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Memória Roda Viva

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Benjamin Steinbruch

27/6/2005

O empresário fala sobre sua transição da indústria têxtil para a siderúrgica e conta eventos envolvendo familiares e políticos

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Paulo Markun: Boa noite. Ele foi do tecido para o aço, de uma tecelagem criada pela família para uma das principais siderúrgicas do país que, a exemplo de outras estatais, saiu da mão do governo e hoje é controlada pela iniciativa privada. O Roda Viva entrevista, esta noite, o empresário Benjamin Steinbruch, diretor presidente da Companhia Siderúrgica Nacional.  

[Comentarista]: Benjamin Steinbruch é um dos principais representante do novo empresariado que surgiu no Brasil nos anos 90. Carioca, formado em administração e pós-graduado em marketing e finanças na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, começou a trabalhar com o pai na Tecelagem Vicunha, empresa criada pelas famílias Steinbruch e Rabinovich. No comando do processo de diversificação dos negócios da Vicunha, nos anos 80, Benjamim Steinbruch aumentou o faturamento do grupo a ponto de se permitir uma ousadia: comprar a Companhia Siderúrgica Nacional [CSN], estatal colocada a venda no processo de privatização do governo Fernando Henrique [Fernando Henrique Cardoso, foi presidente do país entre 1990 1998].  A frente do consórcio vencedor do leilão em 1993, Benjamim Steinbruch empreendeu uma reformulação da siderúrgica e 3 anos depois ampliou o negócio. Liderando outro negócio, venceu o grupo Votorantin no leilão de privatização de outra gigante, a Companhia Vale do Rio Doce, maior produtora e exportadora de minérios de ferro do mundo. Juntas, CSN e Vale formaram o maior grupo siderúrgico brasileiro, o que não durou muito. Estratégias diferentes entre integrantes dos consórcios levaram a um descruzamento das participações acionárias e as 2 empresas se afastaram. A CSN centrou o foco na busca de novas metas, fez mais investimentos, firmou sua liderança no setor siderúrgico brasileiro e se globalizou. Em 2004, registrou o maior lucro líquido de sua história e, no balanço do primeiro trimestre de 2005, entrou na lista das 8 empresas mais lucrativas de país. 

Paulo Markun: Para entrevistar Benjamin Steinbruch nós convidamos José Paulo Kupfer, editor da revista Foco Economia e Negócios, Carlos Marques diretor de redação da Isto É Dinheiro, Cida Damasco, diretora de economia do Caderno de Economia do jornal O Estado de S. Paulo, Luís Nassif comentarista de economia da TV Cultura, Ivo Ribeiro, editor do Caderno de Empresas do jornal Valor Econômico, e Júlio César Gomes de Almeida, diretor executivo do grupo IED – Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial. Também temos a participação do cartunista Paulo Caruso, mostrando com seus desenhos os momentos e flagrantes do programa. O Roda Viva é transmitido em rede nacional para todo o Brasil. Boa noite, Benjamim.

Benjamin Steinbruch: Boa noite. 

Paulo Markun: Queria começar pelo seguinte: a publicação do balanço de vocês, aqui da CSN, na "gestão de riscos" estão relacionados os aspectos que podem afetar os negócios da companhia, alguns nas esferas de influência da CSN e outros independentes da CSN. Então, quais são? A política monetária e fiscal no Brasil em mercado chave, como a China e Estados Unidos, a atividade econômica mundial e brasileira, o ambiente regulatório em nível global, os assuntos do mercado financeiro e o ambiente político do Brasil. Queria perguntar: em que medida você imagina que esta crise que nós estamos vivendo no Brasil pode interferir nos negócio da CSN? Aliás, como em toda economia brasileira?

Benjamin Steinbruch: É ligado, claro, a parte política com a parte econômica. Até agora não foi contaminada pela crise política, a economia, mas eu acho que nós estamos num bom momento. Talvez até estejamos um pouco atrasados no sentido de abafar esta crise política. Abafar, que digo, é realmente entender o que aconteceu, sem pré-julgamentos, afastando aquilo que tem que ser afastado, apurando aquilo o que tem que ser apurado. A partir daí, eu acho, que o presidente [referindo-se a Luiz Inácio Lula da Silva, na época, exercendo seu primeiro mandado como presidente da República] tem que ter uma chance de recompor o seu governo, seja do ponto de vista de pessoas, seja do ponto de vista de estruturas, reduzir o número de ministérios, agrupar esses ministérios na preocupação de reduzir gastos e também poder ter um poder gerencial maior sobre isso. Precisa também partir para ofensiva. Quer dizer, eu acho que se aconteceu alguma coisa que não devia, aconteceu, tem que encarar de frente, reconhecer, arrumar e tocar em frente, antes que contamine a questão econômica. Quer dizer, o Brasil... [interrompido] 

Paulo Markun: Por que, na sua opinião, até agora não contaminou? Em ocasiões anteriores crises menos graves contaminaram.

Benjamin Steinbruch: Eu tenho a impressão que foi feito um trabalho muito duro por parte do ministro Palocci [Antônio Palocci Filho, ministro da Fazenda de 2003 a 2006]. Quer dizer, nós estamos sofrendo um arrocho monetário grande e, em função disso, eu acho que não contaminou ainda. Acho que temos créditos lá fora com os investidores, com aqueles que acompanham os mercados emergentes. Agora, eu acho que foi feito esse exagero de política monetária justamente para o país poder crescer.

Carlos Marques:  Desculpe, sobre essa "não contaminação", a gente vê hoje 2 situações. Você tem hoje o mercado financeiro, que de fato não está analizando se as exportações parecem estar indo bem. Mas a gente vê casos pontuais, creio que no seu próprio setor, o do aço, onde você sente que de alguma forma está se preparando a contaminação. Vamos supor, semana passada, por exemplo, o próprio Grupo Gerdau [grupo siderúrgico brasileiro líder na produção de aço nas Américas] e o Grupo Belgo [empresa siderúrgica do grupo internacional Arcelor, cujas empresas estão presentes em 60 países] falavam em engavetar projetos. Efetivamente, na área econômica, você acredita que as empresas estão dispostas a investir neste momento, apesar do cenário de crises políticas? Não vai acontecer esse engavetamento de projetos? 

Benjamin Steinbruch: Não. Eu acho que vai, mas não em função da crise política, será em função da política monetária que  o governo adotou. Então, você não tem investimentos se você não tem perspectiva de exportação se você não tem perspectiva de mercado interno. Você vai investir para quê? Hoje, com os juros na medida que estão, que são os mais exagerados, os mais altos do mundo e não tem necessidade disso, faz com que seja clara a mensagem do governo de querer combater a inflação a todo custo. Então, está vencendo a inflação até agora.

Carlos Marques: Isso que está provocando efeito de retorno dos projetos?

Benjamin Steinbruch: É que com juro alto e o real valorizado, você vai investir para quê? Se você não tem sinalização do governo para o mercado interno, não tem sinalização para exportação? Sem crise política você teria a mesma coisa. Então, por isso que eu estou dizendo que não contaminou ainda, mas, certamente, se continuar, vai contaminar. 

Carlos Marques: Deixa eu ver se estou conseguindo entender. Quer dizer, a economia não contaminou, a política não contaminou, porque a economia está ruim, está contida, está sob pressão. Se ela estivesse boa teria contaminado?

Cida Danasco: Esse excesso impediu a contaminação ou pode complicar?  É bom ou ruim? 

Benjamin Steinbruch: Eu acho que a questão política é uma coisa em separado. Acho que do ponto de vista do investimento, independentemente da crise, estava todo mundo postergando os investimentos.

José Paulo Kupfer: Mas isso piora, não é?

Benjamin Steinbruch: Claro que piora.

José Paulo Kupfer: Como é que fica para uma empresa tomar uma decisão?

Benjamin Steinbruch: Mas ainda não piorou, isso é que estou dizendo.

José Paulo Kupfer: Já estava ruim.É isso?

Benjamin Steinbruch:Todo mundo já estava esperando uma sinalização do governo. É aquilo que eu falei: acho que eles estavam apertando, o ministro Palocci estava apertando muito para depois soltar. O soltar, que eu digo, é reduzir juros e, eventualmente, possibilitar maior demanda interna.

Cida Danasco: O senhor acha que a crise política complica isso?

Benjamin Steinbruch: Complica, sem dúvida.

Cida Danasco: Ela pode atrasar mais ainda?

Benjamin Steinbruch: Claro que sim. A crise nunca é esperada e não é desenhada.

Cida Danasco: Se acelerar esse processo de liberação, pode atrasar ainda mais, inclusive?

Benjamin Steinbruch: Pode, claro, por isso que eu acho que tem que ser resolvida de maneira rápida, para que a contaminação seja a menor possível, porque o país ainda está em boas condições, no sentido de propiciar um novo ciclo de investimentos. Agora, se não se providenciar rápido uma mudança em nível de perspectivas, de confiança, certamente, a gente vai perder todo o esforço que foi feito durante 2 anos.

Luis Nassif: Benjamim, a gente viu, nos anos 90, a privatização de grandes empresas. A siderurgia foi um setor que teve uma estruturação ampla, que resultou em um conjunto de empresas com um bom potencial de crescimento, com grande competitividade. Questão do minério, de gestão e tudo mais. Mas o ambiente econômico não acompanhou. Então, hoje estamos vendo muitos grupos como a Gerdau, que é um exemplo de empresa que está investindo mais lá fora do que está aqui dentro.  Para onde caminha a siderurgia brasileira? Primeiro com o processo de globalização e, depois, com falta de condições internas de mercado, a tendência é acontecer o que aconteceu com AmBev [é a maior cervejaria da América Latina, criada em 1999 com a fusão das empresas Brahma e Antártica. Em 2004, a AmBev criou uma aliança global que expandiu suas exportações, fundindo-se com a cervejaria belga Interbrew e formando a InBev], por exemplo, virar uma empresa nacional? 

