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[Programa ao vivo, que
permitiu a participação do telespectador por telefone, fax e internet]
Paulo Markun: Boa noite. A fusão das bolsas de valores do
Rio
e de São Paulo abre caminho para a união das bolsas brasileiras e para
a integração das bolsas da América Latina. A Bolsa do Brasil é o tema
do Roda Viva desta noite. No centro do debate está
o
presidente da Bolsa de Valores de São Paulo, Alfredo Rizkallah. Ele
nasceu em São Paulo, tem 69 anos, é casado, três filhos, e é dono de um
extenso currículo profissional. Alfredo Rizkallah formou-se engenheiro
civil pela USP, fez cursos de extensão em administração de empresas e
mercado de capitais, e preside desde 1996 o Conselho de Administração
da Bovespa [Bovespa é a instituição administradora de mercado de bolsa
e de balcão
organizado, de centros de negociação de valores mobiliários, efetuando
compras e vendas desses valores através de sistemas eletrônicos de
negociação] pela segunda vez. A primeira vez foi de 1973 a 76.
[Comentarista]: A fusão das duas maiores bolsas de
valores do
país formalizada no mês passado põe fim a uma rivalidade histórica
entre os dois centros financeiros. A partir do mês que vem, São Paulo
vai centralizar os negócios com ações e o Rio de Janeiro deverá
trabalhar exclusivamente com títulos públicos; mercado em que as
instituições financeiras vendem entre si os papéis emitidos pelo
governo. Cada qual com sua especialidade. O próximo passo será integrar
ao sistema as demais bolsas de valores existentes no país, formando a
Bolsa do Brasil. A idéia é concentrar o mercado de ações na Bolsa de
São Paulo, que em breve passará a abrigar também os negócios dos
pregões [modalidade de licitação para a aquisição de bens e serviços
com características, especificações e padrões de qualidade definidos em
edital] de Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte, Recife e Fortaleza.
Os objetivos são: tornar competitivos os mercados de capitais do país e
reduzir os custos operacionais. Nos últimos anos, as bolsas brasileiras
vinham perdendo espaço para as de outros países. As bolsas
estrangeiras, como a de Nova Iorque, atraem empresas brasileiras porque
têm custos baixos e não cobram impostos, como ocorre nas bolsas
brasileiras, onde os negócios estão sujeitos a tributação da CPMF
[Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, cobrança
de caráter provisório, criada em 1996, que incidia sobre as
movimentações bancárias. Foi prorrogada até dezembro de 2007].
Para
complicar, no ano passado, mais de 35 empresas anunciaram a intenção de
fechar o capital no país, deixando de negociar suas ações em bolsa. A
criação da Bolsa do Brasil deve intensificar o processo de inserção do
seu mercado de capitais na economia mundial e vai também facilitar sua
modernização. A venda de ações foi uma das primeiras coisas a decolar
na internet. Seis corretoras brasileiras já vendem ações pela rede
mundial de computadores desde março do ano passado e existe uma
previsão de que daqui a três anos 30% do movimento das bolsas
brasileiras seja realizado pela Internet, que atraiu gente que nunca
havia comprado ações antes. Quanto ao pregão de viva voz, está virando
coisa do passado. Nas bolsas modernas, a compra e venda de ações
dispensa gritaria. São feitas pelos terminais do sistema eletrônico.
Paulo Markun: Para entrevistar o presidente da
Bovespa, Alfredo
Rizkallah, nós convidamos o jornalista Celso Pinto, diretor do jornal
que vai surgir agora em abril, Valor Econômico, e
colunista da Folha de S.Paulo; convidamos também o
jornalista Paulo Henrique Amorim, do programa Conversa Afiada,
aqui da TV Cultura; o economista Roberto Teixeira da Costa,
vice-presidente do conselho de administração do Banco Sul América; o
jornalista José Paulo Kupfer, colunista e editor de opinião do jornal Gazeta
Mercantil; a jornalista Sônia Racy, colunista do jornal O
Estado de S. Paulo;
e o economista Alfried Ploger, presidente da Abrasca, Associação
Brasileira das Companhias Abertas. [...] Doutor Rizkallah, boa noite.
Alfredo Rizkallah: Boa noite.
Paulo Markun: Eu estava vendo as imagens da matéria
de
apresentação do senhor, do programa que nós estamos discutindo. Eu
estava me lembrando que, como jornalista de televisão já há vinte anos,
e de jornal um pouco mais, eu já fui em diversas ocasiões à Bolsa de
Valores, sempre como repórter de economia, mas para cobrir situações
como a de hoje, por exemplo, quando a bolsa alcança um novo recorde. Ou
em outras situações, quando havia uma queda surpreendente. Mais
recentemente, a própria televisão passa a trazer programas e índices da
Bolsa de Valores mas, apesar de tudo isso, para o grande público, para
a maioria da população, a Bolsa de Valores continua sendo uma coisa
esquisita, as pessoas vêem aquele monte de gente correndo para lá e
para cá, gritando, assistem aqueles filmes de Hollywood em que há
sempre um misterioso comando da subida e da descida das ações, mas na
verdade não faz parte da vida das pessoas. Quando é que o senhor
imagina que isso vai acontecer, se é que vai acontecer no Brasil?
Alfredo Rizkallah: Eu acredito que é um processo
cultural. Nós
não temos um risco de ações no Brasil de longa data. Nos Estados
Unidos
nós temos um mercado que já tem mais de duzentos anos. Muitos fatores
podem ser elencados para justificar este noviciado no mercado de ações.
Quer dizer, tem fatores culturais que remontam inclusive ao período de
colonização brasileira e americana, que eu acho que não precisamos
tocar. Mas realmente no que diz respeito, por exemplo, à legislação, o
Brasil veio a ter uma legislação que instituiu o sistema financeiro
nacional somente em 1965. A própria lei de SAs [Sociedades Anônimas –
empresas cujo capital é dividido em partes iguais chamadas ações] é de
1975. Essa lei veio substituir a antiga lei de 1940, que tratava mais
das sociedades limitadas [aquelas constituídas por dois ou mais sócios,
detentores de cotas não necessariamente iguais]. A lei que permite o
acesso a investidores estrangeiros
no
Brasil é de 1991 e, eu gostaria de lembrar, por exemplo, que nos
Estados Unidos, quando os americanos decidiram construir as suas
ferrovias em direção ao oeste, isso há mais de duzentos anos atrás,
eles foram buscar capital estrangeiro, foram buscar capital em Londres.
E também não é novidade para nós, porque o Barão de Mauá, por exemplo,
no século passado, foi buscar capital em Londres. Mas capital
estrangeiro para nós, portanto, de verdade, passou a existir só a
partir de 1991. Fora essa parte de legislação, nós temos que incluir
também que, a partir de 1975, quando nós já tínhamos uma legislação de
SAs, nós entramos num período inflacionário, nós passamos aí trinta
anos
com uma inflação de quase 1% ao dia em alguns períodos. Seria
praticamente impossível você aconselhar alguém a investir no mercado de
risco num período tão tenso como aquele que nós passamos. Fora disso,
também, nós temos que considerar que a própria legislação que regulou a
constituição das sociedades corretoras, do mercado etc., teve um
período de adaptação. E o mercado de ações passa a ter a possibilidade
de existir nesses últimos cinco anos de estabilidade. Somente com
estabilidade você pode realmente imaginar a possibilidade de existência
de um mercado de ações.
Paulo Markun: O senhor acha que, hoje, por exemplo,
já seria...
porque também era uma pergunta que o jornalista era obrigado a fazer e
uma recomendação que praticamente se repetia, que era dizer o seguinte:
"Olha, você está animado agora porque a bolsa registrou um novo
recorde, houve uma alta muito grande. Não entre na bolsa agora porque
isso não é negócio para amador". Continua valendo essa recomendação?
Alfredo Rizkallah: Essa é uma recomendação que a
gente ouve com
freqüência. Realmente eu espero que a gente não vá continuar ouvindo
isso por muito tempo, porque todo o povo brasileiro está se acostumando
a esse mercado. Esse mercado, como você disse, seria possivelmente um
reduto de uma elite. Hoje, no mundo inteiro, bolsa é um assunto de
primeira página dos jornais, portanto não é um assunto que pode
interessar somente a um reduzido número de experts ou
analistas. É um
assunto que interessa ao próprio país. A evolução da bolsa, como também
a evolução da cotação da sua moeda, são indicadores hoje muito
importantes para definir qual é o grau de desenvolvimento ou do estágio
do país. Portanto, a bolsa passa a ser um fator inerente ao nosso
dia-a-dia. E isso vai começar realmente a influir definitivamente no
conhecimento do público em relação à bolsa.
Sonia Racy: Doutor Alfredo, o que a bolsa está
fazendo para
abrir mais esse mercado para novos investidores? O que vocês estão
fazendo em termos de divulgar informações, abrir espaço, mostrar o
caminho das pedras, o que vocês estão fazendo nesse sentido?
Alfredo Rizkallah: A Bolsa já tem...
Sonia Racy: Nós não vamos levar duzentos anos, não
é?
Alfredo Rizkallah: Não, não, realmente as coisas
que antigamente
levavam duzentos anos, a moderna tecnologia de hoje pode reduzir isso a
um prazo bastante mais curto. E é importante que a gente o faça num
prazo mais curto, senão novamente nós vamos perder... [sendo
interrompido]
Sonia Racy: O que é um prazo curto, doutor Alfredo?
Alfredo Rizkallah: ...nós vamos perder o bonde da
história se
nós não entrarmos no mercado de ações. Uma das atividades mais
importantes que a bolsa desenvolveu recentemente para atrair o público,
atrair indivíduos, é o nosso sistema de negociação via internet.
Lamentavelmente, o processo de privatização [venda de empresas estatais
para a iniciativa privada] no Brasil não contemplou a participação do
grande público, como ocorreu no Reino Unido, na França, na Alemanha, na
Espanha. Em outros países, o povo foi chamado a participar e, com isso,
o povo também aprendeu a viver dentro...
Sonia Racy: Foi um erro, doutor Alfredo? O governo
errou?
