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Memória Roda Viva

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Hortência

15/6/1992

Além de falar sobre a carreira no esporte e a vida pessoal, a atleta opina sobre assuntos polêmicos do início da década de 1990, como o governo Collor e a aids

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[Programa gravado, não permitindo a participação de telespectadores]

Jorge Escosteguy: Boa noite. Pela primeira vez na história, o basquete feminino do Brasil vai a uma Olimpíada. As meninas brasileiras carimbaram seu passaporte para Barcelona [Jogos Olímpicos de 1992] depois de uma disputa dramática no Pré-Olímpico [5º Torneio Pré-Olímpico Feminino] de Vigo, na Espanha. Não foi uma apresentação brilhante. Com altos e baixos, a Seleção Brasileira precisou de muita garra, muito coração e de uma providencial ajuda da Seleção da Tchecoslováquia, que derrotou a Austrália e beneficiou as brasileiras. Uma das jogadoras brasileiras, em especial, chegou em Vigo com a intenção de "arrasar", mas quase saiu arrasada com os problemas que enfrentou, e amargou um banco de reservas durante um jogo contra a China. Mas ganhou. Ganhou e conseguiu realizar o penúltimo sonho que faltava em sua vida. Sobre o último sonho, nós conversaremos mais tarde. No centro do Roda Viva, que começa agora pela TV Cultura de São Paulo, está Hortência Marcari Oliva, seguramente a melhor jogadora de toda a história do basquete feminino brasileiro e uma das melhores do mundo. Lembramos que o Roda Viva também é transmitido pela TV Minas Cultural e Educativa, TVE da Bahia, TVE do Ceará, TVE do Piauí, TVE do Mato Grosso do Sul, TVE de Porto Alegre e transmitido a partir das dez e meia da noite pela TVE do Rio de Janeiro, para todas as emissoras que compõem a Rede Brasil. Hortência Oliva tem 32 anos e já ganhou quase todos os títulos possíveis para uma jogadora de basquete. Ela mesma diz que já perdeu a conta do que ganhou - e nós, de certa forma, também - mas foi campeã dos Jogos Regionais, dos Jogos Abertos do Interior e campeã paulista, campeã brasileira e sul-americana, além de cestinha do Campeonato Mundial na Malásia. Tem o recorde de 124 pontos em uma partida de basquete. Nasceu na pequena Potirendaba, no interior de São Paulo. Posou nua para a revista Playboy e casou-se com um playboy, o empresário da noite José Victor Oliva. Para entrevistar Hortência esta noite no Roda Viva, nós convidamos: Joyce Pascowitch, colunista da Folha de S.Paulo; Marco Antonio Sabino, repórter e apresentador da Rádio Eldorado; Lia Benthien, repórter da TV Cultura; Hélio de Alcântara, chefe de reportagem da Rede OM [atual CNT - Central Nacional de Televisão]; Alex Solnick, repórter da revista Interview; Orlando de Almeida, repórter do jornal O Estado de S. Paulo; Oldinei Edson, narrador e coordenador de esporte da Rádio Gazeta; Silvio Luiz, narrador da TV Bandeirantes. Lembro a você, telespectador, que infelizmente hoje não será possível fazer perguntas por telefone, porque o programa foi gravado. Hortência tinha um compromisso nesta segunda-feira. Boa noite, Hortência.

Hortência: Boa noite.

Jorge Escosteguy: A classificação para as Olimpíadas de Barcelona foi dramática, foi difícil, você mesma ficou um tempo no banco de reservas. Fomos ajudados pela Tchecoslováquia, o que, de repente, parece um pouco um prêmio de consolação. Você acha que a Seleção Brasileira vai para Barcelona como um prêmio de consolação ou tem uma chance, uma possibilidade objetiva der vir com alguma medalha, talvez até de ouro?

Hortência: Não importa de que maneira a gente conseguiu a classificação, o importante é que nós conseguimos. Se foi de maneira dramática, se foi fácil ou mais difícil, eu [vejo] com muito orgulho a maneira como nós conseguimos nos classificar. A equipe começou meio nervosa no jogo com a Tchecoslováquia, mas jogou de igual para igual. Acho que o único jogo em que a equipe não se saiu bem foi contra a China, a equipe não jogou aquilo que poderia ter jogado, principalmente eu e a Paula [Magic Paula]. Mas eu acho que nós estamos lá, é isso que importa, nós temos condições, somos uma grande equipe, mostramos isso no Pré-Olímpico. Já ganhamos das campeãs olímpicas no Pan-Americano [Jogos Pan-Americanos de Havana, em 1991], então eu acho que nós podemos até lutar por uma medalha de ouro.

Jorge Escosteguy: Você ficou brava, não gostou de ter ficado no banco. Isso é coisa de estrela ou acha que foi injustiçada?

Hortência: Não, não é coisa de estrela, nem acho que fui injustiçada. Na realidade, eu fiquei 20 minutos no banco. Nenhum jogador gosta de ficar no banco, em qualquer modalidade de esporte, você quer ser o titular em todas as jogadas e jogar os 40 minutos [tempo regulamentar de uma partida de basquete oficial].  Agora, existe uma tática empregada dentro de um jogo e a Maria Helena escolheu a tática dela. Eu respeito, em nenhum lugar o senhor me viu criticando a Maria Helena, eu tenho um respeito muito grande pela hierarquia que existe dentro da Seleção Brasileira. Ela é um grau acima de mim e eu respeito a tática que ela quis imprimir na partida.

Jorge Escosteguy: Mas você disse que estava correndo como uma menina de 20 anos e que, se alguma menina de 20 anos estivesse encestando melhor do que você, tudo bem, mas no caso não era assim....

Hortência: [interrompendo] Não, isso foi uma outra pergunta.

Jorge Escosteguy: ...e que inclusive falou com a Maria Helena sobre isso.

Hortência: Não, isso foi uma outra pergunta que fizeram para mim. [Perguntaram-me] quando eu pararia de jogar basquete. E eu disse que não sabia, que estou com 32 anos de idade, mas tenho condicionamento físico melhor do que o de uma menina de 20 anos. Eu acho que o atleta não pode ser cobrado de parar porque ele tem 32 ou 35 anos, ele tem que ser medido também pela capacidade. Se eu tiver 40 anos de idade e estiver jogando melhor, estiver encestando melhor, e uma jogadora de 20 quiser ocupar o meu espaço, ela disputa o lugar comigo. Se ela for melhor do que eu, paro de jogar basquete e vou para o banco.

Jorge Escosteguy: Aqui na platéia, assistindo ao programa, temos convidados da produção, que são as meninas do mini, mirim e do infantil do Leite Moça de Sorocaba [time de basquete do interior de São Paulo, clube pelo qual Hortência jogava, na ocasião desta entrevista]. O que você diria para essas meninas que estão começando agora, em função dessa experiência em Vigo, da classificação dramática e de você mesma estar dizendo agora que vai jogar enquanto puder, aos 40, 45 [anos]?

Hortência: Eu convivo com elas todos os dias e a gente procura passar uma experiência que a gente vem adquirindo há anos. A gente procura também não fazer com que elas sofram do jeito que nós sofremos, e que elas se espelhem na nossa luta, na batalha de alcançar objetivos. Então o que eu tenho a dizer para elas é: se vocês realmente almejam alguma coisa, precisam ir em busca desse objetivo e nunca desistirem.

Jorge Escosteguy: Silvio Luiz, por favor.

Silvio Luiz: Eu queria que a Hortência me respondesse até que ponto o marido atrapalha ou ajuda em uma competição como essa, que vocês disputaram em Vigo.

Hortência: Depende do marido. Se for um marido chato, que fica cobrando muito da sua mulher, eu acho que atrapalha. Não é o meu caso, já que o Victor é um cara que me dá muita força, não só para mim, mas para todas, como a Maria Helena e as meninas. Ele está disposto a ajudar em tudo que possível para que a gente se sinta bem. Algumas coisas que saíram nos jornais não são verdadeiras.

Jorge Escosteguy: E aquela história da aposta dos mil dólares...

Hortência: Que absurdo!

Jorge Escosteguy:...que ele apostava mil dólares que a Austrália ia ganhar da Tchecoslováquia?

Hortência: Como é que uma pessoa pode apostar contra a sua mulher?

Jorge Escosteguy: De repente ele é um apostador frio, ele acha que...

Hortência: Não, eu conheço o meu marido. 

Jorge Escosteguy: Independente de ser sua mulher, ele achou que a Austrália ia ganhar.

Hortência: Eu vou dizer mais uma coisa que talvez vocês não saibam. Nós fomos pagar uma promessa em Santiago de Compostela, feita pelo meu marido naquele jogo  Tchecoslováquia x Austrália. Ele falou: "Se [o Brasil] ganhar, vocês vão em Santiago de Compostela, todo mundo vai comigo". E a gente falou: “Tudo bem, a gente vai”, quer dizer, eu não acredito que uma pessoa que faça uma promessa como essa, no outro dia aposta contra. O que é isso, gente?

Lia Benthien: Hortência, não existe a possibilidade ou não seria melhor que você ficasse com a concentração totalmente voltada para o basquete? Seu marido não te tira um pouco a concentração e não prejudica o grupo também, já que a imprensa explora o fato de ele estar ali?

Hortência: Veja bem, eu acho que o meu caso e do Victor é uma coisa muito complicada. Se o Victor me ajuda, está ao lado da sua mulher, é porque ele está ao lado. Se o Victor não está ao lado, é porque ele não está ao lado, não gosta que a mulher jogue basquete. Quer dizer, a gente fica em uma situação meio difícil. Ele não me atrapalha em nada porque eu tenho uma personalidade muito forte e jamais - não é o meu marido, não vai ser a minha mãe, não vai ser o meu pai, não vai ser a minha melhor amiga - alguém vai me atrapalhar de eu fazer o meu basquetebol dentro da quadra. Enquanto eu entro naquelas quatro linhas, nada me atrapalha. Pelo contrário, eu estou feliz, porque o meu marido está ao meu lado, me apoiando, me dando força, me aplaudindo. Ele tem orgulho de mim e isso só faz com que eu me sinta bem.

Marco Antonio Sabino: É verdade que ele te ajuda nos momentos da derrota? A Hortência sabe perder? Porque contaram uma história que ele te segurou depois da primeira derrota, que você chutou a porta, é verdade isso?

Hortência: Não, isso não é verdade.

Marco Antonio Sabino: A Hortência sabe perder, está preparada para perder?

Hortência: Eu sei perder, mas eu não gosto de perder. Vocês nunca me viram sair de uma quadra falando besteira ou dizendo que o outro time não merecia vencer, eu só...

Jorge Escosteguy: Como você desabafa quando perde?

Hortência: Só fico quieta, choro, o meu marido está ao meu lado sempre para me dar uma força, eu sei perder. Mas, por exemplo, falaram que o Victor tinha apostado. Isso não é verdade. Falaram que quando nós perdemos o grupo se separou, o que também não é verdade. Falaram que a Hortência saiu da quadra chutando cadeira, que também não é verdade. Então fica difícil...

Joyce Pascowitch: Hortência.

Jorge Escosteguy: Joyce Pascowitch, por favor.

Joyce Pascowitch: Hortência, sexo antes do jogo. Você acha que isso ajuda a relaxar ou atrapalha a concentração? Você é a favor do quê?

Hortência: Eu acho que depende da pessoa.

Joyce Pascowitch: No seu caso.

Hortência: No meu caso, eu acho que ajuda, quando você faz uma coisa por amor - sexo é uma coisa que você faz por amor - aquilo nos deixa muito feliz, nos anima.

Joyce Pascowitch: E você já percebeu isso?

Hortência: Claro.

Joyce Pascowitch: Que depois de ter transado...

Hortência: Claro, para mim não prejudica absolutamente em nada, eu me sinto muito bem, muito feliz. O sexo me realiza e quando a mulher se sente realizada, produz muito melhor. 

Alex Solnick: Hortência, o José Victor deu uma entrevista que vai sair no próximo Interview, onde ele conta que você, um dia, o flagrou na cama com o Ricardo Amaral, sócio dele. É verdade? [risos]

Hortência: [risos] É brincadeira! É que [quando] o Ricardo Amaral vem para São Paulo, se hospeda na minha casa. Então o Victor faz essa brincadeira e eu falo: “Vocês dois aí, cuidado”. É brincadeira, ele quis "tirar um sarro" do Ricardo Amaral.

