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Memória Roda Viva

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José Genoino

4/7/2005

Em entrevista tensa, o presidente do PT, suspeito de participar do suposto esquema que ficou conhecido como mensalão, apresenta sua versão dos fatos e rememora sua trajetória política

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[programa ao vivo]

Paulo Markun: Boa noite. A executiva nacional do Partido dos Trabalhadores decide amanhã, em São Paulo, o futuro da atual cúpula do PT. O partido, que virou vidraça ao virar governo, está sob o fogo serrado das denúncias de corrupção que deram origem e agravaram a atual crise política vivida pelo país. No centro do Roda Viva, esta noite, [está] José Genoino, presidente nacional do Partido dos Trabalhadores.

[inserção de vídeo]

[Paulo Markun]: [Ele tem] 59 anos, metade disso fazendo política. Foram dois anos na militância clandestina do PC do B, mais dois na guerrilha do Araguaia, cinco na prisão com tortura e mais de 20 na atividade parlamentar. São alguns números da vida desse cearense de Quixeramobim que, em 2002, no quinto mandato de deputado federal, disputou e perdeu, no segundo turno, a eleição para o governo de São Paulo. No ano seguinte, na formação do governo Lula, era tida como certa a indicação de Genoino para algum ministério, mas o presidente deu outra missão a ele: comandar o Partido dos Trabalhadores, que o próprio Genoino ajudou a fundar em 1980. Assumiu [a presidência do PT] no momento mais importante da história do partido, que finalmente havia chegado ao poder, mas também no momento que marcava o início das dificuldades que o poder traria ao PT. A mais recente é resultado da reportagem publicada pela revista Veja neste final de semana [link para a matéria: http://veja.abril.com.br/060705/p_050.html ]. Genoino assinou como avalista um empréstimo de 2 milhões e 400 mil reais tomados pelo PT. O empréstimo tem mais dois avalistas: o tesoureiro do partido, Delúbio Soares, e o publicitário Marcos Valério, que nunca foi petista e é apontado como o operador do mensalão.

Paulo Markun: Para entrevistar José Genoino nós convidamos Mauro Chaves, editorialista do jornal O Estado de S. Paulo; Sérgio Lírio, editor da revista Carta Capital; Merval Pereira, colunista do jornal O Globo; Florência Costa, subeditora da editoria Brasil da revista IstoÉ; Eliane Cantanhêde, colunista da Folha de S.Paulo; Alexandre Machado, editor de política da TV Cultura; e Felipe Patury, repórter da revista Veja. Também temos a participação do cartunista Paulo Caruso, registrando em seus desenhos os momentos e os flagrantes do programa. O Roda Viva é transmitido em rede nacional para todos os estados brasileiros e para Brasília. Para participar do programa, você pode utilizar o telefone (0XX11) 3252-6525 ou o fax (0XX11) 3874-3454, ou ainda o endereço do programa na internet, rodaviva@tvcultura.com.br. Boa noite, Genoino.

José Genoino: Boa noite, Paulo Markun.

Paulo Markun: Eu conheço um pouco da trajetória do senhor; fiz um perfil [seu] para a revista Playboy, acho que em 1996, e acompanhei o senhor mais de uma vez naquela semana em que nós estivemos juntos no guichê do Banco do Brasil na Câmara dos Deputados, em que o senhor acompanhava cuidadosamente o seu extrato bancário, preocupado com a possibilidade de que alguém depositasse algum dinheiro na sua conta e isso, de alguma forma, comprometesse o senhor. Aí eu pergunto: como é que o senhor assina [como avalista] um documento desses, aparentemente sem saber [o conteúdo do documento] que estava assinando?

José Genoino: Paulo Markun, em primeiro lugar, eu continuo fazendo a mesma coisa; aliás, eu moro no mesmo hotel que você, na reportagem, falou que era um hotel simples, e estou naquele mesmo apartamento. Aliás, eu ia mudar de apartamento quando você fez o perfil na revista; mas é o mesmo hotel. Continuo olhando minhas contas toda semana, continuo com o mesmo patrimônio que eu sempre tive como deputado federal, e sobrevivo financeiramente com o salário que recebo do PT. No PT, nós temos uma relação coletiva de trabalho na executiva; chega à presidência, até por disposição estatutária, a assinatura dos contratos financeiros do partido. Vem a instrução, vem a assinatura do responsável e nós assinamos em confiança. A partir do momento em que eu assinei, eu sou co-responsável, sou co-responsável por um contrato de um empréstimo que era necessário para o partido, num momento em que o partido saía de 2002 com uma bancada pequena, com um fundo partidário pequeno, e começava 2003 sem alteração no fundo partidário e sem alteração no número de deputados e senadores. Fizemos esse empréstimo, pagamos os juros de 2003, atrasamos [o pagamento dos juros] no meio do ano de 2004. O avalista, um dos avalistas desse empréstimo, pagou uma parcela com juros...

Paulo Markun: [interrompendo] Quer dizer, é aí que mora o problema.

José Genoino: Pagou uma parcela dos juros.

Paulo Markun: [interrompendo] Que avalista era esse?

José Genoino: Essa relação com o avalista não produziu nenhum tipo de influência do PT no governo ao seu favor, nenhum tipo de influência. É claro que isso é uma lição para se levar mais em conta, para se ter mais cuidado, é uma lição que nós tiramos...

Merval Pereira: Presidente.

José Genoino: E eu quero prestar contas ao partido, à opinião pública, de procedimentos inadequados; mas não houve ilegalidade, não houve crime, não houve influência no governo. E ele foi avalista porque os nossos bens individuais não eram suficientes para fazer empréstimo do banco.

[Charge de Paulo Caruso em que Genoino, de perfil, examina seu extrato bancário. Da folha do extrato, aparece a indicação “$!”; e do pensamento de Genoino, a indicação “?”]

Paulo Markun: Mas imagine para ser avalista de uma casa, presidente, do aluguel de um amigo. Eu, por exemplo, se alguém me pedir para ser avalista, eu nem vou ser. Agora, eu penso o seguinte: num negócio como esse, alguém que se dispõe a ser avalista deve ter alguma razão.

Merval Pereira: [interrompendo] E outra coisa: o senhor disse que garante que não houve nenhuma influência desse aval nas atividades do publicitário [Marcos Valério] no governo...

José Genoino: [interrompendo] O PT não praticou...

Merval Pereira: Mas por que nós devemos acreditar nisso, se depois, no governo Lula, o Marcos Valério teve milhões e milhões em contratos depois desse aval?

José Genoino: Merval, não adianta agora eu colocar a minha palavra diante da sua dúvida; é investigação [que deve ser feita]. Esse empresário, que eu não conhecia na época, tinha contratos anteriores com o governo. E apenas um contrato, que está nos Correios, é novo; isso vai ser fruto da investigação. Portanto, deixe que a investigação fale...

[...]: Mas Genoino...

José Genoino: Nós não fizemos mediação, não fizemos a defesa desse empresário, até porque quando eu fui avalista e assinei, a partir da instrução do secretário de finanças, eu sou co-responsável.

[...]: Mas Genoino...