Alfredo Rizkallah: Eu acho que foi uma opção
equivocada. O
governo gostaria, naquele momento, de obter, dentro do processo de
privatização, o maior volume possível de arrecadação. E imaginou então
que se permitisse que uma parcela de ações fosse distribuída a público
o produto final da venda não seria tão substancioso como o foi. Eu
acredito que possa ter sido um equívoco, porque nós tivemos
privatizações de grande sucesso, como eu disse, nesses outros países,
com a participação popular. Mesmo... [sendo interrompido]
Sonia Racy: O senhor defende então que a
continuidade, agora, do
processo de privatização que está em discussão - a nova modelagem desse
processo de privatização está em discussão -, o senhor defende então a
pulverização dessas novas ações do governo Fernando Henrique [entre
1995 e 2003, quando ocorreram privatizações como da
Embraer, Telebrás e Vale do Rio Doce]?
Alfredo Rizkallah: Ah, sem dúvida, sem dúvida. Nós
precisamos
chamar o povo para participar desse benefício, nós precisamos
transformar... por exemplo, nós vamos ter privatização do sistema
elétrico, nós precisamos chamar os consumidores para se tornarem
acionistas. Será extremamente importante que uma pessoa se coloque dos
dois lados. Como acionista, ele vai demandar da empresa de energia
elétrica o melhor resultado possível, e como consumidor ele vai
demandar da mesma empresa um melhor serviço. Então, é bastante
importante essa participação popular nas privatizações.
Celso Pinto: Doutor Rizkallah, o governo não só não
pulverizou a
privatização, o capital para o povo em geral, mas o que está
acontecendo agora em função em parte do modelo de privatização é que a
privatização pode acabar esvaziando a Bolsa de Valores. O que nós
estamos vendo acontecer com a principal vedete hoje da Bolsa de
Valores, que é a Telesp [Telecomunicações de São Paulo,
comprada
pela
empresa espanhola Telefonica, em 1998], é uma operação da Telefonica de
Espanha - que comprou a Telesp - de compra de ação, de troca dessa ação
por ação da Telefonica de Espanha, que vai provavelmente fazer com que
a Telesp desapareça como a grande blue
chip
[ações de primeira linha] do mercado. E na esteira da
Telesp, outras telefônicas, que são as grandes vedetes, deveriam ser as
grandes vedetes aqui da bolsa brasileira, estão dando indicações
também, alguma indicação de que pode seguir nesse mesmo caminho. Então,
na verdade não só não houve a pulverização, como nós temos uma ameaça
para a Bolsa, de esvaziar a Bolsa de grandes empresas, que são grandes
oportunidades de investimento, que poderiam dar uma força para a bolsa
brasileira, em função da privatização. Como é que o senhor vê essa
ameaça?
Roberto Teixeira da Costa: E complementando à
pergunta do Celso,
Alfredo, dentro desse mesmo contexto. Quer dizer, um outro subproduto
negativo da privatização foi ter tirado uma série de direitos dos
acionistas minoritários. Quer dizer, o governo, para viabilizar a
privatização, ele acabou com o direito de retirada nos casos de
transferência de controle, na fusão de empresas, na cisão de empresas
etc. Quer dizer, não só você não pulverizou como você, hoje...,
um dos benefícios que se via da privatização era aumentar o elenco de
papéis disponíveis no mercado e conseqüentemente aumentar o elenco de
papéis disponíveis. Um aspecto que faltou você comentar, que está
dentro da pergunta do Markun, é o seguinte: a bolsa do Brasil tem tido
excessiva volatividade, que assusta um pouco o investidor, ele não
consegue alcançar isso. Então se imaginava que você, pulverizando um
número maior, tendo um número maior de empresas participantes, o nível
de volatividade do mercado seria menor. Quer dizer, você não teve, não,
[ao contrário], está tendo uma maior volatividade. Você tirou direito
das minorias e
você não pulverizou a propriedade e, agora, corre o risco de haver uma
concentração, porque as empresas que foram privatizadas pagaram por uma
percentagem pequena do capital, valores excessivos. E elas acham que o
esforço gerencial que estão fazendo não é compatível com o [...] que
elas têm dentro da empresa. Então elas querem fazer um processo às
avessas para aumentar a participação e, conseqüentemente, tirar essas
ações do mercado.
Alfredo Rizkallah: Vamos tentar responder a essas
indagações muito
pertinentes sem perder de vista, entretanto, um mérito do processo de
privatização, que eu me permito depois voltar ao assunto. Na questão
que o Celso colocou, em relação especificamente à Telesp, eu vejo com
extrema preocupação essa operação de troca das ações da Telesp. Uma
empresa brasileira, uma das maiores empresas de telefonia, senão a
maior empresa de telefonia fixa do Brasil, com um papel, que pelas suas
qualidades, pela visibilidade que deu ao público, está se transformando
hoje na possível sucessora da Telebrás, quer dizer, uma autêntica blue chip... E nós
estamos correndo o risco de perdermos esse papel se essa
operação de troca for bem sucedida. Existe uma compulsoriedade, existe
uma oferta.
Paulo Markun: Mas há o que fazer? Existe algum
mecanismo? Dizer:
"olha, legalmente não pode..."? Porque, pelo que eu imagino, não há
nada o que fazer.
Alfredo Rizkallah: Não compete à Bolsa a avaliação
dos aspectos
legais da operação, mas eu quero crer que as empresas que estão
envolvidas no processo, que todos os aspectos legais tenham sido feito
perfeitamente avaliados. O que nós estamos aqui discutindo, realmente,
é
que é um dano para o mercado se isso vier a acontecer.
Celso Pinto: Se der certo, então, vai esvaziar ainda
mais a Bolsa.
Sonia Racy: Agora, só vai dar certo se, na opção,
quando eles
fizerem a oferta pública, o público todo resolver vender realmente as
suas ações.
Alfredo Rizkallah: Trocar.
Sonia Racy: Trocar as suas ações. Se várias pessoas,
vários
investidores, não quiserem fazer essa troca, pode aí permanecer um
remanescente.
Paulo Markun: Deixa eu fazer uma pergunta de
ignorante aqui:
essas ações que é possível trocar são aquelas mesmas que as pessoas
praticamente nem sabiam que tinham? [Antes da privatização, o
consumidor que adquiria uma linha telefônica
junto à Telesp tornava-se automaticamente acionista da empresa]
Alfredo Rizkallah: Não, essas ações são ações
oriundas da antiga
Telebrás. Quando a Telebrás fez a cisão nasceram três empresas. Uma das
empresas foi a Telesp. Telesp Operadora, naquela ocasião. Depois se
constituiu a Telesp Participações.
Paulo Markun: Mas muitos telefones eram trocados
por ações, aquelas antigas...
Alfredo Rizkallah: Então, tem ações antigas, mas o
grande
percentual de ações hoje no mercado, Paulo, é realmente produto da
liquidez do mercado. Quer dizer, voltando à pergunta inicial, nós vemos
com preocupação, e eu acredito que não é uma operação interessante,
nada interessante para o mercado brasileiro. Pode ser interessante para
a empresa, não há dúvida, porque como estava dizendo o Roberto, se você
lembra que o P/L, o índice preço-lucro - que dá o retorno de
investimento da Telefonica de Espanha - está em torno de 38, e o índice
P/L da Telesp é 17, portanto a Telefonica, que havia comprado perto de
20% a 22% das ações ordinárias da Telesp a um preço médio de 77
dólares,
agora está fazendo uma oferta dos 75% restante das ações a um preço
médio de 23 dólares. Em termos de Telefonica...
Sonia Racy: Doutor Alfredo, o senhor poderia
popularizar a linguagem? P/L o telespectador não sabe o que é.
Alfredo Rizkallah: Por isso que eu [riso]
realmente... O P/L é o
índice que mede o retorno que o investidor tem ao fazer uma aplicação,
em quantos anos ele pode ter esse retorno. Quer dizer, se ele comprar
uma ação da Telefonica de Espanha, ele espera 35 anos, se comprar da
Telesp, 17. Portanto, o retorno da Telesp é bastante mais interessante.
Dessa forma, o que aconteceu com a Telefonica, e você mesma viu nesses
últimos 15 dias após a oferta pública feita, as ações da Telefonica
de Espanha valorizaram-se no mercado de Madri perto de 30%. Se você
imaginar, Celso... [sendo interrompido]
Celso Pinto: Foi um ótimo negócio para os acionistas
da Telefonica de Espanha.
Alfredo Rizkallah: Se você imaginar, Celso, só para
te dizer que o capital, o market capitalization,
desculpe, o valor de capital da empresa Telefonica no mercado
internacional é perto de noventa bilhões de dólares; e houve uma
valorização de 30%. Nós estamos falando em uma valorização de 27
bilhões de dólares. Essa operação de compra da Telesp brasileira, [de
telefônicas] do
Peru e da Argentina, representa um investimento de 22 bilhões de
dólares, portanto, que já foi amortizado. É uma operação realmente de
extrema competência feita pela Telefonica. Mas, volto a dizer, não é
uma operação que interessa ao mercado nacional.
[...]: Senhor presidente, eu gostaria de fazer
uma... [sendo interrompido]
Paulo Markun: Só um pouquinho, eu acho que ele não
respondeu à segunda parte da observação.
Roberto Teixeira da Costa: Nós comentávamos a
questão do direito
das minorias, não é? Porque os investidores minoritários, isso você
ouve no exterior com muita freqüência, ele não se sente protegido hoje,
porque ele acha [que é] um jogo feito para grandes investidores, e ele,
pequeno
investidor, nesse processo está muito marginalizado.
Alfredo Rizkallah: Não há dúvida que nós... Um dos
focos
principais da nossa atuação neste ano deve ser a reformulação da lei
das SAs, principalmente visando o resguardo dos
direitos das minorias. Quando nós estamos falando em minorias não
estamos falando nem preferencialistas, nem outros. Minorias, sejam elas
ordinárias ou preferenciais [refere-se à ações nominais ordinárias, com
direito ao voto nas assembléias da empresa; e ações preferenciais, que
priorizam uma preferência no caso de reembolso de capitais]. Até porque
dentro das minorias nós não temos hoje só o pequeno investidor
brasileiro, os grandes fundos internacionais que investem no Brasil,
eles investem em parcelas de minorias de nossos papéis, e esses fundos
de investimento estrangeiros estão extremamente preocupados, como você
disse, Roberto, com o tratamento que tem sido dado às minorias dentro
do mercado de ações brasileiro. Portanto, operações como essa, de troca
de papéis, não são operações positivas para a imagem do mercado
brasileiro.
