povo? Como é que você a novela no Brasil?

Benedito Ruy Barbosa: Olha, você quando começa a escrever novela, você sabe que você vai ter um ano de sacrifício. Você fica muito tempo, dez, doze horas. Às vezes 14, 15. Se atrasa um capítulo, como aconteceu comigo agora, meu Deus do céu [riso], não tem hora para começar nem para parar. E quando chega no final da novela, se você... não fica um residual, algo produtivo, que tenha valido a pena o teu esforço, é como você contar um conto de carochinha. Não tem... uma história de amor pela história de amor... não é? Então, eu sempre achei e venho tentando fazer isso desde 1971, quando eu fiz aqui a primeira novela educativa, usar a novela como instrumento de educação também. Porque eu percebo uma coisa: que o telespectador, quando ele está vendo a novela de televisão, ele fica desarmado pela emoção. Ele entra na emoção da trama e, quando você encontra ele desarmado assim, você pode jogar elementos educativos dentro da trama que ele assimila muito bem.

Eugênio Bucci: Você acha que os fantasmas também são algum elemento educativo? No Pantanal, quando a novela terminou, os personagens do início voltaram como fantasmas. Agora também. Os Berdinazzi... a casa estava cheia de fantasma. Isso você explica por essa via também?

Benedito Ruy Barbosa: Não, aí é uma questão de crença pessoal minha.

Eugênio Bucci: Você é espírita?

Benedito Ruy Barbosa: Sou. Eu tenho os meus motivos particulares e muito fortes para que acreditar nisso. Eu sei que muita gente não acredita e nem quero discutir isso. Mas ali eu tinha que fechar a novela de alguma forma. Eu tinha montado, como carpintaria, dramaturgia, eu tinha montado no começo o enterro daquela medalha, não é? Que foi um negócio muito marcante. E aquela medalha... só haveria paz naquela família, naqueles dois núcleos, no momento em que aquela medalha fosse retirada do solo e fosse entregue ao irmão. Quer dizer, era um ato generoso. Mas ali também estava comprovado que os outros, os antepassados estavam presentes. E eles que começaram essa briga. Então, eles teriam que participar no final para que houvesse a concórdia novamente.

Eugênio Bucci: Você acha que a tua missão assim, tem alguma relação de abrir as portas para as pessoas entenderem essa outra realidade, na qual você acredita?

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho que é reconfortante você acreditar em uma outra vida. Eu acho terrível, de repente, você ser puramente pó, matéria e acabou, acabou! Porque eu acho que o centro da cabeça do homem, a inteligência mesmo, eu acho que ela não cabe na matéria em si. Eu acho que ela vai além disso. Então, por ser uma crença pessoal... E eu estou tão cansado de ver pais, amigos meus que perdem um ente querido, que nunca acreditou e, de repente, ele busca um conforto exatamente nisso. Apaga tudo o que ele não acreditava e busca uma forma de se encontrar novamente com um ente querido, ou receber alguma mensagem. Eu conheço muito o Chico Xavier [Francisco Cândido Xavier (1910-2002), importante figura do espiritismo no Brasil, ele é considerado o maior médium brasileiro, tendo publicado mais de 400 livros e realizado muitas obras assistenciais], já conversei muito com ele. Já fiz novelas espíritas. A primeira novela que eu fiz foi na TV Tupi e chamava-se Somos todos irmãos. Um título ecumênico. Mas a novela foi inspirada num livro, chamado A vingança do Judeu, livro psicografado pelo Xavier e escrito em 1817, 1870 e pouco, pelo Conde de Rochester [John Wilmot (1647-1680), poeta britânico]. Foi um sucesso nacional. E lidava com esse tema, numa época que isso aí era execrado. Os padres falavam no púlpito isso, não é? Eram contra, absolutamente contra. E nós encontramos uma maneira de colocar isso no ar.

José Graziano da Silva: Você tem esperança que a realidade imite a ficção? Você acha que a novela ajudou a resolver a questão da reforma agrária no Brasil?

Benedito Ruy Barbosa: Olha, uma coisa eu tenho consciência, e aliás, foi a nossa única preocupação. Quando eu estava começando a escrever novela, eu já tinha feito a sinopse e tudo, eu conversei com a direção da Globo, porque eu queria abordar esse tema, reforma agrária. É uma coisa que me preocupa. Eu estou falando de reforma agrária há muitos anos. Em Renascer não tinha o Tião Galinha, que sonhava com um pedaço de chão?

José Graziano da Silva: Mas ficou louco!

Benedito Ruy Barbosa: Ficou louco, acabou se enforcando. Dessa vez eu não quis fazer isso. E outra coisa: dessa vez, a minha intenção era me aprofundar um pouco mais dentro do tema. Então, eu coloquei que poderia dar problema, eu coloquei: "Olha, talvez aconteça um problema no decorrer da novela". Mas eles me deixaram livres. Em nenhum momento a Globo disse: "Olha, pára, não faça isso, não faça aquilo". Em nenhum momento. E eu mesmo comecei a sentir a repercussão. E então eu fui me cuidando, comecei a me cuidar. A minha intenção é que se discutisse a reforma agrária. E eu tenho consciência plena e absoluta que a novela levou o público a entender inclusive o que é a terra devoluta. Você perguntava, para cada dez, o que é terra devoluta, um sabia, nove não sabiam. Nós fizemos esse teste, fizemos pesquisa a respeito disso. Então, quando você começa a discutir o que é terra devoluta, o que não é terra devoluta, o direito que o homem tem ao trabalho no campo, que a terra não pode ficar na mão de meia dúzia. Tanta terra improdutiva. Eu defendo a posse da terra para aquele que faz com que ela produza. E nós estamos cada vez caminhando mais dentro do avanço da tecnologia moderna. O homem do campo hoje, o fazendeiro, se ele não se modernizar, ele vai ficar para trás. Eu não acredito mais que você possa criar gado como se criava há 20, 30 anos atrás. Tem que mudar isso. Se o sujeito não adotar a tecnologia como nos outros países...[sendo interrompido]

Luiz Hafers: Benedito, você tem razão. Ele não vai ficar para trás, ele já ficou para trás.

Benedito Ruy Barbosa: Já ficou para trás, não é?

Luiz Hafers: E essa é uma realidade do campo, grave. Hoje eu acho que você chamou atenção muito bem nisso. Esse tipo de gente, esse criticado, ele já ficou para trás. O esperneio dele não vai resolver.

Benedito Ruy Barbosa: Pois é. E outra coisa também que na novela tentei falar, porque é uma coisa também que eu conheço de depoimentos, é que, realmente, se nós formos ser honestos com esse país, nós vamos observar o seguinte: eu estou com 65 anos, nasci dentro de uma fazenda, trabalhei, eu derricei café, eu bati feijão, colhi algodão, eu nasci no meio desse povo, eu estou com o linguajar deles no ouvido até hoje. Eu não me lembro de nós termos tido uma política agrícola, nem agrária nem agrícola. Nós nunca tivemos. Então, o agricultor brasileiro, ele é um herói em todos os sentidos. Nós não temos seguro agrícola. Não temos realmente o que valha, não temos. O banco financia o coitado que planta o feijão, o arroz, que corre todos os riscos: da falta de chuva, do excesso de chuva, de tudo. Da queda de preços quando chega na safra, porque, geralmente quando se colhe o feijão aqui, o governo estava importando feijão, derrubava o preço. Gente que plantava cebola, enterrava a cebola.

José Graziano da Silva: Eu estranhei, por exemplo, que você não tenha tratado desses temas.

Benedito Ruy Barbosa: Eu falei isso.

José Graziano da Silva: Mas pouco. O fazendeiro que você mostrou era sempre o fazendeiro bem sucedido, com o carro que queria, na hora que queria.

Benedito Ruy Barbosa: Eu falei isso. Inclusive, na minha história, o Regino era um sitiante e o pai perdeu a terra; por quê? Porque isso aconteceu muito no sul. Você deve saber disso. O que se fez lá, financiamento de... Para comprar um trator, eles tinham que perder o trator e perder a terra. Começava com um financiamento de 6% ao ano e, de repente, estava 30% ao mês! Como ele pode colher o produto do esforço dele e na hora de vender não ter mercado? O Brasil não tem política de preço mínimo, não tem controle de preço na entresafra. Porque não tem nem como armazenar. Quando o Figueiredo [João Baptista de Oliveira Figueiredo (1918-1999), presidente do Brasil entre 1979 a 1985, o último da ditadura militar] veio com aquela história do "Plante que o João garante", eu estava com aquela novela Paraíso no ar. Eu tinha uma rádio e quem abria o programa de manhã era um bebum da cidade de lá, mas era o maior intelectual da cidade, o cara mais politizado. E, quando saiu esse negócio "Plante que o João garante", eu fiz uma cena que a censura cortou, mas depois acabaram liberando, eu teimei e eles soltaram, não é? Porque também estava na época de abertura [abertura política, como foi chamado o período de transição entre o regime militar e o democrático, que marcou os anos 1980] e eles não podiam se contradizer. O locutor começava de manhã, botava o jornal, como fazia o Vicente Leporace [(1912-1978), famoso radialista brasileiro, apresentava A hora do trabuco, na Rádio Bandeirantes], no Trabuco, ele botava o jornal de lado e ficava lendo jornal e falando na rádio. Então, ele falava: "Bom dia,  professorinha, você que acordou agora, está indo para a escola com os livros dos seus meninos debaixo do braço; você, garotinho, pé do chão, vai comendo poeira para ir para a escola, vai que é lá o teu futuro; caminhoneiro, você que está transportando o progresso; cafeicultor, você que está ouvindo o radinho pendurado no pé de café, e assim ia... boiadeiro..." Depois falava assim: "Acorda, presidente!" E aí falava: "Presidente, olha..." - Bom dia, Brasil, chamava o programa - "... mas, presidente, o senhor está dizendo aqui..." Ele não falava João Figueiredo, porque aí seria demais. Ele falava assim: "Presidente, o senhor está dizendo aqui, mandando o povo plantar que o senhor garante, "Plante que o João garante", professor? Mas como o Senhor garante? O senhor tem silagem para essa safra que o senhor pretende que esse país colha? O senhor tem armazenamento para essa safra, ou vai ficar tudo coberto com encerado em um pátio de colégio, no meio da rua, como ficou no sul? Arroz, soja, milho, tudo. Onde é que vai se guardar esse produto? Plantar para perder? Um país que se dá ao luxo de perder 25% da sua safra, do grão que fica na horta."

Esther Hamburger: Com esse tipo de intervenção, a novela acaba sendo uma mediadora, na política? Você citou um exemplo, um detalhe em uma novela passada. No caso agora do O rei do gado isso foi mais presente. Foi para toda uma questão que estava presente na conjuntura.

Benedito Ruy Barbosa: Mas, sabe o que acontece? Ali foi uma crítica a essa política do "Plante que o João garante". Eu achava um absurdo, sabe? De repente o governo fazer um apelo desse, sendo que: primeiro, não oferecia financiamento à altura e o financiamento era uma coisa cochante, em termos de juros; segundo, colhendo 75 milhões de toneladas de grão. Onde é que vai botar tudo isso aí? Não tinha, nós não temos. O Brasil não tem uma rede de armazenamento e silagem à altura.

Matinas Suzuki: Qual a sua avaliação pessoal, tirando agora a novela, do Movimento dos Sem-Terra e da política com relação à reforma agrária do governo Fernando Henrique? Quer dizer, que balanço você faz? Qual a sua visão pessoal, cidadão Benedito Rui Barbosa sobre essa questão?

Benedito Ruy Barbosa: Primeiro, eu acho - parte do princípio que se eu não achasse, eu não teria feito essa novela, não é? [risos] - que essa reforma agrária sempre prometida e nunca realizada, sempre tema de palanque e não de governo, ninguém leva a sério depois que se elege - porque promessas nós tivemos de todos os tipos - tem que ser realizada. E com urgência. Esse país não pode mais se dar ao luxo de manter a situação no campo como está hoje. Nós não podemos pretender nunca chegar a ser um país de Primeiro Mundo com essa coisa incipiente. Nossa agricultura é uma coisa vergonhosa ainda. E com tanta gente precisando trabalhar. Então, isso tem que ser feito. Acho o Movimento Sem-Terra é um movimento necessário. Tinha que nascer com a força que nasceu. Porque se não tivesse nascido, estaria todo mundo quieto. Se eles não estivessem entregues nessa luta, nós não estaríamos discutindo isso aqui.

Eugênio Bucci: Em quem que você votou em 94, para o presidente da República?

Benedito Ruy Barbosa: Agora em 94? Eu votei no presidente aí [Fernando Henrique Cardoso].

Eugênio Bucci: No primeiro turno?