Merval Pereira: [interrompendo] O senhor sabia que o senhor não podia pagar essa dívida, se o partido um dia não pudesse pagar; o senhor sabia que o Delúbio não podia pagar; então, o senhor não teve nem curiosidade de saber quem era o terceiro avalista?

José Genoino: O partido tinha condições de pagar, o partido tem orçamento e tem condições de pagar essa dívida, pelo que ele tem, no seu balanço...

Merval Pereira: [interrompendo] Mas, tanto não tem, que não pagou.

José Genoino: E nós vamos pagar essa dívida, que está hoje em torno de 2 milhões e 700 [mil reais].

Alexandre Machado: Genoino, me permita perguntar, nessa questão tem uma outra coisa que...

José Genoino: [interrompendo] Mas pagamos, para deixar claro, Merval. Nós pagamos os juros dessa dívida em 2003, pagamos em 2004, e houve uma parcela dos juros que atrasou e foi descontado do avalista...

Sérgio Lírio: [interrompendo] Genoino, a pergunta que o Markun fez inicialmente, eu queria só...

José Genoino: E vamos pagar essa dívida; o PT vai pagar essa dívida. Deixe-me ir pela ordem democrática, Alexandre.

Alexandre Machado: Genoino é o seguinte: você nos explicou que não leu [o contrato] e assinou em confiança, e a gente...

José Genoino: [interrompendo] Não, não existe essa história de não ler. Nós recebemos do PT uma instrução das secretarias para assinar. É claro que o contrato estava assinado pelo companheiro Delúbio, em confiança, o que é normal em qualquer secretaria...

Alexandre Machado: Sim, tudo bem, mas acho...

José Genoino: O presidente assina, até porque ele é obrigado estatutariamente...

Alexandre Machado: Deixe-me chegar no meu ponto. O meu ponto é o seguinte: qualquer executivo, de qualquer empresa, quando tem algum fato importante e fora da rotina, costuma chegar ao seu superior imediato e explicar o que está acontecendo. Então, um empréstimo desse porte não é um empréstimo comum, é um empréstimo extraordinário na vida de um partido. Ou seja, o normal seria que o Delúbio, como tesoureiro, chegasse ao presidente do partido e falasse: “Olha, nós fizemos esse empréstimo dessa maneira; quem vai assinar aqui como avalista é o Marcos Valério, que é meu amigo, que é da agência...”.

José Genoino: [interrompendo] Que eu não conhecia.

Alexandre Machado: Sim, seria esse o [procedimento] normal, está certo? Bom, passa-se o evento e percebe-se que esse fato era um fato que, politicamente, tinha agravantes, já que o Marcos Valério tinha contas do governo, ou seja, facilitava a possibilidade de se perceber uma relação promíscua nessa relação, e você... [corrigindo o tratamento] o senhor...

José Genoino: [interrompendo] Pode falar “você”, melhor assim, negócio de “senhor” não é bom, não.

Alexandre Machado: Está bom, a gente já se conhece há muitos anos. Mas então você, ao contar, ao prestar declarações à sociedade, disse que não se sentia traído pelo Delúbio, e essa é uma questão que eu não consigo entender, porque ou bem o Delúbio tinha explicado claramente o que se tratava aquele negócio, que era a sua obrigação a um superior hierárquico e a um amigo e companheiro de partido, ou então ele teve uma atitude que não foi correta com você, não fica uma coisa estranha...

José Genoino: [interrompendo] Em primeiro lugar, Alexandre...

Alexandre Machado: De ao mesmo tempo você ter confiado nele e ele não ter tido a relação de confiança necessária?

José Genoino: Em primeiro lugar, Alexandre, não se trata dessa questão. Existe uma norma no partido que funciona com todas as secretarias, e funciona na secretaria de finanças, em que o nosso aval diante da assinatura do tesoureiro é decidido basicamente pela confiança que se estabelece. Eu não tinha conhecimento com o avalista individual, no caso o senhor Marcos Valério, eu não conhecia ele, não sabia a história dele, nem sabia de contratos, mas assinei...

[Charge de Paulo Caruso mostra Genoino escrevendo a palavra “erro”. Ele diz: “Assinou, não leu, o pau comeu!”]

Merval Pereira: [interrompendo] Mas nem perguntou quem [ele] era?

José Genoino: Assinei em confiança ao Delúbio. Isso é normal no PT...

Florência Costa: [interrompendo] O senhor perdeu a confiança nele [Delúbio]?

José Genoino: A partir do momento em que eu assino, eu sou co-responsável como presidente do PT...

Alexandre Machado: Sem dúvida.

José Genoino: Eu, como presidente do PT, sou responsável por todos os atos do PT...

Alexandre Machado: Sem dúvida.

José Genoino: E vou de cabeça erguida prestar contas ao meu partido e à sociedade, sem nenhum problema, seja na CPI...

Florência Costa: O senhor perdeu a confiança nele?

José Genoino: Não. Não se trata disso. Os procedimentos que nós respeitamos, e foram legais, pagamos os juros, atrasamos uma prestação dos juros, temos uma dívida que vamos honrar...

Merval Pereira: [interrompendo] Ele deu uma informação errada quando a [revista] Veja ...

José Genoino: [interrompendo] Não, a informação..., vamos deixar claro, Merval, e eu quero responder a todas as questões aqui com a maior transparência. Quando a revista Veja me ligou, eu estava dentro do avião, e aquele diálogo [entre o petista e um repórter da Veja, no qual Genoino disse que Marcos Valério nunca fora avalista do PT] aconteceu. Eu não sabia, porque a quantidade de contratos, de assinaturas de um ano atrás...

Merval Pereira: [interrompendo] Que o senhor não soubesse, é normal. Mas que o Delúbio não soubesse, é...

José Genoino: A secretaria não me informou. Quando eu vi a informação na Veja, eu, no dia seguinte, em respeito aos leitores da Veja, recebi uma informação equivocada e corrigi, pedi desculpas...

Merval Pereira: Não, o senhor fez bem, agora ele... ele se portou muito mal nesse episódio, porque se o senhor não acha que ele se portou mal anteriormente, agora nesse [caso], ele se portou muito mal.

Florência Costa: O senhor assinaria de novo um documento...?

José Genoino: [interrompendo] Eu não vou aqui fazer julgamento desse ou daquele dirigente. Florência, Veja bem...

Florência Costa: [interrompendo] O senhor assinaria de novo um documento dele?

José Genoino: Qual é a lição que a gente tira desse episódio? A lição que eu tiro, como presidente do PT, e que o partido tem que tirar, é que esses contratos que nós temos com bancos, que nós temos com empresas, campanhas eleitorais, nós temos que ter um critério, nós temos que ter um exame mais detalhado, esta é a lição que nós aprendemos. Agora, não houve crime, não houve influência do PT no governo para contratos empresariais de Marcos Valério, e vamos honrar a dívida com o banco, é isso.

Sérgio Lírio: A matéria da Veja fala de encontros de diretores do banco [BMG], levados pelo Marcos Valério... um encontro com José Dirceu...