Roberto Teixeira da Costa: O relatório recente da
[Global]
Financial Stability [em que o Fundo Monetário Internacional
analisa o crédito pessoal em 23 países emergentes], Paulo, dizia
claramente que ele, como analista do mercado internacional, se sentia
muito mais seguro em recomendar ações do México do que ações do mercado
brasileiro, porque ele achava que a legislação mexicana protege muito
mais o investidor do que a legislação brasileira.
Paulo Henrique Amorim: Doutor Rizkallah, vamos
supor que essa
operação da Telefonica dê certo e, portanto, haja este risco que o
senhor mencionou, que ela contribua para o esvaziamento da bolsa
brasileira. Agora, eu gostaria de saber, me colocando um pouco nos
sapatos do espectador brasileiro, que não pode, necessariamente, não
precisa ficar restrito a comprar ações... ou até através da internet,
que
é um processo mais sofisticado... mas um comprador de cota de fundo,
que
é como no fundo, no fundo, no fundo, sem trocadilho, os acionistas dos
Estados Unidos, a viúva do Kentucky [refere-se aos pequenos
investidores cuja poupança está em fundos de pensão] entra no mercado
de ações, o
que o senhor acha que precisa acontecer, além de preservar o direito
das minorias, o que precisa acontecer para essa bolsa dar certo?
Alfredo Rizkallah: Precisa realmente uma vontade
política para
que essa bolsa seja parte integrante do nosso processo de
desenvolvimento. E isto aqui por, não é incrível que pareça, por
felicidade geral de todos nós, está começando a acontecer, Paulo. Desde
março de 1999, quando tomou posse a nova diretoria do Banco Central
[cujo
presidente era Armínio Fraga Neto], sentiu-se realmente uma decisão
bastante positiva de encaminhar inúmeros estudos no sentido de
fortalecer o mercado de capitais para substituir o sistema bancário
tradicional, seja ele privado, seja ele oficial - BNDES [Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social], no caso - pelo mercado de
capitais. E nós tivemos agora, no dia 27 de janeiro, quando estávamos
em Brasília para a assinatura do protocolo de intenções que selou a
integração [das bolsas] Rio-São Paulo, nós tivemos a palavra do
presidente Fernando Henrique Cardoso falando durante 15 minutos
sobre a necessidade do mercado de capitais para financiar o
desenvolvimento brasileiro em bases estáveis e sustentadas. Portanto,
já começa a tomar corpo definitivamente uma vontade política para
fazê-lo. É claro que existem outros aspectos, sejam eles de natureza
legislativa, sejam eles de natureza a preservar da
vulnerabilidade a
economia brasileira. Não se imagina um mercado de capitais próspero se
você tem um país ainda apresentando algumas vulnerabilidades, seja para
o investidor nacional, seja para o investidor externo. Portanto, nós
precisamos nos empenhar em consertar.
José Paulo Kupfer: Como é que o senhor classificaria
o mercado
de capitais brasileiro hoje, antes dessa vontade política? Ao longo
desses trinta anos em que houve uma tentativa de impô-lo, tanto do lado
de quem pudesse demandar ir a ele e quem precisasse pegar recurso. Como
o senhor classificaria, uma classificação tipo desastre, deserto,
inexistência, seria boa?
Alfredo Rizkallah: Eu classificaria como
experiência,
aprendizado. Aprendemos trinta anos, levamos trinta anos aprendendo.
Nós fizemos nesses trinta anos, como você está dizendo, Kupfer, [foi]
criar
um mercado de ações em cima de incentivos. Foram propiciados incentivos
para os investidores, destacando uma parcela do seu imposto renda para
investir em ações, e foram dados incentivos também para empresas, para
pagar menos imposto de renda sobre dividendos aquelas que se tornassem
capital aberto.
José Paulo Kupfer: O resultado é que disso saiu uma
coisa, um
negócio, em que quem tem controle não quer ter sócios. E quem tem os
recursos, o próprio povo, não quer ser sócio, é isso?
Alfredo Rizkallah: Não, não é, nós temos que
atravessar essa fase.
José Paulo Kupfer: Porque... olha, eu vou lhe pedir
para fazer a
análise de alguns dados de uma pesquisa mais ou menos recente do
economista Carlos Antônio Roca, o senhor conhece bem, [que] tem
trabalhado
nesse aspecto. Olha só, doutor Rizkallah, quanto à liquidez, que é uma
coisa importante para o acionista, controlador, inclusive: nos 271
pregões de 1997 até 1998 foram analisadas 463 ações da lista de bolsa;
sessenta fizeram negócios em mais de 260 desses pregões, e metade,
metade, só foram negociadas, uma operaçãozinha própria, direta, o que
seja, em sessenta dias. Quer dizer, liquidez não tem. Está certo? De
outro lado, entre 1994 e 1998 foram feitas 41, e o ano passado teve
quase
nada, talvez este ano melhore um pouco, 41 emissões de ações primárias
em bolsa, 41 em quatro anos. Menos do que os ADRs [papéis que
representam a propriedade de ações de empresas brasileiras, emitidos e
negociados nos EUA], que são aquelas ações, ou quase-ações lançadas em
mercados externos, que foi 57. Ou seja, quem quer liquidez não tem, e
quem quer aplicar aqui não encontra. Que mercado é esse, doutor?
Alfried Ploger: Eu gostaria de aduzir a essa
pergunta do Kupfer
um pensamento, a Abrasca [Associação Brasileira de Companhias Abertas:
empresas que abriram o seu capital ao público investidor captando novos
acionistas] pediu exatamente ao mesmo Antônio Roca que fizesse um
estudo em todo esse mercado de capitais, e aí se detectou que,
em 1998,
só 7,8% do PIB [Produto Interno Bruto] - que é menos do que sessenta
milhões de dólares - foram aplicados no mercado privado, via emissões
de
ações, debêntures e comercial
papers [debêntures e commercial
papers
são títulos de emitidos por empresas com capital aberto a fim de captar
recursos para financiar as suas atividades. Os commercial papers
tem um
prazo mais curto de duração do que os debêntures]. Eu acho muito
louvável, presidente, que o senhor cite o governo como... defendendo a
tese de ajudar o mercado de capitais. Mas eu sou muito franco, eu estou
há três anos e meio à frente da Abrasca, e estou cansado de ouvir essas
promessas. E não vejo absolutamente nada acontecer, porque tem dois
problemas seríssimos que bloqueiam, que travam o nosso mercado de
capitais: são os juros estratosféricos. Esses, ao meu
ver, só se consegue baixar se nós promovermos finalmente o equilíbrio,
as
reformas tributária e previdenciária, [já] que o juro está alto porque
o
negócio concorre com a iniciativa privada na captação de recurso. E, o
segundo lugar, o custo Brasil. O fato de ainda termos hoje o monopólio
do Diário Oficial do Estado para publicação de eventos das Sociedades
Anônimas, que é obrigatório; [o fato de] que nós temos uma CPMF que
equivale a oito
vezes o custo de uma transação na bolsa de Nova Iorque; de termos as
taxas; de termos imposto de renda sobre ganhos de capital; IOF [Imposto
sobre Operações Financeiras]; anuidades nas bolsas; temos anuidade na
CVM [Comissão de Valores Moiliários]; e assim afora. Eu acho que estes
são os problemas principais e
enquanto isso não for solucionado não vejo nenhuma chance de nós termos
um mercado de capitais pujante. É bem o que o Kupfer disse, nós não
temos lançamentos de ações primárias. E esse é o grande problema,
porque o que nós temos na verdade é o giro de ações que foram lançadas
há não sei quantos anos.
Alfredo Rizkallah: É importante que se mantenha uma
bolsa líquida. Portanto, o giro das ações é condição sine qua
non
[indispensável] para que a gente possa lançar novas empresas. Nós temos
problemas do lado das empresas, Kupfer, e do lado dos investidores. Nós
não temos ainda uma formação sólida de poupança nacional, nós temos uma
taxa de poupança bruta nacional em torno de 18%. Porque a poupança do
setor privado é de 23% a 25% e nós temos uma despoupança do setor
público. Portanto, nós não temos ainda o combustível para realmente
propiciar liquidez para esse mercado e, portanto, para que todas essas
ações tivessem a liquidez que elas devem ter, porque são muito boas
empresas. Do lado das empresas, realmente nós não temos condições para
estimulá-las a se tornarem sociedades anônimas de capital aberto. Nós
temos problemas de legislação tributária, de legislação trabalhista, de
custo de capital e de burocracia. Realmente com uma legislação
tributária como essa que nós temos, realmente, é muito difícil você
convencer uma empresa a se tornar uma sociedade anônima de capital
aberto. Porque, ela sendo de capital aberto, ela fica uma empresa
extremamente transparente para efeito...
José Paulo Kupfer: Deveria ficar.
Alfredo Rizkallah: Ela fica realmente. Porque nas
reuniões de [...], por exemplo, são discutidos todos os aspectos
internos da
empresa, desde suas técnicas de produção até seu gerenciamento de
recursos. Portanto, a empresa de capital aberto, ela tem uma
transparência muito maior que a de capital fechado, aí ela já
tem uma concorrência que eu diria desleal. Quer dizer, os concorrentes
dela, de capital fechado, conhecem dados dela, de capital aberto, muito
mais do que ela conhece o inverso.
Roberto Teixeira da Costa: Nós temos que esgotar o
tempo, o
Alfried Ploger não vai gostar do que eu vou dizer, mas o fato de você
ter ações preferenciais, elas não estimulam a formação do mecanismo de
liquidez. Por quê? Na medida em que o acionista controlador, ele não
tem interesse em criar um referencial para o valor das preferenciais,
ele não se preocupa com a liquidez. Se você não tivesse preferenciais
no mercado, só ações votantes, a ameaça de um take over [compra]
sempre faria
com que estas ações tivessem uma liquidez muito maior. Porque o sujeito
não ia abandonar suas ações no mercado, a liquidez seria muito maior
porque sempre haveria grupos querendo comprar aquela ação no ameaço de,
amanhã, poder assumir o controle da companhia.
Sonia Racy: Ou grupos querendo fechar seu
capital.