Benedito Ruy Barbosa: É. Não votei no Lula [Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil de 2003 a 2009]. Gosto muito do Lula, nasci petista, deixei de ser petista a partir de um certo momento em que eu não estou... [sendo interrompido]

Eugênio Bucci: Quando?

Benedito Ruy Barbosa: Quando começam essas lutas intestinas no do PT [Partido dos Trabalhadores], que se personaliza o partido. O partido era uma esperança, não é? A força do trabalhador, de repente uma força política que pudesse mudar o rumo deste país... [sendo interrompido]

[Falam simultaneamente]

Benedito Ruy Barbosa: A implicância com a bandeira vermelha eu vou explicar aqui, porque deu muita falação.

Mônica Teixeira: Eu fiquei nervosa com isso, porque você disse que apóia o Movimento dos Sem-Terra, mas...

Benedito Ruy Barbosa: Espera um pouquinho, espera um poquinho [risos]. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. A bandeira vermelha, eu não estava me referindo ao Movimento dos Sem-Terra.

Mônica Teixeira: Mas pareceu.

Benedito Ruy Barbosa: Houve um mal entendido aí. Eu estava me referindo à bandeira com foice e martelo, que eu encontrei na estrada, e fiquei quatro, cinco horas com a minha família presa lá, não sabia o que era, um acidente... Quando eu cheguei, estavam os sem-terra lá, com foice e martelo. Aí eu falei: "Mas que cambada de imbecis!" O que tem a ver a foice e o martelo com esse movimento? Quer dizer: quem vem com a família ali, o que é que acha? Acabou o comunismo. Tchau, acabou. Utopia do século XX. Nós temos que pensar de outra forma.

Luiz Hafers: Mas essa é a preocupação do fazendeiro, talvez o menos seguro. Porque o radicalismo é fruto da insegurança. Esse que é o problema. Agora, quando você vê um sujeito na porta da sua casa, com uma bandeira vermelha com a foice e o martelo, a boa causa da reforma agrária, a que todos nós somos favoráveis, perde por exagero de argumento.

Benedito Ruy Barbosa: E todas vezes que a reforma agrária foi dita e deixada para trás, sempre aconteceu uma coisa: se misturou... o assunto da reforma agrária deve ser tratado tecnicamente, ideologicamente não tem mais lugar para isso. Quer dizer, você não pode misturar ideologia com reforma agrária, senão aí começa... é outro tipo de luta.

José Graziano da Silva: Mas você não tratou tecnicamente, você tratou como um conflito.

Benedito Ruy Barbosa: Mas é um conflito. Esta é a realidade que está aí.

José Graziano da Silva: Um conflito, inclusive, que você reconhece a legitimidade...

Benedito Ruy Barbosa: Claro que reconheço [ao fundo, sem interromper da Silva]

José Graziano da Silva: ... da ocupação das terras não utilizadas.

Benedito Ruy Barbosa: É, não utilizadas. Eu sou contra, sempre... [sendo interrompido]

José Graziano da Silva: Por que, então, você nunca usou o termo ocupação, sempre usou o termo invasão? Os únicos sem-terra que falam em invasão são os da sua novela.

Benedito Ruy Barbosa: Não, eu usei o termo ocupação também.

José Graziano da Silva: Nunca.

Benedito Ruy Barbosa: Usei ocupação sim, usei.

Mônica Teixeira: Não. Em todos os capítulos que eu vi você usou invasão.

Benedito Ruy Barbosa: Você viu todos? Todos?

Mônica Teixeira: Não, eu não vi todos. Mas eu ouvi invasão nos que eu vi.

[Falam simultaneamente]

Luiz Hafers: Mas é invasão, mesmo. Eu ainda agora tive uma discussão com João Pedro Stédile [economista e uma das principais lideranças do MST] e ele fez uma discussão entre invasão e ocupação. Isso é uma discussão semântica, porque quem está sendo invadido, vai convencer ele que é uma ocupação! Ora...

Benedito Ruy Barbosa: Realmente é uma questão de semântica aí.

Luiz Hafers: E é uma semântica para disfarçar uma ilegalidade.

Benedito Ruy Barbosa: Outra coisa também que a gente sabe que está acontecendo hoje: tem fazendeiro aí que não cuida do seu solo, e está rezando para ser invadido.

Luiz Hafers: Pela Luana [personagem sem-terra da telenovela O rei do gado, representada pela atriz Patrícia Pillar], principalmente [ao fundo].

Benedito Ruy Barbosa: É, porque: "Vamos logo aí que eu preciso vender este negócio para o Incra, meu irmão!". Ainda mais que eles estão pagando bem para burro...

Matinas Suzuki: Mudando um pouco, você sente na classe dos produtores rurais brasileiros uma disposição para modernizar? Essa classe também está mudando? Está mudando o ideário? Como é que você avalia isso?

Benedito Ruy Barbosa: Eu tenho conversado com os fazendeiros que têm até me deixado assim, com uma esperança muito grande de mudança deste país. Por exemplo, no sul de Minas, lá em Guaxupé, eu fiquei conhecendo - e hoje nos tornamos amigos - o senhor Olavo Barbosa. Ele tem café, café a dar com pau; é um empresário já de certa idade, uns 70 e poucos anos; e ele fala como se tivesse 30. Ele faz projeto para ele daqui há 20 anos. Ele produz o leite Fazenda Bela Vista. Eu estive lá várias vezes, nós gravamos muitas cenas lá dentro. E ele tem essa visão moderna de que não há outra saída para a agricultura, no Brasil, que não seja através da modernização da lavoura. Ele tem vaca lá que dá 32 crias no ano. Agora, usando o quê? Inseminação artificial, transferência de embrião com as barrigas de aluguéis. Enquanto o caboclo no campo aqui, ele vai ter a cada dois anos, uma vaca vai dar um bezerro para ele.

Esther Hamburger: Posso mudar um pouquinho de assunto, sair um pouco da questão agrária?

Benedito Ruy Barbosa: Pois não.

Esther Hamburguer: Falar um pouco assim dos personagens da novela [riso]. Muitas novelas têm personagens femininos fortes. O Rei do gado tinha personagens masculinos mais fortes que os femininos. E uma coisa interessante, é você ter o protagonista da novela que foi traído pela mulher e não tem uma reação violenta, não tem... Você está construindo uma idéia de homem diferente? Como é que é isso?

Benedito Ruy Barbosa: Não, eu acho que ... sei lá. Acho que a violência nunca resolve nada, não é? Então, mesmo no caso de uma traição que foi o caso da novela, eu quis mostrar o comportamento de uma pessoa que sendo rude, um fazendeiro, um homem do campo que foi peão de boiadeiro, normalmente a reação dele teria sido outra. Isso o que a gente costuma saber. Ali era cortar orelha, pegar o cara, capar e fazer essas coisas.

Esther Hamburger:  Mas ele tinha o pretexto de que ele queria se livrar da mulher também.

Benedito Ruy Barbosa: Não, é porque o casamento deles não vinha legal. A novela já começou mostrando que eles não estavam bem, entende?

Cristina Padiglione: Tanto que ele usou isso para se livrar da divisão dos bens e tal.

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente. Ali ele foi vivo, não é? Tentou sair fora. Mas as mulheres não eram frágeis, não! Aparentemente frágeis. A Luana era muito forte, a outra que chegou depois também, era forte só que ali não deu certo.

Esther Hamburger: Mas tem uma relação entre pai e filhos, por exemplo? Porque tinha tanto o senador quanto o Bruno Mezenga com os filhos dele, que é uma relação extremamente compreensiva e tal e que também... [sendo interrompida]

Cristina Padiglione: A de irmãos também que não era muito comum, não é?

Esther Hamburger: É, e que é um pouco diferente também do esteriótipo, vamos dizer assim. Você teve reações nesse sentido? As pessoas comentando?

Benedito Ruy Barbosa: As pessoas gostaram de ver isso. Eu sentia que a novela fazia bem para as pessoas, quando você dá um exemplo desses dentro de uma história que atinge 70 milhões de pessoas. E é porque, também, essa visão que eu tenho de pai. Eu tenho quatro filhos, tenho oito netos e sou um babaca com eles. Procuro ver de toda forma. Eu acho que é uma maneira legal da gente se relacionar com os filhos. Graças a Deus nunca tive problemas de droga com nenhum. Converso abertamente com eles. Eles conversam comigo abertamente. Eu acho que é esse tipo de relação que a gente devia... Eu já tive novelas minhas com grandes atritos entre pais e filhos também. Essa daí eu peguei no outro caminho. Mas eu acho que ali não precisava usar de violência dentro da família. Houve momentos de violência ou de incompreensão. Mas são coisas que foram superadas pelo bom senso.

Mauro Alencar: A época de Cabocla [exibida em 1979 e readaptada pelas filhas de Benedito Ruy Barbosa, Edmara e Edilene Barbosa, em 2004], você falava muito sobre voto livre, não é? Então eu quero saber, uma curiosidade minha. Como foi driblar a censura nessa época?

Benedito Ruy Barbosa: Ah! terrível!

Mauro Alencar: Porque foi uma grande novela, premiada e tal, e falava muito sobre o voto de cabresto e o voto livre. E acabou a novela pregando, falando sobre o voto livre.

Benedito Ruy Barbosa: É: "Vote nesta força, vote..." [Alencar sobrepõe sua fala, tornando o final do comentário incompreensível]

Mauro Alencar: Exatamente. Esta foi a última cena dela.

Benedito Ruy Barbosa: Então, ali acontecia o seguinte: eu escrevia a cena e a censura cortava. Passava cinco, seis capítulos, eu escrevia de novo - a mesma cena - e eles cortavam [risos]. Mudava umas palavras. Aí de repente eles não cortavam e ia para o ar. Fiz isso umas dez vezes já [risos]. Mesmo naquele final que... eu termino num palanque, não é?

Mauro Alencar: Exato.

Benedito Ruy Barbosa: Foi a novela que não terminou com ninguém beijando ninguém, nem casamento. Tinha um filho do Bonerges lá, o coronel, que era a mentalidade jovem, do político jovem, explicando para o povo: "Olha, vocês têm que saber em quem vocês votam, vocês estão votando. Vocês votam aquele voto pinga-pinga, senador e deputado que coligem voto de tudo quanto é canto. Aí você vai pedir para ele uma audiência, ele fala assim: "De onde é o senhor? De Cambuquira. Quantos votos de lá? Vinte.  Ah, não, então não recebo. Só recebo de 200 para cima". Não conhece a região, não conhece os problemas da região. Por isso que tem que haver essa reforma política urgente também, não é? Aliás, tem tanta coisa urgente. Este país fica esperando não sei o quê.

José Graziano da Silva: Sobre a questão da violência que você estava comentando. Realmente você fez um esforço de não ser violento. Agora, uma das cenas mais violentas é o assassinato do Regino, não é?

Benedito Ruy Barbosa: É, foi.

José Graziano da Silva: Até uma cena, num certo sentido, inesperada. O que é uma violência pessoal quase, não é? Levada e individual. Não é essa violência que nós temos hoje, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Eu sei que não.

José Graziano da Silva: Não é a violência do Estado, a violência da sociedade, a violência da Polícia Militar. Quer dizer, todos os massacres de trabalhadores rurais estão envolvidos de forma institucionalizadas, não é? Não são individuais.

Benedito Ruy Barbosa: A lição que eu quis passar com esse exemplo foi o seguinte: quem arma é responsável pelo tiro que essa arma vai dar. Aliás, tem essa frase: quem arma é responsável. Ainda que ele não tenha mandado, na seqüência ele até mandaria, se fosse o caso, se não resolvesse o problema dele, como ele está esperando. A expectativa dele é essa, receber do Estado indenização pelas suas benfeitorias, não é? Então, ele foi condescendente: "Olha, gente, não me mata boi. Fica nesse canto que eu estou vendo se recebo o dinheiro aqui". Tanto que, na seqüência, ele não recebe e eu botei as três mulheres lá marchando de novo, não é? Mas aí a mensagem foi a seguinte: quem arma é responsável pelo o que acontece com essa arma. E também tem a morte do senador. Por exemplo: eu recebi uns recados lá do próprio Congresso, através de uns amigos lá. Me disseram que estavam me cobrando: como é que eu mato um senador da República e ninguém fica sabendo quem matou, ou não vai ser punido? A resposta que eu dei na época, eu falei: "Pergunta o seguinte lá: quem matou, quais foram e por que os mandantes... aconteceu a chacina lá de Corumbiara [massacre de Corumbiara]? Cadê os assassinos do Eldorado de Carajás [massacre de Eldorado dos Carajás]? Se vocês me apresentarem, eu também mostro quem matou o..." [sendo interrompido].

José Graziano da Silva: Nesse sentido, você não acha que você foi muito condescendente com a Justiça? Sua novela passou uma imagem de um juiz chamado até de "Sua Santidade", não é?