Benjamin Steinbruch: Acho que o real valorizado é um convite para lá fora. Porque, realmente, se você for analisar as perspectivas de mercado interno, elas são muito restritas. Então, essas empresas todas que fizeram um bom trabalho, e realmente as indústrias brasileiras melhoraram muito nesses últimos 2 ou 3 anos,  estão em condições de investir aqui ou lá fora.  Aquelas que podem, eu acho, vão tentar investir aqui dentro em termos de matéria-prima básica e agregar valor de produto lá fora. Aquelas que não podem, como é o caso do Gerdau, vão comprar geograficamente plantas para que produza e abasteça o mercado local.  Então, eu acho que é uma tendência. Quer dizer, o que aconteceu com a AmBev é realmente uma tendência e preocupa, porque, na verdade, a gente gostaria que esse esforço todo fosse feito dentro do Brasil. Quer dizer, que propiciasse novos investimentos, melhora de emprego, melhora de renda, melhora de consumos aqui dentro. E não que a gente transformasse o Brasil em investimento em matéria-prima para ser exportada lá para fora. Em alguns casos, até se conseguir obter valor agregado em cima dessas matérias todas.

Ivan Ribeiro: Você é um dos empresários brasileiros que mais representa o empresariado nacional com visão nacionalista. Você acha que, por exemplo, o setor siderúrgico, petrolífero e de mineração são setores considerados estratégicos que teriam que permanecer em mãos de capital nacional?

Benjamin Steinbruch: Eu não tenho dúvida disso, porque o Brasil tem que se dedicar àquilo que ele é competitivo. Então, são pouquíssimos setores que o Brasil é competitivo hoje em dia. A gente pode considerar mineração, siderurgia, celulose, agrobusiness, têxtil, calçados, e eu acho que pára por aí. Quer dizer, a gente tem que se dedicar a esses setores, porque certamente não vai ser nos eletrônicos, nos fármacos, que a gente vai conseguir ser competitivo. Entregar os setores que nós somos competitivos para estrangeiros, realmente, não me agrada, porque naquilo que a gente não é competitivo a gente não vai conseguir vencer. Então, realmente, eu acho que deveria ter uma atenção especial com esses setores no sentido de preservar aquilo que o Brasil...

Ivan Ribeiro: Acha que tem que haver uma interferência de governo, alguma coisa assim?

Benjamin Steinbruch: Não, não, não acho que tem que haver interferência nenhuma, tem é que ter um cuidado do governo. Acho que o governo tem que prestigiar empresas nacionais no sentido de fazê-las fortes. Inclusive, para irem para fora. Quer dizer, neste mundo globalizado, o Brasil tem que ter as empresas brasileiras multinacionais que ainda não tem.

Carlos Marques: Uma delas, a Vale do Rio Doce, por exemplo, de alguma forma parece ter aberto uma queda de braço com o setor siderúrgico. Fala-se até que essa queda de braço é uma revanche liderada por sua pessoa, já que você, em determinado momento, esteve à frente da própria Vale. Sei que o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica, órgão governamental, última instância da esfera administrativa, responsável por decisões na esfera concorrencial] deu um parecer favorável para a siderúrgica. Agora, essa é uma guerra pessoal ou uma guerra do setor do aço e Vale do Rio Doce?

Benjamin Steinbruch: Não tem nada de pessoal. Inclusive, eu adoro a Vale. Eu liderei a privatização da Vale do Rio Doce, eu conheço e respeito seu pessoal, sua história. A Vale é uma das grandes empresas brasileiras e não tem nada de pessoal nisso.  Agora, o que acontece é que, no meu entendimento, a Vale tomou uma posição completamente equivocada. Dentro daquilo que eu estava falando anteriormente, eu acho que caberia à Vale oferecer a possibilidade de investimento conjunto para siderúrgicas brasileiras antes de chamar estrangeiras. No caso de as siderúrgicas brasileiras não atenderem o convite, certamente, a Vale estaria liberada para fazer o que quisesse, mas não foi isso que aconteceu. A Vale partiu para convidar grandes siderúrgicas mundiais a se estabelecerem no Brasil e, com isso, tem o risco de o Brasil se estabelecer como um produtor de baixo custo de matéria prima, em que o resultado ficaria todo lá fora. Então, eu acho que houve uma posição equivocada da Vale no sentido de não propiciar à indústria brasileira um trabalho conjunto. Está certo? Então, não tem nada de pessoal nisso. Agora, a questão do Cade é outra coisa, a questão do Cade é de direito econômico, que independe de Vale ou CSN. Eu estava na Vale e eu fiz essa estratégia da Vale do Rio Doce. Então, ninguém mais do que eu sabe exatamente aquilo que a Vale se propôs a fazer. A Vale se propôs a ter um monopólio de toda logística brasileira da mineração e das siderúrgicas. Essa que era a nossa tentativa. Quando nós fizemos a privatização da Vale do Rio Doce, na verdade, a Vale era para ser disputada em 5 grandes companhias brasileiras e globais: mineração, siderurgia, celulose, alumínio e logística. Para isso nós investimentos em logística de Norte a Sul do Brasil. O capitalismo gosta do monopólio e a Vale, do ponto de vista empresarial, está certa, assim como eu estava certo quando lancei esse projeto. Então, do ponto de vista empresarial, está correto o que a Vale está fazendo. Do ponto de vista de direito econômico é um outro problema.

Carlos Marques:  E vocês têm um parecer favorável. Quer dizer, as siderúrgicas já ganharam, no caso?

Benjamin Steinbruch: A gente não ganhou ainda. Tem um posicionamento favorável e não é questão de ganhar ou perder também. Acho que temos que deixar isso claro. Na Constituição Brasileira está escrito, no parágrafo 170, sei lá, que a livre concorrência é o que vale no mercado. Então, é questão de Constituição e para suportar isso é que foi feito a Secretaria do Direito Econômico, o Cade. Então, o monopólio não é contemplado como uma coisa positiva pela Constituição e isso é que está sendo julgado.  Então, o que aconteceu com a Vale?  A Vale comprou ...

Carlos Marques: Ela juntou quase todo...

Benjamin Steinbruch: ... a Samitre e com a Samitre veio a Samarco. Depois, deram preferência para a Casa de Pedra, depois para a Ferteco e depois a Caemi [citando mineradoras]. Então, do ponto de vista empresarial, ela fez tudo que estava certo. Agora vem o julgamento de tudo o que ela fez. Então, o que pode ocorrer é o governo falar: não, tudo bem, a Vale fez muito bem, acho que tem que se fortalecer. Só que para ter concorrência ela tem que se desfazer da mina tal da Ferteco, da mina tal da Caemi. Do ponto de logística não pode estar em 2 corredores. O governo pode chegar e falar: nós queremos que tenha concorrência para que tenha baixo custo, para que tenha qualidade no serviço e, para isso, tem que ficar em um ou outro. Então, é questão de julgamento em nível de direito econômico, não adianta eu querer, ou a Vale querer, isso vai acontecer naturalmente, está certo? 

Luis Nassif: Só para tentar entender um pouquinho os argumentos da Vale. O que a Vale argumenta em suas declarações é o seguinte: o preço do minério é fixado internacionalmente, se é fixado internacionalmente, você não pode pegar como mercado relevante um mercado brasileiro. Ou seja, eu vendo para meus clientes o equivalente ao preço internacional menos o frete.  A mera explicitação em lei, em resolução, não é uma garantia de que não vai ter abuso de poder aqui. Mesmo com essa explicitação pode haver abuso?

Benjamin Steinbruch: O mercado não é isso, não existe estabelecimento de preço. Cada cliente tem seu preço e cada produto tem sua diferenciação. Então, o mercado é livre, está certo?  Não existe, vamos dizer assim, fixação de preço. E eu acho que é bom que o mercado seja livre, está certo? Acho que o monopólio está fora de moda em tudo. Não se consegue justificar o porquê do monopólio ser bom. 

Luis Nassif:  Então, vamos pegar um ponto que a Vale alega. Ela é uma das poucas empresas brasileiras - estou fazendo um  "advogado do diabo" aqui-, que tem preço internacionalmente. Se ela perdesse esse preço internamente, ela também perderia...

Benjamin Steinbruch: Não é verdade, porque ninguém fixa preço internacional. 

Luis Nassif: Ela fixou com a China recentemente.

Benjamin Steinbruch: Não, ela não fixou, porque na verdade tem a BHP [a BHP Billinton é um grupo anglo-australiano, lider mundial no ramo de mineração]. Quem se antecipou, inclusive, foi a BHP e a Vale, se você quer saber, foi tremendamente prejudicada, porque a BHP, que tem carvão e minério, tabelou o carvão em 120%. Ou seja, ela tem a produção equivalente, ela conseguiu para um produto que só ela tem 120% de aumento. Assim, o que ela conseguisse depois com minério, seria lucro. A Vale só tinha minério, não tem carvão. Então, a Vale acompanhou a BHP. O certo seria ter se fixado, primeiro, o preço do minério e, daí, o carvão seria uma segunda discussão. Na verdade, a Vale pegou carona com BHP e não fixou preço. Não se fixa preço assim também, porque você tem 3 grandes: BHP, RTZ  e Vale. Nenhuma consegue fixar sozinha. Está certo? E o cliente, do outro lado, tem que estar de acordo. Você não consegue impor preço.

Júlio de Almeida:  Benjamim, você esteve há pouco tempo... vamos mudar um pouquinho o eixo, voltar para conjuntura.

Benjamin Steinbruch: Nessa questão da Vale estou muito tranqüilo. Eu estava lá e sei o que aconteceu. Depois, tem várias batalhas em que você não tem razão e é difícil de ganhar. Algumas batalhas você tem razão, está certo?  Defender o monopólio é muito difícil, por isso que a Vale está tendo tanta dificuldade, porque ela é uma grande empresa, tem uma força política incrível, tem lobby funcionando no Brasil inteiro, justamente por ser uma grande empresa, mas a razão não se constrói assim.

Júlio de Almeida: Vamos pegar a questão do monopólio, a maneira como a indústria...

Benjamin Steinbruch: Desculpe, vamos pegar o doutor Júlio aí.