Alfredo Rizkallah: Não há dúvida que nós temos um
sistema de
divisão de ações ordinárias e preferenciais, Roberto, oriundos da
própria origem das nossas empresas. Praticamente todas as nossas
empresas vinham de controles familiares, que naturalmente têm... vinham
de empreendimentos familiares, que naturalmente têm o controle como uma
idéia realmente bastante enraizada. Então se criaram as ações
preferenciais, que de resto existem no mundo inteiro, e que tomaram
aqui no Brasil uma dimensão muito maior do que em outros lugares. Não
há dúvida de que os mercados de ações mais prósperos do mundo são os
mercados onde prevalecem as ações ordinárias. Isso é um fato
inconteste, quer dizer, isso está dito e, como você bem disse, existe
um problema cultural. O empresário brasileiro realmente tem um apego
bastante grande ao controle, quando ele poderia ter um interesse muito
grande no valor da sua empresa. Na hora que as ações ordinárias forem
as mais negociadas, realmente, ele poderá ter uma noção exata de quanto
a
sua empresa vale, porque aí ele vai poder verificar, como você disse,
se existem grupos decididos ou dispostos a assumir o controle. Então é
uma questão cultural trocar o desejo, o gosto pelo controle, com o
conhecimento de quanto vale. Eu acho que é um processo, Roberto.
[...]: Desde que não mande.
Paulo Markun: Alfredo, eu tenho uma pergunta aqui,
eu acho que
daria para começar o bloco, de telespectador, mas antes eu queria
juntar quatro perguntas de telespectador sobre uma mesma questão que o
senhor mencionou, mas creio que ficou faltando aí um pedacinho: que é a
questão das ações, dessa troca das ações da Telesp pela Telefonica de
Espanha. Então a Adriana, do Itaim, aqui de São Paulo, pergunta se o
senhor acha que o acionista minoritário da Telesp vai ser prejudicado,
o que o senhor recomenda para quem tem ações da Telesp por conta dos
planos de expansão, deve vendê-las ou deve trocá-las? Daí a Maria Luisa
Silva, de Petrópolis, do Rio de Janeiro, pergunta: "Quem tem ações da
Telesp e Telebrás, como pode receber hoje? Qual seria o procedimento?"
José Roberto Dias, de Osasco: "O que aconteceu com o preço de ações da
Telesp, que estava cotado em 180 reais, as PNs [ações preferenciais
nominativas], e hoje valem 54 reais?" E, finalmente, Sérgio Augusto, de
Lins, São Paulo: "Hoje o pequeno investidor que tem ações da Telesp,
compensa ficar com ela ou é melhor negociá-la?" O senhor virou aqui uma
espécie de comentarista. [Riso]
Alfredo Rizkallah: Consultor. [Riso]
Paulo Markun: Mas eu tenho... essas perguntas estão
preocupando as pessoas.
Alfredo Rizkallah: Eu acredito que não compete ao
presidente da
Bolsa realmente fazer uma indicação sobre compra, venda ou mesmo troca
de ações. Eu fiz questão de dizer que, realmente, em termos de mercado
brasileiro, para o nosso mercado, seria preferível que as ações da
Telesp continuassem sendo aqui negociadas. Até porque o investidor, ou
o analista brasileiro, sabe muito bem o que é a Telesp, qual é a sua
área de atuação, quais são suas possibilidades de expansão, quais são
os seus resultados até o momento, quais são os seus concorrentes.
Portanto, é muito mais fácil você lidar com uma empresa como essa do
que lidar com uma empresa, naturalmente de diâmetro internacional, mas
que você passaria a ter que se familiarizar realmente com os dados
referentes. Quer dizer, essa é apenas uma opinião em relação ao
mercado, eu não poderia dizer economicamente, sob o ponto de vista
econômico, se será mais vantajoso para o investidor trocar a ação da
Telesp por uma ação da Telefonica.
Paulo Markun: Vamos tentar uma recomendação mais
genérica, que
não vai, digamos assim, entrar, imagino, na questão ética. Uma pessoa
que tenha ações - porque muita gente que teve os planos de expansão,
tem
estas ações-, há alguns anos atrás houve aí um processo de
esclarecimento próximo às privatizações e muita gente acabou vendendo
essas ações ou trocando. Essas pessoas têm a quem recorrer no sentido
de saber o que fazer numa hora dessas?
Roberto Teixeira da Costa: Os corretores estão aí
para isso.
Alfredo Rizkallah: Tanto a Bolsa como principalmente
as
sociedades corretoras estão exatamente encarregadas de fazê-lo. E hoje
todas essas pessoas podem fazê-lo via fax, via Internet, via e-mail,
todas as corretoras, hoje, praticamente, estão dentro do sistema de
Internet. Nós estaremos agora, em março, próximo mês de março, com mais
de cinqüenta corretoras já na Internet. Qualquer pessoa que quiser
acessar o site da Bolsa, que é www.bovespa.com.br, poderá saber quais
são as corretoras que prestam essas informações. Hoje, todas as
corretoras têm páginas dedicadas exclusivamente a esclarecimento e
instrução dos investidores, é a forma mais correta e prática das
pessoas poderem... [sendo interrompido]
Roberto Teixeira da Costa: Eu, como ex-presidente da
CVM
[Comissão de Valores Mobiliários] e, portanto, sem o chapéu de
regulador, o conselho que eu daria aos demandantes das perguntas aqui é
o seguinte: você está trocando uma ação negociada no mercado local por
uma ação de um conglomerado que tem participação em diferentes países.
Quer dizer, aqui você pode avaliar o risco da Telesp brasileira, e
amanhã você tem que avaliar o risco da Telefonica espanhola. Bom, além
disso, você tem o risco cambial. Quer dizer, hoje, se as previsões de
alguns operadores se confirmarem, daqui até o final do ano, por
exemplo, [se] houver uma valorização do real em relação ao dólar...
está
certo? Quer dizer, se você trocar hoje tendo como referência 1,77 e, no
final do ano tiver 1,70, você perdeu dinheiro. No entanto, se a ação se
valorizar aqui e se valorizar em Madri, você ganhou dinheiro. Quer
dizer, então tem uma série de fatores que vão ter que ser ponderados
para uma decisão. O Alfredo referiu-se ao P/L. O que a Telefonica fez?
A Telefonica deu um prêmio em relação ao preço do mercado. Então os
acionistas podem achar que esse prêmio é insuficiente. Em casos
recentes de ofertas públicas de ação os acionistas se rebelaram quanto
à oferta pública e exigiram que o preço fosse aumentado. Quer dizer,
então tem uma série de fatores aí. Não dá para ter uma resposta.
Paulo Henrique Amorim: Doutor Rizkallah,
aproveitando a deixa do
Roberto, ele falou da CVM, eu gostaria de perguntar ao senhor o
seguinte: depois de um início brilhante, promissor, sob a presidência
do Dr. Roberto Teixeira da Costa, nós assistimos alguns episódios no
mínimo controversos da história da CVM. Para ficarmos em períodos mais
recentes, tivemos, por exemplo, o caso de um presidente da CVM que era
advogado de um especulador que quase provocou a quebra da Bolsa do Rio
de Janeiro [Refere-se provavelmente a Luiz Leonardo Cantidiano, que
advogou pelo especulador Naji Nahas e foi presidente da CVM em 2002].
Agora o episódio da Telesp, da CPFL [Companhia Paulista de
Força e Luz], a CVM parecia o Ronaldinho na decisão da Copa da Franca
[Refere-se ao craque da seleção brasileira que, na Copa do Mundo, em
1998, passou mal antes do jogo final com a França]: ia, não ia,
passava, não passava,
concordava, discordava, e a gente ficava sem saber se aquilo era uma
operação legal, se não era uma operação ilegal.
Celso Pinto: E deixou a Telefonica fazer o gol,
vamos esclarecer.
Paulo Henrique Amorim: E acabou achando que a
operação é legal.
Eu perguntaria ao senhor qual é o papel que o senhor acha num futuro da
Bolsa, num ambiente mais propício, com a entrada de capital
estrangeiro. E a viúva do Brás e do Catulé do Rocha [refere-se aos
cidadãos comuns, de pouco poder aquisitivo], podendo comprar fundo de
ações, e poder investir
na bolsa brasileira. Qual é o papel da CVM? O senhor gostaria que a CVM
pudesse ser, por exemplo, uma agência reguladora, como nós temos a
Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações], a Aneel [Agência
Nacional de Energia Elétrica]? O senhor gostaria que a CVM fosse mais
forte ou mais fraca?
Alfredo Rizkallah: Eu gostaria que a CVM fosse tão
forte quanto
o mercado que ela pudesse ajudar a construir. A CVM tem duas funções.
A função mais importante dela é regular o mercado; a outra função, que
foi brilhantemente iniciada na gestão do Roberto Teixeira da Costa, seu
primeiro presidente, foi de desenvolver o mercado. Com relação a esses
episódios que você mencionou, é importante dizer que realmente nós
tivemos alguns episódios na história da CVM, como de resto nós tivemos
episódios na área do Ministério da Saúde, do Ministério da Integração
Regional...
Paulo Henrique Amorim: Não vai acabar sua lista,
doutor Rizkallah.
[Risos]
Alfredo Rizkallah: Mas eu posso lhe dizer que, mais
recentemente,
nós tivemos a própria CVM editando três resoluções nesses últimos
noventa dias que vêm de encontro à defesa do interesse dos acionistas
minoritários, principalmente no que diz respeito a essas operações que
implicam em fusões, em trocas de ações. Porque tudo isso, Paulo, são
fatos novos para nós. A própria privatização, que foi de uma
arquitetura extraordinária na sua concepção, previa que as ações
oriundas, as empresas oriundas da privatização continuassem com capital
aberto. E isso, elas, teoricamente, devem continuar.
Paulo Henrique Amorim: Vai ficar aberto entre aspas.
Alfredo Rizkallah: Vai ficar aberto entre aspas. Mas
ela já previa... ela não podia prever tudo. A privatização da
Telefonica...
Paulo Henrique Amorim: Podia prever melhor. Não
podia prever tudo porque ninguém pode prever tudo, mas podia prever
melhor.
[Risos]
Roberto Teixeira da Costa: O assunto mais complicado
é a
regulação dos mercados globalizados. A discussão em Davos [cidade suíça
onde se realiza anualmente o Fórum Econômico Mundial] que eu participei
agora... em que medida realmente os órgãos reguladores vão ter os
poderes
nesse mercado totalmente eletronificado e, com a Internet, qual vai ser
o papel das comissões de valores. Esse é o grande...