Benedito Ruy Barbosa: Aquilo lá foi uma brincadeira [risos]. Ali era o espírito do menino, filhinho de papai, que acha que pode falar tudo o que quer.

José Graziano da Silva: E a justiça onde estava na novela?

Benedito Ruy Barbosa: Estava ali presente. O que é a justiça no Brasil? Vamos citar casos aqui? Lembrar casos que acontecem todos os dias? Outro dia teve em Brasília um caso aí terrível, não é? Se fosse o filho de um qualquer coitado, estava preso. Então, a justiça é isso mesmo.

[...]: Que caso? Que caso?

[...]: Do Odacir Klein [o filho de Odacir Klein, então deputado e ex-ministro dos Transportes, Fabrício Klein, de 18 anos, atropelou e matou um auxiliar de pedreiro que caminhava pelo acostamento; Fabrício, que dirigia na presença do pai e não prestou socorro à vítima, teve que ficar sem dirigir por dois anos e doar 24 cestas básicas a uma instituição que cuida de dependentes químicos, não tendo respondido por homicídio culposo nem omissão de socorro].

Benedito Ruy  Barbosa: É, é.

Mônica Teixeira: Mas não estaria preso, se fosse o filho de qualquer pessoa.

Benedito Ruy Barbosa: Não?

Mônica Teixeira: Porque ali não iria preso, entendeu? Porque ali é um problema de como a lei está armada, num caso específico lá.

Benedito Ruy Barbosa: Então muda-se a lei!

[Falam simultaneamente]

Luiz Hafers: Mas a justiça trabalhista é forte.

Benedito Ruy Barbosa: É sim, eu tenho um exemplo na minha vida agora [risos].

Luiz Hafers: A justiça trabalhista... Fala-se mal da justiça que é morosa. Fala-se mal da justiça, mas a justiça trabalhista... E uma das coisas muito interessantes é que os empregados sentem segurança por causa da justiça trabalhista. E ela é absolutamente forte.

Benedito Ruy Barbosa: É. Eu não posso discutir a justiça trabalhista porque eu nunca tive problemas com a justiça trabalhista.

Luiz Hafers: Eu tenho. E eu sou sempre o culpado antes de começar o julgamento.

Benedito Ruy Barbosa: O patrão sempre é, não é?

Luiz Hafers: Então, não se pode dizer que a justiça não funciona. Na trabalhista, se há alguma queixa, ela é que é a favor.

Matinas Suzuki: Benedito, você falou, fez uma brincadeira aí... Como é que ficou essa história sua com relação a SBT, que você... Dá para você rememorar esse caso, dizer como é que ele ficou? Como é que isso repercutiu em você?

Benedito Ruy Barbosa: Nesse caso... dessas coisas... que, do ponto de vista assim, eu réu [rindo], eu sei como é que as pessoas podem julgar. Mas, quando foi feita lá a audiência, eu fui e o Sílvio Santos não foi e nem mandou ninguém. Foi advogado contra advogado. E eu cheguei lá porque eu queria prestar o meu depoimento ao juiz. E eu não podia abrir a boca. Larguei de escrever a minha novela lá em Sorocaba, vim, cheguei aqui morto de cansado, fiquei um tempão no Fórum lá e fiquei sentado ouvindo os advogados falando. Bom, não pude falar. Não pude explicar para ele a minha versão que constava a minha defesa. Mas não era uma coisa que... Eu queria fazer de viva voz, e não houve isso, não é? E a sentença depois, que me foi passado pelos advogados, eu fiquei abismado. Porque: primeiro, diz o juiz que a novela é subcultura, sei lá, alguma coisa assim; que o autor de novela ganha demais, tanto que estão sendo disputados por duas grandes potências, a Globo e o SBT.

Cristina Padiglione: Ah, o juiz julgou a novela e a profissão de... ele não julgou... [rindo]

Benedito Ruy Barbosa: E, no final, me condenou a pagar dez milhões, não sei quantos mil reais. E também alegando, pressupondo que eu teria assinado o contrato com a Globo. E eu não tenho contrato com a Globo, nem sei se vou assinar, entende? Porque não vou escrever mais novelas, não sei se vai interessar a eles minha presença lá. Partindo do pressuposto também que quem vai pagar é a Globo, então tudo bem.

Cristina Padiglione: Não há como provar ao SBT que você não assinou a renovação de contrato com a Globo?

Benedito Ruy Barbosa: Claro. Está dito na minha defesa, mas o SBT alegou que eu assinei, e o juiz acreditou no SBT.

Mônica Teixeira : Mas o senhor não assinou?

Benedito Ruy Barbosa: Não!

Mônica Teixeira: O contrato com o SBT?

Benedito Ruy Barbosa: Com o SBT eu assinei.

Mônica Teixeira: Então por que o senhor desistiu?

Benedito Ruy Barbosa: Ah, por mil razões. Eu não quero nem falar isso aqui, porque eu vou me irritar se eu falar sobre isso aí eu vou  me irritar [rindo]. Não é possível eu ter que falar isso [sorrindo e olhando para cima]. Mas, o que foge ao entendimento do leigo -leia-se - é que o meu contrato com o Sílvio Santos rezava que, em três anos, eu teria que escrever para ele duas novelas. Então, você multiplica isso, são 12 mil laudas em três anos.

Matinas suzuki: É uma média de seis mil laudas cada novela?

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente. Então eu, na verdade, não ia ter descanso nenhum. Eu ia acabar uma e estar começando a outra, não é verdade? Mas esse contrato, no cômputo geral, equivalia a uma remuneração de cinco milhões e 800 mil reais. Que seria um belíssimo contrato para mim, não é? Abri mão dele. Agora, o juiz me condenou a pagar 10 milhões de reais.

Eugênio Bucci: Mas se esse é o contrato do SBT e você abriu mão, o da Globo deve ser ótimo.

Benedito Ruy Barbosa: Pressupondo inclusive que o Sílvio está tendo um prejuízo... é o tal de lucro cessante. Mas, se eu vou me apresentar para trabalhar só em 98... Talvez eu até faça isso, chegue no dia 1º de janeiro e fale lá para o Sílvio: "Estou aqui" [risos]. Não dá para pagar isso mesmo, não tem! Como vai pagar? Vou ter que trabalhar. Mas, que razões levaram ele a esse raciocínio? Se eu só vou começar a trabalhar no dia 1º de janeiro de 98, o juiz me condena a pagar mais cinco milhões por lucro cessante do senhor Sílvio Santos?

Cristina Padiglione: Em que pé que está a situação agora, vocês recorreram?

Benedito Ruy Barbosa: Estou recorrendo, quero ver se... pelo amor de Deus.

Mônica Teixeira: Já que estamos falando do SBT, eu queria perguntar uma coisa para você.

Benedito Ruy Barbosa: Aliás, eu queria muito ir para lá, sou amigo do Sílvio há 30 e tantos anos. Era a minha vontade participar dessa luta, implantar a novela para valer lá dentro, como eu fiz na Manchete, como eu fiz na Record, como fiz aqui. Sempre fiquei semeando. E eu queria ir para lá!

[Falam simultaneamente]

Mônica Teixeira: Mas por que você não foi?

Benedito Ruy Barbosa: Houve uma situação desagradável, entende? Em que eu me senti ofendido. Uma coisa que podia ser resolvida por telefone, mandaram um oficial de justiça na minha casa, e era para eu dizer sim ou não.

Cristina Padiglione: O Walter Negrão [importante dramaturgo brasileiro, escreve telenovelas desde os tempos da TV Tupi, já tendo escrito adaptações para televisões sul-americanas também] assinou um contrato com SBT também, e parece que não deve ir também. Porque que... pelo que eu sei não enviaram nenhum oficial de justiça a casa dele? Ficou dito pelo não dito.

Benedito Ruy Barbosa: Não sei. Então, comigo não.

Cristina Padiglione: Você não sabe qual é a diferença...?

Benedito Ruy Barbosa: Comigo, eu acordei às oito horas da manhã com o cara batendo na minha porta, e eu: "O que é isso, meu Deus?"

Mauro Alencar: Ruy, você não acha, em relação a isso tudo, que.... [sendo interrompido]

Benedito Ruy Barbosa: Esse assunto seria bom até ser cortado, que não deixasse ir para o ar [risos].  Eu não queria falar sobre isso. Nossa... [abaixando a cabeça com as mãos no rosto]

Mauro Alencar: Então, outro assunto. Não vou fazer, vou mudar minha pergunta. Orígenes Lessa [(1903-1986), jornalista e premiado escritor brasileiro, imortal da Academia Brasileira de Letras], na época de O feijão e o sonho [telenovela exibida pela Rede Globo, em 1976, baseada no romance homônimo de Orígenes Lessa, de 1938], chegou a dizer que você havia ampliado o romance dele. Muito bem. O romance vendeu extraordinariamente bem; Cabocla [inspirada no romance homônimo de Ribeiro Couto, de 1931] também; Sinhá Moça [inspirada no romance homônimo de Maria Dezonne Pacheco Fernandes, de 1950] também, no mundo inteiro. Então, a pergunta é para o adaptador Benedito Ruy Barbosa: quais são as suas prioridades ao adaptar um romance para a TV que invariavelmente têm grande êxito, sendo de sua autoria?

Benedito Ruy Barbosa: Bom, primeiro eu preciso gostar do romance, não é? O feijão e o sonho é um livro maravilhoso. E outra coisa, o Orígenes foi colega meu como redator de propaganda. Ele trabalha na Thompson [agência de publicidade], e eu também. Ele trabalhava na Thompson Rio, e eu, São Paulo, no tempo que eu trabalhava com publicidade. Ele vendeu esse romance para a Globo e, quando ele ficou sabendo que eu ia fazer a adaptação, ele falou na TV Educativa do Rio de Janeiro que... Eu dei uma sorte, porque ele me deu um ânimo... Eu estava deitado de tarde no meu quarto de hotel e estava vendo a TV Educativa. E ele falou em uma roda com intelectuais, que estavam cobrando dele: "Você vai vender o seu romance, a sua obra prima para a televisão?" Ele falou: "Vou vender. Recebi e não quero nem saber, mesmo porque quem vai adaptar é o meu amigo Benedito Ruy Barbosa e eu confio nele". Então, era uma coisa engraçada, porque a gente se falava quase todos os dias. Acabava um capítulo e ele chorava no telefone comigo, era um sarro: "Onde é que você foi buscar isso?" Eu li nas entrelinhas, está nas entrelinhas [rindo]. Inventarva cenas, mas eu sempre mantive uma fidelidade total aos personagens dele. O Campos Lara nunca deixou de ser o poeta Campos Lara.

Cristina Padiglione: Se a Globo quisesse hoje fazer algum remake de uma sua novela antiga, você iria permitir que outra pessoa escrevesse?

Benedito Ruy Barbosa: Dependendo da outra pessoa.

Cristina Padiglione: Você iria escolher?

Benedito Ruy Barbosa: Claro.

Esther Hamburger: Benedito, no começo de sua carreira você trabalhou na Colgate-Palmolive, quando a Colgate... quando as produções eram feitas...

Benedito Ruy Barbosa: É. Eu trabalhava na Thompson, J. Walter Thompson nessa época, e a Denison Propaganda [agência de publicidade] conquistou a conta da Colgate Palmolive. Mas, no contrato que havia entre a agência e a empresa Colgate, tinha uma cláusula que dizia que a Denison tinha que oferecer para a Colgate um editor de script. Ninguém sabia o que era isso. Para novela, não é? Então, eu tinha uns amigos meus dentro da Denison que foram atrás de mim e disseram: "Você não quer ser editor de script de novela? Eu disse: "Eu, de novela?" Eu odiava novela. Eu achava ruim demais aquilo lá. Mas aí, o espírito de aventura, fui saber o que era. Aí eu fui na Colgate - o Ricardo Ramos, o filho do Graciliano [Ramos] era o diretor de propaganda, na época - e eles tinham a Glória Magadan [autora de telenovelas cubana, exilada após a Revolução Cubana; faleceu nos Estado Unidos em 2001] já contratada.

Esther Hamburguer: É isso que eu queria saber também [sorrindo].

Benedito Ruy Barbosa: Então, no papo que eu tive com eles lá - eu tinha feito teatro, tinha ganho prêmios de revelação do ano - aquele negócio me ajudou bastante. Então, trocamos um pouco de idéia sobre o que eu achava de novela também e, no final, eles me contrataram. E eu saí da Thompsom para fazer isso. E comecei a trabalhar com a Glória Magadan. A Glória Magadan era uma autora - não sei se ela está viva ainda...

Mauro Alencar: Está.