Júlio de Almeida: O senhor esteve há pouco tempo com o presidente Lula e esteve também com o ministro palocci. Fale um pouco para gente como foi. Você é um crítico, vamos dizer assim, austero, porém, bastante compreensivo da política econômica.  O que você acha que o presidente assimilou mais nessa conversa, se é que ele assimilou alguma coisa, que você poderia colocar para a gente.

Benjamin Steinbruch:  Eu tinha pedido uma conversa com o presidente há bastante tempo e ele me convidou para ir em Brasília conversar. Eu levei até a Vitória, minha filha, para esse encontro. Cheguei lá e falei: "Trouxe minha filha, o senhor se incomoda?" E ele: “Não, pelo contrário.” O presidente Lula é uma figura muito carismática, é pouco explorado isso, poucos o conhecem. Ele chegou, deu um abração na Vitória, um abraço não protocolar, abraço de avô, sabe? Pegou ela e ficou com ela. E foi muito gostoso esse encontro do ponto de vista da abertura que o presidente Lula deu. Eu não sabia que o ministro palocci estaria na reunião. Ele convidou o ministro Palocci para estar com a gente na reunião e a gente conversou. Ele me perguntou a opinião que eu tinha e eu dei a opinião que eu tenho. Já tinha discutido, inclusive, com o ministro palocci. Não é crítica ao governo, eu sou desenvolvimentista, eu acho que a gente tem que crescer, a solução para o Brasil é o crescimento. Você pode analisar qualquer outra tentativa ou estratégia. Eu não acredito que nada dê certo se não houver crescimento, se não houver mais emprego, se não houver a perspectiva de vida para... [interrompido]

Júlio de Almeida:  Mas é esse o discurso do presidente.

Benjamin Steinbruch: Então. Agora, estranhamente, o que aconteceu é o que você vai ver. Eu acho que o governo Lula está muito mais favorável à classe média alta e à classe alta do que à classe média baixa ou pobre. É justamente essa incompatibilidade que não consigo entender, porque, realmente, eu acho que o presidente Lula se elegeu, não para ser mais um presidente. Ele tem que ser “o presidente”. Porque em sua história toda, ele atende a maioria da nação brasileira. Se você tem o ônus de ter uma nação como nós temos, de 200 milhões de habitantes, quase 200 milhões de habitantes, que é um ônus do ponto de vista de educação, de saúde, de infra-estrutura, de previdência, você também tem o bônus. Porque você tem 60 ou 70 milhões de pessoas que não têm acesso a nada. Então, eu acho, particularmente, eu posso estar errado, mas eu procuro ver todas as alternativas, que o grande segredo do Brasil seria trazer esses 60, 70 milhões de pessoas para o consumo.  E isso a gente só vai conseguir com a economia crescendo. Então, o que eu falei para o presidente Lula foi exatamente isso, que ele é um presidente que foi eleito pela maioria e que acredita que ele é o presidente certo para fazer isso.  

[...]: Esse contato foi recente?

Benjamin Steinbruch: Há 3 anos e pouco não aconteceu isso e acho que ele quer que aconteça. Acho que ele enxergou que realmente é isso que tem que ser a base do governo dele. Aliás, é como você falou, a proposta de governo.

Cida Danasco: O senhor foi sondado para ter um papel mais forte, um papel mais importante, no chamado Conselho de Desenvolvimento Social, o chamado "Conselhão"?

Benjamin Steinbruch: Não, não.

Cida Danasco: Não foi sondado ou teve qualquer conversa nesse sentido?

Benjamin Steinbruch: Não.

Cida Danasco: Como é que o senhor acha que os empresários poderiam ajudar nesse período em que se discute governabilidade?

Benjamin Steinbruch: Olha, eu acho que o "Conselhão" é uma coisa importantíssima criada pelo presidente Lula. A gente que está lá, vê os talentos, a inteligência representada nesse conselho. Acho que a gente não conseguiu ainda aproveitar isso, o "Conselhão". Você vai lá e vê tudo o que tem de bom, ou grande parte do que tem de bom no Brasil, e a gente não conseguiu ainda estabelecer um relacionamento com o governo que permitisse realmente uma troca de idéias para que a gente pudesse, de certa forma, entrar nos pontos chaves do governo.

José Paulo Kupfer: O que teria que ser feito para funcionar, o que precisa fazer?

Benjamin Steinbruch: Acho que precisa ter uma abertura um pouco maior do governo no sentido, digamos, de realmente colocar os temas que ele acha importante. A gente também, do ponto de vista de conselho, devia ter a oportunidade de colocar os temas que acha importante. Porque, na verdade, a gente tem que ter uma preocupação de médio e longo prazo. Quer dizer, o imediatismo tira o brilhantismo do conselho. Acho que lá está representada toda a sociedade brasileira e é uma oportunidade nova e única, que ainda não está sendo bem aproveitada. Agora, não fui convidado para nada diferente em nível de atuação de conselho.

Paulo Markun: Benjamin, vamos fazer um rápido intervalo.

Benjamin Steinbruch:  O Carlos queria fazer uma pergunta.

Paulo Markun: Ele queria saber quando foi o encontro.

Benjamin Steinbruch: Recente, 2 semanas atrás.

Paulo Markun: Então, vamos fazer um intervalo. Na nossa platéia, esta noite, acompanham a entrevista no estúdio César Davi Teixeira de Freitas, diretor da Yellow Comunicação, Miguel Neto, diretor do Instituto PVC, Márcio Freitas, jornalista e o advogado Rafael de Carvalho Cestari. A gente volta já. 

[intervalo]

[Comentarista]:
Benjamin Steinbruch surpreendeu o mercado quando surgiu à frente do grupo vencedor do leilão da Companhia Siderúrgica Nacional. Ele era executivo de uma companhia têxtil familiar e despontava como mega empresário no novo mundo da privatização. Os desafios da tecelagem ele já havia superado, fez da Vicunha Têxtil a líder do Brasil e uma das maiores do mundo na produção de índigo, tecido para roupas jeans. Mas, de tecido para aço, o desafio era outro e bem maior. A siderúrgica brasileira, hoje, é referência internacional, tem custo operacional baixo, está perto das maiores e melhores jazidas do mundo, tem tecnologia e parque industrial atualizado. Ainda é pouco. O aço brasileiro não tem preço nem escala de produção para conquistar o mercado internacional. O próprio setor já sabe que para competir de igual para igual será preciso investir muito na criação das usinas e junto com o diagnóstico insiste na reclamação. Os juros estratosféricos do Brasil impedem tais investimentos.

Paulo Markun: E recomeço aqui o bloco com a pergunta de Roy Vivian: A constatação do setor siderúrgico, que vem acontecendo no mundo, é ameaça para CSN? E que alianças a CSN vislumbra para fazer frente aos grandes grupos que visam, inclusive, investir aqui no Brasil?

Benjamin Steinbruch: Acho que não é uma ameaça. Acho que a siderurgia brasileira é muito competitiva, não só a CSN como todas as outras. Na verdade, o que a gente precisa é aumentar a produção aqui e eventualmente comprar mercado lá fora. Quer dizer, eu acho que esse processo que está acontecendo, de globalização lá fora, é perigoso no sentido de transformar o Brasil num centro de custos, porque todos os estrangeiros que estão vindo para cá, estão vindo atrás da placa barata e exportando a placa barata, tem... [interrompido]

Paulo Markun: Quer dizer, se um grupo desses comprar uma siderúrgica brasileira, ele já faz um bom negócio?

Benjamin Steinbruch: Com certeza, você veja a Usinor [indústria francesa, fabricante de aços laminados] que comprou a CST [Companhia Siderúrgica de Tubarão] e foi uma perda para o Brasil. Na verdade, o processo de privatização brasileiro foi um pouco atrasado. Naquele momento, já estava se formando os grandes conglomerados lá fora e o Brasil foi picado, privatizado em partes.  Acredito que se naquele momento a gente tivesse blocos maiores, realmente, a siderurgia brasileira seria imbatível hoje. Temos problema de custo capital. Quer dizer, para investir aqui você vai ter com esses juros um custo muito alto, comparado com o custo lá de fora, dos estrangeiros. Inclusive, é permitido a eles se instalarem no Brasil com uma diferença brutal de capital. Então, nós temos que vencer esse problema para realmente crescer e ser competitivo em nível global. Acredito que o mais importante é você ter margem, é você ter lucro. Você apenas ser grande não quer dizer nada.

Carlos Marques: As grandes montadoras estão reclamando do preço do setor de aço, como se fosse uma inflação do aço. Já tivemos inflação do chuchu e agora parece que o aço está em uma corrida muito grande aqui no país. A que se deve essa consecutiva situação de aumento de preços?

Benjamin Steinbruch: Não foi toda a indústria, foi parte dela, e induziu o governo a um erro, na verdade, com sérias conseqüências para o Brasil. Eu acho que esse modelo de mamar nas tetas do governo ainda quer se perpetuar no Brasil. Para você ter uma idéia, na época da siderúrgica estatal, houve uma transferência da indústria automobilística de 17 bilhões de dólares e isso nós estamos falando sobre um passado não muito distante.

Paulo Markun: Transferência de que tipo? 

Benjamin Steinbruch: A estatal bancava o controle de preço da indústria automobilística que não era privada. Então, houve essa transferência. Acredito que esse mau hábito teria continuado pela indústria automobilística e digo que tem que ser coisas iguais. Então, você pega a siderurgia, ela tinha uma proteção média de 12% dos produtos siderúrgicos e o governo derrubou para 15 os produtos siderúrgicos. A indústria automobilística tem uma proteção de 32% ou 34%. Então, acho que é uma coisa muito complicada pedir alíquota zero para fornecedor, sendo que você tem uma proteção de 34%. A indústria automobilística, é bom que se entenda isso, pelo fato de ela ser exportadora, tinha direito, no ano de 2003 e 2004, de fazer draw back, que é um direito que o exportador tem de trazer matérias primas sem impostos. Ela tinha o direito a 2 milhões de toneladas de aço e não pagaria imposto nenhum. Por que ela não trouxe? 

Júlio de Almeida: Agora, a inflação do aço existe ou não?