José Genoino: Isso é uma informação de responsabilidade da revista Veja . Eu sempre encontrei com Marcos Valério na sede do PT; jamais encontrei com ele na Casa Civil com o companheiro José Dirceu.

Mauro Chaves: Eu gostaria de fazer uma pergunta, saindo um pouquinho disso. É o seguinte, é muito simples. O senhor escreveu no site do PT textualmente o seguinte, começa assim: ”O Brasil está sendo assolado por uma onda de denúncias vazias e irresponsáveis”. Isso está mais ou menos de acordo com aquela primeira nota do PT, logo que eclodiu esse escândalo, e o senhor atribuiu isso à oposição, falou em pessoas que queriam acabar com a governabilidade etc. Eu perguntaria ao senhor o seguinte: com tudo que tem acontecido, com o que tem agora, não só a CPI [dos Correios, instaurada em 2005 para investigar denúncias de corrupção nas estatais, especialmente nos Correios], como a própria Polícia Federal, como agora o Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras], que tem descoberto... Hoje, por exemplo, saiu que não eram mais 20 milhões, mas 70 milhões. Enfim, com tudo isso, com esses contratos... o senhor disse que o senhor Marcos Valério não foi favorecido, mas tem 150 milhões [reais] em contratos com ele, e dizem que tem muito mais, chegaria a 500 milhões. Muito bem, com tudo isso que está surgindo, eu perguntaria para o senhor o seguinte: o senhor ainda mantém isso? O senhor acha ainda que é a oposição querendo tirar a governabilidade do presidente Lula?

José Genoino: [interrompendo] Oh, Mauro Chaves.

Mauro Chaves: Ou o senhor acha que isso tudo é vazio...?

José Genoino: Mauro Chaves, nós estamos vivendo uma crise política; tem uma denúncia feita por um ex-aliado [refere-se a Roberto Jefferson, à época deputado federal pelo PTB/RJ, que fazia parte da base de apoio do governo e se rebelou, denunciando a existência de um esquema de pagamentos a políticos dos partidos de sustentação do governo na Câmara para garantir a aprovação de projetos - o chamado mensalão], que mistura fatos com fábulas, com invenções, e cria, inclusive, um constrangimento no próprio Congresso Nacional, é só ver o último depoimento [dele] na CPI. E nessa esteira, vêm várias denúncias, vêm várias colocações, que fazem parte desse vendaval. Agora, vamos ser claros: em política não há ingenuidade; quem assistiu ao depoimento dele no Conselho de Ética e na CPI, viu com que parceria, com que compadrio, com que satisfação, os setores da oposição buscam projetar na disputa política, para combater principalmente o PT, para combater o governo e precipitar o debate de 2006. Essas denúncias... Qual é o caminho...?

[Charge de Paulo Caruso, Genoino aparece com braços e pernas abertos sobre uma grande estrela vermelha, como que crucificado. Ele diz: “Eu sou o responsável!”]

Mauro Chaves: [interrompendo] Genoino, o presidente da CPI, o senador presidente e o relator...

Merval Pereira: [interrompendo] Se o PT estivesse na oposição, o que você acha que estaria acontecendo?

José Genoino: A oposição está cumprindo o papel dela. Agora eu digo, Merval: fiz oposição ao governo Fernando Henrique Cardoso; o nosso partido tinha até divergência sobre isso, [mas] durante todo o período do governo Fernando Henrique Cardoso eu sempre tive diálogo com ele. O PT não fez a oposição radical, raivosa e extremada...

Mauro Chaves: O presidente Fernando Henrique está...

José Genoino: Como está ocorrendo com setores da oposição.

Merval Pereira: [interrompendo] Ah, com setores da oposição...

José Genoino: Eu não estou aqui nomeando este ou aquele partido. Agora, essa disputa existe para potencializar, para atacar o PT; lógico que existe, ou o país não tem uma disputa política? É só ver as declarações, as colocações...

Merval Pereira: Mas o PT... pela história do PT, [se estivesse na oposição em meio a denúncias de corrupção semelhantes à do mensalão] faria muito mais confusão do que...

José Genoino: [interrompendo] Claro, mas estamos vivendo, Merval, um processo de disputa política, uma crise de denúncia, qual é o caminho?

Mauro Chaves: [interrompendo] Mas Genoino, a CPI não está sendo conduzida pela oposição...

José Genoino: [interrompendo] Deixe-me responder a ele [Merval Pereira]. Eu tenho que responder a ele. Em primeiro lugar, existem denúncias que estão sendo investigadas, e com a palavra as investigações. E o PT não tem medo das investigações. O PT quer a verdade, e o patrimônio do PT, a história do PT e o valor do PT serão honrados em nome da militância, dos filiados ao PT. E se alguém do PT cometeu crime ou irregularidade, o PT não vacilará em cortar na própria carne. Agora, tem as investigações...

[Charge de Paulo Caruso com um tucano em cima de um muro]

Merval Pereira: [interrompendo] Até agora vacilou.

José Genoino: Mas até agora, Merval, qual é a prova concreta? Eu não vou fazer pré-julgamento e nunca fiz com os meus adversários; você sabe disso, é só ver as matérias da imprensa de quando eu fiz oposição.

Mauro Chaves: Genoino, tem que pedir apuração na CPI. Sinto muito, mas quem está conduzindo a CPI não é a oposição. Tem o presidente [o senador Delcídio Amaral] que é do PT [de Mato Grosso do Sul] e tem um relator [Osmar Serraglio] que é do PMDB [do Paraná]; portanto não é a oposição. Então, o que eles têm dito... agora, as entrevistas, tanto do relator como a do presidente, o senhor teve [acesso] às entrevistas, as coisas estão aparecendo...

Merval Pereira: [interrompendo] Diz-se que o senhor telefonou para o Delcídio [Amaral], reclamando...

Mauro Chaves: O senhor ligou para o Delcídio para impedir... dizendo que o que você fez conosco...

Merval Pereira: É verdade isso?

Mauro Chaves: É verdade ou não?

José Genoino: [com veemência] Mentira!

Mauro Chaves: É mentira?

José Genoino: Mentira. E eu devia ter sido ouvido. Eu liguei para o Delcídio para saber qual era o cronograma de depoimento do Silvio Pereira [um dos fundadores do PT, era secretário-geral do partido na época das denúncias de Roberto Jefferson] na CPI. Liguei para ele, [mas] não falei sobre...

Merval Pereira: [interrompendo] Não comentou sobre o Marcos Valério?

José Genoino: Não comentei com ele sobre o Marcos Valério, quando eu liguei para ele. Eu perguntei qual era o cronograma de depoimento...

Mauro Chaves: [interrompendo] Ele inventou isso, deputado? Ele inventou?

José Genoino: Bem, não tem declaração do Delcídio, é uma informação; o que tem de informação...

Mauro Chaves: [interrompendo] Ele é um petista.

Merval Pereira: O senhor ligou para ele para checar se ele disse isso mesmo?

José Genoino: Não, eu liguei para ele...

Merval Pereira: [interrompendo] Não; depois que saiu a notícia, o senhor ligou para ele para checar se ele comentou isso?