Benedito Ruy Barbosa: Está viva ainda, não é? Ela tinha uma habilidade danada para lidar com novela, dentro daquele conceito de novela. Ela era cubana, não é? Então, ela escrevia em espanhol e eu lia em espanhol, eu mandava para um tradutor, voltava, eu lia de novo e botava a rubrica para a gente poder gravar. A primeira novela que eu fiz com ela foi [pausa]: Eu compro essa mulher [Rede Globo, 1966, baseada no romance O conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas], com [os atores] a Yoná Magalhães e o Carlos Alberto [Soares]. E aí eu já estava funcionando como supervisor. A escalação dessa novela eu fiz com o Walter Clark [(1936-1997), produtor e executivo de TV], da Globo. Nós dois sozinhos fizemos a escalação e tocamos. O Henrique Martins [nome artístico de Hanez Schlesinger, brasileiro, famoso diretor de telenovelas] foi o diretor, inclusive, na época. Bom, a partir daí eu não pretendia escrever novelas, mas eu lia tudo o que ela escrevia. Além disso, eu lia todos os originais que a Colgate comprava do exterior, para fazer uma avaliação. Era chato ler aquilo, meu Deus do céu [risos]!

Esther Hamburger: O que ficou daquilo tudo?

Benedito Ruy Barbosa: Nossa! Olha, não me valeu muito. Da Glória me valeu alguma coisa, uns truques que ela usava, entende? Que foi me alertando um pouco a cabeça. Mas, de qualquer forma, existia ali um modo da gente fazer aquilo, não é? Então, eu aprendi a como não fazer também, entende? E foi numa emergência... Eu tinha sugerido à Colgate que fizesse adaptação do Rochester - que eu falei - A vingança do judeu, porque a história era fantástica para novela. E o Walter George Durst [(1922-1997), politizado cineasta e escritor brasileiro] estava fazendo a adaptação. Aí teve uma reunião na Tupi, começou uma discussão dos diabos lá e eles não queriam aceitar o livro como era. Os judeus estavam em pé de guerra...

Esther Hamburger: Eles não queriam aceitar porque envolvia um problema religioso?

Benedito Ruy Barbosa: É claro. Tinha o rabino, tinha o padre católico... O livro é espírita e dava um cacete nos dois, entende? [Risos] Então, eu estava na reunião lá e a Glória Magadan comigo. Nós já estávamos com todos os figurinos prontos, todo cenário pronto, o elenco montado, ia começar dali a dois dias a gravação da novela. E a Glória olhava para mim e falava: "E agora? E agora? E agora?" De repente, me deu na... [aponta para a testa] e eu falei: "Olha, não é essa a história, não. Não é essa a história, não!" Nós não estamos discutindo o livro, nós estamos discutindo a novela. Inclusive, não é A vingança do judeu.  "Mas o que é?" Eu falei: Somos todos irmãos. Veio na hora [risos]! Somos todos irmãos - é ecumênica a novela! Aí a Glória falou assim: "Conta você a história. Conta você a história". Aí eu fiz assim, na viva voz, uma sinopse para eles. "Ah, mas o judeu é herói?" Eu falei: "Claro, tem olho azul, poxa, um negócio legal" [risos].  Aí eles toparam e liberaram a novela. Eu voltei para casa com a - eu tinha um fusqueta - estava com a Magda - com a Glória Magadan - e ela morava perto da minha casa também, aqui na Vila Mariana, na época. Ela falou assim: "Vai para casa, toma um uísque, senta na máquina e seis capítulos para começar gravar!" Eu: "Não, não vou fazer isso, não.  Não, não, vai fazer você. Aquela história que você contou, faça aquela história, aí o Durste vai fazer outra história que..." Na seqüência o Durste já fez outra novela. Eu cheguei em casa, nossa! Aquilo foi um suplício, viu? E eu não bebia, pior que eu não bebia [risos]. Aí sentei na máquina e não saía, e não saía, pegava o livro e olhava para o livro... Aí eu desci, peguei um uísque, tomei uma talagada [risos], sentei e falei: "Vai embora!". No dia seguinte, às dez horas da manhã, eu cheguei na TV Tupi já com dois capítulos. Entreguei para a diretora, para a Wanda Kosmo [nome artístico de Wanda Nerine Luizi (1930-2007), atriz, diretora e escritora brasileira], que dirigiu. Voltei para casa, dormi umas três horas, e voltei no dia seguinte com mais dois. E assim fiz os seis primeiros capítulos em três dias. Nós começamos a gravar e foi o recorde nacional de audiência da Colgate. Aí eu não quis largar mais, porque me deram salário extra. Eu falei: "Só vou fazer isso!" Só que era uma porcaria. Hoje eu fico imaginando como é que eu trabalhava de graça, nossa senhora!

Matinas Suzuki: Benedito, nós vamos fazer um rápido intervalinho e a gente já volta, daqui há pouquinho, com a segunda parte da entrevista com o Benedito Ruy Barbosa. Até já.

[intervalo]

Matinas Suzuki: Bem, nós voltamos com o Roda Viva que entrevista esta noite o dramaturgo Benedito Ruy Barbosa. [...] Benedito, até que ponto uma novela depende dos atores?

Benedito Ruy Barbosa: Muito. Você põe a novela a perder na escalação. Por quê? Eu sempre digo o seguinte - sem querer puxar a brasa para a minha sardinha - 50% é a história. Se a história não segurar, não adianta você investir em nada, entende? Mas, se você tem uma história boa e escala mal o elenco, ou tem um mau diretor, você corre o risco de não ter uma leitura correta da história que você está escrevendo. Então, quando uma atriz ou um ator, ele não encaixa no papel, você sente de cara isso. Então, o autor começa a correr atrás, começa a tentar consertar. Não está indo bem aqui, vou para cá. Não está indo bem aqui, vou para cá, entende? E nisso você se perde, você corre o risco de se perder.

Mônica Teixeira: Agora, quando que uma história segura, Benedito?

Benedito Ruy Barbosa: Quando na leitura... Sabe quando segura? Quando você manda o capítulo para emissora e o elenco corre atrás para pegar o capítulo. Quando o elenco diz; na hora eu pego e deixa para depois. Tem uns escaninhos lá... Eu sempre falei: "Não tem nenhum escaninho... nenhum capítulo aqui, senão..." [sendo interrompido

Mônica Teixeira: Mas isso é um resultado da história que segura. Eu quero saber o que, na estrutura da história, segura. Não que você deva aqui contar o seu segredo profissional, absolutamente [rindo].

Benedito Ruy Barbosa: Eu não tenho segredo, não. Eu tenho um hábito - até me gozam muito por causa disso - antes de escrever a novela, eu começo a contar para grupos de amigos. Então, eu estou na praia, tomando cerveja com o pessoal, batendo papo, e eu começo a contar uma história. E, de repente, eu paro. Se ninguém se interessou, eu falo: "Não está legal". Mas, se alguém perguntar: "Mas escuta, e depois o que acontece? Vai acabar como?". Se você, no relato, consegue prender a atenção de criar a expectativa em todos os personagens, quando você vai botar no papel vai funcionar. Outra coisa também que me dá segurança é você ver a reação dos atores, já pela sinopse. O ator lê a sinopse: ele se sente animado e entusiasmado com a personagem, é bom sinal. Na medida que você está mandando capítulo e essa expectativa vai crescendo, isso passa para o público, é normal. Eu sempre digo o seguinte... me chamam de chorão [risos]. Tem cena que eu estou escrevendo e eu me emociono. Eu não faço nenhuma barreira, entende? Meus netos acham que eu sou maluco, eles chegam em casa e falam: "O vô está rindo de quê? Está chorando por quê?" [risos]. Não é chorar de lágrimas não, eu fico comovido. Mas quando eu fico, o ator fica e o público fica também. E outra coisa: é fundamental uma mão firma numa direção. É muito. Por isso o pessoal fala... Eu esperei um tempo bem grande para fazer essa novela - O rei do gado -, esperando o Luiz Fernando [Luiz Fernando Carvalho de Almeida, cineasta e diretor de telenovelas e minisséries, dirigiu O rei do gado] ficar liberado para trabalhar comigo. Porque ele tem uma leitura correta, certeira do que eu faço. E ele é um co-autor, sabe? Ele é o autor da imagem, mas ele participa muito de perto comigo na novela. Então eu fico tranqüilo, não é? Nós nunca brigamos. Ele já dirigiu 440 e poucos capítulos meus. Nunca tive uma desavença com ele falando: "Aqui você errou..."; entende? Nunca, nunca, nunca! Por quê? Primeiro, porque ele é um entusiasta. Ele é um renovador, um criador, está sempre buscando uma linguagem nova, conhece Durst como poucos, não é? Tem grandes diretores na Globo, não quero com isso desprestigiar ninguém, porque já trabalhei com todos e sempre me dei muito bem. Mas o Luiz tem essa coisa, ele é estimulante. Então, esse casamento autor-diretor e elenco é fundamental. Agora, tem uma coisa chamada produção também. Nessa novela, eu sacrifiquei demais a produção, eu não me canso de falar isso. Por quê? Eu tinha um avanço de 40 capítulos, quer dizer, eu estava tranqüilo. Depois eu resolvi mudar o começo da novela. Eu estava escrevendo 38 ou 39, eu voltei para o oitavo e escrevi tudo. Aí a novela começou a gravar e, ao invés de ter 40, só tinha 20. Eu vinha sustendo os 20. Depois, para eu escapar do assédio que eu estava sofrendo em casa, de todo tipo - principalmente da imprensa, que não me da folga [risos], porque eu atendo todo mundo..

Cristina Padiglione: Fugiu para Sorocaba...

Benedito Ruy Barbosa: Eu fui para Sorocaba e fiquei lá isolado. Mas dei um azar danado, porque eu cheguei lá e tive um problema de coluna que eu não conseguia ficar uma hora no computador. Sentava uma hora e deitava no chão, uma hora e deitava no chão. E não tem nada pior na vida do que você tentar escrever com emoção, com uma dor desgraçada nas costas o tempo todo. De noite, eu deitava na cama e não conseguia ficar, ia para o chão e não conseguia ficar. Eu fiquei uns 15 dias assim, porque o meu acupunturista, meu massagista estava viajando.

José Graziano da Silva: Benedito, e a música, também não ajuda a segurar?

Benedito Ruy Barbosa: Ajuda, mas você tem... aí que está. Quando você está afinado com a direção, até na escolha das músicas fica mas fácil. Eu gosto da música rural, eu gosto da música sertaneja. Modéstia à parte, eu conheço bem isso aí porque nossa, sou amigo de...

Cristina Padiglione: Teve uma altura que começaram a falar que a novela estava cheia de clipes. Que tinha mais cena...

Benedito Ruy Barbosa: Então, mas foi a hora que eu estava passando apertado. Ninguém sabia [risos].

Cristina Padiglione: Que foi onde o Luiz Fernando...

[Falam simultaneamente]

[...]: Dava para sentir [mais de um entrevistador comenta].

[...]: Queimou o Pirilampo. Ninguém aguentava mais, coitado.

Benedito Ruy Barbosa: Eu chegava a falar assim: "Bom, não vou fechar 30 páginas de jeito nenhum".

Cristina Padiglione: Que foi quando o Luiz Fernando participou mais. Foi nessa altura, quer dizer, em relação ao diretor...

Benedito Ruy Barbosa: É. Aí eu botava: quem está cantando é o Pirilampo, está cantando o Saracura... Se tivesse mais alguém cantando podia entrar que...

Mauro Alencar: E no interior vendeu muito isso, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Vendeu demais!

Mauro Alencar: Quer dizer, acabou sendo uma saída ótima que... [sendo interrompido]

Benedito Ruy Barbosa: Tem dois tipos de reação. Tem gente que fica esperando a música.

Eugênio Bucci: Você que escolhe a música também?

Benedito Ruy Barbosa: Na maioria das vezes eu e o diretor. Tem o diretor musical também, porque a gente trabalha junto. Eu indico as minhas.

Luiz Hafers: Isso é uma coisa que eu acho muito importante: é que nós, os caipiras, do campo, temos uma cultura diferente do urbano. E essas coisas nos agradam. E 85% da população é urbana e 15% só somos nós. Eu acho muito interessante esse choque de cultura com as perspectivas de um problema ou de um gosto. Você se deu conta bem disso?

Benedito Ruy Barbosa: Eu aprendi uma coisa também: é que você tem uma população imensa aqui em São Paulo, mas a grande maioria tem barro na sola do pé. Ou vem do interior ou o pai veio, o avô veio... Então, os meus filhos estavam fazendo faculdade e uma vez eu voltei do Rio, eu estava fazendo a novela Paraíso e... até fiquei espantado. Cheguei em casa e me pediram para selecionar 12 músicas, porque eu tinha colocado o Sérgio Reis [cantor de música sertaneja] fazendo o Bentão, não é? Bentão não, era outro... Diogão! E me pediram - a [gravadora] Som Livre me pediu -: "Seleciona para a gente lançar o segundo disco". Porque estava dando muito certo o Sérgio cantando e o disco anterior não estava indo legal. As músicas não cabiam na novela, então não tinha como você encaixar. Aí eu cheguei em casa e tinha uns oito ou nove lá, estudando para... para fazer o... como é que chama?