Sonia Racy: Doutor Alfredo, eu quero fazer uma
pergunta
justamente na esteira da pergunta aqui dos dois. A CVM, hoje em dia,
ela
é acionada só quando há um questionamento. Vamos dizer, se há uma
operação e alguém questiona essa operação é que a CVM entra em ação.
Paulo Henrique Amorim: Não tem liderança no mercado,
não tem liderança!
[Falam simultaneamente]
Sonia Racy: Caso contrário... [falando
simultaneamente com Paulo
Henrique Amorim] Espera um pouquinho [pedindo para poder falar]. ...ela
não se mexe.
Paulo Henrique Amorim: Você já entrevistou o
presidente da CVM? Qual é o nome do presidente da CVM, Sonia?
Sonia Racy: Eu, por acaso, sei.
Paulo Henrique Amorim: Bom, você sabe tudo.
[Risos]
Sonia Racy: José Luiz Osório. Bom, presidente, o
seguinte: essa
coisa da CVM, dela ser um órgão reativo e não pró-ativo. Ela não sai
investigando irregularidades ou movimentações estranhas sem que haja
uma reclamação formal, alguma coisa. Isso não é uma trava dentro da
CVM, dentro da operação, dentro do fortalecimento da CVM? Ela não
poderia ser mais pró-ativa do que mais reativa?
Alfredo Rizkallah: Eu acredito que ela sofre o
mesmo problema que toda autarquia sofre. Quer dizer...
Sonia Racy: Mas não por ser autarquia. Isso é uma
regra. Você
liga para o presidente da CVM, você fala assim: você viu o tal negócio,
o que você acha? “Ah, não posso opinar. Não posso opinar porque não
veio nenhuma reclamação aqui na CVM”.
Alfredo Rizkallah: As bolsas também têm um papel de
auto-regulação. E aí é importante lembrar que o papel de auto-regulação
das
bolsas nos seus três estágios, em relação às corretoras, o papel de
auto-regulação das bolsas é total.
Roberto Teixeira da Costa: Fundamental.
Alfredo Rizkallah: Quer dizer, a Bolsa tem plenos
poderes para
suspender corretoras, seus administradores. Com relação à empresas, o
poder de regulação da Bolsa já é mais limitado. A Bolsa pode determinar
que a empresa forneça explicações, a Bolsa pode suspender a negociação
das ações dessa empresa quando há algum fato que esteja alterando o
rumo dos negócios, e vai até aí. Com relação aos investidores, o poder
de regulação das bolsas é menor ainda. Quer dizer, para aqueles que
estão atuando no mercado, ela pode determinar chamamento de imagens,
pode limitar posições, ou pode verificar se eles estão se organizando
sob a forma de conjunto de pessoas, tentando manipular preços ou criar
condições artificiais de demanda. E aí formar um processo e enviar a
CVM, que é o órgão que realmente tem autoridade sobre o assunto.
Voltando à sua pergunta, Sônia, realmente eu acho que a atividade da
CVM vem crescendo nos últimos tempos, eu acho que a atividade pró-ativa
da CVM vem crescendo.
Sonia Racy: O governo dá recursos suficientes para
a CVM para
ela poder ser um órgão um pouco mais forte? Existe recurso, uma
diretoria
técnica?
Paulo Henrique Amorim: A lei é muito boa. Precisa é
usar a lei.
Alfried Ploger: Eu gostaria de fazer uma
intervenção, Paulo, me
parece importante. Eu não estou aqui para defender a CVM, mas eu acho
que nós temos também que sermos, nesse ponto, muito objetivos. Quem
mais
tem solapado a própria CVM foi o governo, nós sabemos de situações no
passado, extremamente críticas, que ocorreram no mercado com empresas
estatais, que é onde a CVM foi tolhida de tomar as medidas necessárias.
Isso não ocorreu uma vez, nem duas, nem três. Sem falar dos incentivos
fiscais no Norte e no Nordeste. Então, o outro ponto são os próprios
recursos que não são colocados à disposição. De um lado, as empresas da
iniciativa privada, principalmente, são obrigadas a pagar inúmeras... à
CVM. Mas sabemos que não chegam às mãos da própria CVM para montar a
sua
estrutura, para se equiparem. Então, a CVM, nesse ponto, eu acho que
faz
o que é possível. Mas também não podemos exigir dela dentro da
estrutura atual mais do que ela pode dar. O que falta, ao meu ver, é o
apoio decisivo de Brasília.
Sonia Racy: O doutor Alfried respondeu à minha
pergunta. O
doutor Alfried [riso], que também se chama Alfredo, respondeu à minha
pergunta.
O senhor não respondeu. O senhor acha que o governo dá a devida
importância à CVM?
Alfredo Rizkallah: Eu acredito que o governo está
reconhecendo,
hoje, a importância do mercado de capitais como um instrumento
fundamental para o Brasil poder crescer e, portanto, a CVM é um órgão
indispensável para ele poder atuar. Eu acredito que a CVM...
Sonia Racy: Mas ele dá ou não dá a importância
devida?
Alfredo Rizkallah: Dá.
Sonia Racy: Dá recursos suficientes para ela poder
atuar?
Alfredo Rizkallah: Ela tem um quadro hoje de
profissionais extremamente competentes, a CVM tem mais de setecentos
funcionários.
Paulo Henrique Amorim: Isso é um mau sinal, doutor.
[Risos]
Paulo Henrique Amorim: O senhor agora me deixou
muito preocupado. Setecentos funcionários?
Alfredo Rizkallah: Pela dimensão do mercado, pelo
número de
instituições que existem hoje no Brasil inteiro, a CVM precisa estar
presente em todos os lugares e ela precisa realmente de uma estrutura
para isso. Ela tem recursos, ela está, progressivamente, eu
acredito, construindo mais em relação àquilo que é muito mais
visto nela, que é a
atividade fiscalizatória. Mas eu acho que na atividade de
desenvolvimento do mercado ela tem se dedicado, principalmente agora,
pelos efeitos que nós tivemos aprendendo após a privatização. A
privatização brasileira é uma das privatizações de maior de sucesso no
mundo, realmente nós não podíamos ser suficientemente sábios para
prever todos os desdobramentos da privatização. Mas nós não podemos
esquecer que a privatização criou, para o consumidor brasileiro, para o
povo brasileiro, uma série de serviços até então indisponíveis ou
disponíveis a preços exorbitantes. A privatização trouxe para o mercado
brasileiro o instituto da concorrência de serviços, a privatização
trouxe opções para o consumidor brasileiro. A privatização criou a
possibilidade de nós termos um volume muito grande de investimentos na
área de telefonia, na área de distribuição de energia, na área de
estradas. Claro, com os defeitos de pedágio, com os defeitos de
apagões etc.
Sonia Racy: O governo então não errou na
privatização brasileira? O senhor disse no começo que o governo errou.
Alfredo Rizkallah: Errou na estratégia de não
incluir o povo, a pulverização das ações.
Sonia Racy: E os minoritários. Ia proteger aí os
minoritários também.
Alfredo Rizkallah: Os minoritários, que foram de uma
certa forma
protegidos, porque ela determinou que as empresas continuassem abertas.
Naturalmente, agora a CVM está procedendo à avaliação dos problemas
resultantes das empresas que tentam fechamentos brancos [a
transformação, na prática, em empresas de capital fechado, embora
legalmente continuem como de capital aberto].
Roberto Teixeira da Costa: Faltou mencionar que a
grande
dificuldade. Desde o início, quando eu fui o primeiro presidente da
CVM,
foi a relação com o Banco Central. Nunca foi uma situação totalmente
clara. Houve sempre uma ponta de ciúme do Banco Central com relação à
CVM. Agora, eu acho que com o presidente Armínio Fraga, essa situação
está resolvida.
Paulo Henrique Amorim: Mas o presidente da CVM não
tem mandato?
Roberto Teixeira da Costa: Teoricamente tem, mas
ele é escolhido pelo ministro da Fazenda.
Paulo Henrique Amorim: Você não exerceu o mandato?
Você é demissível?
Roberto Teixeira da Costa: Eu acho que poder você
conquista, você não pede.
Paulo Henrique Amorim: Evidente. Tem mandato.
Então...
Roberto Teixeira da Costa: Pois é, você depende do
ministro da
Fazenda, e o Banco Central sempre teve um poder enorme nesse país e
continua tendo. Quer dizer, eu acho que o Armínio hoje reconhece o
papel da CVM. Ele tem dado muito poder, as conversas privadas que você
tem com ele... ele entende o papel do mercado. E eu acho que nós temos,
à
frente do Banco Central, um presidente que realmente sabe que, sem o
mercado de capitais, este país não vai crescer. Quer dizer, então eu
estou muito mais confiante, eu acho que o Dr. José Luiz Osório é um
homem com toda a preparação para o exercício do cargo. Eu acho que na
média o [Francisco da] Costa e Silva [presidente da CVM no período de
1995 a 1999] fez um bom trabalho à frente da CVM. Eu não subscrevo as
críticas que foram feitas a ele. Primeiro que ele passou bastante tempo
no cargo e deu consistência ao cargo, ele não usou o cargo para
aparecer e sair. De modo que eu acho...
Alfredo Rizkallah: Eu acho que nós estamos numa
nova era. Você
mesmo citou, quer dizer, existe hoje pela primeira vez... por causa da
diretoria do Banco Central e da disposição da CVM, de um grupo de
trabalho conjunto, Banco Central, CVM, Receita Federal, analisando
exatamente as formas de implementar definitivamente o mercado de
capitais no Brasil, para poder atender àquela pergunta do Kupfer, para
atender o investidor e a empresa. Quer dizer, você que muitas vezes viu
às vezes zonas cinzentas de atuação entre Banco Central e CVM, pela
primeira vez nós estamos vendo, através dessa Comissão Permanente, uma
integração muito produtiva entre CVM, Banco Central e Receita Federal.
José Paulo Kupfer: Eu queria lhe fazer uma
pergunta, pode?