José Genoino: Liguei para ele e disse: “Delcídio, essa informação aqui, eu liguei naquele dia para você [para perguntar] sobre o cronograma dos depoimentos, para saber qual era o dia em que o dirigente do PT ia depor”. Foi isso que eu falei. Agora, nesse vendaval, nessas especulações, tem muitas notícias que precisam ser checadas...

Merval Pereira: O senhor imagina que ele possa ter se sentido pressionado?

José Genoino: Nada disso; uma prova é que os sigilos estão sendo quebrados, os depoimentos...

Mauro Chaves: [interrompendo] Ele falou em coação, ele usou o termo coação...

José Genoino: [interrompendo] Isso não é declaração dele.

Mauro Chaves: Ele disse que, num telefonema, falou para o senhor: “Genoino, eu não aceito esta coação”. Ele disse isso.

José Genoino: [Com veemência] Ele não falou isso! Ele não falou isso para mim, e eu telefonei para ele. E a melhor maneira agora é perguntar a ele sobre isso. O meu telefonema foi sobre o depoimento que já tinha sido aprovado; os 25 primeiros depoimentos, entre os quais o do companheiro Silvio Pereira [já tinham sido aprovados pela CPI].

Eliane Cantanhêde: Deputado, eu estou com a sensação no programa de que a gente está indo com uma velocidade tal, que parece a velocidade das denúncias...

José Genoino: E da crise.

Eliane Cantanhêde: E eu acho que, antes de a gente chegar nesta questão política, e chegar nesta questão de PSDB, de como foi o PT ou não, eu gostaria de fazer uma pergunta muito simples: quem é esse Marcos Valério, de que nunca ninguém ouviu falar? Nem o senhor, que assina com ele um empréstimo de R$ 2 milhões e 400 [mil reais], e de repente...

José Genoino: Bem, Eliane, sobre...

Eliane Cantanhêde: Descobre-se que ele é uma entidade fantástica. Quem é ele?

José Genoino: Sobre quem é Marcos Valério, ele vai depor na CPI, vai ser investigado e vai tomar conhecimento. A minha relação com o Marcos Valério, eu já deixei claro aqui...

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Eu não perguntei qual é a sua relação, deputado.

José Genoino: Eu já deixei claro aqui, foi a partir do secretário de finanças do partido... Então, as investigações é que vão mostrar quem [ele] é.

Eliane Cantanhêde: As investigações já estão mostrando que, primeiro: o Roberto Jefferson não inventou um ser, um fantasma, ele inventou um ser de carne e osso, que é publicitário, que tem essas contas de 400 milhões [de reais em contratos com estatais] e que agora, com outras investigações, a gente está comprovando que o Roberto Jefferson não mentiu no [que se refere a] quem ele [Marcos Valério] era...

José Genoino: [interrompendo] Eu vou lhe dar um exemplo, vou lhe dar um exemplo aqui de como é que ele [Roberto Jefferson] faz a história.

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Como é que ele [Marcos Valério] surge na vida do Delúbio; o senhor assina; ninguém sabe quem ele é. Só o Delúbio sabe quem ele é?

José Genoino: Deixe-me falar como é que ele faz a história. O Roberto Jefferson, à 1h30 da manhã, ele depõe dizendo o seguinte: que houve uma reunião com o Marcos Valério e ele me telefonou sobre uma negociação no [hotel] Ibis. [Isso] Nunca existiu; pode dizer a hora, o número do telefone, quebra o sigilo do telefone, [o fato é que] nunca conversei com o Roberto Jefferson sobre Marcos Valério, nem de relações...

Merval Pereira: [interrompendo] O senhor disse: “Ele é confiável, pode confiar”.

José Genoino: Nada disso. Aliás, ele nunca me perguntou sobre o Marcos Valério, ele nunca me perguntou.

Felipe Patury: Seguindo a simplicidade da Eliane, eu queria lhe perguntar só uma coisa. O senhor, quando assinou o documento, o senhor viu que o nome do Marcos Valério estava a dois centímetros do seu?

José Genoino: Claro que eu não sabia [quem era ele].

Felipe Patury: E o senhor sabia que ele...

Merval Pereira: [interrompendo] E o senhor perguntou quem era?

José Genoino: Eu não o conhecia...

Merval Pereira: Mas perguntou quem era ele?

José Genoino: E assinei em confiança ao secretário de finanças do PT, e a partir daí eu sou co-responsável, com a minha assinatura, pelo documento.

Sérgio Lírio: Depois que isso estourou, o senhor chegou e perguntou para o Delúbio, afinal, por que que um publicitário que tem tantas contas com estatais foi avalista e pagou uma parte desse empréstimo nesses últimos meses? Qual a explicação que foi dada?

José Genoino: Veja bem, é claro que eu conversei com o Delúbio, discutimos a questão... É evidente que é um procedimento que deixa essa forte lição para o PT. Não praticamos crime, não praticamos ilegalidade e nem fizemos qualquer defesa dos interesses do Marcos Valério, mas nós temos que ser mais vigilantes, mais criteriosos com esse empréstimo.

Florência Costa: Mas, por exemplo, o senhor estranha o fato de a bancada do PT ter discutido durante horas a quebra do sigilo, tentando evitar a quebra do sigilo dele, é uma situação difícil?

José Genoino: Não, sabe o que é, Florência, [você fez uma] ótima pergunta. Eu participei de duas CPIs; sabe qual era o procedimento que a gente tinha na CPI [do Orçamento, de 1994], presidida por Jarbas Passarinho, e depois pelo Benito Gama? Quebra de sigilo é a partir do depoimento; você ouve a pessoa, tem o depoimento, tem dúvida, tem contradição, quebra o sigilo e pode chamar [para depor na CPI] duas, três, quatro vezes, esse é o critério.

[Charge de Paulo Caruso em que os entrevistadores são representados por cabos de espingardas apontadas para Genoino, que diz: “Atirem a primeira pergunta!”]

Mauro Chaves: Qual o interesse que tinham para defender [o Marcos Valério]? O senhor nem o conhecia.

Merval Pereira: Mas isso é uma coisa técnica, uma coisa técnica que não tem a menor importância.

Mauro Chaves: Que interesse o senhor tinha em defendê-lo?

José Genoino: Mas eu não fui lá defender, porque eu não era deputado. Isso foi uma decisão da bancada, Mauro Chaves, a partir desse critério...

Mauro Chaves: [interrompendo] A bancada, que interesse tinha a bancada em defendê-lo?

José Genoino: A partir desse critério.

Merval Pereira: Mas é um critério técnico, bobo.

José Genoino: A partir desse critério, por exemplo, o Roberto Jefferson até agora não teve o seu sigilo quebrado, a CPI vai decidir, você...

Mauro Chaves: [interrompendo] Mas o interesse de se discutir oito horas, por que isso?

José Genoino: O normal... Toda CPI, a CPI no Congresso, ela é uma investigação política, tem disputa, e evidentemente se buscam procedimentos que sejam para todos, sejam para todos.

Mauro Chaves: Mas por que o medo da quebra de sigilo, deputado? Por que o medo da quebra de sigilo?