[...]: Vestibular.

Benedito Ruy Barbosa: É, vestibular. Eu cheguei lá e: "Vamos acabar [batendo palmas], limpa aqui...", porque tinha o aparelho de som na sala. E disseram: "O que é?" Eu disse: "Eu vou ouvir umas músicas aqui, porque...". E quando eu expliquei o que era, eles ficaram todos comigo: "Não, então nós vamos ajudar!". Então eu comecei a colocar as músicas, selecionar e eles iam dando nota. Eu fiz a minha relação e bateu com a deles. Quando bateu... uma ou outra [movimentando a mão como uma balança, a pesar para dois lados]

Luiz Hafers: E eles eram urbanos?

Benedito Ruy Barbosa: Urbanos.

Matinas Suzuki: Você explica um pouco o interesse, o grande interesse por novelas como Pantanal, como O rei do gado por isso? Porque todo mundo tem lá um pé nessa...?

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho que sim.

Matinas Suzuki: Ou existe uma nostalgia desse mundo urbano, complicado e difícil?

Benedito Ruy Barbosa: É o comportamento das personagens também. Engraçado isso, não é? Porque você vive em São Paulo, uma cidade que te agride o tempo todo. Rio de Janeiro, mesma coisa. Você trabalha oito horas, fica duas horas para chegar no serviço, depois fica duas horas para chegar em casa, chega extenuado... Você senta na frente lá e você vai ver a avenida Paulista, Copacabana, Leblon, o jeito de falar... não é? De repente, se você liga você vê verde, vê boi no pasto, vê uma canção mais ingênua, mais gostosa, mais romântica... Os personagens são machos para burro [dando um murro na palma de uma das mãos; risos], é o tipo de gente forte. As mulheres também são maravilhosas... entende?

Eugênio Bucci: Mas olha só, aí tem essas novelas mexicanas que estão estreando agora. São 13 novelas no ar, cinco na CNT, mexicanas, que são isso aí: o personagem masculino é forte, a mocinha vai..., o romantismo...

Benedito Ruy Barbosa: Mas aí é outro tipo de fortaleza, não é [rindo]?

Eugênio Bucci: Está certo que tem uma claustrofobia ali [Ruy Barbosa ri], porque tudo se passa dentro de um estúdio, que deve ser quente e tal... horrível!

[Falam simultaneamente]

Eugênio Bucci: Mas, se as razões são essas, essas novelas mexicanas - que já fazem sucesso - não podem fazer uma concorrência séria para a novela brasileira e para o novelista brasileiro?

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho que depende da novela brasileira. Eu acho que uma novela como essa Miramar chegar a 20 pontos de audiência...

[...]: Marimar.

Benedito Ruy Barbosa: É mesmo, Marimar [risos]. Miramar... [debochando do próprio erro; risos] Ela atinge um determinado público, eu acho, sabe? Eu, por curiosidade, sempre vejo tudo. Pelo menos um capítulo ou dois, eu vou ver para ver do que se trata aquilo, o que é aquilo. E eu fiquei espantado, porque é muito ruim a novela! Para os nossos padrões, não quero também diminuir ninguém.

Mônica Teixeira: Mas as pessoas gostam, não é?

Eugênio Bucci: Pois é!

Benedito Ruy Barbosa: Então, mas é por causa... é de uma ingenuidade! Aquilo ali não força ninguém a pensar.

Eugênio Bucci: Mas é isso, o sujeito chegou do trabalho, cansado e tal...

Benedito Ruy Barbosa: Você está ali e morre de rir: "Como é chorona essa mulher, como é chata, não sei o quê!" [apontando para frente, como sentado diante de um televisor, apontando para ele]. Mas está ali vendo, não é?

[...]: É incrível como empolga!

Mônica Teixeira: Mas as mesmas pessoas que vêem Miramar [Marimar], os mesmos 20% de audiência que vêem Miramar, vêem O rei do gado também. E vão vendo a...

Benedito Ruy Barbosa: Graças a Deus [risos]!

Mônica Teixeira: Então, como que é possível?

Benedito Ruy Barbosa: Mas eu acho que a história do Rei do gado era uma coisa mais envolvente do que Miramar. Miramar era muito maniqueísta, não é? É novela totalmente maniqueísta.

[Falam simultaneamente]

Mônica Teixeira: Mas todas as novelas mexicanas são. As novelas da Glória Magadan eram maniqueístas.

Benedito Ruy Barbosa: Todas, todas. E são todas iguais, não é [rindo]?

Luiz Hafers: O México é, o México é maniqueísta.

Benedito Ruy Barbosa: É [rindo]!

Cristina Padiglione: Falando em maniqueismo, você chegou em uma altura em que nenhum personagem era absolutamente vilão no Rei do gado.

Benedito Ruy Barbosa: Nada, não consigo fazer isso.

Cristina Padiglione: Não existe o cara muito bom ou o cara muito mau...?

Benedito Ruy Barbosa: Não, porque na vida ninguém é ruim por ser ruim... [Padiglione interrompe e torna o final da frase incompreensível]

Cristina Padiglione:  E aquela receita que o autor diz que toda novela tem que ter um grande vilão e tal? Furada?

Benedito Ruy Barbosa: Não, eu não consigo, nas minhas novelas todas, aprontar um grande vilão. Porque, na verdade, eu não sei fazer o grande vilão. Eu fico justificando a maldade do cara de tal forma [rindo]... O Berdinazzi: roubou a mãe, roubou o irmão, fez o diabo, e a turma adorava!

Cristina Padiglione: Pois é. Acabou todo mundo torcendo por ele.

Mônica Teixeira: Agora, foi um problema para você - que disse no começo do programa que a questão central como autor é de manter a audiência - foi um problema para você a queda de audiência do Jornal Nacional causada pela novela, pelo sucesso Marimar?

Benedito Ruy Barbosa: Olha, eu acho que foi um problema para a Globo. Evidente que, quando... eu entrava com a novela, antigamente, por exemplo, no tempo de Renascer, eu recebia o Jornal Nacional com 50. Então eu chegar nos 62... Agora, durante essa novela - especificamente O rei do gado - tinha dia que eu recebia com 31.

Mônica Teixeira: É pouco.

Cristina Padiglione: Teve a época do TRE também, que subia 17 pontos.

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente. Com o TRE eu pegava lá em baixo, nossa! Então, o que acontece? Os primeiros quatro, cinco minutos, quando a minha novela começa pegar no breu e subir, eu herdei uma faixa de tempo com a audiência baixa, que somada à alta, depois...

Mônica Teixeira: Mas é que a Marimar concorria.

Benedito Ruy Barbosa: Então, a média podia ser 60, 61, 59 e a média ficava em 57, 58, 54, 55 por causa dessa herança da audiência baixa.

Mônica Teixeira: Você está dizendo que no último capítulo teve 68, você disse no começo, não é?

Benedito Ruy Barbosa: É, segundo o que me disseram. Eu não tive nas mãos.

Matinas Suzuki: Benedito, até que ponto o autor é autor mesmo da novela?

Benedito Ruy Barbosa: Totalmente.

Matinas suzuki: Eu digo pensando sobre essa questão: é verdade essa história... um personagem não está indo bem na audiência, você tem que tirar esse personagem?

Benedito Ruy Barbosa: Não é que não vai indo bem... [ao fundo, sem interromper Suzuki]

Matinas Suzuki: O personagem está indo bem, você tem que acrescentar... Quer dizer, até que ponto você - evidentemente você que escreve - mas até que ponto essa escrita é condicionada pela audiência, pela aceitação do personagem? Porque eu acho que isso é uma coisa interessante de saber: como é esse processo, como é escrever assim? Começando uma história sem saber direito como ela vai terminar, como ela vai ser?

Mônica Teixeira: Ou você sabe como ela vai terminar?

Benedito Ruy Barbosa: Eu sempre soube. Eu nunca mudei o final de novela minha. Mesmo no Pantanal, eu tinha que matar o Zé Leôncio lá, e o Sr. Adolfo Bloch [dono da emissora] me ligou pedindo pelo amor de Deus, para eu não fazer isso [risos]! Disse: "Você vai matar o pai dos brasileiros, não pode matar!" [risos]. Eu falei: "Não...". Depois que morreu, que ele viu o capítulo no ar, ele me ligou para dizer: "Olha, pelo amor de Deus..." "Não morreu, ele continua!" [Ruy Barbosa falando].

Mônica Teixeira: Então, mas isso é o eixo central, tanto é que ele voltou chatíssimo.

Benedito Ruy Barbosa: É, você não pode mudar.

Mônica Teixeira: O eixo central tudo bem?

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente, a sinopse tem uma trama central. Essa, para mim, é imutável. A menos que você encontre uma razão muito forte para alterar alguma coisa. Mas deve ser imutável. Você joga mais com as cenas paralelas.  Essas cenas paralelas enriquecem muito a novela e te causam surpresa. Por quê? Vou dar um exemplo só: a Walderez de Barros atriz de teatro, cinema e televisão], ela entrou para fazer a empregada do Berdinazzi. Quando eu comecei a perceber a atuação dela, aquilo me incentivou para burro, eu queria colocar mais em cena, entende? Então ela deixou de ser... era uma boa personagem, mas foi fantástica. Quando ela entrou na novela...

Eugênio Bucci: Mas é interessante como as empregadas domésticas assumiram um papel importantíssimo ali no meio da novela. Tudo passava por elas.

Benedito Ruy Barbosa: Mas passa, mas passa.

Eugênio Bucci: Todas as coisas encontram-se em torno do fogão. A Esther estava falando do papel dos homens, das mulheres, desse equilíbrio... Eu acho que tem, na sua novela, um papel muito importante das empregadas domésticas. Talvez mais importante do que nas outras novelas.

Benedito Ruy Barbosa: Mas elas são importantes [ao fundo, sem interromper Bucci].

Eugênio Bucci: Então a Judith, Walderez de Barros, foi muito importante, mas a Júlia também foi, a Iara Janra casou com o... tudo passava por ali.

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente.

Cristina Padiglione: Benedito, e a Rafaela, personagem da Glória Pires?

Esther Hamburguer: Como você imagina o público?

Benedito Ruy Barbosa: Olha, eu já vou falar [apontando para Padiglione]. Esse negócio de empregada... Empregada em casa, a que durou menos durou 20 anos. Eu tenho empregada que me ajudou a criar meus filhos e está criando meus netos. E são assim, seres humanos maravilhosos, porque eles choram com a gente, eles riem com a gente, eles participam da vida com a gente. Então, você não pode tratar como se fossem... "leva um recado, serve um café". Porque é mentira. Elas se preocupam, não é? Elas se preocupam. Um filho meu chegava tarde, ela fazia: "Mas o Ruyzinho não chegou?" "Calma aí" [Ruy Barbosa falando]. Ficava preocupada com o que está acontecendo com a família. Vira da família! Tem algumas que não abrem a boca, mas não quer dizer que não estejam participando.

Eugênio Bucci: Mas na novela elas não tinham tempo assim, de trabalhar. Elas só ficavam conversando e contando as coisas. Quando elas trabalhavam...?

[Falam simultaneamente]

Benedito Ruy Barbosa: Não! O que é isso? Elas faziam comida o dia inteiro. Coitadas, o pessoal está todo gordo lá [risos].

Cristina Padiglione: Só elas que trabalhavam! Benedito, houve essa diminuição da personagem da Rafaela, que se falou, pelo número de aparição ou pela importância dela. De repente, na última semana ela deu uma, nem se tocou...

Benedito Ruy Barbosa: Não, ali eu tinha... Eu comecei 15 dias antes a fechar as tramas paralelas. Você observou isso?

Cristina Padiglione: [Responde com som gutural, em sinal afirmativo].

Benedito Ruy Barbosa: Eu fui fechando aqui, fechando aqui, para poder ficar com a última para o último capítulo. Senão acontece aquele negócio que muitas vezes acontece em novela, que acontece tudo no último capítulo e você se sente frustrado: "Fiquei oito meses acompanhando, e de repente [fazendo som com a boca de cenas que passam em velocidade acelerada]: acabou!" Então, eu vim devagar: aqui acabou, aqui acabou, aqui acabou. No final, eles fizeram uma figuração de alto luxo no fechamento da novela. Então, todas as histórias foram terminando como deviam terminar. A morte do sem-terra lá, do Regino... Vou responder para você [virando-se para um dos entrevistadores]. Eu cheguei numa situação da novela que eu falei: "O que eu faço com ele?". A minha intenção - e não tive tempo hábil para isso - eu queria mostrar um assentamento. Cheguei até a conversar sobre isso com pessoas... Eu queria mostrar um assentamento funcionando, a cooperativa funcionando, mostrando no que pode resultar um trabalho bem feito, não é? Mas eu não tive tempo para mostrar isso. Eu quis também ali deixar a lição dele valendo e as mulheres assumindo o lugar. Essa liderança feminina que houve inclusive quando a Deolinda [líder sem-terra, mulher de José Rainha do MST. Ambos foram presos, ela uma vez e ele diversas vezes, por terem invadido/ocupado terras] foi presa, as mulheres invadiram o Pontal [do Paranapanema, região de ocupação] [rindo], por conta e risco delas, não foi? Quer dizer...