Orlando de Almeida: Hortência, voltando um pouquinho às declarações dadas ou não dadas pelo seu marido lá na Espanha, o Vendramini [Antônio Carlos Vendramini, técnico brasileiro de basquete feminino. Dirigiu diversas equipes no país, entre elas a Leite Moça de Sorocaba] foi outro pivô de toda essa história. Ele confirmou aos jornais aqui de São Paulo que ele falou que a Maria Helena era "ruim de banco" ao deixar você e a Paula lá por mais de vinte minutos. Então nem tudo foi invenção da imprensa...

Hortência: Não, a aposta foi invenção da imprensa, que eu saí chutando foi invenção da imprensa, e que o meu marido estaria torcendo contra a Seleção é um absurdo. Agora, o caso do Vendramini foi o seguinte: eles estavam em um bar conversando com os jornalistas, depois da derrota do Brasil, e fizeram uma pergunta  ao Vendramini. Era um momento descontraído, não era uma entrevista, e um repórter escutou e resolveu publicar. Perguntaram a ele: “Você tiraria a Hortência e a Paula?” e ele falou: "A Hortência e a Paula podem estar vomitando dentro da quadra, mas eu não as tiro”. Quer dizer, existe várias maneiras de você interpretar uma palavra, então interpretaram que ele estava criticando. Eu não posso dizer porque não estava lá.

Alex Solnick: É só a Maria Helena que faz a tática do time ou vocês discutem a tática com ela? 

Hortência: Não, na hora do jogo é a Maria Helena e a Heleninha [assistente técnica da Seleção Feminina de Basquete]. Eu respeito, jamais vou dizer a Maria Helena o que ela tem que fazer.

Alex Solnick: Ela pede a opinião de vocês ou não?

Hortência: Não. Às vezes, no treinamento surge uma jogada que a gente discute. Mas isso não sou eu, pode até ser a Helen [Helen Luz, jogadora da Seleção Brasileira de Basquete], que está começando agora e fala: “Mas, Maria Helena, nessa hora a menina pode aparecer por aqui e você não acha que...”. Não é uma coisa muito rígida, é algo democrático na Seleção Brasileira.

Silvio Luiz: Hortência, quando vocês ficaram no banco por 20 minutos, estavam perdendo o jogo. Aí a Maria Helena fez a troca, vocês chegaram a empatar 61 a 61. O Vendramini não falou nada?

Hortência: Eu não sei, eu estava jogando.

Silvio Luiz: Você se lembra do jogo?

Hortência: Eu me lembro do jogo, estava 62 a 62, parece.

Silvio Luiz: Quando a Maria Helena fez a modificação, vocês estavam perdendo, aí empataram 61 a 61, quer dizer, isso [refere-se às declarações do técnico] demonstra dor de cotovelo do Vendramini ou uma falta de respeito com uma profissional como ela. Embora ele tenha feito as declarações [oficialmente], ele poderia ter dito “por gentileza, não publiquem isso”.

Hortência: É, mas ele não viu o repórter ali.

Silvio Luiz: O problema é dele, então ele nunca deveria ter falado. Isso é falta de ética.

Alex Solnick: Ele falou realmente o que pensou.

Hortência: Olha, eu vou dizer uma coisa para você...

Orlando de Almeida: Pensou alto.

Hortência: Eu sou suspeita para falar, porque o Vendramini é meu amigo, é meu técnico. Eu vou defendê-lo sempre. Eu conheço muito o Vendramini e não acho que devemos sacrificar ou crucificar uma pessoa por causa de uma frase em um momento infeliz.

Silvio Luiz: Certo.

Hortência: Eu acho que ele tem bom caráter, é uma grande pessoa, sempre torceu pela Seleção Brasileira. Foi infeliz, realmente, de ter comentado [isso] quando [havia] um repórter ao lado.

Silvio Luiz: Então ele foi infeliz duas vezes: quando ele disse lá e quando confirmou aqui.

Hortência: Bom, não sei.

Orlando de Almeida: É, ele confirmou sim. Está publicado na edição do Jornal da Tarde.

Hortência: Foi infeliz.

Orlando de Almeida: Outra coisa, Hortência. Foi dito também que o presidente da Confederação [Confederação Brasileira de Basketball], [Renato] Brito Cunha, entrou no vestiário, no jogo Brasil x Tchecoslováquia ou Brasil x China, fechou as portas e ficou em um "tête à tête" com vocês. O que ele falou naquele momento?

Hortência: Ele entra em todos os jogos, antes e depois. De qual momento você está falando?

Orlando de Almeida: Acho que foi depois de Brasil x China.

Hortência: Olha, o Brito Cunha nunca chamou nossa atenção. Pelo contrário, sempre entrou para dizer alguma coisa sobre o jogo. Ele entra e fala: “Vamos lá, esse jogo hoje é um pouco de defesa”. Não que ele passe por cima da Maria Helena, ela dá essa liberdade para ele. Ele também fala: “Gente, não acabou ainda, vamos lá, parabéns. Ele nunca deu uma bronca na gente. Também não teria o porquê dar, ele sabe que todo mundo está lutando com garra e determinação.

Hélio de Alcântara: Hortência, você está há tanto tempo em contato com a imprensa...Qual é sua avaliação sobre a cobertura da imprensa esportiva, de uma maneira geral?

Hortência: Eu acho que tudo que nós temos hoje, devemos à imprensa. Se eu tenho hoje um patrocínio na minha cabeça [mostra seu boné com o símbolo do Leite Moça], é porque a televisão está mostrando, porque vocês estão falando da gente. Se hoje recebo o que recebo, é porque - claro, tenho meus méritos, minha capacidade - a imprensa publica,  valoriza o atleta. A imprensa também derruba, mas ela mais valoriza do que derruba, está certo? Então eu acho que se o esporte hoje está conseguindo caminhar sozinho, depois desse abandono total do governo, é por causa da imprensa escrita, falada e [televisionada].

Oldinei Edson: Hortência, você já falou bastante do José Victor, seu marido, que ele não atrapalha, mas ajuda, por exemplo, no aspecto publicitário. Ele que vai buscar publicidades, que tenta organizar um pouco o time de vocês, enfim, ele passa a ser seu empresário. Ele faz isso só porque é seu marido ou há algum aspecto profissional como empresário aí?

Hortência: Não, tudo que ele faz para mim é porque ele é meu marido, porque ele gosta de mim. O Victor entrou no basquetebol quando ele me conheceu, tanto é que ele já fez o primeiro Campeonato Mundial Interclubes e já está fazendo o segundo, tudo isso porque ele gosta do basquete. Por isso, eu falo que seria impossível ele torcer contra se ele tem um campeonato mundial agora em setembro e precisa de um patrocinador. Então, quanto mais o time ganhar...

Oldinei Edson: Mas é ele que vai buscar o patrocínio?

Hortência: É ele que vai atrás.

Oldinei Edson: O Leite Moça, foi ele que arrumou?

Hortência: Ele que arrumou, então é absurdo as pessoas falarem que ele torceu contra. Agora, ele me ajuda muito em termos [empresariais], me aconselha, já que ele está mais no meio da publicidade do que eu. É claro que as pessoas me procuram, porque eu sou a Hortência, jogadora de basquete. Ninguém "chuta cachorro morto" também, ninguém consegue "levantar defunto", não é verdade?

Oldinei Edson: Lógico.

Hortência: Mas ele me dá uma força muito grande, me aconselha.

Alex Solnick: Você tem alguma sociedade com ele fora o casamento, uma sociedade comercial?

Hortência: Nada, tudo que é meu...inclusive nós nos casamos com separação total de bens.

Jorge Escosteguy: E o que é seu?

Hortência: Então, o que é meu é meu, o que é dele é dele.

Jorge Escosteguy: Você é uma mulher rica hoje?

Hortência: Não.

Jorge Escosteguy: Onde você investe seu dinheiro?

Hortência: Eu invisto no meu futuro e no meu presente.

Alex Solnick: Qual é o seu futuro?

Jorge Escosteguy: Você compra apartamento, aplica na poupança, compra sítio?

Hortência: Aplico na poupança, invisto em imóveis. Eu vivo bem o meu presente, ajudo toda a minha família, meu pai e minha mãe vivem comigo, praticamente.

Marco Antonio Sabino: Você administra tudo isso ou tem alguma pessoa que administra por você?

Hortência: Eu que administro tudo isso. O Victor também me ajuda muito, as secretárias do escritório dele me ajudam em algumas coisas.

Marco Antonio Sabino: Hortência vai ser dona de casa noturna quando parar ou não?

Hortência: Sei lá, pode até ser, mas o que pretendo mesmo é continuar no esporte.

Oldinei Edson: Pois é, você [ tem grande dificuldade em falar] do futuro sem o basquete.

Hortência: É.

Oldinei Edson: Você, sem o basquete. Como é isso na sua cabeça? Você prefere não pensar, esperar e depois ver o que vai acontecer na realidade?

Hortência: Eu não gosto de falar muito do meu futuro, porque eu realmente vivo como as coisas vão acontecendo. Mas acho que tudo que faço hoje, procuro guardar dinheiro para o futuro. Se acontecer algum problema, eu tenho dinheiro para montar alguma coisa, para viver.

Jorge Escosteguy: Como você é com o dinheiro? É liberal, gosta de gastar ou gosta de segurar e fazer economias?

Hortência: Depende, eu não sou uma pessoa que gasta com besteiras, eu guardo bastante. Procuro viver bem o presente e também pensar um pouquinho no futuro.

Lia Benthien: Quem vai dizer a hora de parar, é a mulher Hortência que vai dizer para a jogadora quando parar com o basquete?

Hortência: Eu acho que a jogadora que vai dizer, porque é a minha vida, eu penso em basquete 24 horas por dia. Se eu estou com meu marido, estamos falando de basquete, estamos discutindo sobre basquete, quer dizer,  minha vida é direcionada ao basquete. Então quando eu parar de jogar, tenho que continuar no esporte.

Orlando de Almeida: Hortência, você tinha dois sonhos. Um deles é a Olimpíada.

Hortência: Que eu vou realizar daqui a um mês.

Orlando de Almeida: O segundo é um filho, que você está projetando para 1993. Talvez esse seja o termômetro de uma parada, pelo menos [por] nove meses?

Hortência: É, mas eu vou continuar treinando, vou continuar treinando.

Jorge Escosteguy: Você fez um acordo entre a mulher e a jogadora para ter esse filho? [risos]

Hortência: Não, a minha vida não é um disquete, como se fosse um computador. Algumas coisas você tem que programar, como, por exemplo, ter filho. De resto, as coisas vão acontecendo naturalmente, não me programo. Pode ser que eu pare, mas eu não posso falar para vocês, com certeza, porque eu não sou um computador, eu não sei.

Lia Benthien: Quer dizer, o filho não vai te fazer parar com o basquete?

Hortência: Não, de jeito nenhum. Filho não é uma coisa que incomoda, vem para te dar prazer, te satisfazer.

Alex Solnick: Hortência,  você disse que o governo está destruindo o esporte no Brasil, não é?

Hortência: Não, ele não está destruindo, mas também não ajuda como deveria.

Alex Solnick: Você votou no presidente Collor, não é?

Hortência: Votei.

Alex Solnick: E ele não está cumprindo o que você esperava que ele cumprisse?

Hortência: [tosses] Desculpe, eu engasguei. [risos]

Oldinei Edson: Está nervosa?

Jorge Escosteguy: Você engasgou porque está nervosa ou foi a pergunta que te engasgou? [risos]

Alex Solnick: A imagem que tinha dele, ao votar nele, ficou arranhada pelas denúncias do irmão ou ele é o mesmo para você?

Hortência: Olha, a gente nunca sabe até que ponto as coisas são verídicas. Você vê, a imprensa noticia, fala e depois você não sabe "no que deu". Você vê o caso do Magri [Antônio Rogério Magri, ex-ministro do Trabalho do governo Fernando Collor de Mello, foi processado por corrupção], um cara que desviava verba da Apae [Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais], das pessoas, 200 milhões, o que aconteceu? A gente não sabe, você não vê a pessoa sendo punida aqui no Brasi. Agora, esse caso do PC [PC Farias], não sei, será que é verdade tudo isso que está acontecendo? Vamos esperar para ver.

Alex Solnick: Mas, para você, arranhou a imagem dele?

Hortência: Eu votei no Fernando Collor, acho que a imagem dele caiu muito depois disso. Agora, eu quero provas, eu quero ver. Por incrível que pareça, eu não deixo de ter confiança nele, eu não sei porquê, até que me provem ao contrário, enquanto não me provarem, eu não posso falar mal dele, porque não sei o que é. Ele nunca me fez nada, nem a favor e nem contra, mas eu não sei, eu ainda acredito nele.

Oldinei Edson: E a reação do povo com relação a isso, Hortência? O país quer discutir se o Paulo César [PC Farias] é culpado ou não na história.