José Genoino: O PT não tem esse medo, o PT não tem esse medo...

Merval Pereira: [interrompendo] Mas o comportamento do PT...

Mauro Chaves: [interrompendo] O comportamento da bancada não foi esse...

José Genoino: O PT não teme as investigações e o PT quer a verdade...

Mauro Chaves: Mas o comportamento da bancada é como se tivesse medo.

José Genoino: O PT quer a verdade. O PT, a bancada estava defendendo um critério para várias câmaras e vários deputados.

Alexandre Machado: Genoino. Presidente Genoino, só uma perguntinha.

Felipe Patury: [interrompendo] O PT, me parece que não está muito fechado sobre essas suas explicações. Parece que hoje, eu li na internet, o Romênio Pereira, que é dirigente do partido, disse que não acreditava nas suas justificativas...

Merval Pereira: [interrompendo] E está pedindo a sua saída. Aliás, vários deputados hoje foram à tribuna pedir a saída de toda a direção [do PT].

[sobreposição de vozes]

[...]: Se o Romênio Pereira, que é o seu colega de executiva, não acredita, por que o resto da população tem que acreditar, deputado?

Eliane Cantanhêde: Não só deputados; o ministro [Ricardo] Berzoini, do Trabalho, também pediu a sua saída hoje.

José Genoino: Eu vou falar sobre isso com a maior tranqüilidade. Em primeiro lugar, eu respeito a opinião desses dirigentes, respeito. Quero, de maneira muito sincera e franca, também destacar a importância de outros dirigentes que defendem a minha permanência na presidência do PT. O cargo de presidente do PT é do diretório nacional...

Alexandre Machado: [interrompendo] Você vai colocar o cargo à disposição?

José Genoino: Nada farei, nada, que prejudique o meu partido. Pode ter certeza disso, e eu olho no olho. Eu não tenho motivo, depois de 25 anos de PT e 40 anos de militância política, o que está aqui em jogo não é a vida pessoal; eu vou discutir isso tranqüilamente no diretório nacional, com todos os dirigentes...

Alexandre machado: Genoino, Genoino...

Florência Costa: [interrompendo] O senhor quer permanecer no partido como presidente do partido?

José Genoino: Eu sou presidente do PT.

Florência Costa: Sinceramente, o senhor quer permanecer?

José Genoino: Eu sou presidente do PT. É um orgulho e uma honra dirigir o PT, é um orgulho e uma honra dirigir o PT. E dirigir o PT num momento grave da história do PT, que é enfrentar essa crise, com a verdade e com as investigações, cumprir a agenda de defesa das mudanças do governo Lula, preparar o partido para a realização do seu processo interno de eleição da direção...

Merval Pereira: [interrompendo] O senhor acha que o senhor tem condições [...] de continuar [na presidência do PT]?

[sobreposição de vozes]

José Genoino: E produzir internamente uma pactuação dentro do PT.

[sobreposição de vozes]

Alexandre Machado: Genoino.

José Genoino: Sobre as condições, quem faz essa avaliação...

Mauro Chaves: [interrompendo] Eu acho até admirável, eu até dou os parabéns para o senhor, eu acho admirável a sua coragem.

José Genoino: Sobre isso, deixe-me responder a ele, antes de agradecer ao seu elogio, deixe-me responder ao Merval antes de agradecer ao seu elogio.

Mauro Chaves: Eu admiro.

José Genoino: Merval, essa avaliação não é minha. Eu sempre fui de um projeto coletivo. Quando eu fiz greve de fome na cadeia, eu era contra, e aderi imediatamente, está certo? Todos os processos que eu vivi, eu sou de um projeto coletivo.

Merval Pereira: O senhor disse uma frase uma vez, que “o erro pela causa é perdoado; o erro pela causa própria não é perdoado”. O senhor continua com essa idéia?

José Genoino: Olha, o PT não rouba, não roubou; o PT não comprou voto nem apoio de deputado. Se houve falhas e erros, nós temos que avaliar com o partido, dar as explicações ao partido, pedir desculpas ao partido e à opinião pública e continuar defendendo esse grande projeto, que é o projeto do PT.

Paulo Markun: [interrompendo] Presidente Genoino, tem aqui um levantamento feito pela Agência Reuters – é uma agência de notícias respeitada não só no Brasil –, que relaciona os dados entre os saques feitos em dinheiro vivo pelas empresas do Marcos Valério Fernandes de Souza e votações importantes que aconteceram na Câmara e no Senado. E os dados são impressionantes, porque, em diversas ocasiões, esses saques de valores muito consideráveis coincidem com as votações em questão. O senhor acha que isso é mera coincidência?

José Genoino: Markun, eu não tenho a competência nem o poder para investigar esse tipo de coincidência ou não, até porque as próprias matérias falam de coincidência e de não coincidência, pelo que eu li hoje. Quem é que vai responder a essa questão? As investigações; com a palavra, os depoimentos; com a palavra, as quebras dos sigilos; com a palavra, o processo de investigação eficaz que vai acontecer.

Paulo Markun: Mas o senhor não acha que o PT vem agindo, na CPI, no sentido de desqualificar os acusadores, muitos dos quais não precisam ser desqualificados?

José Genoino: Pelo contrário, pelo contrário, o que aconteceu na CPI é que algumas pessoas, como o senhor [Maurício] Marinho [ex-chefe do departamento dos Correios, flagrado num vídeo recebendo suposta propina], que estava lá na fita, citando esse ou aquele político, foi badalado, foi cortejado. O PT tem feito perguntas consistentes, sérias, e atuado com toda a autonomia. E veja bem: o que diziam dessa CPI? Essa CPI, quando ela foi formada, diziam que ela era a CPI do governo, [mas] não é CPI do governo, é CPI do Congresso, e o que ela está fazendo, é com total autonomia, com total independência.

[Charge de Paulo Caruso mostra a sigla “CPI”, em tamanho avantajado, sendo carregada com muito esforço pelos braços e costas de Genoino, com o corpo arqueado]

Paulo Markun: Muito embora não se tenha respeitado a paridade de ter um presidente da oposição e um relator do governo ou vice-versa.

José Genoino: Isso não altera o caráter, a legitimidade e a autonomia da CPI, e os fatos estão mostrando que falam mais do que a interpretação.

Alexandre Machado: Genoino, ainda voltando ao caso do partido e da executiva, amanhã acontecerá a reunião da executiva, e hoje o secretário Silvio Pereira entregou o seu cargo. Eu gostaria de ouvir o seu comentário a respeito disso, já que você está defendendo a idéia de que, apesar do engano, foi um engano que não havia crime, não havia ilegalidade e que, então, não havia um problema maior.