Benjamin Steinbruch: A inflação do aço não existe. Existe o preço internacional. Então, houve uma puxada muito forte da China que não foi só para aço, a mesma coisa aconteceu na soja, a mesma coisa aconteceu nos metais. Quer dizer, havia uma grande potência mundial em torno demandando matéria-prima e o mundo não estava preparado para isso. Não só matéria-prima, por exemplo, em logística, os fretes subiram muito. Na verdade, foi uma equiparação à demanda internacional.  Isso que houve. 

Júlio de Almeida: Só para entender um pouco a estrutura de custo do aço. No ano passado, vocês tiveram câmbio favorável, preço internacional favorável e preço de minério favorável. Quais são as perspectivas até o final do ano e para o próximo ano?

Benjamin Steinbruch: Eu acho que vai ser favorável. Acho que a China continua crescendo, a Índia começou a crescer agora também, acho que está passando por uma barrigada, mas as coisas vão voltar. Acho que o preço do minério não volta para trás. Carvão não volta para trás. Acho que, tendo uma demanda asiática forte, vai ter uma recuperação em nível de mercado.

Júlio de Almeida:  E as exportações do setor?

Benjamin Steinbruch: Acho que vai ser por volta de 30% a 35% da nossa produção, um pouquinho a mais que no ano passado.

Cida Danasco: E câmbio?

Benjamin Steinbruch: Câmbio é ruim, mas não tem jeito.

Cida Danasco: Chega a atrapalhar, está atrapalhando? 

Benjamin Steinbruch: Chega a atrapalhar bastante. É um inibidor do esforço maior de exportação. Tem um grande erro do governo, porque você faz contratos anuais que vão se vencendo. Nós, por exemplo, com nossos clientes, perdemos muitos contratos.

Cida Danasco: Já perderam contratos?

Benjamin Steinbruch: Perdemos muitos contratos.

Cida Danasco: Ou deixaram de ganhar mais?

Benjamin Steinbruch: Não, perdemos, porque seu cliente chega e fala: “Olha, tenho contrato de 500 mil refrigeradores para a Europa". Preciso ter esse contrato e se a gente não atende na hora, alguém vende e acabou. Você perdeu 1 ano de refrigeradores. Então, perdemos muita exportação em função desse câmbio.

José Paulo Kupfer: Queria voltar para aquele encontro com o presidente, em que o ministro palocci estava presente. Certamente você comentou e criticou a política cambial. O que o ministro palocci respondeu para você? 

Benjamin Steinbruch: Não, é aquilo que eu já te falei, eu não critiquei a política do ministro palocci, não é verdade.

José Paulo Kupfer: Você disse que com esse câmbio, como você disse aqui para nós, não vai dar. E ele falou o quê?

Benjamin Steinbruch: O entendimento meu é diferente do ministro palocci. Se você for ver, o ministro Palocci é um grande vitorioso da política monetária que foi implementada. Ele conseguiu atingir aquilo a que se propôs. Então, não teve erro nenhum. Ele fez aquilo que se propôs a fazer e conseguiu. Na minha opinião, eu iria para um outro lado, iria para um lado de maior crescimento, de menos combate à inflação, de juros menores e um real... [interrompido]

José Paulo Kupfer: Isso você disse a ele? “Olha, na minha opinião, você teria que ir para um lado de mais crescimento, de câmbio mais favorável etc”.  E ele não disse nada?

Benjamin Steinbruch: Ele disse que tem um respeito muito grande pela volta da inflação e que achava que a inflação tinha que cair. Realmente, a inflação está caindo. Só que, na minha maneira de ver, a inflação está caindo junto com a economia.  Então, não adianta muita coisa. Acho que essa busca que nós estamos de inflação, o ano que vem, se não me engano, é 4,5%, ela é equivocada.

José Paulo Kupfer: E o presidente, o que ele falou na hora que você falou que o câmbio estava meio ruim?

Benjamin Steinbruch: O presidente entende. Na verdade, é como estamos discutindo, não é mais um ou menos um. Você pergunta para mim o que você acha. Eu não acho que a inflação tenha que ser 4,5%. Na minha opinião, é uma coisa técnica e aí tem que ser detalhada, mas, em nível de conceito, a minha inflação, ela certamente é maior do que 5%. Certamente, ela é menor do que 10%.  Então, eu acho que o Brasil precisa de alguma coisa por aí.  Porque os 4,5% provoca isso que governo está tendo, o sucesso no que está se propondo a fazer...

José Paulo Kupfer: Sem crescimento.

Benjamin Steinbruch:... mas que não é minha prioridade. Minha prioridade é crescimento. Não é crescimento que se está fazendo, é emprego.

José Paulo Kupfer: Quer dizer, até 2007, pelo visto, vamos ficar sem crescimento, se der certo a política financeira?

Benjamin Steinbruch: Porque o problema do crescimento... Acho que governo fala em 3,5% ao ano e é muito menos. Com mais do que isso, outros países se viabilizam. Se você pegar a Argentina, está com um crescimento fantástico. A Venezuela, lá fora, é país com crescimento fantástico e, Brasil, nos últimos 10 anos, não cresceu. Se a gente tivesse crescido 3%, 2,5%, 3,5%, em 10 anos seguidos, estaríamos em posição diferente, mas não aconteceu. Então, temos que ver o que o Brasil precisa e não é aquilo que se pode fazer. Se a gente continuar nessa política, certamente, vai ter desemprego, que é justamente o oposto do que o presidente Lula gostaria de ter no seu governo.

Luis Nassif: A crise política, na sua opinião, ajuda na mudança do modelo ou estratifica o modelo do jeito que está? 

Benjamin Steinbruch: Não, eu espero que a crise política não contamine o modelo, porque você mudar numa hora de pressão é muito complicado. Então, se você for fazer qualquer coisa agora, tem que fazer com muito cuidado. Nem sei se pode baixar muito os juros. O que acho que tem que fazer agora, se pudesse sugerir alguma coisa para o presidente Lula, seria reduzir os ministérios, mostrar autoridade, botar as melhores pessoas possíveis nos ministérios, reduzir a despesa do governo, acabar com esses 20 mil e poucos cargos de confiança, não sei como é que chama, são os cargos sem concurso que tivemos aí, fazer aquilo que a gente faz. Quer dizer, administrar um país não é nada mais complicado do que administrar a indústria ou administrar o negócio de cada um de nós ou a nossa casa. Tem que segurar a despesa. 

Luis Nassif: Porque você não precisa colocar parente de sócio na empresa, não é? E o governo precisa.

Carlos Marques: Com essa reforma ministerial, informalmente, o governo chegou a sondar, por exemplo, o empresário Abílio Diniz para compor o ministério. Ele declinou do convite. Você goza de simpatia do PT [Partido dos Trabalhadores], pelo seu nome, você cogitaria a possibilidade de uma consulta desse tipo para entrar no ministério? Ele quer dar um caráter mais técnico ao ministério.

Benjamin Steinbruch: A maior contribuição que eu posso dar hoje ao Brasil é isso que estou fazendo. É encarar, investir, ter sucesso, dar mais emprego, ser empreendedor, levar minha empresa para fora.

Carlos Marques: Ministério, não?

Benjamin Steinbruch: Acho que minha contribuição em nível ministerial seria muito menor do que na iniciativa privada. Você pega hoje a CSN, o grupo nosso deve ter mais de 35 mil empregos diretos. Poxa, é uma coisa que tem que ser mantida. Acho que papel maior que eu estou fazendo ajudando o governo é no recolhimento de impostos. A gente recolhe este ano uma barbaridade. Acho que vamos recolher mais de 3 bilhões em impostos. É muito mais do que o orçamento de muitos estados brasileiros. Então, acho que o trabalho nosso está sendo feito pelo lado de produção da iniciativa privada. Agora, mais tarde, eu acho também que bem mais tarde, que cada um de nós terá que dar sua contribuição para o país. Então, certamente, a minha contribuição não vai ser em nível eletivo. Não acho que meu perfil seja de eleição, mas de executivo. Então, se me for dada a chance mais tarde de colaborar...

Cida Danasco: Mais tarde quer dizer o quê?

Carlos Marques: 2006? 

Cida Danasco: Pois é.

Benjamin Steinbruch: Não, bem mais tarde [risos].  Eu acho que tenho muito para produzir na iniciativa privada, como todas as pessoas que tiveram sorte na sua trajetória, seja ela empresarial, seja liberal, para dar sua contribuição ao país em algum momento.

Cida Danasco: Em algum momento é no próximo governo? Como é isso aí?  Quando é esse bem mais tarde?

Benjamin Steinbruch: Bem mais para frente [risos].

Ivan Ribeiro: Benjamim, até o ano passado, você reclamava que o nosso amigo Carlos Lessa não estava te emprestando nenhum um tostão para o CSN.

Benjamin Steinbruch: O ex-presidente do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], só para esclarecer.

Ivan Ribeiro: Isso, ex-presidente do BNDES.

Benjamin Steinbruch: O professor Carlos Lessa é pessoa que eu admiro muito. Inclusive, eu brincava muito com ele que eu estava invicto no governo Lula, que o BNDES tinha liberado zero para nós e até agora a gente continuava invicto.

Ivan Ribeiro: Vocês zeraram a dívida com eles?

Benjamin Steinbruch: Tivemos zero de empréstimo até agora.

Cida Danasco: Mas está sobrando no governo?

Carlos Marques: 1,9 bilhões, uma operação triangular com os bancos, não é?

Benjamin Steinbruch: Pagamos o empréstimo antecipado do descruzamento, 1,9 bilhões, que venceria em 2011. Acho que foi a primeira vez que aconteceu isso na história do BNDES.

Cida Danasco: Mas o BNDES não...

Benjamin Steinbruch: Eles não queriam nem receber, não sabiam como fazer.

Carlos Marques: Quanto tempo tem esse empréstimo? 

Benjamin Steinbruch: Esse empréstimo foi no cruzamento da CSN com a Vale. Foi no governo Fernando Henrique ainda.