Hortência: Eu acho que o país está muito desacreditado, os políticos estão totalmente desacreditados, então o povo não sabe o que fazer, não sabe o que pensar. O povo quer trabalho e não tem trabalho, o povo só vê denúncias na televisão e nada se faz para isso melhorar. Uma vez estoura o caso da Zélia, outra vez estoura o caso do Magri, agora é o PC, amanhã é o quê? Com tudo isso, o povo fica meio bobo, sem saber o que está acontecendo no país. Agora vem a Eco 92, que o povo não sabe o que é, é uma coisa atrás da outra. Por isso que o pessoal fala: "O brasileiro não tem memória". Mas também, haja memória para lembrar de tudo que acontece!

Joyce Pascowitch: Hortência, mudando um pouco de assunto, como é para você carregar a fama? Quero dizer, como que é em relação ao teu marido, já que é muito mais famosa do que ele no mundo inteiro? E o que você faz para "segurar a barra", análises, psicanálise, terapia? Porque não é fácil...

Hortência: Não, não faço análise, não faço nenhum tipo de tratamento, porque, na realidade, eu não me sinto uma estrela, me sinto uma pessoa normal.

Joyce Pascowitch: Mas você tem noção da sua fama?

Hortência: Não tenho. Às vezes eu saio na rua e as pessoas começam... Eu fico assustada e falo “Gente!”.

Jorge Escosteguy: Você acha que estão confundindo você com algum parente dela? [risos]

Hortência: Eu não tenho noção. Você sabe outro dia fui ao hospital ver a minha mãe, que estava internada. Foi tão engraçado porque um velhinho, que estava lá e viu um monte de gente em volta de mim pedindo autógrafo, falou: "Será que é alguma cantora?” [risos]. Eu achei uma gracinha, aí disseram a ele que era a jogadora. Mas eu não tenho noção, porque não paro para pensar sobre esse assunto.

Alex Solnick: Hortência...

Joyce Pascowitch: E em relação ao teu marido?

Hortência: Eu não tenho nenhum problema.

Joyce Pascowitch: É fácil?

Hortência: Pelo contrário, ele sente o maior orgulho de eu ser a esposa dele,  me fala isso sempre, e eu falo: "Quero ver quando eu parar de jogar". Ele diz: “Você pode parar já, quando você quiser".

Alex Solnick: Hortência, quando estão jogando, vocês se xingam, como no jogo de homem e tal? Como vocês [agem] dentro da quadra?

Hortência: As meninas ou as adversárias?

Alex Solnick: Não, vocês. Você xinga sua colega, que errou o passe?

Hortência: Não.

Alex Solnick: Como em um jogo [entre] homens...

Hortência: Não.

Alex Solnick: Vocês não cobram uma da outra?

Hortência: É muito difícil. Às vezes você fala um pouco mais alto, grita, porque é o clima da partida, mas brigas faz muito tempo que não há.

Alex Solnick: Cobranças?

Hortência: Não, não.

Marco Antonio Sabino: Ninguém puxa o cabelo uma da outra?

Hortência: Por enquanto nunca teve.

Silvio Luiz: O que, no seu modo de ver, aconteceu de errado nessa delegação?

Hortência: Nada.

Silvio Luiz: Nada, tudo zero?

Hortência: Você sabe por quê?

Silvio Luiz: Eu digo porque você disse que a imprensa falou tanta coisa...E eu não estive lá, não estive com o Luciano [Luciano do Valle, jornalista e locutor esportivo] ainda, então o que ocorreu de errado? Faltou comida? Porque geralmente o jogador reclama que o hotel era ruim, que o ônibus tinha o banco furado, que a mala não tinha alça. O ambiente ficou legal, vocês que perderam e se acertaram?  Você acha que, se esse ambiente for repetido na Espanha, vocês ganham uma medalha?

Hortência: Esse ambiente está sendo repetido há muito tempo. Desde que essas meninas foram reunidas, esse mesmo grupo - tiraram algumas jogadoras - ficou muito positivo. A Maria Helena, que é uma grande técnica, sabe unir muito a equipe.

Silvio Luiz: Ela é boa de banco?

Hortência: Isso quem tem que dizer são vocês, eu tenho a minha opinião e já disse isso a ela. Se eu não aprovasse a Maria Helena, não estava na Seleção Brasileira agora, porque eu não participo de coisas que não concordo.

Silvio Luiz: O grupo é homogêneo, simpático. Quando alguém desse grupo não está se afinando, como vocês fazem para que essa peça seja retirada do conjunto? 

Hortência: A gente não retira, a gente conversa com a pessoa.

Jorge Escosteguy: Ou enquadrar?

Alex Solnick: Aquele episódio da jogadora que denunciou o homossexualismo atrapalhou vocês?

Hortência: Não.

Alex Solnick: Se eu não me engano, chamava...

Hélio de Alcântara: Edna.

Alex Solnick: Edna!

Marco Antonio Sabino: É quando saíram algumas garotas, como você falou...

Hortência: [interrompendo] É, algumas...

Marco Antonio Sabino: Isso atrapalhou?

Hortência: Não, algumas garotas não. Veja bem, da minha geração só tem eu e a Paula. Várias jogadoras foram trocadas.

Silvio Luiz: Quase todas?

Hortência: E, de repente, formou-se um grupo ótimo, [composto] por essas 12 jogadoras. Tanto é que a Maria Helena não vai convocar mais ninguém, vão ficar essas mesmas.

Marco Antonio Sabino: Antes não era ótimo, Hortência?

Hortência:  Não, era mais ou menos, eu não sei se é porque nós amadurecemos muito. Hoje eu tenho 32 anos, antes eu tinha 16.

Alex Solnick: Mas nos jogos de Cuba...

Marco Antonio Sabino: Não teve, Hortência...

Jorge Escosteguy: Por favor, desculpem, mas é um de cada vez.

Alex Solnick: Aquele episódio não teve alguma influência?

Jorge Escosteguy: Deixa ela responder.

Marco Antonio Sabino: É que ela não respondeu.

Hortência: Eu vou responder!

Jorge Escosteguy: Ela está respondendo. Por favor, senão ninguém escuta.

Hortência: Hoje nós amadurecemos muito e deixamos algumas coisas imbecis, idiotas, para trás. Resolvemos nos unir e vamos jogar. A equipe ficou ótima, a Maria Helena formou um grupo bom, assim ficou muito mais fácil para trabalhar. Hoje em dia você tem prazer em estar na Seleção Brasileira. O caso da Edna, por que aquilo iria atingir a gente? Aquilo não é verdade, eu não me senti atingida, ninguém se sentiu atingido, entendeu? Então, por que vamos ligar para uma menina que foi infeliz, que deu uma declaração em hora errada, estava nervosa, falou besteira? Imagina! Os nossos objetivos eram muito mais importantes do que esse tipo de coisa, fofoca. Imagina se nós [estávamos] preocupados se estava acontecendo alguma coisa com o juiz, com os dirigentes, com o técnico ou não sei quem? Nós somos doze jogadoras, Maria Helena, Heleninha, a fisioterapeuta, a médica e o nosso preparador físico. Nós nos fechamos para aquilo, meu marido me ligava, ele nem no hotel ficou comigo, ia lá assistir ao jogo e eu o encontrava na quadra. Quer dizer, nós nos fechamos para tudo.

Alex Solnick: Quais são as coisas imbecis que vocês faziam e não estão fazendo mais?

Hortência: Coisa "bestas" de clube que a gente levava para a Seleção Brasileira, aquela rivalidade que existia entre uma equipe e outra.  

Marco Antonio Sabino: Você e a Paula, por exemplo?

Hortência: Não, eu e a Paula não, nunca tivemos nenhum tipo de problema. Mas existia aquela coisa de menininha, por exemplo, a imprensa noticiava o time que iria ganhar, a rivalidade que começou a [existir] entre o meu time e o time da Paula. Isso aí era levado e agora não existe mais.

Lia Benthien: Hortência, é sempre você e a Paula, "porque a Hortência e a Paula foram para o banco", sempre os problemas são em torno de vocês.

Hortência: Mas não teve problema. Quem fez os problemas foram os repórteres que vieram [nos] questionar. Eu não tive nenhum problema com a Maria Helena, e nem a Paula!

Lia Benthien: Se a Seleção teoricamente hoje tivesse três Hortências e duas Paulas, ela seria provavelmente imbatível?

Hortência: Eu ficaria muito triste se [a Seleção] tivesse três Hortências e três Paulas.

Lia Benthien: É que em toda partida, vocês dão um pouco mais do que o resto do grupo, até pelas limitações técnicas etc. Isso não incomoda em uma derrota, por exemplo, [sabendo] que se todo mundo tivesse no mesmo nível talvez o time tivesse vencido?

Hortência: Olha, eu ficaria muito triste se fossem três Hortências. Eu não quero dividir o meu espaço com ninguém [risos]! Eu tenho o meu espaço e quero muito que a Janeth [exemplificando, com a citação da jogadora Janeth Arcain, sua colega na Seleção] também ocupe o espaço dela, eu quero que amanhã vocês falem “A Janeth é a melhor jogadora do Brasil”, e não a segunda Hortência, ou a terceira Paula, entendeu? Eu quero que todas conquistem o que eu conquistei, todas são boas jogadoras, por exemplo, a Janeth. Hoje eu e a Paula temos um pouco mais de responsabilidade sobre a equipe, porque somos duas veteranas. A Helen é a mais nova. Quando eu entrei na Seleção Brasileira, éramos todas novas, e eu não tive, por exemplo, uma Hortência ou uma Paula, como hoje a Helen tem, para me orientar em um momento de desespero dentro da quadra. Eu aprendi "tomando pancada", entendeu? Eu quero que a Helen seja a melhor jogadora do Brasil, a melhor jogadora do mundo, e não que ela queira ser uma Hortência. Ela pode se espelhar em mim, mas eu quero que seja sempre ela.

Lia Benthien: Você não vai ter tempo, por exemplo, de esperar que a Helen seja a melhor jogadora do Brasil para jogar com uma das melhores jogadoras do mundo, que é você, e fazer não uma dupla, mas um trio.

Hortência: Eu acho que todas são muito importantes nessa Seleção Brasileira. Por exemplo, quando nós estávamos jogando contra Cuba na final do campeonato Pan-Americano, [todos] se preocuparam tanto comigo e com a Paula, que a Janeth foi lá e "arrebentou" com o jogo. E o que aconteceu? Tiveram que se preocupar com a Janeth, isso abriu o jogo para mim e para a Paula. Quer dizer, isso que é importante! É importante não só aquela jogadora que faz a cesta, mas também a Marta [Sobral], que faz um bom bloqueio para eu fazer meu arremesso de três pontos livre, importante é a Paula que faz um bom passe, para que eu possa fazer uma bandeja [arremesso em movimento que pode ser feito com passe ou driblando], importante é a Vânia Hernandes, que é uma grande guerreira e pega todos os rebotes de ataque, uma das melhores reboteiras de ataque da competição. Nós damos muito valor à Vânia Hernandes, à Helen, que é uma jogadora nova, que está começando agora.

Alex Solnick: Hortência, além de não gostar que a imprensa diga que há uma segunda Hortência etc, o que mais você não gosta que a imprensa diga?     

Hortência: Não, pode falar o que quiser, não estou dizendo que eu não goste que fale que uma menina vai me substituir. Pelo contrário, eu tenho orgulho das pessoas quando falam "nossa, essa menina se parece com a Hortência". Imagina, eu tenho o maior orgulho! O que eu não quero é que ela tenha a responsabilidade de jogar como eu. Quando tiver minha filha, não quero que ela seja  jogadora de basquete, a não ser que ela queira.

Alex Solnick: Eu pensei que você ia falar jornalista...

Hortência: Não, imagina! Eu não tenho nada contra jornalista.

Alex Solnick: Você gosta?

Hortência: No início da entrevista eu disse que vocês são fundamentais para nós.

Alex Solnick: Você deve ter alguma queixa, claro.

Hortência: Nenhuma.

Alex Solnick: Que tipo de queixa você tem?

Hortência: Vocês podem falar o que quiserem desde que falem aquilo que falei, que publiquem aquilo que realmente falei.

Marco Antonio Sabino: Hortência, se a gente pode falar o quiser, a Joyce tocou no assunto sexo e eu queria voltar nele. Eu assisti a uma entrevista de vocês, depois de Cuba [refere-se aos Jogos Pan-Americanos], e vocês falavam das paqueras durante a concentração, antes dos jogos. A Marta contou um caso, inclusive. Como é esse ambiente de concentração, quando há uma competição grande, por exemplo, uma Olimpíada, com outros atletas do sexo oposto? Acontecem flertes, casos, conta um pouco para a gente?