José Genoino: Veja bem, Alexandre, em primeiro lugar eu quero destacar a importância dos termos da carta do Silvio Pereira. Ele diz uma frase lá que é um princípio a todos nós: “o PT é maior do que as pessoas individualmente”. A executiva não pode, ela não tem competência para decidir, a executiva prepara a reunião do diretório nacional que nós vamos..., a executiva vai convocar provavelmente para o fim de semana e aí vai discutir essa questão em toda a sua dimensão, em todos os seus aspectos, buscando como tarefa central a defesa do PT e o enfrentamento dessa crise. E nós não vamos esconder nada, e vamos fazer essa discussão franca, olho no olho; eu vou conversar com os dirigentes do PT, eu vou conversar com todos os membros do diretório nacional; estou conversando com todas as correntes do PT, porque nós vamos enfrentar essa crise, e o PT já passou por crises também duras, duras – só que não tinha [muita] repercussão porque é agora que nós estamos no governo –, mas muito duras. Eu quero deixar um exemplo aqui: eu fui acusado de ter matado um bóia-fria em 86, e a minha votação caiu de 58 mil para 29 mil em Leme, vocês sabem disso. E foi o Tadeu Afonso, que eu faço questão de registrar aqui, que fez uma página inteira de uma reportagem mostrando que o PT, que os deputados do PT, não tinham atirado em bóia-fria. Portanto, essas questões nós vamos resolver, o PT tem energia, tem dirigentes, tem militância, tem acúmulo para resolver essa crise...

[...]: [interrompendo] A comparação...

José Genoino: O que menos vale agora é a avaliação pessoal desse ou daquele indivíduo.

[Inserção de vídeo]

Paulo Markun [em off, enquanto passam imagens de políticos e de episódios que marcaram o escândalo do mensalão]: José Genoino e o PT eram alvos distantes de denúncias de corrupção, quando o ex-diretor dos Correios, Maurício Marinho, foi flagrado recebendo suposta propina. Ao relacionar o esquema ao deputado Roberto Jefferson, Marinho endereçou as suspeitas ao então presidente do PTB. Jefferson negou e, como havia prometido, partiu para a acusação, torpedeando o governo e o PT com a denúncia do mensalão. No depoimento ao conselho de ética da Câmara, além de atacar o então chefe da Casa Civil, José Dirceu, disse que o presidente do Partido dos Trabalhadores também sabia da propina mensal.

[Roberto Jefferson no vídeo]: Desde agosto de 2003 é voz corrente em cada canto desta casa [corte no vídeo] que o seu Delúbio, com conhecimento do seu José Genoino sim, tendo como pombo-correio o seu Marcos Valério, um carequinha que é publicitário lá de Minas Gerais, repassa dinheiro a partidos que compõem a base de sustentação do governo, num negócio chamado “mensalão”.

Paulo Markun: Na semana passada, Jefferson voltou à carga no depoimento à CPI dos Correios. Acusou o PT de tentar impedir as investigações, desafiou deputados e senadores, ao dizer que todos fazem prestação falsa de contas à Justiça Eleitoral, e confirmou a denúncia sobre o desvio de dinheiro de Furnas [Centrais Elétricas S.A.], que o próprio diretor de engenharia da empresa, Dimas Toledo, explicou a ele como funcionava.

[Roberto Jefferson no vídeo]: Explicou o seguinte: que Furnas deixa sem problema três milhões de reais por mês à diretoria dele, e que ele fazia os seguintes repasses: um milhão para o senhor Delúbio, PT nacional; um milhão para o doutor Rodrigo [Botelho Campos], PT de Minas Gerais; 500 mil para o doutor [José Roberto Cesaroni] Cury, para uma diretoria de um grupo de deputados que havia constituído esse diretor no princípio do governo, com o ministro José Dirceu; e 500 [mil] ficavam na diretoria.

Paulo Markun: Genoino, são duas acusações: o mensalão e Furnas, como é que o senhor responde a elas?

José Genoino: O PT nunca conversou, nunca participou de reunião, nunca recebeu denúncia de mensalão. A primeira vez que eu vi essa matéria, que eu vi essa história, foi no Jornal do Brasil [de 24/9/2004], quando o então presidente da Câmara [João Paulo Cunha, do PT/SP] tomou as providências. Portanto, essa invenção tem que ser apurada; talvez tenha uma CPI do mensalão, ou a CPI mista, ou a CPI da Câmara, e vai investigar. Não existe, por parte do PT, por parte dos aliados, essa história de mensalão...

Paulo Markun: [interrompendo] Isso inclui o Delúbio?

José Genoino: Não existe, não existe. É uma denúncia genérica, fala das pessoas, sem nenhuma prova concreta, e cria um constrangimento com os deputados da CPI sobre declaração de prestação de contas. Aliás, um jornal no fim de semana mostrou que os números que ele [Roberto Jefferson] colocou – parece que foi o jornal O Globo – não correspondiam ao que ele tinha anunciado pela prestação de contas dos senadores e deputados. Portanto, isso não existe; o PT nunca conversou, nunca discutiu, não tem conhecimento disso. Quando a denúncia foi formulada, e o Jornal do Brasil divulgou, houve providência do presidente da Câmara. Sobre essa denúncia de Furnas, veja bem, a própria empresa está com a comissão de sindicância, os deputados do PTB que ele denuncia disseram no jornal O Globo que foi o contrário a conversa. Olha bem, vamos imaginar, um diretor de Furnas, antigo, com a experiência que tem, no primeiro contato com o deputado, imagina, vai chegar a fazer esse tipo de proposta? Isso não existe; portanto, o PT nacional, o PT de Minas Gerais não têm qualquer relação financeira com Furnas, isso vai ser esclarecido CPI ou na comissão de sindicância com a qual Furnas está apurando.

[Charge de Paulo Caruso com Genoino, de boca aberta, segurando uma lupa. Seu olho direito aparece aumentado pela lente. Lê-se: “Olho no olho!”]

Alexandre Machado: Presidente, nesse episódio todo, parece que tem muitas coisas que não existem. Você diz que esse caso não existe. Agora, uma empresa publicitária que retira, aparentemente, 72 milhões de reais, em dinheiro vivo, é algo que não existe em nenhum ramo de atividade no Brasil, não há nada que... E eu vou fazer uma pergunta meio torta, mas...

José Genoino: [interrompendo] Pode perguntar reto, direto, eu gosto de direto [risos].

Alexandre Machado: Não, eu vou lhe explicar por que é torta; porque nesse documento que você assinou, o Delúbio não teve o cuidado de lhe contar com quem que ele estava negociando, não é? E o Delúbio e o Marcos Valério já se declararam grandes amigos, grandes amigos, são duas pessoas que vêm do interior, que têm raízes próximas e tudo isso. Não terá havido a possibilidade então de que o próprio Delúbio estivesse envolvido com o outro caso e que você não tivesse nenhum conhecimento de uma coisa...?

José Genoino: [interrompendo] Alexandre, quando se trata de denúncias, e você sabe disso muito bem, como jornalista, e até como pessoa que já trabalhou no governo, nós temos que ter muito cuidado.

Alexandre Machado: Sem dúvida.

José Genoino: Nós temos que ter muito cuidado. Primeiro: eu não posso responder genericamente nos termos em que você coloca. Segundo: sobre o empréstimo, eu já deixei claro. Agora, essa história num momento de investigação, você tem que saber separar o joio do trigo; tem denúncias que são formuladas que têm que ser investigadas; com a palavra, a investigação.

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Mas espera aí, espera aí, deputado.