Paulo Markun: Só um pouquinho, eu queria passar a
bola para
frente. Dr. Alfredo, eu acho que nós podíamos discutir aqui o resto da
noite a CVM e as peculiaridades específicas do mercado, e isso muito
poucas pessoas compreendem, infelizmente, embora seja um tema
importante. Danilo Bruzadim, de Indaiatuba, aqui de São Paulo; e Marcel
Figueiredo, de Indaiatuba também, perguntam o seguinte, são perguntas
bastante similares: quais as possibilidades de se formar um grande
centro no âmbito do Mercosul e da América Latina? A Bovespa tem
conversado com outras bolsas latino-americanas? E a outra pergunta é o
seguinte: o que está acontecendo com as bolsas no mundo, já que as
bolsas européias, por exemplo, tentam formas de competir com as bolsas
americanas? E como é que evolui esse sistema e onde é que a bolsa
brasileira, a Bolsa do Brasil se inseriria? E o Marcelo Magno, aqui de
São Paulo, pergunta: "Qual foi a vantagem da Bovespa em se fundir com o
Rio de Janeiro, já que a Bovespa tinha 95% do mercado nacional"?
Alfredo Rizkallah: Muito bem, para começar a
responder eu quero
remontar aos últimos trinta [anos]. Nesses últimos trinta anos, Bolsa
de São
Paulo e Bolsa do Rio exerciam uma concorrência muito grande no sentido
de criar os melhores serviços possíveis para os seus investidores e no
sentido também de criar o maior volume possível de negócios para si.
Nós atravessamos trinta anos nessa concorrência, só que nesses trinta
anos o mundo mudou. Hoje, o que está realmente se verificando em todos
os lugares do mundo é a formação de grandes centros de liquidez. Só os
grandes centros de liquidez vão poder sobreviver a essa nova era da
economia. Então, era absolutamente indispensável para o Brasil que nós,
dentro do nosso país, não tivéssemos nove bolsas operando, era
absolutamente indispensável que nós tivéssemos um grande centro de
liquidez, e nós conseguimos depois de árduos esforços, depois de um
exercício de diálogo, de experiências trocadas, de muita maturidade, de
muita concessão, fazer esta integração das duas bolsas. Não houve uma
fusão. O Brasil passou a ter, a partir dessa assinatura de protocolo,
duas grandes bolsas: uma bolsa de títulos públicos, administrada no
Rio, e uma bolsa de títulos privados de ações, administrada em São
Paulo. O grande mérito dessa integração é que nós fizemos com que todos
os corretores de São Paulo sejam sócios da Bolsa do Rio e,
inversamente, todos os corretores do Rio sejam sócios da Bolsa de São
Paulo. Quer dizer, nós transformamos, Markun, concorrentes em sócios. E
nós lançamos agora a semente para o grande pólo de liquidez do
Mercosul. Nós precisamos realmente integrar São Paulo, ou seja, Brasil,
Buenos Aires, Santiago, Lima. Nós temos que criar massa crítica, porque
isso é o que está ocorrendo tanto nos Estados Unidos como na Europa.
Nos Estados Unidos nós já temos dois gigantes de ações, um que é a
Bolsa de Nova Iorque, e outro é a Nasdaq, que se associou à Amex
[American Stock Exchange]. Então são dois grandes gigantes competindo.
Na
Europa, nós temos a formação de uma grande bolsa pan-européia, também
para constituir um grande centro de liquidez, exatamente para competir
com o centro americano. A América do Sul, o Brasil, não pode ficar de
fora. Claro que nós não temos a pretensão de fazer aqui na América do
Sul um centro de liquidez que tenha as dimensões de um centro
americano, mas não há dúvida alguma que se nós aparecermos para
negociar com os americanos ou com os europeus como um bloco unido de
quatro, cinco países, ou toda a América do Sul. Nós vamos ter condições
para o nosso mercado de ações brasileiras muito superiores a que nós
estaríamos se aparecêssemos fragmentados. O outro grande subproduto,
Markun, que eu quero aproveitar a sua pergunta, é o seguinte: na medida
em que nós tínhamos duas bolsas importantes no Brasil, São Paulo e Rio,
e o mercado internacional está ávido por papéis e por áreas de atuação,
nós tínhamos a possibilidade de alguma grande bolsa estrangeira vir a
se associar a uma dessas grandes bolsas e, então, fracionando o mercado
brasileiro, isso seria a destruição total do mercado brasileiro. A
partir de agora, nós temos um único mercado de ações no Brasil. Mais
importante, nós temos uma única central de liquidação, única central
para guarda, custódia dos títulos. Nós ganhamos muito mais eficiência,
ganhamos confiabilidade e evitamos que o mercado brasileiro de ações
tivesse um destino de satélite. O Brasil tem dimensão suficiente para
ser, eu digo, um planeta no sistema solar do mercado de capitais de
capitais, ele não precisava ser um satélite. Essa é a grande vantagem.
Roberto Teixeira da Costa: Em outras palavras:
efeito Mercosul. É importante fortalecer o Mercosul para entrar na Alca
em função de negociação.
Alfredo Rizkallah: É ganharmos curvatura, Roberto,
está perfeito.
Roberto Teixeira da Costa: É o mesmo raciocínio.
Paulo Markun: A Internet é o tema de perguntas de
diversos
telespectadores, e eu vou citar as perguntas tentando juntar tudo numa
bola só. Jorge Ricardo da Silva, economista aqui de São Paulo, pergunta
até que ponto, ou melhor, qual a opinião do senhor com relação à
valorização exuberante de ações de empresas ligadas a Internet,
comércio eletrônico, no mercado americano, e até que ponto essa euforia
pode alimentar uma bolha especulativa no mercado de capitais
internacional? Gustavo Elishirmen pergunta qual a sua previsão para o
mercado via Internet, onde atualmente existem mais de 15 corretoras
online. Quem sobreviverá? Alexandre Nunes, do Rio de Janeiro, pergunta
se as empresas brasileiras de Internet estão pensando somente em lançar
as suas ações na bolsa americana porque é mais negócio lá do que aqui,
e como a Bovespa pensa em atrair estes novos empresários da Internet
evitando que fujam para as bolsas americanas. "Que tipo de futuro o
comércio de ações terá na internet?", pergunta Kleber Souza, da Saúde,
aqui de São Paulo, administrador de empresas. E finalmente, Marco
Silva, aqui de São Paulo - eu até pediria aos telespectadores que
mandam
perguntas pela Internet, que digam de onde é, porque como vem um
e-mail, a gente acaba não sabendo, o Marco Silva, por exemplo, tem
apenas o e-mail dele-, diz o seguinte: ele tem muita vontade de
realizar
negociações de ações através da Internet, mas quer saber quais são as
garantias que o investidor tem. E a mesma pergunta, mais ou menos, faz
Eliana Maria Garisto, aqui de São Paulo, que quer saber os
procedimentos para o investidor aplicar via Internet.
Alfredo Rizkallah: Temos um programa aí para falar
das suas perguntas.
Paulo Markun: Pois é.
Alfredo Rizkallah: A primeira pergunta me chamou
atenção, é sobre a...
Paulo Markun: Bolha especulativa.
Alfredo Rizkallah: A bolha especulativa, em relação
não no
mercado brasileiro, mas principalmente no mercado internacional. Se
você pega hoje o valor de mercado de uma Aol [provedor de internet],
por exemplo, ela é de perto de 130 bilhões de dólares, quando o valor
de mercado de todas as empresas brasileiras é de 220 bilhões de
dólares. Portanto, uma empresa americana dessas dedicadas a esse ramo
de atividades tem mais do que metade do tamanho do mercado brasileiro.
É porque nós, na realidade, estamos entrando numa nova era, nós não
sabemos exatamente o que vai acontecer. Quando a máquina a vapor foi
descoberta, quer dizer, a autorização dessa máquina a vapor para
movimentar navios veio a ocorrer anos mais tarde... Quando a Revolução
Industrial ocorreu, quer dizer, levaram-se muitos anos até que ela
atingisse a linha de montagem da Ford. A internet é a inauguração de
uma nova era.
Paulo Markun: A Corrida do Ouro também foi, o oeste
americano.
Alfredo Rizkallah: Sim, mas é tudo no seu tempo e o
prazo que
levava... Só que agora as coisas ocorrem de uma maneira muito mais
rápida. Talvez os instrumentos que nós temos hoje para medir o
comportamento das empresas e das ações não sejam mais adequados hoje
para medir os fatos que estão ocorrendo através da Internet. Nós
estamos na era do conhecimento. Quer dizer, antigamente você, para
montar uma empresa, precisava de terrenos, equipamentos, operários,
matéria-prima etc. Hoje você pode montar uma empresa com uma sala com
um, ou dois, melhor até, com três cabeças, você é capaz de montar uma
empresa de alguns milhões de dólares. Tudo isso é absolutamente novo.
Nós estamos substituindo massa, nós estamos substituindo materiais por
conhecimento. Hoje em dia, aquilo que vai ter... nós estamos talvez
criando, saindo de uma era, devagar, é claro, saindo do capitalismo da
propriedade, dos meios de produção, para o capitalismo do conhecimento.
Daí porque nós não sabemos explicar exatamente, poderemos não saber
explicar exatamente o que está ocorrendo com a valorização dessas
ações. No que diz respeito à utilização da Internet como instrumento
para acessar o mercado, a Bolsa de São Paulo fez um sistema de
negociação e Internet único no mundo, porque ele é o sistema central
que conecta todas as corretoras a um mesmo sistema de ligação com o
pregão eletrônico. Quer dizer, o objetivo principal da Bolsa foi
propiciar a inserção nesse mercado do investidor individual. Através da
Internet o investidor individual poderá acessar o mercado em idênticas
condições do grande investidor institucional. O investidor individual,
através da janela da Internet, das páginas que lhe são oferecidas pelas
sociedades corretoras habilitadas, poderá ter acesso, no mesmo momento
que um grande investidor tem, ao mesmo preço, e especialmente, a
condições de custo extremamente baixas. Portanto a Internet é um
instrumento destinado exclusivamente a investidores individuais, até
porque nós temos limites de investimento em Internet, cinquenta mil
[...] por operação.
Roberto Teixeira da Costa: Doutor Alfredo, o papel
do corretor nisso, qual é?
Alfredo Rizkallah: O papel do corretor na Internet é
extremamente importante. Primeiro, que todas essas operações se
realizam via a sociedade de corretores. Existe um filtro pelo qual
passa a mensagem do investidor para o pregão eletrônico. E esse filtro
está dentro da corretora. Esse filtro, por exemplo, diz que se esse
investidor está vendendo ações que ele tem lá, custodiadas. Ele diz se
ele está comprando ações e ele já tem dinheiro em conta para pagá-las.