Hortência: Isso é uma grande união. Eu adoro ambiente de concentração, principalmente de Pan-Americano. Olimpíada, eu nunca fui. O que aconteceu, por exemplo, no Pan-Americano, como você falou, foi que depois [da competição], ficamos cinco dias na Vila Olímpica sem fazer nada. Já estávamos com a medalha de ouro pendurada no pescoço. Somos muito profissionais, até a competição somos inteiramente do basquete, 24 horas por dia. Acabou a competição, aí você faz o que você quiser.

Marco Antonio Sabino: O José Victor não fica com ciúme?

Hortência: Não, ele confia em mim.

Hélio de Alcântara: Hortência, o que você acha da aids?  É uma doença que veio para que as pessoas mudem sua postura em relação ao sexo?

Hortência: Claro que não. As criancinhas têm algo a ver com isso? Quer dizer, eu não acho que isso veio para atingir...

Hélio de Alcântara: [interrompendo] O que você acha dessa doença?

Hortência: Eu acho que o amor é uma coisa tão bonita...

Jorge Escosteguy: Até que ponto a aids te preocupa?

Hortência: Olha, se eu falar para você que não me preocupa, eu estou mentindo, porque eu posso sofrer um acidente amanhã e ter que ir em um hospital, me aplicarem um...

Hélio de Alcântara: Transfusão.

Hortência: ...sangue contaminado. Eu tenho medo, está certo? Agora,  as pessoas, por exemplo, homossexuais ou drogadas - que formam um índice maior [de infectados] hoje - que tomem cuidado. Se você tomar cuidado, pode fazer o que quiser na sua vida, desde que tome todas as providências cabíveis.

Jorge Escosteguy: Mas quando eu falo preocupação, digo como cidadã e pessoa pública, ou seja, se você acha que tem ou não algum tipo de contribuição para dar em uma campanha de esclarecimento, de combate à aids.

Hortência: Sim, eu estou sempre à disposição para ajudar nesse aspecto. O brasileiro precisa ser mais esclarecido, existe uma campanha, mas que não esclarece muito. Outro dia eu estava vendo a matéria de uma mulher que não tem televisão, porque não tem energia na casa dela, não tem água, então ela pega água do rio. O tema era vibrião da cólera. Ela não sabe nem o que é isso, imagina se ela vai saber o que é aids!

Oldinei Edson: Com relação à aids, em algum momento você já sentiu vontade de  fazer um exame? Se é que fez, eu não sei...

Hortência: Eu já fiz.

Oldinei Edson: Ah, você já fez o exame?

Hortência: Já, eu fiz há uns cinco meses.

Oldinei Edson: Por que você fez?

Hortência: Porque... ah, porque eu não sei com quem eu saí há seis ou sete anos!

Oldinei Edson: O teu marido também fez?

Hortência: Eu não sei.

Oldinei Edson: Você não sabe? [risos]

Hortência: Não sei.

Jorge Escosteguy: Você acha que ele deveria fazer?

Hortência: Se ele sentir que tem que fazer, sim. Se ele sentir que não tem necessidade, não.

Marco Antonio Sabino: Você emagreceu, Hortência? [risos]

Alex Solnick: Você vê alguma relação entre...

Hortência: Deixa só eu responder porque eu fiz, eu acho importante senão daqui a pouco vão falar que eu estou com aids. [risos]

Hortência: Eu fiz  porque eu quero ser mãe, então estou fazendo exame de sangue e vários outros.

Oldinei Edson: O pai, o marido também deveria seguir esse caminho?

Hortência: Eu acho que ele está fazendo também.

Oldinei Edson: Vocês não conversam muito sobre isso?

Hortência: Não, o Victor faz muitos exames, é super preocupado, eu acho que ele já fez sim exame de aids. E deu negativo, viu?

Alex Solnick: Alguma relação entre aids e homossexualismo? Quer dizer, você acha que diminuindo o homossexualismo, diminui a incidência da doença?

Hortência: Não.

Alex Solnick: E você tolera ou condena o homossexualismo?

Hortência: Não, não tenho nada contra homossexualismo. Cada um escolhe o seu parceiro, é uma coisa tão íntima, cada um faz aquilo que quer da sua vida, leva para sua cama quem bem quiser.

Alex Solnick: Mas você acha que o número de homossexuais aumenta [a incidência da aids], você vê alguma relação?

Hortência: Não, não vejo porque a aids não é do homossexual, é de todos nós, todos estão sujeitos a pegar, seja por transfusão de sangue...

Oldinei Edson: [interrompendo] Você entraria na quadra com Magic Johnson [um dos principais jogadores de basquete do mundo, armador do time Los Angeles Lakers, da NBA (National Basketball Association). Quando soube que era portador do vírus HIV, teve que abandonar a carreira], por exemplo?

Hortência: Entraria.

Oldinei Edson: Não teria problema nenhum?

Hortência: Não tenho esse preconceito.

Jorge Escosteguy: Muito por alto, em relação ao incidente com a Edna, a impressão que se tem é que houve uma mistura de informação e preconceito, ou seja, quando ela fez a denúncia, disse que foi cortada porque os critérios de cortes seriam critérios não apenas técnicos, mas também ligados ao homossexualismo. Na Seleção, a reação das pessoas não foi dizer que os critérios eram técnicos. As reações das pessoas, aparentemente, foi de condenar e dizer "Não, aqui não existe homossexualismo". Isso é um certo tipo de preconceito, ou seja, a resposta deveria ser o critério foi técnico e ponto. Se existe homossexualismo ou não, é outro problema.

Hortência: Não, nossa reação foi de não responder.

Jorge Escosteguy: Por quê?

Hortência: Porque nós não tínhamos nada a ver com aquilo, não nos atingiu em nada.

Alex Solnick: Alguma coisa tinha a ver, uma moça da Seleção, do grupo, que disse uma coisa...

Hortência: Veja bem, ninguém perguntou para mim se ela tinha sido cortada por critérios técnicos.

Jorge Escosteguy: Sim, mas ela disse que no grupo havia homossexualismo, e as pessoas...

Hortência: Eu achava que não havia.

Jorge Escosteguy: ...em vez de se revoltarem contra o fato da acusação e dizer que foi técnico.

Hortência: Mas que pessoas são essas que você está falando?

Jorge Escosteguy: As pessoas da Seleção que se manifestaram sobre isso.

Hortência: Não existiu isso, ninguém se revoltou contra ela, não teve revolta, porque aquilo não nos atingiu.

Alex Solnick: E vocês ignoraram a revelação dela?

Hortência: Ignoramos. Gente, a coitada ficou louca.

Alex Solnick: Quer dizer, uma espécie de desprezo. Vocês desprezaram a declaração dela?

Hortência: Nós não desprezamos, porque ela já não estava entre nós, já estava fora, quer dizer, nós continuamos nossa luta.

Lia Benthien: Mas vocês tinham um bom relacionamento com a Edna enquanto ela estava na Seleção?

Hortência: Tínhamos, por isso que quando nós lemos aquela entrevista, nos perguntamos o que estava acontecendo.

Alex Solnick: E hoje, o relacionamento é bom?

Hortência: Nós queríamos saber o que tinha acontecido com a Edna. Agora, eu não sei se isso existe na Seleção Brasileira ou não, porque eu não sei da vida íntima de todas, eu acho que isso é um problema mundial... Problema não, desculpa, eu acho que isso existe no mundo inteiro. O que as pessoas fazem fora da quadra, é problema delas. Na Seleção Brasileira, não existe. O que existe é um respeito muito grande comigo, que sou casada, com o meu marido, com as meninas, com a Adriana [jogadora], que mora com o namorado dela.

Marco Antonio Sabino: Você nunca recebeu cantada de uma mulher?

Hortência: Não, na Seleção Brasileira, nunca.

Hélio de Alcântara: No basquete sim?

Marco Antonio Sabino: Onde você recebeu?

Jorge Escosteguy: E fora da Seleção?

Hortência: Gente, eu recebo cartas de fãs que eu não conheço, é muito difícil uma mulher nunca ter sido assediada por outra. [risos]

Alex Solnick: Pessoalmente?

Hortência: Não, eu acho que elas têm até um pouco de medo de chegar perto de mim.

Jorge Escosteguy: Por favor, um minutinho, que o Silvio Luiz quer fazer uma pergunta.

Silvio Luiz: Muito obrigado. Hortência, o governo está fazendo uma força desgraçada, falando uma palavra bem popular, para que as Olimpíadas do ano 2000 sejam realizadas em Brasília. E você acabou de dizer que estava vendo uma entrevista de uma senhora na televisão e que ela não tinha água, não tinha luz, não tinha esgoto.

Hortência: Não sabia nem o que era cólera.

Silvio Luiz: Você acha que o governo deve investir tanto dinheiro para se fazer uma Olimpíada em Brasília?

Hortência: É claro que ele tem que investir no ser humano, investir na saúde. Agora, eu vou defender a minha profissão. No início, eu até recebi essa notícia e falei: "poxa, será que vai dar certo?". Até que eu estava aplaudindo, se eles trabalhassem o atleta para o ano 2000. Eu acho que são oito anos, da época que eles anunciaram até o ano 2000. Faz um ano e meio que eles anunciaram isso?

Silvio Luiz: Eles estão muito afoitos, deve ter alguém, algum "rolo" nisso aí, o que estão fazendo de força é brincadeira, viu?

Hortência: É, há uns dois anos eles começaram a falar dessa Olimpíada e eu já era contra. Eles teriam dez anos para  investir em um atleta aqui no Brasil. Ao passar esse tempo, vejo que eles não fazem nada,  então eu sou contra. Sou contra porque você vai fazer uma Olimpíada no nosso país, que está vivendo uma dificuldade tremenda, um país do Terceiro Mundo, que não tem dinheiro nem para dar o que comer para os aposentados, vai fazer uma Olimpíada, gastar uma fortuna? E os atletas, quem vai defender o Brasil daqui oito anos, quem vai defender o Brasil?

Silvio Luiz: Não há reposição.

Hortência: Nós vamos fazer festas... Não está tendo renovação [de atletas], quer dizer, nós vamos fazer festas para eles? Toda hora em que tocar hino, você vai ouvir só o dos Estados Unidos, da CEI [Comunidade dos Estados Independentes]. O hino do Brasil você não vai ouvir, não será tocado nunca.

Oldinei Edson: Uma Copa do Mundo na Itália dá lucro para o país, uma Olimpíada nos Estados Unidos dá lucro para o país. Então, não realizar uma Olimpíada no Brasil é porque não se tem ninguém competente para fazer dar lucro aqui também?

Hortência: Mas que lucro?

Oldinei Edson: Lucro financeiro, dinheiro para o país.

Hortência: Mas você não vai ter que investir?

Jorge Escosteguy: Turismo, visitantes, etc.

Jorge Escosteguy: Dólares, divisas.

Hortência: E esse dinheiro vai ser investido em quê?

Oldinei Edson: No próprio país.

Hortência: Ah é?

Oldinei Edson: Não sei, no esporte, enfim.

Hortência: Ah então está bom. Então está certo, eu não sabia que iam investir esse dinheiro.

Oldinei Edson: Se der lucro para o país, você acha que deveria ser realizado assim?

Hortência: Não acho.

Oldinei Edson: Acha que não?

Hortência: Que lucro para o país? Eu acho que esse dinheiro terá que ser investido no ser humano, não é dar lucro, terão que investir na saúde. Será que as pessoas só visam dinheiro? Será que investir em um atleta para o futuro não é um lucro?

Jorge Escosteguy: Partindo desse princípio, Hortência, nós não deveríamos mandar ninguém às Olimpíadas de Barcelona, porque custa muito dinheiro. Mandar vocês para Vigo custou muito dinheiro.

Hortência: Mas não [dinheiro] do governo. Desculpe-me, mas não é do governo.

Jorge Escosteguy: Mas custa dinheiro.

Hortência: Esse dinheiro é da iniciativa privada.

Jorge Escosteguy: Um dinheiro que podia ser investido em outro lugar.

Hortência: Não é do governo.

Jorge Escosteguy: Mas a iniciativa privada também pode estar envolvida.

Hortência: Não é dos aposentados, não é da saúde, não é dinheiro que eles teriam que investir em outras coisas.

Jorge Escosteguy: Mas a iniciativa privada também estaria envolvida na organização de uma Olimpíada?

Hortência: Mas investindo na realização do quê?

Jorge Escosteguy: Da infra-estrutura da Olimpíada.

Hortência: E por que, ao invés dessa infra-estrutura, a iniciativa privada não faz outra coisa?