José Genoino: E essa investigação vai esclarecer. Eu estou me referindo à questão de Furnas.

Eliane Cantanhêde: Mas espera aí, só um minutinho. O senhor, desde o início do programa, o senhor está dizendo assim: “quando for investigado”, “vamos esperar as investigações”, mas eu acho que a essa altura do campeonato, já há muita coisa investigada, porque são órgãos do governo, o Coaf é do governo, existe gente...

José Genoino: [interrompendo] A Polícia Federal é do governo...

Eliane Cantanhêde: Sim, a Polícia Federal é do governo...

José Genoino: [interrompendo] Que está investigando.

Eliane Cantanhêde: Então vamos falar sobre as coisas que já foram investigadas. Por exemplo, o senhor acha que é coincidência o Roberto Jefferson falar: “Olha, tem um carequinha aí chamado Marcos Valério, e ele tem milhões e paga deputados em nome do PT”; e logo depois se descobre que realmente o sujeito tem 400 milhões e que movimenta 72 milhões em dinheiro vivo. E logo depois se descobre que esse mesmo sujeito, ele é não só avalista do PT, como ele paga dívidas do PT. O senhor acha que toda essa seqüência de coisas investigadas...

Mauro Chaves: [interrompendo] Não, e os contratos...

Eliane Cantanhêde: Essas coisas investigadas...

José Genoino: [interrompendo] Agora me dá o espaço para lhe responder, não é?

Eliane Cantanhêde: Espera aí, deixe-me só fazer a interrogação...

Mauro Chaves: [interrompendo] Contrato com o Banco do Brasil, Eletronorte...

Eliane Cantanhêde: A pergunta e a interrogação: o senhor acha que tudo isso é uma mera coincidência, essas investigações já comprovadas?

José Genoino: Em primeiro lugar, vamos tratar das investigações: a Polícia Federal está investigando. No governo Lula, foi o maior número de operações, o maior número de prisões, o maior número de demissões, 2003, 2004, 2005, inclusive algumas investigações que o PT soube cortar na própria carne. E algumas investigações que foram estampadas em primeira página de setores da imprensa, que pegaram dois petistas como se fosse corrupção de madeira, e os dois não tinham nada a ver, até a Polícia Federal pediu desculpas, o diretor de floresta, de Brasília, e o chefe do Ibama no Mato Grosso. Veja bem, qual é a denúncia concreta que atinge esse ou aquele dirigente do PT, enquanto prova, enquanto coisa concreta? Por isso que eu falo que tem que ter as investigações...

[Charge de Paulo Caruso onde se vê uma luta de boxe entre Genoino e Roberto Jefferson. O primeiro acerta um soco no olho esquerdo de Jefferson e diz: “Eu gosto de direto!”]

Eliane Cantanhêde: Pois é, por isso que eu lhe pergunto...

José Genoino: Tem que ter as investigações, eu não posso aceitar...

Eliane Cantanhêde: Então o senhor acha que, por enquanto, tudo isso é uma coincidência?

José Genoino: Não, eu estou dizendo o seguinte, eu estou lhe falando...

Eliane Cantanhêde: O que é isso então? Quem é esse ser? E que coincidência é?

José Genoino: Eliane, eu estou lhe falando o seguinte: num processo como esse, tem coincidências ou não, tem contradições ou não, quem é que vai resolver o problema? É uma investigação; a CPI tem o poder de investigação judicial. Vai ter depoimento, tem quebra de sigilo, tem exames dos documentos, e o PT não teme investigação. E se alguém do PT cometeu erro, e se aparecer, se cometeu erro vai aparecer nas investigações, o PT vai... o patrimônio do PT é maior do que cada um de nós individualmente. É isso que eu estou lhe colocando; agora nós estamos num processo de investigação. Eu não aceito a sua tese de que já tem uma pré-condenação ou um prejulgamento formulado.

Eliane Cantanhêde: Mas toda vez que a gente fala aqui do Marcos Valério e do que já foi apurado, o senhor sai sempre com a mesma resposta...

José Genoino: [interrompendo] Não, eu estou dizendo...

Eliane Cantanhêde: Que é: “Vamos esperar as investigações...”

José Genoino: Não, eu estou dizendo para você...

Eliane Cantanhêde: Vamos trabalhar com o que já apareceu...

José Genoino: Eu estou dizendo, Eliane, três coisas. Vamos deixar claro aqui para a gente se entender, eu respondo tudo...

Eliane Cantanhêde: Vamos entender: o senhor explica quem é o Marcos Valério...

José Genoino: Primeiro, é olho no olho. Primeiro, eu disse aqui que quando assinei o contrato, é em confiança ao Delúbio. Fazia dois meses que eu estava na presidência do PT e [estava] dois anos afastado da executiva. Em segundo lugar, assinei em confiança, e é um procedimento normal no partido; passo a ser co-responsável, como presidente do PT, pelos meus atos. Falei aqui que vi o Marcos Valério algumas vezes em Brasília, sem ter relação de trabalho e de reunião com ele. Esses documentos do Coaf, que é um processo que, pela própria informação do Coaf, vem de um período anterior de relações desse empresário, que não era com o PT, eram relações com o governo de Minas, que não é do PT, porque é um processo antigo...

Merval Pereira: [interrompendo] Mas de onde que o senhor tirou que o Coaf informou que o dinheiro vinha de antes?

José Genoino: Não, eu estou dizendo o seguinte: não estou dizendo que o Coaf informou, estou dizendo [que] o processo que levou à investigação do Coaf é um processo antigo.

[sobreposição de vozes]

José Genoino: Foi isso que eu vi na...

Eliane Cantanhêde: O fato é que o Roberto Jefferson disse: “Existe esse carequinha aí que paga os deputados em dinheiro, 30 mil reais, em nome do PT todo mês, e se confirma por um órgão do governo que o sujeito realmente pega o dinheiro e sai...

José Genoino: [interrompendo] Aí você tem que dar...

Eliane Cantanhêde: E vai 31 vezes a Brasília, e é em dinheiro vivo. É uma coincidência?

[sobreposição de vozes]

José Genoino: Primeiro, Eliane, você tem que dar um crédito ao governo...

Eliane Cantanhêde: Eu lhe perguntei objetivamente: é uma coincidência, deputado?

José Genoino: Primeiro, [o Coaf] é um órgão do governo que está fazendo isso. Segundo, isso é um processo antigo, que estava correndo em Minas Gerais e não foi divulgado. Terceiro...

Merval Pereira: [interrompendo] Não, não é um órgão do governo. O órgão do governo tem lá a relação...

José Genoino: [interrompendo] Claro, até porque...

Merval Pereira: Foi requisitado...

José Genoino: [com veemência] E você sabe, Merval, até porque foi este governo nosso que aprovou uma lei que, a partir de 100 mil reais, informa ao Ministério Público. Foi o nosso governo que aprovou essa lei, você sabe disso.

Mauro Chaves: [interrompendo] Genoino, me responda uma coisa. Se o...

José Genoino: [interrompendo] Então, veja bem. Esse processo está correndo e está sendo investigado...

Paulo Markun: [interrompendo] Tem um outro tema...