Por outro lado, o corretor disponibiliza para o investidor as páginas
do
seu site. Nessas páginas, o investidor tem toda a gama de informações
que ele teria em mais de meia hora de conversação com o seu corretor.
[...]: Eu acho importante você salientar isso...
Alfredo Rizkallah: Ele tem todo o noticiário do
dia, todas as
informações sobre as boas opções de investimento, toda a análise
gráfica ou fundamentalista de todas as companhias, informações sobre
mercados internacionais. E ele tem também noticiário de natureza
política e econômica. Tudo isso está disponibilizado para o investidor
que for cadastrado numa sociedade corretora e ganhar uma senha para
poder operar. Além de operar, ele tem todo um instrumental que ele não
teria condição de ter se ele tivesse conversando pessoalmente ou por
telefone com o corretor.
Paulo Markun: E como atrair ou como impedir que os
investidores,
as empresas brasileiras de base tecnológica que estão indo, ou se
dispondo a ir para a bolsa americana, fiquem aqui?
Alfredo Rizkallah: Não há dúvida de que o mercado
americano
apreendeu muito rapidamente qual é o grande potencial dessas empresas
de alta base tecnológica. Portanto ele é mais sedento, ele cria
melhores condições de disponibilização de recursos para essas empresas.
Mas é óbvio também que o mercado brasileiro está se organizando. Já
existe hoje no mercado brasileiro, no mínimo, dez fundos de
investimento em empresas de tecnologia. Hoje existe, no mercado
brasileiro, no mínimo, um bilhão e trezentos milhões de reais
disponível para empresa de tecnologia. Ou seja, nós passamos a
valorizar idéias. Quer dizer, até um ano atrás, se você chegasse a um
banco com uma idéia, ele ia perguntar para você qual é a garantia que
você poderia lhe dar, se você tinha algum imóvel, se você tinha algum
telefone para lhe dar em garantia. Hoje existem fundos de investimento
de empresas de tecnologia que investem em idéias.
José Paulo Kupfer: Doutor Alfredo, eu também queria
falar sobre
o futuro, mas mais com um pé no chão. Talvez um assunto menos charmoso
do que as ações de Internet e tudo mais. Nós estamos aqui há quase uma
hora e meia falando de bolsa de valores, mas o único valor que a gente
falou aqui foi ação. Tem outros valores que correm no mundo e que têm
grandes mercados, títulos, vários títulos, renda fixa, debêntures, tudo
mais. Por que no Brasil o investidor não tem essa opção de um mercado
secundário de outros valores? Vou lhe fazer uma provocação: será que a
culpa é dos bancos que fazem ofertas firmes, pegam os títulos,
entesouram e depois cobram os juros? Será que a culpa não é do governo
que só faz negócio com os bancos, eles colocam nos seus fundos e esses
mercados não têm nenhuma liquidez? Se eu não quiser ação nem fundo de
ação eu não posso ter um bom mercado secundário, enfim, commercial
papers, uma boa empresa, papéis - não ação - de boas
empresas?
Roberto Teixeira da Costa: Você acha que falta
liquidez?
Alfredo Rizkallah: José Paulo, realmente nós
estamos sofrendo
uma mudança. Esse programa que o Banco Central está
realmente disposto a construir dentro do Brasil, um mercado secundário
de títulos públicos, é realmente a pedra de toque para exatamente
termos
também um mercado secundário de títulos privados. Quando nós estamos
falando de bolsa, nós não estamos falando só de ações, estamos falando
de todos os papéis de emissão da companhia privada.
José Paulo Kupfer: Nós estamos... nós não
deveríamos falar sobre bolsa, mas a gente ainda não sabe dessas coisas.
Alfredo Rizkallah: Eu gostaria de estar traduzindo
mercado de
bolsa como mercado de ações, de debêntures, de commercial papers,
de
papéis securitizados, de bônus, todos papéis oriundos de emissão da
empresa privada. A empresa privada tem hoje uma soma de mecanismos
realmente para levantar recursos. Agora, esse é um processo que está se
formando. Nós já temos um programa hoje de negociação dentro da Bolsa
para exatamente propiciar a negociação no mercado secundário desses
títulos, que como você disse hoje são objeto de negociação às vezes
direta entre a empresa emissora e a instituição financeira. Mas isso
vai ser objeto... [sendo interrompido]
José Paulo Kupfer: Quando que eu vou poder ter no
meu portfólio
um bom papel, não ação, de uma grande empresa? Quem sabe essas de
Internet aí, tão boas?
Alfredo Rizkallah: Nós estamos fazendo diligências
junto à
empresas para que elas tragam para a Bolsa os papéis, nós já
temos sistemas adequados para negociação.
José Paulo Kupfer: Tem alguma empresa que já está
nisso?
Alfredo Rizkallah: Está sendo estudada. Tem empresa
que já está
negociando debêntures [títulos de médio e long prazo emitidos por
empresas para captarem recursos] no mercado secundário de balcão, mas
nós queremos
que ela negocie no mercado principal de bolsa. Portanto, existe. Existe
necessidade das empresas. Tudo isso é um processo que foi derivando,
Kupfer, da queda das taxas de juros. Você não poderia imaginar a
emissão desses papéis com as taxas de juros então existentes. Hoje nós
temos clima para isso.
Alfried Ploger: Eu tenho uma pergunta que preocupa
muito a
Abrasca. É: qual é o futuro do mercado bolsístico nosso com a Internet?
Nós estamos assistindo a saltos extraordinários no desenvolvimento de
negociações diretas com a Internet. E a pergunta é a seguinte, as
bolsas no futuro ainda existirão?
Alfredo Rizkallah: Existe um estudo muito... uma
preocupação muito
grande das bolsas no mundo inteiro para saber qual é o futuro das
bolsas. Existe naturalmente, no mundo inteiro, principalmente nos
Estados Unidos e mesmo na Europa, organizações que estão concorrendo
com as bolsas, as ECN’s [Eletronic Communication Network – mercado
eletrônico]. São grupos de corretoras ou de bancos que se juntam para
produzir negociações entre si dos papéis negociados em bolsa, são uma
concorrência às bolsas. Eu acredito que as bolsas vão continuar a
existir por um futuro muito longo, na medida em que elas sejam
eficientes o suficiente para concorrerem com essas instituições
paralelas. Porque pelo menos dentro das bolsas você terá sempre o
resguardo legal, a proteção de regras estabelecidas, alguém a quem
reclamar, um sistema de liquidação competente. Essa é a garantia da
perenidade das bolsas. Claro que elas poderão mudar o seu aspecto,
claro que você poderá ver bolsas atuando de uma maneira bastante
diferente do que atuam hoje. Mas um sistema organizado de negociação e,
principalmente, um sistema organizado de liquidação e guarda de títulos
é imprescindível para a continuidade desse mercado.
Celso Pinto: Doutor Rizkallah, nós estávamos
discutindo agora há
pouco as opções para as empresas entrarem ou não na Bolsa, por quê elas
entram, por quê elas não entram. Eu queria me referir a um estudo, um
dos primeiros estudos do [Carlos Antonio] Rocca [doutor em economia
pela Universidade de São Paulo, consultor de empresas], que foi já
mencionado antes. Uma das conclusões mais interessantes do estudo dele,
ao meu ver, é o seguinte: ele constatou que as empresas abertas... de
fato a carga fiscal, o imposto que elas pagam de fato efetivo é muito
maior por amostragem do que a média das outras empresas. E a razão é
simples: uma empresa aberta é mais difícil ter caixa dois, é mais
difícil sonegar. A conclusão do Rocca, que segue-se disso, é o
seguinte: enquanto o sistema brasileiro funcionar com caixa dois, com
sonegação, com carga fiscal muito alta que leva a esse tipo de coisa, o
estímulo para a empresa entrar na Bolsa é pequeno, porque de fato
entrar na Bolsa significa pagar mais imposto. E o mercado, com todos os
problemas que nós falamos aqui, pouca liquidez, preços relativamente
baixos, assim por diante, como é que se resolve esse problema?
Roberto Teixeira da Costa: Seria uma boa razão para
o Estado fortalecer o mercado de capitais. Isso aumentaria a sua
arrecadação.
Alfredo Rizkallah: Isso parte, exatamente... você
toca num ponto
vital, que é a reforma tributária. Hoje, realmente, após... até dentro
desse estudo do Rocca mostra-se que a empresa de capital aberto paga
mais, muito mais do que a média nacional de tributação. Hoje nós temos
uma média que se diz ser de 32%, a média da carga tributária
brasileira. E
eu chamo atenção para vocês que, a partir desse ano de 2000, com a
elevação do Cofins [Contribuição para Financiamento da Seguridade
Social] de 2% para 3% essa carga tributária pode crescer. Essas
empresas de capital aberto, porque elas são extremamente transparentes
e sujeitas a todo tipo de verificação - não só do Fisco, mas
principalmente de investidores e analistas - elas pagam o imposto na
sua
totalidade. Uma grande parte de empresas que concorrem com elas não
cumprem essas obrigações fiscais. Então está estabelecida aí uma
concorrência desleal. E de que forma nós temos procurado resolver isso?
Não nós da Bolsa. De que forma o governo tem procurado resolver isso?
Aumentando a carga fiscal. Na medida em que nós estamos aumentando a
carga fiscal, nós estamos induzindo um número cada vez maior de
empresas para ir para a informalidade. E a informalidade aqui, Celso,
não quer dizer apenas a vontade do empresário de criar um caixa dois
para si, a informalidade ganha aspectos de sobrevivência. Quer dizer,
muitas empresas nacionais não têm condições de cumprir totalidade de
suas obrigações tributárias por uma condição de sobrevivência. Então,
na hora que nós estamos fazendo uma reforma tributária, qual é o maior
problema hoje brasileiro nessa área tributária? É a dimensão da
economia informal e que está associada também à dimensão do trabalho
informal. Estatísticas do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística] e do Dieese [Departamento Intersindical de Estatística e
Estudos Socioeconômicos] mostram que somente 45% da população
economicamente ativa tem carteira assinada. Portanto, 55% dos operários
não têm seguro, não têm proteção, e estão a mercê... Mas isso tudo por
quê? Por uma questão que a legislação trabalhista é tão elevada que
obriga tanto do lado do operário como do lado da fábrica a não ter
formalidade no seu registro. O que nós devemos fazer? Fazer aquilo que
os Estados Unidos já fizeram uma vez. Se nós queremos fazer uma reforma
tributária, nós precisamos incorporar essa grande massa de economia
informal, que ninguém sabe quanto é, se é 30%, se é 40%. E quando nós
estamos falando em economia informal, nós não estamos falando só de
camelô, nós estamos falando de grandes empresas que, ao comprarem, por
exemplo, sucata de aço, sucata de papel ou de vidro, não podem fazê-lo
com nota porque o provedor não lhe dá nota. Então aí tem uma fonte
enorme... [sendo interrompido]
Celso Pinto: Essa reforma tributária que está sendo
discutida não resolve em nada.