Jorge Escosteguy: Hortência...

Hortência: Investe em um atleta!

Jorge Escosteguy: Essa pergunta eu fiz para você. Por que não pega esse dinheiro de Vigo e investe em saúde e educação? [ironizando]

Hortência: Porque não é do governo, não é do governo.

Oldinei Edson: Lógico que é, se não é para o Brasil...

Hortência: Esse patrocinador não é o governo. Ele investe em outras coisas, não tem obrigação de investir na saúde, a obrigação da saúde é do governo, não da empresa.

Oldinei Edson: Que anúncio estava na camisa da Seleção Brasileira?

Hortência: Telebrás [Telecomunicações Brasileiras S. A., empresa estatal que centralizava todas as prestadoras de serviços telefônicos no Brasil. Foi privatizada em 1998].

Jorge Escosteguy: E de quem é o dinheiro?

Oldinei Edson: E a Telebrás é do...

Jorge Escosteguy: Inclusive, é uma empresa que tem monopólio, não tem concorrência para precisar fazer publicidade.

Hortência: Isso já não é problema meu.

Jorge Escosteguy: Mas você disse que não participa de uma coisa que você não concorda?

Hortência: Do quê?  

Jorge Escosteguy: O governo está usando o dinheiro da Telebrás, que é do governo e que poderia ser utilizado em saúde, educação. E eu acho justo ele patrocinar uma equipe brasileira de basquete, como foi agora.

Hortência: O Banco do Brasil também patrocina o voleibol...bom, aí você tem que perguntar para o governo, não para mim.

Jorge Escosteguy: Está certo. Nós vamos fazer um rápido intervalo e voltamos daqui a pouco, entrevistando hoje a atleta da Seleção Brasileira Feminina de Basquete, Hortência.  Até já.

[intervalo]

Jorge Escosteguy: Voltamos com o Roda Viva, que hoje entrevista Hortência, atleta da Seleção Brasileira Feminina de Basquete. Hortência, estou com um exemplar da revista Superinteressante, cuja matéria de capa é "Olimpíada: o doping leva à medalha de ouro" [refere-se à edição 57, de junho de 1992]. Diz aqui: "novas substâncias usadas para melhorar artificialmente a performance de atletas não serão detectadas pelos testes realizados em Barcelona 92. A fraude pode levar à medalha de ouro". Até que ponto você acha que há, especificamente no basquete feminino, o uso de doping pelas atletas, brasileiras ou estrangeiras? Enfim, isso preocupa os brasileiros?

Hortência: Olha, nem no basquete feminino e nem no masculino nós nos preocupamos. O atleta brasileiro nunca usou esse tipo de...

Jorge Escosteguy: Não, mas eu não digo especificamente no caso de Barcelona, pois disseram aqui que, de repente, em Barcelona vai levar medalha de ouro quem for dopado. Ou seja, a Seleção Brasileira Feminina pode ser prejudicada por outras seleções?

Hortência: Eu acho que não.

Jorge Escosteguy: Você acha que as outras seleções têm atletas com desempenho estranho, acima do normal?

Hortência: Eu acho que não, [os atletas] mais prejudicados [são] do atletismo, esportes mais individuais, como a natação. No esporte coletivo entra um outro aspecto, que não é só a parte física, mas a inteligência da pessoa, ter capacidade para estar ali jogando. Não adianta eu ser dopada, se eu não estiver pensando o que fazer na hora, pois o outro grupo pode ser melhor. Mas eu acho que se lá tem doping, eles vão detectar. Pode ser alguma substância que...

Jorge Escosteguy: Eles falam em substâncias novas que...

Hortência: É, pode ser.

Jorge Escosteguy: Não dá para detectar atualmente?

Hortência: Por exemplo, a gravidez antigamente era considerada doping e agora não será mais.

Jorge Escosteguy: Por quê?

Hortência: Porque a mulher, quando fica grávida, tem um aumento hormonal muito grande no organismo, fica muito mais forte [a gravidez provoca um doping natural porque aumenta a taxa de hemoglobina, o que implica no aumento da capacidade aérobica do atleta] Então, o que elas faziam? Ficavam grávidas. Com um mês de gravidez, elas abortavam e iam competir, pois ainda estavam com aqueles hormônios. Hoje, para irmos às Olimpíadas ou ao Pré-Oímpico, temos que fazer teste de gravidez.

Jorge Escosteguy: Para evitar esse problema?

Hortência: Sim, se você está grávida [durante a competição], isso é doping.

Jorge Escosteguy: Joyce Pascowitch, por favor

Joyce Pascowitch: Hortência, você já falou sua opinião sobre o Fernando Collor. Agora eu queria saber, politicamente falando, sobre sua posição. Você tem simpatia por algum partido, em especial? E hoje em dia, [pensando nos] políticos que estão no Congresso [Nacional], governadores, quem você acha que daria um bom presidente da República?

Hortência: Olha, eu não tenho partido.

Joyce Pascowitch: Nem simpatia?

Alex Solnick: E essa estrela nos brincos? [refere-se aos brincos, em formato de estrela, que atleta está usando durante a gravação. O entrevistador faz alusão ao símbolo do Partido dos Trabalhadores]. [risos]

Hortência: Não, essa aqui é a estrela de quando eu fui campeã do mundo. Eu acho bonito, você não acha bonito? [risos] Eu não tenho partido, eu voto no candidato, independente do partido. Se ele for uma pessoa capaz, competente, eu voto nele.

Joyce Pascowitch: E quem é competente hoje em dia para você?

Hortência: Está muito difícil, mas eu vou dizer o nome de um grande governador, que é o Fleury. Eu gosto muito dele.

Hélio de Alcântara: Hortência, você acha que tem consciência da...

Hortência: [interrompendo] E não sou PMDB [Partido do Movimento Democrático Brasileiro] nem nada, hein!

Hélio de Alcântara: Você tem consciência da dimensão das tuas palavras, quer dizer, sendo uma pessoa muito famosa no Brasil, você acha que consegue influenciar milhares de pessoas? Você opinou sobre determinado assunto, inclusive política.

Hortência: Eu acho que influencia, mas não deveria, por isso que eu não apoio nenhum candidato, eu acho que as pessoas não podem ser influenciadas por ninguém. Não é porque um conjunto de rock toca em uma campanha política, que você vai lá e vota, entendeu? Não é porque a Hortência está falando de um determinado político que você tem que acreditar, porque, às vezes, eu estou sendo paga para isso, eu estou sendo paga.

Jorge Escosteguy: Quando você faz a propaganda de algum produto, você não está influenciando as pessoas para que comprem esse produto?

Hortência: Mas o produto é diferente. Agora, um presidente da República...

Jorge Escosteguy: Alguns produtos podem fazer tão mal quanto um presidente da República.

Hortência: Não, pelo contrário.

Hélio de Alcântara: Aí você está sendo paga para fazer [comercial de] um produto. [aponta para o boné de Hortência]

Hortência: Eu estou fazendo um comercial, um merchandising do Leite Moça, e qualquer pessoa pode...porque eu assino embaixo, entendeu? Mas, já me chamaram para fazer campanha de bebida alcoólica e eu não fui.

Jorge Escosteguy: Do que você não faria ou não faz comercial?

Hortência: De bebida alcoólica e de cigarro, porque eu acho que isso aí sim, você pode matar uma pessoa. Agora, do que mais  eu poderia fazer comercial e que faria mal para alguém? É, um político pode fazer mal para um Brasil inteiro, para a nação inteira.

Alex Solnick: Hortência, você votaria em Pelé para presidente?

Hortência: Por que, ele é candidato?

Alex Solnick: Não, porque toda vez ele fala que um dia será.

Hortência: Se um dia ele for candidato, eu vou pensar, mas enquanto ele não é, eu gostaria de não responder.

Marco Antonio Sabino: Aproveitando, Pelé foi um jogador que marcou o futebol brasileiro. Depois o futebol entrou em crise, quer dizer, não havia ninguém para substitui-lo. A Hortência hoje é o Pelé do futebol, do basquete brasileiro. Você acha que o basquete vai entrar em crise depois da Hortência e da Paula?

Hortência: Eu acho que não, eu espero que não.

Marco Antonio Sabino: Você acha que, ao contrário, isso ajuda?

Hortência: Eu acho que temos a Janeth, Vânia, Helen, Adriana, Marta, muitas jogadoras que estão nascendo e que, de repente, quando sairmos,  vão ocupar o lugar e serão elas mesmas, vão "segurar as pontas".

Lia Benthien: E depois delas?

Hortência: Ah eu não sei, estamos vendo aí [aponta para a platéia no estúdio], as meninas estão chegando.                    .

Lia Benthien: Você acha que a gente tem staff depois delas também?

Hortência: Graças aos nossos patrocinadores, ao time da Ponte Preta, ao Leite Moça de Sorocaba, estamos lutando para trazer jogadoras novas, como as que estão aqui agora.

Orlando de Almeida: O projeto Zico [projeto de incentivo ao esporte, criado pelo jogador de futebol Zico, com apoio do governo], que foi aprovado recentemente, pode ser uma ajuda também?

Hortência: Você falou o quê?

Orlando de Almeida: O projeto Zico.

Hortência: Eu acho que seria ótimo se fosse aprovado.

Orlando de Almeida: Já foi aprovado.

Hortência: Ah, já foi aprovado?

Orlando de Almeida: Mas com algumas mudanças.

Hortência: Essa mudanças é que são os problemas...Mas eu acho que seria ótimo, muitas coisas devem mudar na Lei do Esporte. Eu acho, por exemplo, que os clubes deveriam votar para presidente da CBF [Confederação Brasileira de Futebol], da Confederação e não...

Jorge Escosteguy: Você acha que os clubes deveriam virar empresas, como é na Itália?

Hortência: Eu acho. Nós precisamos sempre evoluir, subir na vida. Se isso deu certo lá, por que não fazer aqui?

Lia Benthien: Agora, se você tem consciência de que essas coisas precisam mudar e de que você exerce uma influência muito grande em cima do povo, por que não utiliza isso para fazer uma campanha sobre o que você considera importante?

Hortência: Campanhas...por exemplo?

Lia Benthien: Para conscientização da aprovação do projeto Zico.

Hortência: Eu faço, falo todas as vezes que me perguntam. Eu não posso, por exemplo, comprar um horário na televisão e  falar sobre isso. Agora, sempre que me procuram, eu oriento, falo aquilo que penso, para ver se as coisas mudam, mas é difícil.

Alex Solnick: Hortência, todos esses problemas do Brasil, isso reflete na imagem que o Brasil tem lá fora, você sente orgulho de representar o Brasil quando você joga?

Hortência: Eu sempre vou sentir, independente de qualquer problema, eu sempre vou ser muito brasileira. O Brasil pode estar em guerra, eu vou sempre ter orgulho de vestir a camisa do meu país.

Alex Solnick: Vocês são bem tratadas como brasileiras?

Hortência: Nós somos. Quando estamos em uma delegação, confesso que somos bem tratadas. Agora, quando estamos viajando...

Jorge Escosteguy: Não oficialmente.

Hortência:...não oficialmente, eu sinto um pouco de discriminação quando você é brasileiro.

Jorge Escosteguy: Que tipo de discriminação, Hortência?

Hortência: Quando você entra em uma loja, eles ficam sempre muito preocupados. Acham que brasileiro gosta de fazer bagunça, [falam] dos políticos do país, que o país é uma brincadeira...

Jorge Escosteguy: E você diz o quê para as pessoas?

Hortência: Ah, eu fico louca, vou falar o quê?

Marco Antonio Sabino: Você nega?

Hortência: Há coisas que são verdadeiras, então não posso negar.

Silvio Luiz: Alguma vez você, como turista, deu uma nota de cem dólares e o cara examinou?

Hortência: Sempre.

Silvio Luiz: Sempre, não é?

Hortência: Até aqui no free shop do nosso país.

Orlando de Almeida: Falando sobre o que vem aí em Barcelona, nós temos uma célebre China, mas conseguimos, no Pan, ganhar de Cuba e dos Estados Unidos, duas seleções que vão estar lá. O que, na sua opinião, o Brasil fez em Vigo, que não pode fazer em termos de erro, de estratégia?

Hortência: Eu acho que o time não pode demorar muito para encontrar o seu jogo. No primeiro jogo, ele demorou muito para se encontrar.

Jorge Escosteguy: Por que demorou, Hortência?

Hortência: Eu não sei.

Jorge Escosteguy: O que você acha que faltou?

Hortência: Não sei, não faltou nada.

Jorge Escosteguy: Que havia nas outras?