Mônica Teixeira: Elas foram com as crianças.

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente.

Cristina Padiglione: Benedito, você chegou a falar com o [José] Rainha durante a novela?

Benedito Ruy Barbosa: Cheguei a falar.

Cristina Padiglione: E ele te dizia "é por aqui" ou "é por ali"?

Benedito Ruy Barbosa: Ele ficou bravo comigo no dia que eu falei que eu não queria a bandeira vermelha [risos].

Mônica Teixeira: Deve ter ficado nervosíssimo [ao fundo, sem interromper o entrevistado].

Benedito Ruy Barbosa: Ele achou que eu estava ofendendo a bandeira dos sem-terra. E não era, ele não entendeu. Talvez eu não tenha explicado para ele direito.

Mônica Teixeira:  Mas o personagem chama Regino em homenagem ao Zé Rainha?

Benedito Ruy Barbosa: Isso aí foi uma coincidência danada, não é? Eu não conhecia o Regino.

Mônica Teixeira: Coincidência ou ato [rindo].

Benedito Ruy Barbosa: Eu não conhecia o Regino. Quando eu escrevi a sinopse eu já tinha botado Jacira e Regino. Aí um dia eu estava indo para o interior aqui, não me lembro para que cidade eu estava indo, aí surgiu o negócio do Regino, sem-terra, Pontal, não sei o quê. Foi quando começou a ferver, eu não tinha nem começado a escrever os capítulos ainda. Falei: "Rainha? Pô, eu tenho um Regino. Quem é esse cara?". Na seqüência, eu vi a entrevista que ele deu para uma rádio - também não me lembro - ele falando sobre a vida dele, que ele aprendeu a ler com o livro do Leonardo...

Eugênio Bucci: Boff [ex-padre católico, ideólogo da Teologia da Libertação].

Benedito Ruy Barbosa: É. Foi a cartilha dele e não sei o quê. Eu fiquei a viagem, um tempão, ouvindo ele falando sobre a vida dele. Eu falei: "Puxa, mas está parecendo o meu personagem, isso aqui eu vou ter que mudar". Mas na hora eu falei: "Não vou mudar, não. Não vou mudar, porque ele é um sem-terra, é um cara que é um líder aí, está tocando para frente um ideal de vida; então, eu vou deixar o Regino também".

Eugênio Bucci: O senador foi inspirado de propósito em alguma figura como o Eduardo Suplicy?

Benedito Ruy Barbosa: Não, não. Eu tenho uma admiração especial pelo Suplicy.

Esther Hamburguer: A propósito, por que só Suplicy e a Benedita [da Silva] participaram do...? [episódio da novela]

Benedito Ruy Barbosa: Não, ali todo mundo estava convidado, só eles foram.

Esther Hamburguer: Ah, foi por convite?

Benedito Ruy Barbosa: A gente queria... Vai quem quiser, entende? Vai quem quiser.

Eugênio Bucci: Não, eles foram especialmente convidados, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Não, eles foram.

Eugênio Bucci: E algum outro foi especialmente convidado?

Benedito Ruy Barbosa: Não sei. Eu deixei isso a cargo da produção. Eu pedi para convidar os dois.

Cristina Padiglione: Porque, de repente, você está tentando colocar a questão apolítica,  tirando da parte ideológica, colocando como um problema social que precisa ser resolvido. E aí entram duas personagens da vida real exatamente do mesmo partido [Partido dos Trabalhadores]. Você não acha que isso... embaralha um pouco?

Benedito Ruy Barbosa: Não. E outra coisa: o Sarney chegou a gravar o começo do enterro lá... ele gravou e depois pediu para não se colocar no ar. Seria maravilhoso se ele estivesse lá.

Cristina Padiglione: Por quê? Mas ele argumentou porque ele...? [Sendo interrompida]

Benedito Ruy Barbosa: Não, porque eles estavam naquela convenção, do PMDB [Partido do Movimento Democrático Brasileiro], e primeiro ele não deixou entrar o caixão porque disse que ia dar azar na convenção [rindo], alguma coisa assim; e depois ele não quis participar.

José Graziano da Silva: O senador teve um discurso governista muito forte, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Puxa, você achou governista? [Sem interromper da Silva]

José Graziano da Silva: Foi na semana da aprovação do ITR [Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural]. Ele fez uns três discursos ali defendendo...

Benedito Ruy Barbosa: Aquilo lá fui eu que fiz, não foi ele, não.

José Graziano da Silva: ... o ministro Jungmann [Raul Jungmann, foi presidente do Incra entre 1996 e 1999 e ministro extraordinário da Política Fundiária, ministério que, a partir de 2000 passou a ser chamado de Ministério do Desenvolvimento Agrário, de 1996 a 2002, até o final do mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso]. Isso foi uma merchandise política ou foi...?

Benedito Ruy Barbosa: Ponto de vista meu. Eu achava que devia ser aprovado. Inclusive, foram feitas concessões para a bancada ruralista aceitar. E achava também que esse sumário tinha que ser aprovado. Posso estar totalmente errado quanto a isso. Mas, pelas informações que a gente recebe, é um entrave a Justiça ficar demorando tanto para resolver um problema e, cada vez que ela demora, isso vai assoberbando de tal forma a coisa que chega um momento que fica insustentável. Então, não pode haver morosidade da Justiça quando se trata do problema agrário, do campo. Não pode.

Mauro Alencar: Eu queria que você comentasse um pouco sobre os Imigrantes. Inclusive Jânio Quadros [Jânio da Silva Quadros (1917-1992), presidente do Brasil entre janeiro e agosto de 1961] esteve nessa novela, enfim, para citar a intervenção da realidade na novela, uma coisa que você sempre buscou. Você vê um remake dos Imigrantes hoje? E d´O Feijão e o sonho hoje?

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho que... hoje não sei. Mas os Imigrantes seria uma novela que eu gostaria de regravar.

Mauro Alencar: Eu também de rever - e acho que todo o Brasil - porque foi uma grande epopéia.

Benedito Ruy Barbosa: Com a tecnologia apurada que a Globo tem...

Mauro Alencar: Exato, isso que eu pensei.

Cristina Padiglione: Você resolveu aquela coisa com a Bandeirantes de...?

Benedito Ruy Barbosa: Resolvi, fiz um acordo com eles. Fiz também com a Manchete. Autor tem que fazer acordo, minha filha, senão está ferrado [risos].

Cristina Padiglione: Como é que está a venda do Pantanal? Você recebe por isso?

Benedito Ruy Barbosa: Recebo.

Cristina Padiglione: E na Globo, logicamente, você recebe um percentual. Qual é esse percentual?

Benedito Ruy Barbosa: O meu?

Cristina Padiglione: Pela venda de uma novela na Globo?

Benedito Ruy Barbosa: É três por cento do valor, três por cento do líquido da novela.

[Falam simultaneamente]

Luiz Hafers: Você disse que uma porção de gente foi convidada. Pelos dois primeiros ou três primeiros capítulos, eu lhe escrevi do meu entusiasmo, de que trazia a vida rural para as casas em São Paulo, para o Brasil inteiro. Você não recebeu esta carta?

Benedito Ruy Barbosa: Devo ter recebido, sim. É o tal negócio, eu recebo tanta carta.

Luiz Hafers: A Sociedade Rural espanta tanto [risos]! A Sociedade Rural Brasileira causa aflição?

Benedito Ruy Barbosa: Não, a mim não.

Luiz Hafers: Porque eu tenho notado que há uma certa aflição. E a [Sociedade] Rural é moderna, tanto assim que eu fui escolhido presidente [risos].

Benedito Ruy Barbosa: Mas eu estou dizendo que eu tenho vários fazendeiros amigos meus que são modernos e que acham que têm que ser resolvido o problema da reforma agrária, tem que ser resolvido. Porque se não resolver, vocês não vão ter sossego.

[Falam simultaneamente]

Luiz Hafers: Mas a Rural tem sido - inequivocamente - a favor.

Matinas Suzuki: Você tem fazenda, Benedito?

Benedito Ruy Barbosa: Eu tenho dois alqueires, mas esse ano eu colhi 12 sacos de feijão, colhi milho pra burro...

[...]: Não é um latifúndio improdutivo? [Risos]

Benedito Ruy Barbosa: Não, que nada! Lá não tem nem lugar para plantar [rindo].

Mônica Teixeira: Benedito, você acha que as pessoas sabem perceber a diferença entre a ficção - vamos dizer, a versão que você está apresentando da realidade, no caso que você usa elementos reais - e o noticiário, que vem antes ou que vem depois?

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho que fazem uma mistura danada.

Mônica Teixeira: É, eu também acho. É essa a impressão.

Benedito Ruy Barbosa: Olha, fazem uma mistura. Por isso que você corre riscos, precisa ter muito cuidado, muito cuidado. E não é outra coisa que eu vou dizer... vira verdade, sabe? Pelas cartas que eu recebo, a reação do público é que está acontecendo mesmo. Nossa Senhora! A morte do Regino lá, daquela tropinha, os quatro lá, precisa ver cartas que eu recebi, telefonemas: "Não devia ter matado". "Por que você matou?" "Por que não sei o quê?".

Esther Hamburger: Qual é a influência da novela, então? Como é que você trabalha esse... ? [Sendo interrompida]

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho que desperta um pouco. Primeiro, desperta a curiosidade para entender do assunto, vira tema de debate em sala de... nas salas mesmo, não é? Acaba o capítulo e eles ficam discutindo a invasão, o que aconteceu. Eles começam a discutir não só o amor que aconteceu lá, eles começam a discutir o lado político da novela também. Isso é demais. Aquilo que eu disse no início, o tipo de cartas que eu já recebi em outras novelas não tem nada a ver com o tipo de carta que eu recebi dessa. Essa era atuante, participante, as pessoas... [sendo interrompido]

Esther Hamburger: Porque a novela intervinha na conjuntura.

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente. E as pessoas levavam aquilo sério. Me davam sugestões, o que eu devia fazer com um personagem, o que eu devia fazer com o outro. Quando começou aquele negócio, começou a surgir noticiário, que o pessoal do Pontal estava se armando, que a DR estava se articulando, as cartas só falavam disso: "Denuncia Benedito, denuncia! Senão vão matar todo mundo lá!".

Mônica Teixeira: Mas então, eu tenho a impressão, justamente porque foi de grande atualidade... quer dizer, no início você foi super feliz. Acho até que você sacou que ia ser de grande atualidade mesmo, porque a questão é candente, ela está aí, ela é... ela só vai crescer. Está lá o Zé Rainha hoje levando... durante dois meses eles vão ser notícia, até chegar em Brasília. Então, o Movimento dos Sem-Terra, nesse ponto, também é bom marketeiro, não é? Mas o que eu quero dizer é o seguinte: justamente por ser de tanta atualidade, você não acha, que para as pessoas que assistiram a novela - que é praticamente todo mundo -, o Movimento dos Sem-Terra não é exatamente aquilo que você mostrou? E os fazendeiros não são exatamente os fazendeiros que você mostrou? Entendeu que eu quero dizer?

Benedito Ruy Barbosa: Entendi. Eu acho que... [sendo interrompido]

Mônica Teixeira: Porque o que você estava apresentando é uma versão, mas você não acha que ela corre o risco de ter se tornado, vamos dizer, como se ela fosse o real?

[...] : A verdade absoluta.

Benedito Ruy Barbosa: Teve uma coisa engraçada no começo, não sei se vocês chegaram a ler isso aí. Um fazendeiro, não sei de que região aqui, matou um boi e mandou entregar para os sem-terra que estavam na porta da propriedade dele. Ele viu na novela isso e achou que era uma forma de se aproximar, de criar um relacionamento melhor. Ele fez isso, não é? Outra coisa também muito forte, pelas reações que eu recebo: as pessoas adoraram a atitude do Mezenga, indo lá no Senado dizendo: "Se vocês não tirarem, eu não vou usar arma". Ele não usou arma. "Eles entraram por engano lá, então vocês que botaram, vocês tirem, senão eu boto a boiada aqui" [fala da personagem Mezenga]. Então, o pessoal [batendo palmas]... isso o fazendeiro... legal! Já quando você fala em... No noticiário, aparece o fazendeiro que está se armando e o diabo a quatro, a reação é: "Não deixa". Eles pedem ajuda na novela: "Fala para não se armar!".