Cida Danasco: Quer dizer que isso não tem nada a ver. Pelo jeito não foi nenhum tratamento especial do professor Carlos Lessa?  Com o Guido Mantega na presidência continua a mesma coisa? [Guido Mantega, ministro da Fazenda,  assumiu o cargo em 2006, no lugar de Antônio Palocci]

Benjamin Steinbruch: Continua invicto.

Cida Danasco: E o BNDES, a grande discussão é que não consegue cumprir o orçamento.

Benjamin Steinbruch: Esse é o problema. O problema é exatamente esse: a gente tem o ferramental da burocracia.

Cida Danasco: É uma questão de burocracia, na sua opinião?

Benjamin Steinbruch: Porque, na verdade, o BNDES é a única fonte de investimento que os empresários têm de longo prazo para fazer os investimentos que o país precisa. Na verdade, o Brasil tem que entrar no segundo ciclo grande de investimento. Nós tivemos ciclo dos anos 70 e agora temos que entrar em outro ciclo de investimentos grandes, que envolve siderúrgica, refinaria, hidroelétrica, ferrovias e não estamos preparados para isso. Para você ter uma idéia, um auto-forno de 5 milhões de toneladas, que é nosso projeto de Itaguaí, é coisa de mais de meio milhão de dólares. O BNDES, pela Basiléia [referindo-se ao Acordo de Basiléia, assinado por diversos países em 1988 e que define procedimentos bancários], não tem condições de emprestar mais que 1 milhão e meio de dólares para nenhum grupo privado, porque ele bate no limite da Basiléia. A gente precisa mais do que isso. Quer dizer, não é questão de um auto-forno, o Brasil vai precisar de um montão de investimento.

Cida Danasco: Se discute, na verdade, como capitalizar mais o BNDES para poder ampliar.

Benjamin Steinbruch: Se capitalizar mais o BNDES, de alguma forma, ou se o BNDES entrar como acionista nos projetos, mas temos que discutir o Brasil que a gente quer no sentido de ter chances para esses novos investimentos. Esses ciclos de investimentos que o Brasil precisa. A gente perde tempo falando o que é investimento, todo mundo fala o que é investimento, mas a gente não está preparado para realizar investimentos. Não é má vontade, pelo contrário, a estrutura do BNDES está super aberta mesmo, porque eles estão com dinheiro.  Mas é que...

Cida Danasco: Pois é, eles têm dinheiro sobrando com relação ao orçamento, mas não estão conseguindo cumprir o orçamento.

Júlio de Almeida: Benjamim, com tudo isso, vale a pena ser empresário industrial?  Eu faço essa pergunta porque muita gente diz que você vai dar uma ajeitada na CSN, vai vender e vai ter um belo lucro patrimonial. E é o contrário, você está é comprando a parte do Rabinovith [sobrenome da família com a qual o empresário tinha sociedade]. Vale a pena ser empresário industrial? Como fica a relação com o chamado famoso mercado financeiro? 

Benjamin Steinbruch: A CSN é o "patinho feio" da privatização e eu acho que era diferente dessa história toda. Na verdade, eu fiz aquilo que meu pai me disse, só. Meu pai é aquela pessoa que eu tenho a maior estima e, realmente, aquilo que ele me ensinou, ele sempre disse para mim: “Benjamim, os grandes grupos privados de um país são completamente diferentes depois do processo de privatização.” Então, aqueles que eram grandes grupos antes, depois da privatização, são outros grandes grupos. Então, a gente tinha que acreditar na privatização. E nós entramos na CSN, em 93, com 7,5% do capital da CSN. A CSN era tão ruim, mas tão ruim, que ela perdia 1 milhão por dia. A ministra Zélia [Zélia Cardoso de Mello, ministra da Economia durante o governo de Fernando Collor de Mello, entre 1990 e 1992] quis fechar CSN e o leilão foi numa sexta-feira, quando o presidente era o Itamar Franco [que governou o país entre 1992 e 1994] e o Fernando Henrique Cardoso era ministro [da Economia]. Para você ter uma idéia, não teve capital suficiente para comprar 50% do lote, para o leilão ser válido, e o governo deixou aberto de segunda a sexta para conseguir arrumar gente que acreditasse que aquilo era um bom negócio. Quem passasse lá na frente, a gente pegava para convencer. Acho que eu fui um fato completamente novo para o mundo dos negócios. Quer dizer, vim de um setor familiar competitivo, que é o setor têxtil, e comecei na CSN. Foi muito duro, eu vou falar a verdade, foi muito duro, porque sempre fui desacreditado, sempre com muitas dificuldades, de todos os tipos que você possa imaginar. Sempre disseram que eu era ousado, que eu era...

Carlos Marques: Louco? 

Benjamin Steinbruch: Louco não, não, mas muito agressivo.

Luis Nassif: A família apoiava ou ficava com "o pé atrás" no começo?

Benjamin Steinbruch: A família sempre apoiou. Eu vou falar uma coisa, falaram em determinado momento que minha mãe estava contra mim, que meus irmãos queriam vender e saía na imprensa tudo o que era plantado. Graças a Deus, sempre teve uma família muito unida, que suportou isso muito bem, mas eu vou falar uma coisa: foi muito difícil. Quando nós fizemos o descruzamento, o pessoal falava que eu estava tirando dinheiro do BNDES, que eu não iria agüentar, que era dinheiro político, que não sei mais o quê. Eu tive a grande satisfação de pré-pagar essa dívida. Quer dizer, não ouvi aqueles todos que falavam que eu não iria agüentar, não ouvi falarem nada com relação ao pagamento que fizemos anteontem, mas...

Luis Nassif: Foi anteontem?

Benjamin Steinbruch: Foi anteontem que pagamos. Aliás, foi semana passada que nós pagamos a dívida do BNDES. Então, eu vou te dizer uma coisa: vale a pena. Porque eu sempre acreditei e acredito no Brasil. Eu tenho orgulho de ser brasileiro, tenho orgulho de ser um industrial brasileiro, aceito os desafios de peito aberto, vou mesmo se eu acho que dá para ir, mas sempre no sentido de construir, no sentido de crescer, no sentido de aumentar, nunca no sentido de prejudicar, de dividir ou desfavorecer qualquer um. Tanto é que, nessa trajetória toda, ninguém perdeu dinheiro com a gente, nem sócio. Dos negócios todos que a gente fez, ninguém nunca perdeu nada com a gente. Realmente, eu tenho orgulho dos desafios que eu assumi. Aquilo que eu apanhei só me fortaleceu, só me musculou mais. Hoje, quando a gente está numa situação invejável, como está a CSN hoje, para você ter uma idéia, há 2 anos atrás tínhamos uma dívida que vencia a cada 8 meses. Aliás, até o começo do ano passado. Hoje, nós temos uma dívida que vence a cada 10 anos. Então, você vê a situação. É um mérito nosso, mérito de outros empresários brasileiros que realmente conseguiram vencer esse tempo difícil, mas eu te digo que valeu a pena. No descruzamento com a Vale, com a CSN, por exemplo, colocaram uma nota preta em cima da mesa. Nós, da terceira geração de trabalho, somos poucos e a maioria dos primos não trabalha. Naquele momento, que eu falei: não, olha, eu trabalhei esse tempo todo. Ou eu fico com a Vale ou fico com a CSN.  Sem nada eu não fico. Não adianta pôr dinheiro na mão".  E a família falou: “Não, se Benjamim falou que é para não aceitar o dinheiro, não vamos aceitar dinheiro, vamos acreditar nele.” E, então, foi possível ficar com a CSN. Fizemos essa dívida grande, mas graças a Deus passaram 2 anos, 3 anos. Eu tenho fé em Deus e, realmente, quando eu peço, eu peço grande. Se Deus atende, tomara que seja bastante e conseguimos concluir esse processo. Além de tudo, também conseguimos chegar a um bom termo na negociação com sócios, que é a família Rabinovith, que foram sócios do meu pai durante 40 anos. Eu tinha a missão de fazer com que a gente chegasse num bom termo, que as 2 partes ficassem satisfeitas. Acredito que amanhã ou depois de amanhã a gente conclui a operação com a família. 

Paulo Markun: Então, é uma semana boa para estar no Roda Viva.

Benjamin Steinbruch: Sim [risos]. É uma semana de boas notícias.

Paulo Markun: Nós vamos fazer mais um rápido intervalo e voltamos em instantes com o Roda Viva, que é acompanhado na platéia por Marcos Addad, diretor da Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo], Deise Maria de Oliveira Gomes, editora da revista Construção Metálica, João Rabelo, diretor e superintendente do Banco Fibra, Francisco Padilha, presidente da Fundação CSN. A gente volta já. 

[intervalo]

[Comentarista]: Ao se tornar o principal acionista da Companhia Siderúrgica Nacional, Benjamim Steinbruch recebeu em mãos não só um peso pesado da indústria, mas o mais forte símbolo da entrada do Brasil na era industrial. A CSN foi criada por Getúlio Vargas em 1941, com o financiamento dos Estados Unidos em troca do apoio do Brasil aos aliados na Segunda Guerra Mundial. Surgiu junto à divisa Rio-São Paulo, onde o rio Paraíba faz uma volta redonda, dando nome à usina; e a cidade é erguida para abrigar trabalhadores da siderúrgica. Inaugurada em 1946, por Eurico Dutra, a CSN passou a fornecer o aço que foi o pilar do país, que desenhou as curvas de concreto armado de Brasília e orientou a construção civil. Depois de crescer durante a fase do milagre econômico militar, a siderúrgica entrou em crise. Com a recessão do gás, o monopólio de sucessões impediu que ela vendesse seu próprio aço e a CSN só teve prejuízos e atingiu momentos de violência. O pior deles em 1988, quando o conflito entre exército e grevistas deixou 3 trabalhadores mortos e algumas dezenas de feridos. No início dos anos 90, com o fim do monopólio dos distribuidores, a CSN voltou a registrar lucros e, como outras estatais, entrou no processo de privatização, cercados de polêmicas, de protestos e leilões tumultuados. Há mais de 10 anos nas mãos da iniciativa privada, a lendária estatal já tem outra história para contar.