Orlando de Almeida: A ponto de as jogadoras, depois do jogo com a Tchecoslováquia, começarem a fazer uma caravana em direção à sala da médica, que colocou todo mundo para correr...

Hortência: Eu não vi isso.

Orlando de Almeida: Você percebe...

Hortência: Eu não fui uma delas, pode ter certeza. Isso foi no jogo com a Tchecoslováquia?

Orlando de Almeida: Depois do jogo contra a Tchecoslováquia.

Hortência: Quando nós jogamos contra a Tchecoslováquia?

Orlando de Almeida: É, depois do jogo.

Hortência: Sabe o que acontece? Eu tive uma contratura muscular nas costas, mas isso foi antes de começar a competição.  É muito tempo de viagem, dez, 11 horas de viagem, depois chega em Madrid,  pega outro avião, vai para Vigo. Isso me deu uma contratura muscular, mas eu não ouvi falar de menina que teve problema.

Orlando de Almeida: Todo mundo apareceu com dores e foi procurar a médica? [risos]

Hortência: Não, não é isso.

Jorge Escosteguy: Quando você faz o lance livre, você faz sempre este gesto. [Jorge Escosteguy mostra foto em jornal]

Hortência: É.

Jorge Escosteguy: O que  você pensa quando faz este gesto, que é típico de alguém que fecha os olhos e pensa em algo antes fazer o lance?

Hortência: Eu sempre penso que eu vou acertar.

Marco Antonio Sabino: Visualiza a cesta?

Hortência: É, visualizo a cesta. É um ritual que eu faço não à toa.

Jorge Escosteguy: Você acha que dá sorte?

Hortência: Não, eu faço porque é uma coisa que...

Marco Antonio Sabino: Para relaxar.

Hortência: Eu aprendi quando eu era pequenininha: "Olha, um lance livre é um presente que a regra te dá, você tem que acertar a cesta, não pode errar. Relaxa, porque você está tensa no jogo, respira bem fundo e [arremessa]".

Oldinei Edson: Você reza ou não?

Hortência: O que eu penso nessa hora? Eu penso que eu vou acertar e penso em Deus.

Jorge Escosteguy: E relaxa com esse gesto.

Oldinei Edson: E Deus te ajuda ou não?

Hortência: Na maioria das vezes.

Oldinei Edson: Para colocar a bola lá.

Hortência: É, eu tenho uma porcentagem muito boa de lance livre.

Jorge Escosteguy: Silvio Luiz, por favor.

Silvio Luiz: Hortência, quando vocês estavam praticamente desclassificadas, houve um tratamento da imprensa de uma certa forma. Depois que vocês estavam quase com a mão na classificação, a imprensa mudou com o time.

Hortência: Olha, todas essas coisas, como a fila no consultório médico, a divisão do time, o problema do Vendramini e do Victor, foi tudo quando nós perdemos, não foi? 

Silvio Luiz: Foi.

Hortência: Agora se houve uma mudança, não sei, mas...

Silvio Luiz: Houve uma mudança de tratamento?

Hortência: Estou dizendo que todas essas notícias surgiram depois do jogo contra a China.

Silvio Luiz: Quer dizer que a imprensa já não acreditava mais na classificação?

Hortência: Eu não sei.

Alex Solnick: Você não leu?

Hortência: Eu não li nada.

Alex Solnick: Você não leu os jornais durante a competição?

Hortência: Eu não fiquei sabendo de nada.

Alex Solnick: Você não lê, de propósito, para não se influenciar?

Hortência: Não, porque nada me influencia, a única coisa que nós nos propusemos era nos fechar naquilo, naquele objetivo de classificar, mesmo depois da derrota. Não houve absolutamente nenhum problema,  por isso que eu fiquei meio pasma quando falaram que o time tinha se dividido. Eu não li, me contaram, não sei se é verdade. E eu ainda falei: "vamos nos unir porque mesmo que nós não nos classificarmos, vamos jogar contra os Estados Unidos dia 27. Não vamos estragar tudo que fizemos até agora". Pelo amor de Deus, a conversa foi assim, não teve nenhum problema. Aliás, estamos tão bem na Seleção Brasileira, o grupo está tão bem, eu tenho prazer em ir para a Seleção Brasileira hoje. E não estou falando isso porque consegui a classificação, isso é um trabalho que já vem há três anos, de repente encontramos a equipe ideal.

Jorge Escosteguy: Você diz que tem prazer hoje. Houve algum momento em que você não tinha?

Hortência: Eu sempre tive prazer, mas hoje a gente não vê a hora de nos encontrarmos. Hoje nos encontramos até fora da seleção, vamos jantar juntas, vamos almoçar juntas, isso antigamente não existia.

Hélio de Alcântara: Hortência, você tem um recorde, que é de fazer ou de ter feito 124 pontos em uma partida. Você já entrou em quadra pensando em algo assim, como "vou bater um recorde hoje"?

Hortência: Não.

Hélio de Alcântara: É sempre durante o jogo que acontece?

Hortência: Nesse jogo, nós entramos.

Hélio de Alcântara: Foi no interior, contra o Araçatuba?  

Hortência: Foi, foi [durante] os Jogos Regionais, nós perdemos de W.O. [sigla de walk over, quando o time perde por não comparecer à partida] nesses jogos, já que levaríamos a medalha de ouro tranquilamente, já que não havia time para competir com a gente. Quando começamos a jogar, percebemos que a contagem, aos dez minutos, estava muito alta, mais do que o normal. Aí nós falamos: "Gente, vamos tentar o recorde, vamos ver se conseguimos fazer o maior número de cestas?". E começamos a fazer, mas não é que a Hortência queria fazer os 124 pontos, isso foi...

Hélio de Alcântara: Em decorrência do jogo.

Hortência: Consequência do jogo, pois eu nunca entrei na quadra pensando em ser a melhor, pensando em ser a cestinha, eu sempre entro pensando em ganhar o jogo, essa é minha intenção.

Oldinei Edson: Hortência, você veio do interior e já declarou que tem orgulho de ser caipira,  se caipira for o que você é. Você tem orgulho disso?

Hortência: Claro.

Oldinei Edson: Falamos muito aqui do teu marido, José Victor Oliva, e da participação dele na tua vida.  E você na vida dele? Você chegou, casou com ele e encontrou pela frente a sociedade de São Paulo, grandes restaurantes. Você chegando com o teu jeitão...como foi sua aceitação na sociedade dele?

Hortência: Eu não sei, eu continuei sendo a mesma, eu mudei em alguma coisa? Continuo sendo sempre a mesma.

Oldinei Edson: Mas você sentiu alguma restrição?

Hortência: Não, porque eu acho que quando eles conversam comigo, sentem prazer em conversar, dizem: "Poxa, eu vi você jogando, parabéns". A conversa sempre começa assim.

Hélio de Alcântara: Não é porque você é famosa?

Hortência: Só pode ser.

Oldinei Edson: Mas alguém [já] te fez alguma pergunta...

Hortência: Não tem como eu te dizer, com certeza, porque não tem o outro lado, mas me receberam numa boa. Não, só uma vez que uma mulher fez uma brincadeira comigo e eu já devolvi.

Oldinei Edson: Que brincadeira?

Hortência: Ela disse "O que você joga mesmo, queridinha" [risos]

Hortência: Eu falei: "Jogo truco".

Oldinei Edson: Você disse truco?

Hortência: Eu falei que eu jogava truco, mas...

Oldinei Edson: Quem foi ela?

Hortência: Não, nem lembro o nome dela. Eu sentia que foi porque...

Orlando de Almeida: Maldoso?

Hortência: Não é todo mundo que conhece, às vezes você não sabe mesmo, mas eu senti que, naquele momento, ela queria me cutucar. Mas eu falei isso, virei as costas e saí. Aí nunca mais brincaram comigo.

Orlando de Almeida: Hortência, o seu BMW de cor preta, chapa 4415, é um presente seu para você mesma?

Hortência: É.

Orlando de Almeida: Ou do Victor, no último Dia dos Namorados?

Hortência: Não, é um presente meu, comprei-o antes de viajar para Vigo. Acho que foi a primeira loucura! [risos]

Jorge Escosteguy: Por que você comprou a BMW?

Hortência: Por quê? Ai, aquele carro é tão lindo! E não foi caro, foi barato para mim.

Silvio Luiz: Acho que ela não deve mais andar de carroça.

Lia Benthien: Então por que foi loucura?

Oldinei Edson: Qual é o outro sonho de consumo que a Hortência tem?

Jorge Escosteguy: Por que você diz que foi uma loucura, a primeira loucura que fez?

Hortência: Ah, sei lá, eu sempre achei muito caro.

Lia Benthien: Você é "pão dura"?

Oldinei Edson: Quanto você pagou no carro, Hortência?

Hortência: Não, é segredo.

Oldinei Edson: Foi baratinho?

Hortência: É, não foi tão caro, em relação ao preço do carro brasileiro, até que não está tão caro.

Oldinei Edson: Um carro desses custa hoje 80 mil dólares, mais ou menos?

Hortência: Não, está mais barato, porque abaixou agora a taxa de importação. Foi para uns 55, 60 mil dólares.  

Marco Antonio Sabino: Que outros sonhos consumistas a Hortência tem?

Hortência: Não, eu não tenho sonho consumista. Acho que batalho tanto, dedico minha vida quase que 24 horas por dia para o basquete. Por isso eu merecia um presente desses.

Alex Solnick: Você dirige ou tem motorista?

Hortência: Eu dirijo, eu dirijo. Não gosto muito de motorista, eu gosto de dirigir.

Jorge Escosteguy: Você nunca bateu seu BMW?

Hortência: Não, o carro é para você usá-lo, não para o carro usar você.

Oldinei Edson: Você gosta mais do carro ou da moto, Hortência?

Hortência: Eu gosto da moto.

Silvio Luiz: Você tem medo de sequestro?

Hortência: Não, não tenho, quem iria me sequestrar? Eu não tenho dinheiro, gente! [risos]

Silvio Luiz: Não, e o BMW?

Hortência: Deixa eu falar uma coisa para você.

Silvio Luiz: [interrompendo] Se o sujeito chega atrás de você, por exemplo, e diz assim: "Ô Zé, estou com a Hortência aqui! Faz um favor, ou você me dá o BMW dela ou eu não devolvo a magrela para você!" [risos]

Joyce Pascowitch: Mas ele também não tem dinheiro para pagar o sequestro!  

Marco Antonio Sabino: Vocês têm separação de bens?

Hortência: É, eu sou casada com separação total.

Lia Benthien: Ele não pagaria por você?

Hortência: Ele não pode pegar no meu dinheiro.

Lia Benthien: Mas ele não pagaria do dinheiro dele por você?

Hortência:  Eu não sei se ele tem dinheiro. [risos] Será que ele tem dinheiro?

Marco Antonio Sabino: Você é mais rica que ele?

Hortência: Não sei, não sei.

Silvio Luiz: Você é mais "mão de vaca" que ele ou não?

Hortência:  Eu sou.

Silvio Luiz: Você?

Hortência:  É.

Alex Solnick: Você controla o orçamento doméstico?

Hortência: Não, nós temos dois apartamentos. O apartamento de São Paulo é ele que controla e o de Sorocaba, controlo eu.

Alex Solnick: E qual é o mais organizado?

Hortência: Os dois, o Victor é super organizado.

Jorge Escosteguy: E como foi posar nua para a Playboy?

Marco Antonio Sabino: Posso pegar um gancho na pergunta?

Jorge Escosteguy: Claro, por favor.

Marco Antonio Sabino: Na primeira parte do programa, falamos muito sobre sexo. Ao aceitar o convite para posar nua, você admitiu que era ou é um símbolo sexual?

Hortência: Não, não sou não.

Marco Antonio Sabino: Mas você aceitou que as outras pessoas te considerassem um símbolo sexual. Você não gosta disso, você se arrependeu?

Hortência: Não, gosto que as pessoas me assediem porque sou uma jogadora de basquete, porque eles me admiram como jogadora, não como símbolo sexual. Agora,  eu quis posar para a Playboy, na época, por causa do dinheiro e porque a mulher tem que levantar uma bandeira pelos direitos da mulher. Quando você tem a palavra, as pessoas te escutam. Eu não sou feminista, não quero ser igual aos homens, mas ele conquistou 100% do seu espaço e a mulher, não. Muitos pensam: "Ah, porque joga basquete, tem o corpo masculino, e não sei o quê". Eu mostrei que ela pode posar para a Playboy, pode ser uma jogadora de basquete, pode ser o que for e continuar sendo uma pessoa séria. O nu é uma coisa séria, não é brincadeira. E acho que as pessoas compraram a minha revista não por eu ser um símbolo sexual, mas por curiosidade de ver como a Hortência é em sua intimidade.