Mônica Teixeira: Então há uma grande confusão.

Benedito Ruy Barbosa: Ao mesmo tempo que o sem-terra ficou louco da vida comigo quando eu falei: "Esse discurso está errado". Na minha opinião, não sou o dono da verdade, mas eu acho que a grande luta é a terra.

Mônica Teixeira: Mas é que você é o dono da verdade.

Benedito Ruy Barbosa: Na medida em que um líder, não é? Como o... como é que chama o... que estava aqui comandando quando invadiram o Incra, pela penúltima vez...

Mônica Teixeira: O Stédile?

Benedito Ruy Barbosa: Não, não é o João Pedro, não.

Luiz Hafers: Gilmar Mauro [membro da coordenação nacional do MST].

Benedito Ruy Barbosa: Gilmar Mauro. É. Primeira coisa: eu estava vendo o jornal em casa e fizeram uma tomada assim, daquele sem-terra deitado no chão, aquele povo todo ali não é? Dá uma pena danada disso. Aí, câmera nele, microfone nele, ele falou: "Daqui nós vamos invadir a Vale do Rio Doce, nós somos contra a política econômica do governo, nós vamos para o ABC fazer greve com os metalúrgicos..." Aí eu botei o pé atrás. Eu falei: "Espera um pouquinho, já virou partido político. Não é mais Movimento dos Sem-Terra, aí já é partido político. Já quer interferir a economia do país, já quer interferir na estratégia de privatização...". Então, eu acho que, como cidadão, ele tem todo esse direito. Isso é uma questão até de afirmação da própria cidadania. Mas um líder que está carregando nas costas esse movimento que é conflitante, muita gente tem medo disso, não tinha... Quer dizer, faltou para ele um pouco do bom senso para ele fazer...

José Graziano da Silva: Eu não consigo entender bem isso, porque você mostrou a novela inteira que a reforma agrária não é um problema técnico, que a reforma agrária é um problema político, e é um problema de buscar alianças.

Benedito Ruy Barbosa: Não, eu mostrei que é técnico.

José Graziano da Silva: Como técnico?

Benedito Ruy Barbosa: Eu falei que não é um problema ideológico, porque fica imbecilizada a discussão... [sendo interrompido]

José Graziano da Silva: Não, é diferente. Como técnico? Tem lá o Pontal do Paranapanema, tem um grileiro e tem um sem-terra. Como que é técnico?

Benedito Ruy Barbosa: Mas vem cá, vamos falar do Pontal. São terras devolutas, não são? Então quantos há nessa família?

José Graziano da Silva: Então, e você mostrou bem isso, você mostrou toda a maracutaia aí, do cara invadir, ocupar, desapropriar...

Benedito Ruy Barbosa: O meu personagem diz que ele detesta terra. Aquilo lá era do avô dele e, na seqüência, o pai o abandonou.

José Graziano da Silva: No entanto, ele quer receber indenização.

Benedito Ruy Barbosa: Ele quer receber pela benfeitoria dele, não é? Agora, o que acontece em cima disso?

José Graziano da Silva: Não é uma luta política essa?

Luiz Hafers: Benedito...

Matinas Suzuki: Um de cada vez! Vamos deixar ele responder aí você faz a sua... Um de cada vez, por favor.

Benedito Ruy Barbosa: Tudo é político [acendendo um cigarro], você abriu a boca você está fazendo política. Dentro de casa, brigando com a tua mulher, é político. Então, o que eu queria discutir é isso aí. Quer dizer, lá existem, no Pontal, propriedades que são produtivas. Não importa se o cara é grileiro, ou se ele é posseiro, não importa, entende? Mas ele está lá, ele está produzindo e eu defendo a posse dessa terra. Eu não defendo a posse da terra improdutiva. Improdutiva não, ela tem que ser estéril, para ser improdutiva, terra abandonada. Essa, para mim, não tem dono. Agora, o Estado tem que agir antes que seja necessário alguém invadir. Se o Estado não age, ele está justificando o que está precisando de terra entrar lá. E outra coisa, eu acho que não pode haver... a invasão não pode servir de motivo para o Incra aumentar os preços dessa terra. Eu acho que ela tem que ter um justo valor. E o Estado tem que pagar por esse valor, porque quem paga somos nós, os contribuintes.

Matinas Suzuki: Vamos deixar o Luiz Hafers, ele quer fazer uma...

Luiz Hafers: Essa questão, Benedito, eu acho que o senhor colocou bem, porque a maioria das pessoas que estão lá, estão de boa fé. Compraram essas terras, registraram, e têm uma pendenga jurídica. E tem a Justiça para responder.

Benedito Ruy Barbosa: E vê há quantos anos, há quantos anos?

Luiz Hafers: Cem anos, oitenta anos.

[...]: Desde 1856.

Benedito Ruy Barbosa: Aí é que entra a Justiça morosa.

[Falam simultaneamente]

Luiz Hafers: Existe um ressentimento que acha que, além de fazer a reforma agrária, precisa punir o fazendeiro.

Benedito Ruy Barbosa: Esse não, esse é outro.

Luiz Hafers: Mas isso por trás tem esse ressentimento. E eu acho que nós temos que resolver o problema, e não provar quem fez ou quem não fez. Então, essa é uma das grandes queixas de quem está lá há 50, 60, 70 anos, trabalhou, tornou produtiva. Eu acho que você colocou muito bem. Tem uma dúvida: é jurídica? Resolva-se, indenize-se.

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho o seguinte: não se justifica, de forma alguma, você tirar a terra de quem está produzindo para dar a outro para entrar lá para produzir ele. Se está produzindo, pega uma que não está e dá para quem quer produzir. Agora, você desalojado de um local de trabalho também...

Luiz Hafers: Mas há subjacente uma versão de punição. O Gilmar Mauro dizia - eu debati várias vezes com Gilmar Mauro -e ele não esconde que, junto com a reforma agrária, eles querem uma punição.

Benedito Ruy Barbosa: Aí que entra a foice e o martelo [símbolos que estão na bandeira comunista], que eu falei. É um sentimento... sabe? De... vira luta de classes.

Luiz Hafers: Exatamente. O Guedes [Luís Carlos Guedes Pinto, engenheiro agrônomo e ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, foi professor da Unicamp e presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária, que tem ligações histórias com o Movimento dos Sem-Terra] fala isso claramente. Não é verdade, Graziano, que o Guedes fala isso claramente?

José Graziano da Silva: Sim, sim.

Luiz Hafers: Ele diz que não há reforma agrária sem expropriação, quando eu quero reforma agrária, eu não quero expropriação.

José Graziano da Silva: Benedito, você acha justo indenizar uma pessoa, por exemplo, dessa fazenda do massacre do Eldorado [massacre de Eldorado dos Carajás]? o sujeito pegou o nosso dinheiro do incentivo fiscal, torrou o dinheiro, tinha se comprometido - a terra não é dele - ele recebeu aquilo para torná-la produtiva.

Benedito Ruy Barbosa: Não tornou?

José Graziano da Silva: Vinte anos depois não tornou. E ele quer ser indenizado, você acha justo isso isso?

Benedito Ruy Barbosa: Indenizado de que?

José Graziano da Silva: Pois é! Não tem que ser indenizado. Isso que é a punição, não é? Isso é punição, não indenizá-lo pelo o que ele não tem direito. Talvez fazer ele devolver o dinheiro que ele gastou, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Mas muita gente usou o incentivo fiscal para comprar terra no Pará, em Mato Grosso, em Goiás... mas poucas - inclusive grandes empresas fizeram isso - poucas foram para frente. A maioria está abandonada, não é? O senhor deve ter conhecimento melhor do que eu [apontando para Hafers].

Luiz Hafers: É verdade.

Benedito Ruy Barbosa: É, eu sei! Então, realmente, quando você tem um país...

Luiz Hafers: É difícil tocar roça, viu?

Benedito Ruy Barbosa: É, eu sei. Outra coisa também que eu defendi na novela - não sei se você concorda comigo: é muito duro lidar na terra [Hafers ri], é muito difícil, sabe? E outra coisa, nós estamos fazendo caminho de volta. Porque, na época da industrialização, quando houve o êxodo rural, começou a vir nego que estava com a enxada na mão, cheio de calo, para apertar parafuso. Agora eles sabem apertar parafusos mas não sabem lidar com a enxada. Estão fazendo o caminho de volta.

Matinas Suzuki: Benedito, você alguma vez chegou a pensar que você tem a maior tribuna do país?

Benedito Ruy Barbosa: Isso dá um medo desgraçado.

Mônica Teixeira: É, porque você é o dono da verdade, é isso que ele está falando.

Benedito Ruy Barbosa: Não, isso é uma responsabilidade. Você sabe que isso, às vezes, deixa a gente meio perturbado. Quando você sabe que, em uma novela, uma questão mal colocada, você pode induzir pessoas a receberem aquilo lá como aquela verdade absoluta, não é? Você cria modismos, costumes.

Eugênio Bucci: Eu acho que as pessoas pensam normalmente - sobretudo em relação à Rede Globo - que existe o controle ideológico, que o Dr. Roberto Marinho fica lá do seu lado: "Não, não escreve isso não, não escreve isso...", editando tudo, cortando tudo. E o que você tem falado aqui aponta uma outra direção, e o Matinas acabou de dizer se você não se sente com a maior tribuna do país... Indo um pouco adiante nisso, porque o que o jornalismo mostra é uma coisa mais ou menos debatida, de algum jeito tem algum controle. Não censura, mas tem um debate. Você não, é o soberano, o dono da verdade... Quem controla o dono da novela? Você não tem uma interferência.

Benedito Ruy Barbosa: Não tenho.

Eugênio Bucci: Ninguém manda em você? Quem controla o dono da novela ou o autor da novela? Se você quiser pôr os fazendeiros no paredão e fuzilar todos e vai evoluir assim a trama, qual é o limite?

Benedito Ruy Barbosa: Eu acho que tem que ser meu bom senso, não é? É isso que eu estou te falando. Quando você recebe números de ibope e fala assim: "Ontem você teve 68 milhões"... Calcula em termos de Brasil...

Eugênio Bucci: Então quem controla é o público, você diria?

Benedito Ruy Barbosa: Não, eu acho que é o bom senso mesmo. Quer dizer, é evidente que, se eu quisesse pregar, botar fogo no campo, não iam me deixar fazer.

Eugênio Bucci: Quem não ia te deixar fazer? Quem é o seu... ?

Benedito Ruy Barbosa: A imprensa tem uma linha editorial, entende?

Eugênio Bucci: Alguém lê os capítulos antes. É o diretor?

Benedito Ruy Barbosa: Não, ninguém. Só quem lê é o diretor e a produção.

Eugênio Bucci: Quem não ia te deixar fazer?

Mônica Teixeira: Mas quando estivesse gravando, acende a luz vermelha. Também não é assim. Não tem controle ideológico mas também não...

Benedito Ruy Barbosa: Não, não. Tem um controle de qualidade que, se eu extrapolasse, evidentemente que, de repente, alguém ia pegar no telefone e ia falar: "Boni, no capítulo 55 o Benedito mandou matar todo mundo que é fazendeiro [risos]. Vamos deixar passar isso?" Ele ia falar: "Você está ficando louca!". Aí ligariam para mim: "Benedito, essa cena aqui vamos tirar, você não pode falar isso". Nunca aconteceu, porque nunca banquei o...

Eugênio Bucci: Mas você não nota que as novelas sempre puseram para o país questões que o jornalismo sempre atrasou? Não acontece isso?

Esther Hamburguer: As novelas anteciparam questões, eu acho.

Benedito Ruy Barbosa: É. A novela acontece o seguinte: nós sofremos, durante um período do golpe militar, uma restrição da censura que era uma coisa desesperadora, sabe? Para você ter uma idéia, no Pedacinho de chão, que eu fiz aqui na TV Cultura, eu tive assessoria da Secretaria da Educação de São Paulo, da Secretaria da Agricultura, tinha assessoria do pessoal aqui do Instituto Biológico de Campinas, e mais uma...