Paulo Markun: Eu tenho 3 perguntas aqui de moradores de Volta Redonda. Charles Parente, de Macaé, no Rio de Janeiro, pergunta se o auto-forno 4 sai e qual foi o fim do escritório central da CSN em Volta Redonda? O empresário, Sérgio Pardine, que é nascido e criado em Volta Redonda, pergunta por que a CSN está na contramão da história ao levantar a bandeira do social? Segundo ele, não está fazendo atividades lá que atendam a comunidade externa, como resgate de terrenos usados para lazer e resgate interno, valorizando funcionários e perda do patrimônio humano. Finalmente, Catarine diz o seguinte: Já ouvi por várias vezes que o empresário Benjamin Steinbruch não simpatiza com Volta Redonda e que não quer fazer nada que beneficie a cidade, como o auto-forno 4 ou qualquer expansão da usina.” Aliás, esse auto-forno é uma das alternativas de investimento da CSN, é isso?

Benjamin Steinbruch: Falando primeiro do auto-forno. O auto-forno 4, que na verdade substituiu o 1, em Volta Redonda, tem capacidade pequena. Nós poderíamos fazer auto-forno de 2 milhões e meio de toneladas, seria um investimento mais barato, seria por volta de 400 dólares por tonelada, porque tem a infra-estrutura toda feita. Então, do ponto de vista econômico e financeiro, faz sentido se fazer investimento em Volta Redonda. O problema é que Volta Redonda tem 100 quilômetros quadrados e ela está toda ocupada. Então, temos problema de logística, a gente não consegue andar dentro da usina que pára trem, pára caminhão, não tem fluxo que permita mais materiais. Então, você teria um investimento menor, mas em contrapartida, você estaria limitado pelo tamanho do auto-forno. Outra opção que tem é fazer em Itaguaí ou Casa de Pedra. Aí sim, um auto-forno moderno, de 5 mil toneladas, altamente competitivo, com a produtividade melhor que tem, custando mais caro. Nós estamos estudando isso. O caminho da CSN para termos minério, certamente, vai ser o auto-forno e, eventualmente, fazer os 2. Tanto o pequeno, em Volta Redonda, quanto o maior. Agora, a gente está esperando um pouquinho passar essa questão de juros com dólar para ver o melhor momento da gente fazer. Com relação a eu não gostar de Volta Redonda, pelo contrário, eu adoro Volta Redonda. Muita gente não sabe, acha que eu não gosto do Rio de Janeiro e eu sou carioca. A família da minha mãe toda é do Rio de Janeiro. Sou nascido lá e adoro Rio de Janeiro. Agora, eu tinha que priorizar alguma coisa, ficar morando em São Paulo por conta dos negócios e indo para o Rio de Janeiro não dava certo. Então, a gente decidiu levar os escritórios para Volta Redonda e uma parte pequena veio para São Paulo. Agora, o meu amor pelo Rio é enorme. Eu certamente sou um dos que mais pagam impostos no Rio de Janeiro. Então, a minha parte eu estou fazendo pelo Rio de Janeiro. Então, pelo contrário, se eu pudesse realmente eu gostaria de estar no Rio de Janeiro 24 horas, que é belíssimo aquele estado e aquela gente. E, especificamente, com relação à Volta Redonda,  a CSN era dona de tudo em Volta Redonda. Na verdade, Volta Redonda  era uma fazenda de café, onde foi feita uma usina e não se respeitou, do ponto de vista urbano, a construção da cidade. Na verdade, a cidade cercou Volta Redonda. E dentro dos terrenos que a CSN tem, não tem como a CSN fazer com que pessoas terceiras usem os terrenos da CSN para fazer dinheiro. Nós temos um montão de terrenos lá que estão em comodato e que eram usados por terceiros para fazer dinheiro. Eu comecei a questionar isso e realmente não acho que está certo. Acho que a propriedade tem que ser respeitada e é uma das premissas que eu encaro como mais sérias, que é a propriedade ser respeitada. No caso dos campos de futebol, clubes, esse negócio, o que a gente está fazendo é tentar fazer uma negociação no sentido de que paguem pelo uso. E eu acho que é justo, não vejo porque seria de forma diferente. Quer dizer, se você tem a propriedade do imóvel, se você tem a propriedade, tem que cobrar por ela, porque você pode doá-la para fins beneficentes, mas isso a gente faz também. Agora, você ter um clube que explora baile ou ter um campo de futebol que o cara aluga para terceiros, não vejo sentido nenhum.

Luis Nassif: Benjamim, se os investimentos em auto-forno são tão vultosos, se o BNDES tem dificuldade de financiar, por que foi feita quitação antecipada do financiamento do BNDES e não utilizada?

Benjamin Steinbruch: Não, quem tinha financiamento com o BNDES que foi antecipado foi a siderúrgica que é a dona da CSN e não a CSN.

Luis Nassif: Mas espera um pouquinho, uma das críticas que se faz a CSN é política de dividendos muito agressiva.

Benjamin Steinbruch: Também é coisa que eu estranho. Por que você, como acionista, vai reclamar que recebe dividendos?

Luis Nassif:  Não, o acionista não deve reclamar, o que se reclama é pessoal que quer investimento no Brasil. Essa política não é muito agressiva, a partir do cruzamento das ações das cotas dos sócios, vai manter a mesma política de distribuição de dividendos? 

Benjamin Steinbruch: Olha, eu acho que a gente tem que ser muito agressivo nos dividendos, porque a gente que satisfazer os acionistas. A gente pega a siderurgia, que tem 40% do capital da CSN, 60% são acionistas terceiros, a CSN não parou de crescer. Aliás, pelo contrário, a CSN foi a indústria que mais cresceu nos últimos anos.

Luis Nassif: Você acredita, com a queda de juros, com a indústria de fundos que nós temos hoje, uma indústria de fundos bastante sofisticada, ela possa ser uma grande parceira para capitalização das grandes empresas brasileiras? 

Benjamin Steinbruch: Fundos de pensão, você fala? 

Luis Nassif: Indústria de fundos de maneira geral.

Benjamin Steinbruch: Eu acho que sim, é uma fonte inesgotável de recursos que se quiserem investir na parte produtiva, eu acho que seria muito bom. Hoje, você não tem interesse nenhum de investir em parte produtiva, pelo contrário. Nós temos um modelo rentista. Quer dizer, hoje o que vale é você ter os 13% do juro real e pouquíssimos negócios dão 13% do juro real. Então, se aumentam os fundos, seja qual for, não tem interesse de investir em fundo produtivo.Tomara que isso mude e passe a investir, seria um negócio interessante. Agora, não é pelo fato do dividendo que você deixa de investir. A situação da CSN, que hoje pode pagar dividendos, ela tem 1 bilhão e 600 de dólares em caixa.

Carlos Marques: Quanto ela distribuiu de dividendos?

Benjamin Steinbruch: Então, não é pelo dividendo que ela vai deixar de investir.

Luis Nassif: Mas percentual é percentual, não é?

Benjamin Steinbruch: E hoje você tem facilidade de crédito lá fora. Então, para esse projeto de Itaguaí, das placas, ou para o aumento da produtividade da Casa de Pedra, de 16 milhões de toneladas para 40 milhões de toneladas, o J Bic japonês [Banco de Cooperação Inernacional do Japão], os banco americanos financiam. Você pode politizar a sua produção.

Carlos Marques: A que custo? 

Benjamin Steinbruch: Então, o custo é menor ainda do que se você tomar aqui dentro em termos de reais. O problema é que as empresas todas estão procurando as fontes de financiamento lá fora.

Carlos Marques: Essa distribuição de dividendos, quanto deu a última?

Benjamin Steinbruch: Quanto deu como? 

Carlos Marques: Quanto foi distribuído na última distribuição de dividendos?

Benjamin Steinbruch: 900 milhões de dólares.

Carlos Marques: Isso ano passado? 

Benjamin Steinbruch: Foi feito agora em junho, foi pago agora, com relação ao exercício de 2004.

Cida Danasco: Benjamim, sonbre a questão de investimentos, de definição de prazo etc. O problema é mais a questão conjuntural, o cenário da economia e a política do que a questão interna da empresa?

Benjamin Steinbruch: Claro, de todo mundo é assim. As empresas brasileiras melhoraram muito e estão em condições de investir. Agora, o que eu acho errado também...

Cida Danasco: Ou seja, dinheiro tem e fonte de financiamento também, o que precisa é saber para qual mercado?

Benjamin Steinbruch: O que acho errado é induzir o governo ao erro. Você vê no noticiário de imprensa, o que se anunciou de investimento no Brasil que não se concretizou? Só de pesquisas tem 7. Prometidas e não construídas.

Cida Danasco: A gente acabou de divulgar no jornal uma pesquisa dizendo que apenas 40% dos investimentos anunciados ao longo do segundo semestre do ano passado é que acabaram saindo do papel.

Benjamin Steinbruch: E isso atrapalha o governo, porque todo mundo chega, falam que vai investir e o investimento não acontece.

Cida Danasco: Ou seja, há muito anúncio e, na verdade, nem tanta disposição.

Benjamin Steinbruch: Na verdade se os juros aumentarem...

Júlio de Almeida: O pessoal queria investir, não é, Benjamim?

Benjamin Steinbruch: Todo mundo quer investir.

Júlio de Almeida: No final do ano passado, você tinha uma intenção de investimento no Brasil bastante importante, não só no setor siderúrgico, mas em muitos setores. O que aconteceu? A política muito prolongada de aumento de juros acabou afetando a disposição dos empresários em investir?

Benjamin Steinbruch: Só deixa eu falar uma coisa, Júlio. Nós estamos investindo 800 milhões de dólares na mina e no porto. Há um investimento também na área de transporte, estamos com um investimento andando de 800 milhões de dólares. O porto está sendo concluído agora, em 2006, e nós não tomamos nada do BNDES.

Paulo Markun: E outro de 2 bilhões e meio que está sendo estudado.

Benjamin Steinbruch: Esse de 800 milhões de dólares estamos fazendo independentemente do BNDES. Quer dizer, estamos discutindo com o BNDES e tomara que eles nos atendam, porque seria tremendamente positivo. Infra-estrutura, porto, faz todo sentido.