Jorge Escosteguy: Você já tentou convencer a Paula ou não?

Hortência: Não, é uma decisão tão íntima. Se ela tem a cabeça dela, a gente tem que respeitar.

Alex Solnick: Muita gente fala que aquelas fotos foram retocadas, não é? Foi retocada ou é você mesma ali?

Hortência: Foi retocada. Há uma foto que foi retocada, que eu estou sentada no banco, está só o meu rosto e meu pescoço ficou enrugado. Ali teve retoque. Fora isso, não tem porquê ter retoque, isso acontece quando você tem muitas estrias, essas coisas. Eu sou uma atleta, quer dizer, não tem o que retocar.

Hélio de Alcântara: Você sempre falou que preferia morar no Brasil, não é?

Hortência: É, sempre.

Hélio de Alcântara: E sempre recusou muitas propostas do exterior. É uma raiz muito forte aqui no Brasil?

Hortência: Olha, eu adoro o meu país, não estou sendo demagógica, eu adoro o meu país! Quando fui jogar na Itália, eu sentia uma falta muito grande daqui. Estou jogando basquete há 16 anos na Seleção Brasileira, depois que eu conquistei todo esse espaço, respeito, carinho do público, eu vou largar tudo isso para começar de novo em outro lugar? Se fosse por causa de dinheiro, mas eu sou muito bem remunerada aqui no Brasil, então não teria porquê eu ir embora. E eu sou casada, super bem casada, vou largar tudo? Eu recebi uma proposta...

Jorge Escosteguy: Quanto você ganha como jogadora de basquete, Hortência?

Hortência: Ganho o suficiente para viver uma vida sossegada e tranqüila.

Hélio de Alcântara: E comprar uma BMW? [risos]

Hortência: E, olha, eu fiz loucura!

Lia Benthien: Você está um pouquinho...

Marco Antonio Sabino: E ter um apartamento em Sorocaba, outro em São Paulo. [risos]

Hortência: Gente!

Marco Antonio Sabino: É, isso tudo vale três mil dólares. [ironizando]

Hortência: Eu não nego, eu não nego que tenho um salário privilegiado, em vista do que as pessoas ganham aqui no Brasil.

Oldinei Edson: No basquete feminino tem o maior salário?

Hortência: Eu acho que sim, eu não torço para que eu chegue no que as pessoas estão, mas para que elas cheguem onde eu estou.

Oldinei Edson: Não é pecado.

Hortência: Isso, exatamente. E se eu cheguei onde consegui, foi jogando honestamente, lutando, batalhando muito, entendeu? Não foi pela política, foi pelo meu próprio suor. No que posso ajudar as pessoas, eu ajudo.

Oldinei Edson: Hortência, recentemente você foi convidada para jogar na Ponte Preta, ao lado de Paula. Por que você não foi? Paula e Hortência no mesmo time e o basquetebol sempre com a força muito grande no interior de São Paulo, enfim, você acha que têm que estar em equipes diferente, não compor um time só?

Hortência: Eu acho que para nós duas...

Oldinei Edson: Com exceção da Seleção, é lógico?

Hortência: Para nós duas seria interessante jogar separadamente. Não que isso me impeça de jogar no time dela amanhã, mas eu não posso sair [agora] de um time campeão do mundo, um time que tem o senhor João Caracante [diretor do Clube Atlético de Sorocaba], que me dá tudo o que eu quero, tenho uma estrutura muito boa do Leite Moça, largaria tudo isso para quê? E acredito que a Paula também trocou o Piracicaba, porque o BCN saiu. Não tenho nada contra Campinas, pelo amor de Deus, mas eu não teria porque trocar a cidade de Sorocaba por Campinas, nem por causa de dinheiro. Eu tinha minhas amigas ali, um time de tantos anos, quer dizer, eu trocaria isso se fosse por uma razão muito forte, e não aconteceu.

Jorge Escosteguy: Como você vê o futuro do basquete feminino nessa questão de patrocínio, ou seja, entram as empresas, saem essas empresas, é pouco seguro. Você não tem um pouco de insegurança em relação ao futuro?

Hortência: Eu acho que depende muito. Por exemplo, se você [se mostra], vai ter sempre patrocinador. Agora entrou a Telebrás e estamos muito satisfeitos, está nos ajudando muito e o Brito Cunha está fazendo um trabalho muito bom com esse dinheiro.

Oldinei Edson: E essa concentração do basquete feminino no interior de São Paulo?

Hortência: Por quê? Eu não entendo isso também. Um dia o Vicente Matheus [(1908-1997) figura histórica do futebl, foi presidente do Corinthians por oito mandatos, até 1993] falou que talvez as empresas não entrariam para patrocinar o time do Corinthians, porque se fala "o time do Corinthians", e não como nós, lá em Sorocaba, que falamos "o time do Leite Moça". Como falam "o time do Corinthians", o patrocinador sente-se um pouco inferiorizado.

Orlando de Almeida: Inibe-se.

Hortência: Será que é por causa disso? Não sei por que essa concentração no interior. 

Lia Benthien: Hortência, quando você passou aquela temporada na Itália, na volta você disse que havia uma possibilidade de jogar novamente lá.  O que falta para algum time conseguir levar a Hortência para mais uma temporada?

Hortência: O técnico com quem eu estava jogando agora [no campeonato Pré-Olímpico], e que foi meu técnico na Itália, estava doido para que eu voltasse a jogar lá novamente. No entanto, fica difícil porque quero ter um filho no ano que vem e neste ano temos as Olimpíadas.

Lia Benthien: Mas você não disse que dá para coordenar o filho com o basquete?

Hortência: Mas eu vou estar grávida, como é que vou jogar grávida?

Lia Benthien: Bom, depois que o filho nascer.

Hortência: Depois sim.

Lia Benthien: Existe a possibilidade de você voltar?

Hortência: Aí tudo bem, mas ele me queria para já, entendeu? Eu recebi uma proposta de jogar na Espanha e também recusei, porque tenho outros pensamentos agora. Também tenho contrato com o Leite Moça e estou super feliz, não vou trocar.

Hélio de Alcântara: Hortência, hoje em dia está tudo lindo e maravilhoso, quer dizer, você atingiu um estágio que pouca gente atinge. Como foi o início de carreira para você, teve que trabalhar muito, suou muito, sofreu?

Hortência: Trabalho até hoje! Ninguém consegue chegar a nenhum lugar se não trabalhar.

Hélio de Alcântara: Mas eu digo, as dificuldades foram muito maiores?

Hortência: Eu confesso a você que tive um pouco de sorte na minha vida de ter sempre as pessoas certas nas horas certas, mas foi uma luta.

Jorge Escosteguy: Como foi esse começo, que dificuldades você tinha?

Hortência: Primeiro, não ganhávamos dinheiro para jogar. Eu, por exemplo, tinha família pobre, como eu ia comprar um tênis,  pagar a passagem do ônibus para ir até o clube? Não tinha dinheiro para ser sócia do clube.

Orlando de Almeida: Isso foi em Catanduva?

Hortência: Não, em São Caetano.

Lia Benthien: Como você fazia?

Hortência: Eu pegava [dinheiro] do meu pai, até que um dia ele falou: "Eu não tenho mais dinheiro, você vai ter que parar". Aí eu parei de jogar basquete por uma semana. Foram atrás de mim e começaram a me dar dinheiro para pagar o tênis, a roupa de treinamento, o ônibus e para ajudar minha família.

Hélio de Alcântara: Isso aconteceu na sua adolescência?

Hortência: É, quando eu tinha 14 ou 15 anos. Todos os meus irmãos começaram a trabalhar cedo.

Hélio de Alcântara: Parou de estudar?

Hortência: Não, eu fui até o final porque eu tive dinheiro do clube para estudar, pagaram o meu estudo.

Jorge Escosteguy: Voltando um pouquinho ao Pré-Olímpico e depois Barcelona, Hortência. O Silvio Luiz perguntou como as jogadoras reservas, sem você e a Paula, conseguiram empatar o jogo com a China, e depois o Brasil perdeu. Ou seja, se vocês tivessem permanecido, o Brasil poderia ter ganhado?

Hortência: Elas são grandes jogadoras.  Se não fossem, elas não estariam ali. Nós somos uma equipe, um grupo.

Jorge Escosteguy: Então, a pergunta que eu lhe faço é: se você e a Paula tivessem continuado no banco, o Brasil poderia ter vencido o jogo?

Hortência: Poderia. Elas têm capacidade de virar uma partida, de jogar de igual para igual, tanto é que estão lá porque são boas jogadoras.

Lia Benthien: E se vocês estivessem na quadra, também havia a mesma possibilidade?

Hortência: Não sei, vocês acham que nós tínhamos capacidade para virar o jogo? Eu não sei falar de suposições, gostaria muito de estar na quadra aquela hora, mas eu reconheço...

Lia Benthien: [interrompendo] Que você devia ter ido para o banco?

Hortência: ...que naquele momento, quando o jogo estava empatado, elas tinham que ter continuado..

Marco Antonio Sabino: Você sentiu mais do que as outras, porque você e a Paula são as estrelas do time, as mais experientes. Um dos seus sonhos é disputar uma Olimpíada, quer dizer, você ficou nervosa naquele momento ou não?

Hortência: Em qual momento?

Marco Antonio Sabino: Quando você estava em quadra, decidindo tua classificação para a Olimpíada.

Hortência: Não, gente!

Marco Antonio Sabino: Você não fica nervosa, você é fria em quadra?

Hortência: O que vocês acharam? Vocês que têm que falar. Eu estava nervosa? Eu acho que eu estava tão...

Alex Solnick: Hortência, tua mão é sempre igual, ou tem dia que tua mão não está legal?

Hortência: Não, o ser humano não é um computador. Tem dia que você "levanta com o pé esquerdo", tem dia que, mesmo você sendo uma grande jogadora ou estando bem preparada fisicamente, não está bem, levanta com dor de barriga, dor de cabeça.

Alex Solnick: Nesse dia, você tinha alguma coisa, algum problema?

Hortência: Não! Contra quem, contra a China?

Alex Solnick: Contra a China.

Hortência: Não, não!

Alex Solnick: Sua mão estava legal?

Hortência: Eu estava ótima, o time inteiro estava ótimo.

Marco Antonio Sabino: Se você não estivesse se sentindo bem, pediria para ser substituída?

Hortência: Em que sentido, fisicamente?

Marco Antonio Sabino: Se você não estivesse acertando a cesta, por exemplo, você pediria?

Hortência: Eu nunca vou pedir para sair da quadra.

Silvio Luis: Mesmo estando mal?

Hortência: Nunca.

Jorge Escosteguy: Nunca pediu?

Hortência: Nunca pedi, e nunca pedi para entrar também. Eu acho que o técnico é que tem saber.

Silvio Luis: Você não acha...

Hortência: Porque mesmo estando mal, estou tentando acertar, entendeu?

Silvio Luis: Sim, mas você não acha que não estando bem e não pedir para sair, isso pode prejudicar a equipe?

Hortência: Para isso tem o técnico na quadra, ele está ali para isso.

Silvio Luis: E se você torceu o tornozelo e acha que não dá para continuar?

Hortência: Aí eu saio, pois é um problema [físico].

Silvio Luis: Fisicamente, fisicamente.

Hortência: Se eu torcer o joelho e achar que não tenho condições, é claro. Eu já fiz sacrifícios, torci o pé e continuei na quadra pela minha equipe. Quantas vezes, por causa da minha equipe, já me sacrifiquei a ponto de anestesiar, aplicar uma anestesia no dedo, porque estava com uma inflamação?

Jorge Escosteguy: Você é "fominha"?

Hortência: Eu sou [risos]! Sempre fui "fominha".

Jorge Escosteguy: Agora, voltando um pouquinho a você e a Paula, tenho aqui uma entrevista em que você diz: “no início da nossa carreira, a imprensa vivia nos comparando. Isso causou uma rivalidade que, para mim, foi fundamental, pois comecei a treinar com um único pensamento: ser melhor que a Paula. Portanto, muito do meu basquete eu devo a ela".

Hortência: É.

Jorge Escosteguy: Como você superou essa rivalidade? Como era quando se encontrava com a Paula?

Hortência: Eu não superei.

Jorge Escosteguy: Na Seleção, por exemplo?

Hortência: Essa rivalidade eu tenho até hoje, e quero que permaneça até o resto do meu basquete. A Paula é um calo bom no meu pé, quando vou jogar contra o time dela.

Oldinei Edson: Quem é melhor, você ou ela?

Alex Solnick: Você se considera melhor que ela?