[...]: Agronômico, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Instituto Agronômico, desculpe. Então, eu estava muito calçado, porque eu não queria cometer erros, não é? Então, eu não tinha certeza de alguma coisa, eu tinha uma pessoa para a qual eu ligava, e dali dez minutos eu recebia a literatura a respeito ou informação por telefone. E teve uma cena lá, em que houve uma invasão, uma briga entre dois fazendeiros... O grande conflito dessa novela era uma plantação de milho híbrido contra o milho comum, de semente degenerada [risos]... E eu estava tentando explicar para o público: "Olha, vocês têm que pegar o milho, pegar o milho híbrido, o hp não sei o que lá - não me lembro do número mais -, vocês têm que corrigir o pH do solo, vocês têm que adubar o solo...". Ao mesmo tempo em que eu também defendia que os fazendeiros deveria colocar as crianças na escola, que o futuro daquelas crianças... só a escola que ia abrir o caminho para eles. A censura me proibiu  tocar o hino nacional na igreja, lá da escolinha... Olha que coisa linda: tinha um personagem lá que chamava Chico Viramundo, ele pegava o violão e ensinava os caboclos a cantar o hino nacional. E a professora pegou a bandeira - era uma data histórica, na novela - ela botou a bandeira do Brasil em cima da mesa assim [gesticula como se houvesse uma toalha estendida sobre uma mesa, enfatizando com a mão o caimento da toalha nas arestas], como se faz na mesa de... E ele ensinando... Cortaram, a censura proibiu a cena porque não era permitido tocar o hino nacional, a não ser em ocasiões especiais e tal. Não podia tocar. Aí teve uma outra cena em que a menina chegava em casa, pegava uma espingarda do pai e levava para o pai, porque o pai estava sendo assediado... dono de uma terrinha lá e estava sendo assediado na terra. E ela veio buscar a arma para o pai se defender. Não teve conflito nenhum. Num bloco de 12 capítulos, uma senhora censora me cortou 12 cenas! Desmontou a história! Bom, a Globo era co-produtora da novela. Eles me avisaram e eu parei de escrever, fui para Brasília e fiquei três dias lá em Brasília para liberar. E quando eu comecei a discutir com o chefe da censura da época, que era um... um coronel lá, não me lembro o nome dele mais. Ele estava numa irritação louca e me recebeu muito mal. Aí eu comecei a ponderar: "Olha, por favor, eu queria que o senhor me desse a oportunidade. Monta um time aqui para recensurar esses capítulos, porque não tem cabimento cortar. A novela é educativa, está sendo feita sob a égide do estado, porque não sei o quê...". E ele não queria nem conversar comigo, não queria me dar chance nenhuma. Aí num momento eu falei assim: "É um absurdo o senhor, censor federal, tem essa máquina na mão, esse poder na mão, censurar uma história dessa? Uma história cheia de pureza, romântica, ensinando vacinação, ensinando trato com a terra, ensinando outros valores para esse pessoal do campo..." Porque essa novela fez todo mundo se vacinar aquele ano, fazia fila de gente para se vacinar.

Esther Hamburguer: Ah, isso teve?

Benedito Ruy Barbosa: Foi um exemplo fantástico, a novela dele. Aí ele falou para mim assim: "Olha aqui..." - coisa mesmo de milico [militar] falando com soldado raso - "Olha aqui rapaz, eu já censurei o William Shakespeare, porque eu não vou censurar o Ruy Barbosa? [risos] Ainda por cima Benedito!". Aí eu falei: "Não dá para convesar com o senhor! Não dá para...

[Falam simultaneamente; risos]

Esther Hamburger: Eu li no jornal que o conflito entre os Mezenga e os Berdinazzi teria sido inspirado numa história real entre uma família...

Benedito Ruy Barbosa: Não, isso foi uma coincidência enorme, porque eu fui para Vera Cruz acho que com uns quatro ou cinco anos de idade, não é? Eu nasci em Gália, depois meu pai foi trabalhar no jornal de Marília, depois ele veio para Vera Cruz e fundou A voz de Vera Cruz, o jornal de lá. Então, com quatro ou cinco anos... então, nasci em Vera Cruz, não é? E depois, quando eu com 13 anos para 14 eu fui trabalhar como recebedor de café e auxiliar de guarda livros numa firma que tinha lá, a Comercial Antônio Pedras S.A., que comprava café. E eu fazia o controle de sacaria. Então, no controle que fazia a sacaria, tinha um cliente que chamava Mezenga, que eu fiquei conhecendo. Era um italiano, uma figura fantástica! Difícil negociar com ele, nossa senhora! [risos] Na hora de fechar [as contas do] o café que ele entregava era isso aqui [passa uma das mãos em frente à testa e estala os dedos]. Sempre tinha que dar 50 centavos a mais do que dava na bolsa de Nova York, senão ele não... Ele nem sabia onde ficava Nova Iorque, mas discutia, sabe? [risos] E... era Mezenga. Eu gostei desse nome, a figura dele me impressionou na época.

Cristina Padiglione: E você tinha quantos anos?

Benedito Ruy Barbosa: Eu tinha 13 para 14 anos.

Cristina Padiglione: E guardou esse nome na cabeça?

Benedito Ruy Barbosa: É, eu guardei. E guardei o Berdinazzi, porque o Berdinazzi, em Vera Cruz, era coveiro do cemitério, chamava-se Adolfo Berdinazzi. Eu ganhei... quando na [Segunda Grande] Guerra, em 44 [1944], teve aquele momento do remake, que eu botei na novela...

Matinas Suzuki: Você não poderia explicar porque você colocou esse nome...

Benedito Ruy Barbosa: É, é, já vou explicar. Meu tio era escrivão de polícia em Gália, e lá eles fizeram uma limpeza. Pegaram tudo quanto foi arma de japonês - japonês não podia andar armado - e entre essas armas que eles recolheram, o meu tio pegou e me deu uma Flaubert, uma Hamilton. Foi a primeira arma que eu tive. Então, eu ia pescar, domingo de manhã andava sete quilômetros e ia pescar no rio da Garça - que morreu esse rio, como morreu o rio das Antas também, que eu falei na novela, os dois rios estão mortos - e ia pescar lá. Vinham aqueles marrecos e eu ficava tentando matar. Raramente acertava, porque é difícil acertar um marreco com uma bala [rindo]... E um dia, o marreco veio assim e... ele estava fumando um cachimbo de barro e eu arranquei o cachimbo da mão dele [gestua o movimento da bala atingindo o cachimbo que o Berdinazzi segurava; risos]. Ele deu um berro lá, nossa senhora! Aí fui lá, e quando eu vi, pedi: "Sr. Berdinazzi, pelo amor de Deus, o senhor não conta para a minha mãe...". Ele falou: "Não, tudo bem". Só que a primeira coisa que ele fez quando chegou na cidade - tinha o bar do Bertoni, onde os pescadores chegavam para tomar cerveja, botavam aquela peixarada...

Cristina Padiglione: Foi contar a história...

Benedito Ruy Barbosa: É, o desgraçado contou. E eu não fiquei sabendo que ele tinha contado, as comadres chegaram... Eu sei que, quando cheguei, minha mãe... tinha sumido minha arma e eu nunca mais achei.

Eugênio Bucci: Ainda bem, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Aí a minha mãe deu para um tio, meu tio chegou aqui em São Paulo, vendeu essa arma e comprou... o primeiro terno de casimira [tipo de tecido] que eu tive, ele comprou com essa arma. Só que deu tanto azar que o dia que eu estreei, caí da bicicleta e acabou com o terno, arrebentou tudo [risos]. Então, eu não me esqueci dos Mezenga e dos Berdinazzi. Berdinazzi por causa desse lance, e os Mezenga por causa também da... Mas a família dos Mezenga lá, eu conhecia a Soraia mesmo, ela deu uma entrevista. Inclusive, teve uma reunião do pessoal de Vera Cruz e eu fui na recepção para rever os amigos de infância e tudo, e ela estava lá, já uma senhora. Mas ela era menininha não é? Mas esse conflito do Mezenga e do Berdinazzi nunca existiu. Um era coveiro, o outro era fazendeiro...

Esther Hamburguer: Mas ela era Mezenga com uma família Nissei, acho que ela falou.

Benedito Ruy Barbosa: Exatamente, casou com japonês. Mas os Mezenga... eu podia até ter me inspirado nele, porque ele era um cafeicultor daqueles de calo nas mãos mesmo, que trabalhava... O outro, não...

Cristina Padiglione: Teve uma cena que você explicou que um era Lunardelli, não tinha nada a ver com... [sendo interrompida]

Benedito Ruy Barbosa: É. Aí é por causa do Geremias, não é? Aí também é excesso de zelo da família, não é? Geremias tem milhões aí. Não era Geremias Lunardelli, o meu Geremias era Geremias Berdinazzi. Ocorre que, durante muito anos, o Geremias Lunardelli foi considerado o rei do café. E quando eu comprava café no Paraná - eu comprava café em Marialva e Maringá [cidades do estado do Paraná] também, trabalhei com isso muito tempo - o Lunardelli também comprava café lá, ele já era uma pessoa famosa, ele era considerado o rei do café. Mas olha, acho que nem existe mas o rei do café.

Mônica Teixeira: Acho que não tem nem mais café, não é?

Benedito Ruy Barbosa: Tem ,tem no...

Mônica Teixeira: Não tem tanta importância, não é?

[Falam simultaneamente; risos]

Luiz Hafers: O café é muito importante!

Benedito Ruy Barbosa: Esses quatro milhões de pés de café que eu estava falando na novela, tem aqui, desse amigo meu.

Eugênio Bucci: Agora, tem uma coisa na novela que eu queria saber se não te incomoda, que é o problema das continuidades. No último capítulo, o Berdinazzi e o Bruno Mezenga, eles estão no meio da festa vão beber vinho no cafezal...

Cristina Padiglione: Ficam sujos e aí chegam todos limpinhos... [ao fundo, sem interromper Bucci]

Eugênio Bucci: ... rolam no chão, tiram... e depois voltam. Acho que é uma licença [referindo-se à licença poética] e tudo bem. Agora, o sotaque do Geremias Berdinazzi, que ele adquiriu na velhice, como é que...

Benedito Ruy Barbosa: Ah, isso é muito engraçado. Isso não é nem é liberdade, é licenciosidade poética! O que aconteceu foi o seguinte: o Raul [Cortez], quando ele pegou a segunda fase para fazer, ele foi ver toda a primeira fase. Então, lá a gente falava um pouquinho de italiano mas não era muito, era uma coisa que já estava ficando diluída. Mas, uma experiência pessoal minha... eu conheço muito italiano que está no Brasil há 120 anos e continua falando italiano, não é? E geralmente quando a pessoa vai envelhecendo, parece que eles vão readquirindo hábitos, parece que aflora. Foi baseado nisso que ele se propôs e falou: "Vou botar um pouco de italiano". Eu disse: "Pode botar, sem problema, mas vamos devagar, para o pessoal não levar um choque". Só que ele fez tão bem, que o pessoal adorava o jeito dele falar. Adorava o jeito dele de falar. Então isso acabou sendo altamente positivo para o personagem e para mim.

Matinas Suzuki: Infelizmente, nós estamos chegando ao finalzinho do nosso programa. Só queria te fazer uma pergunta: você foi repórter de campo, cobria futebol. Você acompanha, como é que está o São Paulo, está acompanhando o São Paulo, acompanhando futebol [rindo]?

Benedito Ruy Barbosa: Agora eu vou começar a acompanhar de novo, vou ver uns jogos aí [rindo]. O São Paulo está indo bem, eu acho que nós estamos atravessando uma fase difícil, porque está se investindo muito na recuperação do Morumbi, que foi um desastre, o estádio de repente ter quase que ser refeito. Mas o São Paulo é um clube que sempre lutou muito, ele fez praticamente sozinho sem ajuda nenhuma de poder público nenhum o Morumbi. E agora está recuperando, por sua conta e risco. Então, nós temos que, assim como acontecia no passado, ter um pouco de paciência com o time. Quando a gente estava fazendo o Morumbi, era uma loucura. O Laudo Natel [governador de estado de São Paulo entre 1966 e 1967, substituindo o então governador Ademar de Barros, e entre 1971 e 1975; também foi diretor financeiro e presidente do São Paulo Futebol Clube, do qual é considerado patrono], estóico como ele era, e o Manuel Raimundo Paes de Almeida [ex-diretor do São Paulo Futebol Clube] e outros, deram metade da vida deles para construir aquele estádio. Aliás, o Laudo Natel, muita gente pergunta: "Esse homem, esse político tão honesto..." [referindo ao senador de O rei do gado]. Se eu tivesse que me espelhar em alguém, eu teria me espelhado no Laudo Natel. Foi duas vezes governador de estado, amigo meu, mas é um exemplo de comportamento de homem público, honesto, idealista... Pena que se enojou de política de repente. Eu achava que ele podia ir longe, que era uma pessoa muito querida. Então, de certa forma eu me baseei nessa coisa... porque ele não abria mão, sabe, da honestidade dele, e não abre até hoje, não é?

Matinas Suzuki: Benedito, mais uma vez, muito obrigado pela sua presença aqui essa noite! Eu queria agradecer...

Benedito Ruy Barbosa: Eu que agradeço.

Matinas Suzuki: Agradecer à bancada de entrevistadores aqui que hoje participou de nosso programa, agradecer a sua atenção e lembrar que o Roda Viva volta segunda feira, às dez e meia da noite. Até lá e uma boa semana.


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