Alfredo Rizkallah: Essa reforma tributária que nós
precisamos
fazer, nós devíamos fazer ela revolucionária. No sentido de reduzir,
reduzir as alíquotas para exatamente incorporar todo este contingente
da informalidade à economia como um todo. Aí você poderia realmente
fazer uma tributação muito menor e ter um convergente maior. Isso não é
novidade nenhuma, isso foi o que o [Ronald] Reagan [Foi presidente dos
EUA de 1981 a 1989] fez há 12 anos
atrás.
Sonia Racy: Quais as possibilidades disso ocorrer?
Alfredo Rizkallah: As possibilidades, Sonia, são as
possibilidades que a vontade política que a sociedade fizer, através da
sua pressão, acontecer. A reforma tributária... [sendo interrompido]
Sonia Racy: O senhor acha que está ocorrendo isso?
Alfredo Rizkallah: Eu acredito que nós estamos
buscando, com
enorme dificuldade, conciliar problemas entre estados e a federação. E
nós estamos praticamente rearrumando a situação tributária atual. Nós
não estamos caminhando para uma reforma tributária moderna, como aquela
que o Brasil devia ter neste momento se ele realmente quiser se
inserir na economia moderna.
Paulo Henrique Amorim: Doutor Rizkallah, teve aqui
hoje participando do programa Opinião Nacional o
deputado [Antonio] Kandir [professor universitário, político e
economista. Foi ministro do Planejamento durante a gestão de Fernando
Henrique e entrevistado pelo Roda Viva em 1995],
e eu perguntei para ele ali nos bastidores em que
pé estava a reforma tributária. Ele disse que estava muito otimista
porque provavelmente se chegará a um acordo para aprová-la em breve. E
ele
disse que, neste momento, a única coisa que ainda provoca uma certa
dificuldade é a questão do imposto em cascata. E que eu perguntei para
ele sobre a CPMF [Contribuição Provisória sobre Movimentação
Financeira]. Ele falou: "Não, a CPMF já está resolvida, vai ser um
imposto e vai ser incorporado". Ele revelou também uma coisa que eu não
sabia, e me deixou muito surpreso: Cofins, hoje, é duas vezes a
arrecadação do IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados]. Então, eu
lhe perguntaria uma coisa: o senhor acha que existe alguma
possibilidade de discriminar a bolsa e rever a idéia de cobrar CPMF nas
operações em bolsa?
Alfredo Rizkallah: Eu acho que é absolutamente
indispensável.
Paulo Henrique Amorim: Eu perguntei se é possível.
[Risos]
Alfredo Rizkallah: Se é possível ou não, nós
precisamos continuar...
[...]: O Alfredo conseguiu a fusão das Bolsas, acho
que ele vai conseguir.
[Risos]
Alfredo Rizkallah: Estamos conseguindo. A CPMF é um
imposto que
é injusto socialmente. A CPMF é um imposto que não pune o sonegador, e
a CPMF é um imposto anti-brasileiro. Ele é injusto socialmente porque é
0,38 sobre todo mundo. 0,38 para quem ganha cem mil é alguma coisa,
0,38 para quem ganha cem reais é muito mais. Portanto, socialmente,
CPMF é injusto. Ela não pune o sonegador, porque ele está na suposição
de que ele pega todo o universo dos habitantes que mexe, que tem
qualquer transação financeira. Só que aquele que paga impostos, ele
continua pagando os seus impostos e mais a CPMF. Aquele que não paga
impostos, ele continua não pagando impostos e mais a CPMF. Portanto,
ela não está arrebanhando todo o universo. E, terceiro, ela é
antibrasileira. Todo produto brasileiro aqui fabricado carrega em todas
as suas etapas a CPMF, e aí ele vai concorrer lá fora com o produto
estrangeiro que não tem CPMF. Todo produto importado chega aqui sem
CPMF, e vem concorrer com o produto brasileiro que tem. No mercado de
capitais, a CPMF é um desastre. Na área de juros, ela é uma alcunha
fiscal que torna os juros bastante mais altos. Toda disposição que
tiver de baixar a taxa de juros, se enquanto existir esta alcunha
fiscal da CPMF, vai manter o juro elevado. Agora, no mercado de ações a
CPMF é um tiro fatal. A CPMF, aqui foi dito é 0,38, o custo de
negociação em Bolsa é 0,03. Portanto, a CPMF é doze vezes o custo de
negociação. A CPMF levou para Nova Iorque empresas brasileiras. Hoje se
negocia as empresas de telecomunicações, 70% lá e 30% aqui. E a CPMF,
no mercado de ações, Paulo, ela é inclusive aritmeticamente negativa.
Sonia Racy: Qual a possibilidade da CPMF não
existir para o mercado financeiro?
Alfredo Rizkallah: Haver um convencimento de que
esta CPMF é danosa no mercado de ações.
Sonia Racy: A quem o senhor tem que convencer,
presidente?
Alfredo Rizkallah: Tem que convencer a área do
executivo e do legislativo.
Sonia Racy: Mais especificamente tem alguém que
precisa?
Alfredo Rizkallah: Tem que atuar no Ministério da
Fazenda e na Comissão de Reforma Tributária.
Alfried Ploger: Precisamos lembrar que, quando houve
a IPMF,
o
mercado de capitais já esteve isento. Então, essa figura da isenção o
governo conhece muito bem, e sabe o bem que faz e o mal que faz.
Roberto Teixeira da Costa: Alfredo, eu gostaria de
juntar essa
questão do alargamento do mercado. Quer dizer, uma coisa que me
impressionou no mercado de Davos lá, a coisa lá do mercado alemão,
chamado Neuer Markt.
Quer dizer, o mercado para novas empresas. Quer
dizer, o que nós estamos fazendo efetivamente para criar mecanismos de
indução? Porque o grande problema... vamos dizer, [vamos] abstrair as
empresas de
alta tecnologia, que hoje têm esse mercado todo espetacular. Mas a
liquidez é inerente à abertura de capital. O que a Bolsa está fazendo?
Eu me lembro que você andou apoiando a idéia dos fundos de companhias
emergentes etc. Você vê algum potencial de ter segmentos de mercado
especializados para criar liquidez para empresa que estão...?
Alfredo Rizkallah: Nós estamos continuando a
desenvolver todos
os esforços no sentido de visitar empresas, induzi-las a virem para o
mercado. Nós continuamos... Hoje já existe mais recurso disponível do
que empresa em condição de absorvê-los. Podia ser o inverso, mas hoje
nós temos mais recursos e não temos empresas. Um dos entraves continua,
seguramente, Roberto, sendo o problema da carga tributária.
Sonia Racy: Dr. Alfredo, eu queria fazer uma
pergunta aqui, que
eu acho que o telespectador que acompanha os mercados, tem acompanhado
os mercados, deve ter percebido hoje, principalmente. Há algum tempo a
bolsa brasileira, como as outras bolsas do mundo, vêm acompanhando as
oscilações da bolsa de Nova Iorque. Hoje, surpreendentemente, todas as
bolsas do mundo caíram e a Bovespa não. O que aconteceu, presidente?
Alfried Ploger: Disse que ia ter o Roda
Viva com o presidente aqui no meio, Sonia. É altamente
favorável.
Alfredo Rizkallah: Nós devemos ter algumas exceções
que
confirmem a regra, Sonia. Não existiu nenhum fato nacional realmente
que se superpusesse a acontecimentos lá de fora. Quando se fala em
volatividade, antigamente se falava de volatividade só do Brasil. Hoje
você está tendo em Nova Iorque volatividade similares às que está tendo
aqui. E existe uma regra geral, hoje, que conecta quase todos os
mercados
do mundo, e nós não fugimos à exceção. Algumas vezes realmente nós
temos uma oscilação diferente, mas são exceções. Agora... [sendo
interrompido]
Sonia Racy: Existe alguma explicação para o fato de
hoje, por exemplo?
Alfredo Rizkallah: Não, hoje não tinha nenhuma
explicação
específica de hoje. Quando todo mundo fala que a Bolsa sofreu nesses
últimos doze meses uma elevação de um índice bastante grande,
comparativamente aos índices lá de fora, a gente precisa lembrar que,
em antes da crise asiática, em 1987... - nós precisamos remontar a 87.
Em
87, crise asiática, 1998, crise russa, e em 1999 o problema da
alteração da
sistemática cambial. Se nós pegarmos os índices da Bolsa de São Paulo
de 1987 até hoje... De 1997, perdão. Até hoje nós estamos com uma
defasagem
em dólar negativa de 22%. O índice do México é positivo em 22% e o Dow
Jones [bolsa de Nova Iorque] é positivo em 38%. Portanto, a bolsa de
São Paulo ainda tem
potencial para restaurar o seu estágio anterior à crise asiática.
Paulo Markun: E com essa declaração, que certamente
vai entusiasmar...
Paulo Henrique Amorim: Altista, com "L". [Riso]
Paulo Markun: [Com] Uma declaração "altista", e que
vai entusiasmar os
telespectadores a melhorarem o desempenho da bolsa amanhã, nós
encerramos o nosso programa. Gostaria de agradecer muito à presença do
doutor Rizkallah, dos nossos entrevistadores, de você que está em casa
[e] lembrar que há centenas de perguntas que foram formuladas e não
foram
feitas aqui no ar. Mas, como sempre, serão encaminhadas ao doutor
Rizkallah para que ele possa inclusive responder diretamente a questões
mais específicas. O Roda Viva se despede. A gente
volta na próxima segunda-feira, sempre às dez e meia da noite. Uma boa
semana, uma boa noite, e até lá.