Hortência: Não, nós duas somos jogadoras de estilos diferentes. A Paula é uma grande jogadora.

Jorge Escosteguy: Você já pensou em política ou não?

Silvio Luis: Prefeita de Potirendaba! [risos]

Hortência: Não.

Jorge Escosteguy: Não, por algumas respostas que você dá...[ironizando] [risos]

Alex Solnick: Ele está dizendo que você é muito diplomata.

Jorge Escosteguy: Você está sendo muito política ao falar da sua rivalidade com a Paula.

Hortência: Eu não estou sendo política.

Jorge Escosteguy: Você diz que conseguiu superar essa rivalidade. Como ela se realizava quando vocês se encontravam?

Hortência: Não, estou dizendo que não superei a rivalidade. Sou rival dela até hoje, dentro da quadra.

Jorge Escosteguy: E como isso se realiza quando você encontra com ela na Seleção, por exemplo?

Hortência: Ah, mas aí ela está jogando com a mesma camisa que a minha, então eu quero mais é que...

Jorge Escosteguy: Mas, de qualquer forma, você quer ser melhor que ela?

Hortência: Não quero ser melhor do que ela, eu nunca disse isso.

Jorge Escosteguy: Aqui [na entrevista citada] diz que você disse que queria ser melhor do que ela.

Hortência: Não, isso quando quero ganhar do time dela, para ser melhor dentro da quadra, para ganhar o jogo. Agora, dentro da Seleção Brasileira, quero que a Paula faça tudo que ela sabe, porque assim vamos ganhar o jogo e eu vou para as Olimpíadas,  vou ser campeã e conseguir uma medalha de ouro.

Jorge Escosteguy: Você conversa muito com ela sobre isso?

Hortência: Converso.

Jorge Escosteguy: Como vocês conversam? Acham engraçado?

Hortência: Sobre a rivalidade?

Jorge Escosteguy: É.

Hortência: Isso nós conversamos há muitos anos, não conversamos mais porque não tem mais isso. Não sei se vocês sabem, mas a Paula é minha madrinha de casamento. Se eu fosse muito rival dela, não a convidaria para ser madrinha do meu casamento.

Jorge Escosteguy: O Pelé também é [seu] padrinho de casamento. E você disse que, se ele fosse candidato a presidente da República, você ia pensar.

Hortência: Não, eu não disse que não vou votar nele. 

Jorge Escosteguy: Não necessariamente.

Hortência: Mas, na sua maneira de falar, você já está [dizendo] que eu não vou votar nele, eu disse que...

Jorge Escosteguy: Não, você não disse que ia pensar?

Hortência: Quando ele for candidato, vocês me perguntam, que eu respondo.

Jorge Escosteguy: Lógico.

Hortência: Ele não é candidato.

Jorge Escosteguy: Então, mas o fato de a Paula ser sua madrinha de casamento não impede que você pense sobre essa questão de rivalidade? Uma coisa não tem a ver com a outra?

Hortência: Não, imagina, eu tenho uma admiração muito grande por ela.

Orlando de Almeida: Hortência, você não aproveitaria seu prestígio para se eleger e dar seu serviço à pátria como política?

Hortência: Olha, se um dia isso acontecer, gostaria que as pessoas votassem em mim, não pela atleta, mas pela minha inteligência ou capacidade de tentar resolver algum problema na política. Eu acho que é muito difícil isso acontecer, porque acho que eu não vou mexer com política.

Hélio de Alcântara: Quais [são] os principais problemas do país, na sua visão, já que você falou em idéias?

Hortência: São tantos...olha, eu fico triste com duas coisas: a situação dos velhos e das crianças. Fico muito triste quando eu vejo esse tipo de briga na televisão, se vai dar aumento ou não. Falo isso porque tenho minha família, o meu pai é aposentado. E eu tenho certeza absoluta de que, se não tivesse eu na família, ele estaria em uma situação muito difícil, talvez nem estaria aqui ainda. E a situação do menor, quando paro em um semáforo, me machuca muito ver as pessoas trabalhando, lutando e não conseguindo nada, no final do mês. Por que as pessoas saem por aí assaltando? É claro que não sou a favor disso, mas [acontece] porque é difícil, gente! Chega o final do ano, você vê o seu filho passando fome...o cara fica louco.

Jorge Escosteguy: Você já chegou a considerar a hipótese de, em vez de ter um filho, adotar uma criança?

Hortência: Eu vou adotar. Há certas coisas que eu não gosto de falar, mas eu não adoto uma criança, eu adoto um monte de crianças, porque eu ajudo, minha equipe ajuda [vários] lares. Adotar uma criança não é levá-la atrás de você o tempo todo, para sua casa, mas sim ajudar esses lares que precisam tanto de dinheiro. Mas eu pretendo ter dois filhos e adotar um, essa é a minha intenção.

Marco Antonio Sabino: Hortência, nós temos uma prefeita em São Paulo [Luiza Erundina, prefeita de São Paulo entre 1989 e 1993, eleita pelo Partido dos Trabalhadores]. Você acha que está faltando mulher na política?

Hortência: Olha, o episódio da nossa ex-ministra [Zélia Cardoso de Mello] me deixou muito triste porque eu acho que no momento em que a mulher estava entrando na política, de repente...Eu me senti traída pela Zélia, me desculpe.

Hélio de Alcântara: Por ser mulher?

Hortência: Porque eu achava que não precisava fazer tudo aquilo.

Alex Solnick: Ainda por causa do livro dela e tudo?

Silvio Luiz: Você votou no presidente Collor?

Hortência: Votei.

Silvio Luiz: Se você tivesse que votar hoje, votaria nele outra vez?

Hortência: Eu não sei, quem seriam os outros candidatos?

Silvio Luiz: Eu e o Jorge [Escosteguy].

Marco Antonio Sabino: Eu não, por favor. [risos]

Jorge Escosteguy: Se fossem Lula e Collor?

Hortência: Eu preciso saber quem seria o concorrente dele.

Silvio Luiz: Concordo.

Hortência: Se eu achar que quem está concorrendo com ele for melhor, eu voto no outro.

Silvio Luiz: Vamos supor aqui alguns presidenciáveis, como o Quércia e Brizola. Você votaria em quem?

Hortência: Está difícil, viu?

Jorge Escosteguy: Difícil para o bem ou para o mal?

Hortência: Não, é porque acho que o Quércia também é um grande político. Também gosto do Fernando Collor, não sei.

Alex Solnick: E sobre a primeira dama, o que você acha da Rosane [Collor]?

Hortência: Eu acho que ela deveria participar um pouquinho mais...

Oldinei Edson: Mesmo depois do fato da LBA [Legião Brasileira de Assistência]?

Hortência: Mas ficou provado que ela foi culpada?

Oldinei Edson: Isso está sob sigilo.   

Alex Solnick: O que você faria se seu marido tirasse a aliança publicamente? [refere-se à atitude do presidente Collor]

Hortência: Eu não sei o que aconteceu, não posso analisar as atitudes de outra pessoa. Eu, Hortência, se o meu marido um dia fizer isso, eu largo dele. Mas, veja bem, se ele fizesse isso e eu fosse a primeira dama, eu não sei. Não posso falar de uma coisa que eu não sei, estou falando da Hortência. Se a Hortência fosse a primeira dama e tivesse um "quebra-pau" com o meu marido, eu "seguraria a barra" pelo meu país.

Silvio Luiz: Mas você acha que uma aliança pode dizer - sou casado há 23 anos, fiz 23 anos no mês de maio e sempre usei aliança - se o cara está bem casado? Eu já vi tanto "nego" mal casado usando aliança...

Hortência: Uma aliança não diz nada.

Silvio Luiz: É o que eu estou perguntando.

Hortência: Mas para mim diz muito.

Silvio Luiz: Então veja bem, para você...

Hortência: É, o fato de você usar uma aliança não diz o seu caráter. 

Silvio Luiz: Exatamente.

Hortência: Quer dizer, uma aliança não exige nada. Mas presidente da República e primeira dama são cargos diferentes, não são pessoas comuns. Agora, eles também têm o direito de ter problemas conjugais, são seres humanos como nós. Por que  um presidente da República não pode se separar? É uma pessoa normal como qualquer outra.

Silvio Luiz: É evidente, ele já é separado de um primeiro casamento.

Hortência: E qual é o problema?

Jorge Escosteguy: Voltando um pouquinho ao basquete, você disse que tem uma personalidade muito forte, é "fominha" em campo. Eu me lembro que, no jogo contra a Austrália, a câmera mostrou você com a expressão inesquecível, dramática, de desespero. Naquele momento, o que você pensava, achou que tudo estava perdido?

Hortência: Contra a Austrália?

Jorge Escosteguy: É.

Hortência: Olha, em nenhum momento eu achei que estava perdido, porque eu sempre aprendi, desde pequena, que o jogo só termina quando o juiz apita.

Jorge Escosteguy: E o que rola na sua cabeça durante o jogo?

Hortência: Ah, eu não penso nessas coisas, o basquete é uma coisa natural, você vai fazendo, pensa duas ou três jogadas na frente, quando arremesso já estou pensando na outra...

Jorge Escosteguy: Mas sobre o jogo, como ele está andando, bem ou mal?

Hortência: Não, você pensa se deve ir mais devagar ou fazer contra-ataque...

Alex Solnick: [interrompendo] Quando você começa a errar as cestas, tua atitude é parar de encestar ou insistir até acertar?

Hortência: Não, eu insisto porque você pode errar uma bola, mas pode acertar a outra. Eu treino para acertar, nunca ouvi falar em um atleta que, quando começa mal, pede para sair e depois chega no técnico e fala: "agora você me põe, que eu já estou bem". Quem administra isso é o técnico, porque ele conhece a jogadora, sabe quando o atleta está legal.

Jorge Escosteguy:  Lia, por favor.

Lia Benthien: Hortência, eu queria falar um pouquinho de Barcelona, porque a Seleção saiu eufórica com [a medalha de] ouro no Pan-Americano, foi para Vigo como a melhor Seleção que o Brasil já teve. Depois do que aconteceu em Vigo, da partida contra a China, da classificação no último momento, vocês chegaram a pensar que o time não "estava com essa bola toda" para a Olimpíada, que alguma coisa deveria mudar, talvez até psicologicamente no grupo?

Hortência: Olha, todo mundo "colocou essa bola toda" em nós. Mas em todo momento, nós sempre falávamos: "Olha, não vamos nos influenciar pelo psicológico". Nunca se ouviu falar tanto em "psicologicamente" como agora, "a equipe está abalada psicologicamente", essa coisa não existe. Isso é coisa de gente rica, isso não existe no nosso time, não.

Lia Benthien: Mas vocês acham que têm condições de brigar pelo ouro? 

Hortência: Nós sempre falamos: "Não deixem nada de fora influenciar aqui dentro. Não é porque somos medalha de ouro que vamos [ter que] ganhar agora". Isso sempre foi comentado com o grupo.

Jorge Escosteguy: Hortência...

Hortência: O grupo sempre foi forte nesse aspecto.

Jorge Escosteguy: Nosso tempo está se esgotando e eu gostaria que você encerasse [falando sobre] as perspectivas para Barcelona, a confiança de vocês em medalha na Olimpíada.

Hortência: Olha, a equipe vai com 50% de chance de ser medalha de ouro e 50% de chance de voltar de lá sem nada. Vai depender de como a equipe vai se comportar. Se jogar o basquetebol que sabemos jogar, tenho certeza que vamos fazer o  melhor,  vamos subir no pódio. Mas eu não posso prometer.

Jorge Escosteguy: Tem que ser melhor que o basquetebol do Pré-Olímpico?

Hortência: Olha, contra a Polônia, nós tivemos altos e baixos, mas contra a Austrália  e a Itália nós jogamos um grande basquetebol.

Jorge Escosteguy: Se for esse basquetebol...

Lia Benthien: Tem que ser...

Hortência: Eu acho que é esse basquetebol.

Jorge Escosteguy: Teremos uma medalha?

Hortência: No primeiro jogo, não jogamos bem. Quer dizer,  [as meninas] jogaram bem, não o grupo inteiro. Mas para conquistar um campeonato, conquistar uma vitória, todo o grupo tem que jogar.

Jorge Escosteguy: Bom, tenho certeza de que não faltará torcida por essa medalha de ouro.

Hortência: Tenho certeza absoluta.

Jorge Escosteguy: Nós agradecemos a presença, aqui no Roda Viva, da Hortência, agradecemos aos jornalistas e a atenção do telespectador. O Roda Viva fica por aqui e volta na próxima segunda-feira, às nove da noite. Até lá, boa noite e boa semana a todos!

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