Carlos Marques: E transporte? Você está investindo 550 milhões na malha ferroviária, para transportar soja no sul do Maranhão. É uma diversificação do negócio, é isso?

Benjamin Steinbruch: É a Transnordestina [ferrovia que liga o Porto de Suape, no Recife, ao Porto de Pecém, em Fortaleza]. Isso foi na época da Vale do Rio Doce, que a gente queria ter monopólio da logística e compramos a Companhia Ferroviária do Nordeste. Compramos no sentido de fazer uma siderúrgica no Ceará e trazer minério de São Luiz ou, eventualmente, por cabotagem, mas para desenvolver ferrovias de porte. Acabaram uma em Aracajú e a gente queria ter isso aí no Ceará. Então , a gente tinha aquela visão. Depois, quando foi feito a separação, ficou a Companhia Ferroviária do Nordeste dividida metade e metade, CSN e Vale. Ficou FCA [Ferrovia Centro-Atlântica], que sai do Sergipe e vai até o Rio de Janeiro, metade e metade. Ficou Sepetiba [Porto de Sepetiba, no Rio de Janeiro], metade e metade. Depois do descruzamento, a gente acertou que nós ficaríamos com o Porto de Sepetiba e com a CSN e Vale ficou com a ..[é interrompido e entrevistadores falam juntos]

Carlos Marques: Para transportar soja né?

Benjamin Steinbruch: O projeto da Transnordestina é um projeto muito importante. Na minha visão é o projeto mais importante do presidente Lula neste seu primeiro mandato, que é atender a região do Nordeste, onde, inclusive, ele tem facilidade de vencer a reeleição. Quer dizer, é a região que tem mais facilidade é o Nordeste, que vai levar a soja do sul do Piauí, do sul do Maranhão, do norte da Bahia, até Fortaleza e Recife.  Faz um "Y" lá.

Carlos Marques: Eles colocam 4 milhões e vocês 550 milhões, é isso? 

Benjamin Steinbruch: A gente vai liderar o projeto e o BNDES vai financiar 400 e poucos milhões. Tem Finor [Fundo de Investimento do Nordeste], estamos fazendo...

Carlos Marques: Agora, no seu grupo vai ser uma diversificação total?

Benjamin Steinbruch: Não, não é. A CSN vai ser dividida, em futuro próximo, seja societariamente ou não, depende de questão fiscal, em mineração, siderurgia, cimento e logística. Nós vamos ter 4 grandes empresas e isso atende a questão de logística.

Paulo Markun: A propósito dessa questão da Companhia Ferroviária do Nordeste, o Jorge Duque Estrada pergunta se vocês pensam na participação da CSN junto com as Forças Armadas para montar rede ferroviária do Porto de Suape até a Transamazônica [rodovia com 2,3 mil quilômetros, passando pelo Pará e pela Amazônia, inicialmente projetada para possuir 8 mil quilômetros] um grande projeto que envolve uma transcontinental.

Benjamin Steinbruch: Não, a Transnordestina vai ligar o Porto de Suape e o sul do Piauí. Esse é o primeiro projeto. Depois, ela deve continuar até a Norte-Sul. Quer dizer, a idéia é fazer até a Norte-Sul, ela desce assim [mostra com as mãos] e a gente teria um "T" no nível do Norte e Nordeste. Agora, se for possível ter as Forças Armadas juntas nisso, acho super interessante. Porque temos no projeto todo um departamento de engenharia e nós já discutimos isso. Inclusive, acho que seria uma condição muito boa, tanto para as forças armadas quanto para o projeto, porque eu acredito que seria um negócio legal.  A Vale do Rio Doce já está fazendo alguma coisa com o Exército. Nós estivermos conversando lá também para tentar fazer alguma coisa.

Paulo Markun: Nós vamos fazer um rápido intervalo e voltamos em instantes com a entrevista que é acompanhada pela nossa platéia por Arnold Shuartz, analista financeiro, Francisco de Assis Esmeraldo, presidente da Plastivida, e Alencar Costa, sócio-consultor da Focus Desenvolvimento Empresarial.  A gente volta já. 

[intervalo]

[Comentarista]:
O pensamento de Benjamim Steinbruch tem sido esboçado em público e a "conta-gotas" nos artigos que escreve na Folha de S. Paulo, são comentários, análises e opiniões sobre a economia, o rumo do mercado e decisões do governo. Diante da atual crise, Benjamim disse que no tiroteio político pouca atenção tem sido dada aos sinais de desaquecimento na economia.  Benjamin Steinbruch, diante disso tudo, tem dito que um Brasil que produz, exporta e emprega, é um Brasil real que pede encarecidamente para não ser perturbado. Benjamim Steinbruch considera o governo Lula um sucesso nas ações de inclusão social, mas uma decepção nas políticas de desenvolvimento. Quanto aos juros, adverte que há limite em tudo em matéria de irresponsabilidade e que o governo já foi longe demais na elevação das taxas. Steinbruch defende a criação da empresa nacional contra o assédio estrangeiro e que o Brasil precisa ser vendido no mercado mundial, apesar dos juros e câmbio que encarece os produtos brasileiros. Benjamin argumenta que precisamos de um novo impulso: "Tivemos um ciclo importante de investimentos no pós-guerra, outro na construção de Brasília e o último no governo militar.  É hora de um novo salto."

Paulo Markun: Benjamin, ainda dá tempo desse novo salto? 

Benjamin Steinbruch: Acho que dá, estamos trabalhando para isso. Eu acredito que tem muita coisa que está dando certo. Este fim de semana estive no Acre, um estado que não conhecia, em função do governador Jorge Viana [político do PT, governou o Acre por 2 mandatos consecutivos, entre 199 e 2007] ter vindo para São Paulo e ter feito uma reunião com empresários. Eu falei: Poxa, realmente, é obrigação minha conhecer um estado que até agora não tinha ido. Fiquei impressionado com o que está acontecendo lá. É um estado de 600 mil pessoas, mas que está sendo feito com amor, com coração, com dedicação e você vê as coisas acontecendo para o lado do bem. Então, assim como no Acre, que o governador Jorge Viana tem feito esse excelente trabalho, acho que na iniciativa privada nós temos casos em que está sendo feito um excelente trabalho. Acho que é o momento, acho que é tempo sim. Espero que o presidente Lula faça o mais rápido possível essa reforma ministerial, esse enxugamento. Acho que ele tem que usar 2 em 1, ou, então, inventar. Agora, nos Estados Unidos, quando eu cheguei lá na LLC, que é nossa filial, onde tínhamos apenas 5 vendedores, eu inventei que tinha que ter 18, porque 18 é o número da sorte. E o pessoal está se virando para ter 18 vendedores lá.  E acho que aqui o presidente Lula tem que pegar e fazer um...

Paulo Markun: Mas não para ter mais ministros. É para ter menos [risos].

Benjamin Steinbruch: É, faz tipo 2 em 1 e enxuga. Acho que temos 33 ou 35, não sei nem quantos, ministérios e secretarias . Faz esse enxugamento, põe gente boa, dá um choque de firmeza administrativa e vamos para frente. Tem tempo sim. Acho que está na hora de fazer as grandes coisas.

Ivan Ribeiro: Benjamim, no bloco anterior, você falou que a CSN está sendo dividida em várias unidades de negócios.

Benjamin Steinbruch: Pode ser.

Ivan Ribeiro: E, inclusive, você citou mineração. Você não acha que o fato de você estar criando uma empresa focada em mineração é uma provocação para a Vale do Rio Doce?

Benjamin Steinbruch: Não estou criando nada.

Ivan Ribeiro: Pelo fato de você ter saído de lá em desentendimento com seus antigos parceiros?

Benjamin Steinbruch: Não, Ivan. O que acontece é o seguinte: a CSN foi a primeira, como apareceu no programa. É o marco da industrialização no Brasil. Tudo de melhor nos anos 40 foi dado para a CNS. A melhor mina de minério de ferro, a melhor mina de calcário, melhor porto, melhor ferrovia, tudo foi dado para ela, porque ela foi a primeira. Nós temos um ativo que não é reconhecido pelo mercado, porque não tem um cash flow [declaração financeira] separado, que produzia 6 milhões de toneladas de minérios de ferro. Já produziu 9, produziu 2, está produzindo 16 e vai produzir 40 milhões de toneladas. Esse negócio vale 3 milhões de dólares e não está valorizado como negócio da CNS. É minha obrigação, como gestor, oferecer essa possibilidade para os acionistas. Então, de alguma forma, eu tenho que tirar de dentro dos ativos da CNS isso e mostrar como uma unidade.

Ivan Ribeiro: Fizeram descruzamento...

Benjamin Steinbruch: Agora, não vai ser necessariamente um negócio novo. Não falei isso. Falei que, eventualmente, pode ser dividido em 4, sem separação. Eventualmente, pode ser separado, se a questão fiscal for favorável.

José Paulo Kupfer: Falando em minério e falando em Vale, enfim. Estudando para vir ao programa, porque aqui a produção nos fornece, como todo mundo deveria fazer, uma pesquisa bem feita para a gente ter conteúdo para fazer as perguntas. Uma coisa que me chamou muito atenção foi uma história que você foi protagonista em 97, em relação a Vale do Rio Doce e em relação ao processo de privatização da Vale. Houve uma história, nunca bem resolvida, que você teria sido procurado por um cidadão chamado Ricardo Sérgio [de Oliveira, ex-diretor do Banco do Brasil], que trabalhava no governo, ligado ao hoje prefeito José Serra, que te propôs propina para você ficar com a Vale do Rio Doce. Nessa história ficou que o presidente Fernando Henrique Cardoso soube, que não soube, e o ex-ministro Mendonça de Barros [ex-ministro das Comunicações] confirmou essa história. Confirmou que comunicou isso ao presidente.

Benjamin Steinbruch: Posteriormente.

José Paulo Kupfer: E o mais interessante disso tudo é que o PT, especialmente pela boca do seu presidente na época, o ex-ministro José Dirceu [ministro da Casa Civil no primeiro mandato do governo Lula], pedia vigorosamente uma CPI para apurar esse assunto. Essa história não é uma repetição talvez farsesca do que a gente está vendo hoje? [Referindo-se ao "mensalão", como ficou conhecido o conjunto de denúncias sobre a existência de uma mensalidade paga por membros do partido do governo Lula, aos deputados. O financimento do esquema viria por meios clandestinos de arrecadação de recursos]

Benjamin Steinbruch: Olha, não. Eu te diria que existe muito folclore em cima das coisas e muita desinformação. Eu sou uma pessoa que recebe todo mundo na CSN . Eu vou te contar a história da privatização da Vale e porque nós ganhamos. Apareceu um cidadão chamado Richard (...), de um banco americano que nunca tinha tido negócio no Brasil, e foi visitar a gente no Rio de Janeiro. Eu atendo todo mundo, apesar de ele não ter um negócio comigo, ele foi falar comigo: "Somos de um banco americano,  o Nations Bank. queremos entrar no Brasil, não temos negócio aqui, sei que você é uma grande empresa, é agressivo e se você precisar de alguma coisa você fala comigo."  Eu falei: eu vou precisar, eu estou estudando negócios grandes e vou ligar para você. Passados 6 meses, a gente estava fechado no consórcio Votorantim [grupo brasileiro com atuação em diversas áreas], Bradesco [banco] e CSN. Por razões que a Votorantin avaliou, ela preferiu abrir mão desse consórcio e se ligar com a Anglo American [grupo internacional da área de mineração e recursos naturais]  com 16 trades japonesas. Daí, ficou Bradesco e CSN separado. A gente começou a costurar um consórcio e liguei para esse Richard no banco: Estou querendo fazer um negócio e estou precisando de recursos. Ele falou: "Que ótimo. O que é?"  Eu falei: É a Vale do Rio Doce. "Eu conheço muito a Vale, quanto você quer?"  Eu falei: eu quero 1 bilhão e meio de dólares. Ele falou: "Quanto?" Repeti: "1 bilhão e meio de dólares".  E aconteceu que ele deu um crédito clean para CSN de 1 bilhão e meio de dólares para um consórcio que estávamos formando. Esse 1 bilhão e meio de dólares que nós demos ...

Paulo Markun: Só para explicar para o leigo, o que é o crédito clean?

Benjamin Steinbruch: É um crédito sem garantias, que não é uma coisa normal.

Paulo Markun: Como um voto de confiança.

Benjamin Steinbruch: Hoje, para qualquer coisa, o pessoal pede garantia e esse banco falou que com as ações já estava bom, com uma condição: ele dava uma linha stand by [em espera] para nós e se a gente não usasse teria que pagar 10 milhões de dólares. E ele colocou à disposição. E, desse bilhão e meio, só usamos 900 mil dólares e ainda o convenci...

José Paulo Kupfer: Sim, mas nessa história...

Benjamin Steinbruch: E essa história de que nós fomos procurados, que foram os fundos de pensão que decidiram a privatização da Vale do Rio Doce, não foi verdade. Os fundos de pensão já eram acionistas da Vale do Rio Doce. Eles tinham 10% de ações, principalmente a Previ [plano de prividência privada do Banco do Brasil] , da Vale do Rio Doce. O que eles queriam é que esses 10% fossem incorporados no grupo controlador. Porque tem uma diferença de você ter ações fora do controle e dentro do controle, tendo aí 30% de diferença, e a Votorantin não aceitou isso.

José Paulo Kupfer: E, finalmente, não houve a propina? 

Benjamin Steinbruch: Não, não teve nada disso. Eu já disse que não houve até lá atrás. O que houve é que a gente ganhou porque a gente teve esse financiamento. Para você ter uma idéia, eu preparei o consórcio Brasil junto com meus colegas, naquele momento, para uma guerra. Porque a gente via Votorantin, via japonês, via Anglo American, via tudo junto: 16 trades japonesas. A gente se preparou para ter muita reserva e eles pararam com 19%. Nós demos os 20% e levamos. Nós estávamos preparados para ir muito além.

José Paulo Kupfer: E dá para fazer uma analogia? Quer dizer, essa história que correu, no fundo, não era verdadeira e há alguma analogia com o que está se passando hoje ou você acha que não são coisas verdadeiras?

Benjamin Steinbruch: Histórias ocorrem sempre e têm que ser apuradas. Essa questão, eu acho que tem que ser apurada o quanto antes, pois você tem indícios muito fortes. Acho que, na verdade, o presidente Lula tem que buscar a governabilidade dele na sociedade e não no PMDB [Partido do Movimento Democrático Brasileiro]. O PT tem que dar satisfação para a sociedade e aí está a governabilidade. Eu não quero culpar, muito pelo contrário, porque eu sei como é que funcionam as coisas, durante esses 15 anos de vida profissional eu vi muitas coisas que não são verdades. Então, realmente a gente tem que apurar, investigar direitinho. Mas essa história, por exemplo, que tem 20 milhões que foi dado para boiadeiro para venda de gado e cavalo, eu quero ver aparecer para quem vendeu agora. Quer dizer, entendeu? Você tem certas coisas que não são compatíveis. [Referindo-se ao publicitário Marcos Valério, apontado como um dos administradores do "mensalão", que citou a compra de gado como justificativa para grandes saques em dinheiro]

José Paulo Kupfer:
O presidente não precisará do PMDB para conseguir?

Benjamin Steinbruch:
Eu acho que o presidente pode precisar de todo mundo. Mas, eu acho que lá em Brasília o pessoal está muito preocupado com a questão política. Eu estou mais preocupado é com a sociedade. Porque, na verdade, o PT tem que prestar conta para o próprio PT, para os afiliados, para aqueles caras que acreditaram no PT durante esse tempo todo. Eles só vão conseguir isso apurando e, eventualmente, penalizando.

Paulo Markun: Um dos temas que está sendo discutido é o financiamento das campanhas. Você é tido como um bom amigo, por exemplo, do senador Aloísio Mercadante do PT. As suas empresas financiam campanhas políticas legalmente? Você acha que esse é um caminho?

Benjamin Steinbruch: Financiam e eu acho que tem que financiar mesmo. Agora, preferiria que fosse toda pública [as campanhas]. Eu acho que seria mais equilibrado, mas acho que, mais do que qualquer coisa, teria que ter financiamento com origem formal. Se a opção fosse financiamento privado, que fosse feito dessa forma. Agora, nós temos financiamento para todos os partidos, mesmo porque nós temos amigos em todos os partidos e amigos que a gente acha que pode fazer um bom trabalho pelo Brasil. O senador Aloísio Mercadante, por exemplo, é meu irmão, é muito bom amigo mesmo. Eu acredito que ele é um dos políticos que pode fazer ainda um trabalho muito bom pelo Brasil e apoio ele com dedicação e certeza de que ele vai mostrar um bom trabalho.

Carlos Marques: Quanto deram de dinheiro em campanha?

Benjamin Steinbruch: Quanto o quê?

Carlos Marques: Quanto foi doado em dinheiro para campanha, de quanto foram as doações?

Benjamin Steinbruch: Da nossa? 

Carlos Marques: Sim.

Benjamin Steinbruch: Não sei, mas temos tudo. Foi para muita gente, para muitos partidos, todos eles relacionados pelo PT. Foi nos diretórios em nível de Brasil, demos para todos os diretórios do PT, acho que...

Luis Nassif: Benjamim, alguns anos atrás teve um episódio, uma tentativa de fusão de vocês com a inglesa Corus [grupo é um dos líderes na área de aço e alumínio da Europa]

Benjamin Steinbruch: Corus

Luis Nassif: Conta os detalhes. Qual que era a visão estratégica por trás daquilo e por que não deu certo? Porque, para gente , pareceu que era uma repetição do caso Ambev.

Benjamin Steinbruch: Não só apareceu como você escreveu? 

Luis Nassif: Escrevi [risos]. Escreveu, não leu, apareceu!

Benjamin Steinbruch: Mas, na verdade, aqui no Brasil temos a visão de que para ser dono você tem que ser 50% mais 1. Nos Estados Unidos, com 5%, 10%, você controla uma companhia. A nossa proposta, naquele momento, começou em abril uma discussão, foi para fundir a CSN com a Corus. Nessa participação nós teríamos 32% e 68% a Corus. E fizemos um business plain, um plano que é um orçamento comum às duas empresas. Chegou em novembro, aquilo que era 32 e 68, virou 68 e 32 a nosso favor, porque fizemos um plano duro de redução de custos. Não consideramos que o mercado fosse melhorar e eles não fizeram trabalho interno de redução de custos. Daí, antes de chegar em dezembro, quando era para assinar o negócio, o management inglês decidiu não abrir o negócio, porque não tinha como explicar um negócio que eles começaram com 68% e no final...

Luis Nassif: Em função da rentabilidade?

Benjamin Steinbruch: A gente apertou muito o custo e começou a ter rentabilidade de performance muito melhor do que eles . Então, não foi por essa razão, mas se tivesse sido teria sido um grande negócio para o Brasil e a CSN, porque seria a criação de uma multinacional. Ou seja, você teria o controle de uma empresa desse tamanho por um grupo privado brasileiro. Eu acho que teria sido legal. A Ambev, depois, fez isso e tem outras empresas que estão fazendo isso.

Luis Nassif: E eu critiquei também.

Benjamin Steinbruch: É, isso aí [risos].

Luis Nassif: Porque a lógica...

Benjamin Steinbruch: Nossas empresas brasileiras são pequenas. Quer dizer, comparadas com gigantes mundiais. Na hora que você faz o choque, realmente, você não consegue ter os 51%. Na verdade, com 20%, 30%, 40%, você tem controle da companhia.

Paulo Markun: Benjamim, nosso programa acabou, queria agradecer muito sua entrevista
, desejar boa sorte nos negócios e feliz aniversário, que daqui a pouco é aniversário de Benjamim Steinbruch. E a gente volta na segunda-feira com mais um Roda Viva. Ótima semana e até lá. 

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