José Genoino: [interrompendo] Eu não vou aqui aceitar a tese, porque tem uma tese... Isso é normal no processo de investigação, com essa investigação tão ampla, que você já vai formulando as pré-condenações. Então eu não vou entrar essa tese, que está errada.

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Não, senhor, são fatos, fatos e fatos.

Mauro Chaves: [interrompendo] Se, por acaso, o relator da CPI, o atual relator, ele está dizendo já que, examinando os contratos, ele está vendo já... parece que [ele] é uma pessoa criteriosa, parece que é uma pessoa minuciosa...

José Genoino: [interrompendo] É do PT, não é?

Mauro Chaves: Não, o relator é do PMDB.

[sobreposição de vozes]

José Genoino: [O relator] É da base de apoio do governo.

Eliane Cantanhêde: Mais ou menos...

[sobreposição de vozes]

Mauro Chaves: [A CPI] Tem um presidente petista e tem um relator peemedebista. Mas, Genoino, o importante é o seguinte: ele está fazendo um exame minucioso. Ele está chegando à conclusão, e tem dado entrevistas a respeito disso, de que aqueles contratos – que atualmente [seriam em torno de] 150 milhões [de reais] –, aqueles contratos que [as empresas de Marcos Valério] têm com o Banco do Brasil, Eletronorte, têm com a Câmara dos Deputados, têm com os Correios etc. Esses contratos, ele está já vendo sérios sinais de superfaturamento. Eu pergunto o seguinte: comprovando-se isso – ele está dizendo isso –, o senhor acha também que o PT não tem nada a ver com isso?

José Genoino: Primeiro, eu não vou responder no sim [ou não], porque tem uma investigação. Investigação é investigação...

Mauro Chaves: [interrompendo] Mas ele já está dizendo; ele já viu indícios...

José Genoino: Investigação, e não é... Mauro Chaves, você sabe, como bom jornalista, mas sempre tem que levar em conta que eu, como presidente do PT, não tenho esse tipo de relação de avaliar a opinião do relator, até porque o relator vai aprovar ou não os requerimentos ou relatório, dependendo da maioria, dependendo do consenso da CPI, e a CPI está sendo bem conduzida. Portanto, isso tem que ser esclarecido nas investigações...

Paulo Markun: [interrompendo] Genoino.

José Genoino: Em primeiro lugar, porque a maioria dos contratos já vinha de antes. Aliás, o nosso governo não rompeu contratos que vieram do governo anterior...

Mauro Chaves: [interrompendo] Não, a maioria dos contratos não. Sinto muito, a maioria dos contratos vem de antes? Não.

José Genoino: De antes.

Mauro Chaves: Não.

José Genoino: Só tem um contrato, que é o dos Correios, que vai ser investigado...

Mauro Chaves: A maioria não.

[Charge de Paulo Caruso mostra Genoino andando de bicicleta, tendo deixado rastros em forma de curvas, ao longo das quais está escrito: “Petrobras, Eletronorte, BB, Correios”. Ele diz: “Prefiro as curvas!”]

Paulo Markun: Genoino.

José Genoino: Foram contratos renovados. Isso tudo, Mauro Chaves, a CPI vai investigar.

Paulo Markun: Tem um tema que nós não estamos abordando e eu considero indispensável tocar...

José Genoino: [interrompendo] Então vamos entrar nele.

Paulo Markun: Que é o dinheiro, os 20 milhões de reais que o PT daria para o PTB. Segundo o Roberto Jefferson, deu apenas 4 milhões; reiterou isso “n” vezes e, em todas as ocasiões, citou o senhor como sendo participante desta negociação. A pergunta é...

[sobreposição de vozes]

Merval Pereira: E até há boatos em Brasília de que [...] os 20 milhões...

José Genoino: Olha, boatos existem à vontade. Até existe boato que é como fumaça e gelo seco, que só dura enquanto está tendo o boato...

Paulo Markun: O meu raciocínio é por que o Roberto Jefferson diria algo que o incrimina...

José Genoino: [interrompendo] Primeiro, o PT não fez acordo financeiro de passar dinheiro direto para o PTB [nas eleições de 2004]. O nosso acordo foi político-eleitoral nas cidades em que o PT era cabeça de chapa ou o PTB era cabeça de chapa, e a gente tinha responsabilidades com a despesa. O PT...

Paulo Markun: Mas ele menciona detalhes da conversa com o senhor, não é?

José Genoino: O PT...

Mauro Chaves: Mas nesse apoio entra dinheiro também, não é?

José Genoino: Nós fizemos um acordo listando as cidades...

Mauro Chaves: [interrompendo] Não entra dinheiro nesse acordo?

José Genoino: Nós fizemos um acordo listando as cidades...

Merval Pereira: [interrompendo] Existe a possibilidade de a gente...

José Genoino: Listando as alianças. O PT não passou dinheiro para o PTB.

Merval Pereira: Não, tudo bem, não passou dinheiro. Mas, presidente, só uma coisinha...

José Genoino: Eu vou chegar aí. Como é que o PT fez a aliança com os aliados? O PT ajudou em show, em material de propaganda, em televisão, em várias atividades...

Merval Pereira: Seria possível que o apoio do PT...

José Genoino: E o PT está com uma dívida de campanha de 20 milhões...

Merval Pereira: [interrompendo] Presidente.

José Genoino: Quer dizer, imagine, o PT está sendo acusado de tudo isso e nós temos uma dívida de 20 milhões. Em alguns estados, nós temos dívidas que estamos tentando honrar, das campanhas vitoriosas ou derrotadas.

Merval Pereira: Presidente, será possível que essa ajuda que o senhor admite ter dado para o PTB...

José Genoino: [interrompendo] Nas campanhas eleitorais.

Merval Pereira: Nas campanhas eleitorais... que resultasse num total de quatro milhões?

José Genoino: Olha, primeiro lugar: eu não fiz essa soma; e em segundo lugar, quando ele fala em planilha, era a relação das cidades. Em algumas cidades nós apoiamos, e é bom deixar claro, nós apoiamos até criando divergências internas, como foi o caso de Juiz de Fora [MG], que eu apoiei.

Paulo Markun: Mas ele cita que o dinheiro veio com notas do Banco Rural, Banco do Brasil.

[sobreposição de vozes]

José Genoino: [interrompendo] Mas veja bem, aí ele tem que provar.

Merval Pereira: Mas esse apoio não custa dinheiro?

José Genoino: Porque quando essa questão apareceu, em setembro, numa matéria da revista Veja, o Roberto Jefferson fez um artigo e disse claro...

Felipe Patury: [interrompendo] E desmentiu.

José Genoino: Agora, quem é ele? É o de setembro, é o de agora ou é o de dezembro?

Felipe Patury: Pois é, mas hoje ele se lembrou. Será que o senhor não pode, de repente, ser surpreendido pelo Delúbio se lembrando que fez um novo acordo de que o senhor não tomou conhecimento?

José Genoino: Olha, Patury...

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Está todo mundo tão esquecido ultimamente...

José Genoino: Ficar discutindo hipóteses, o PT...

Felipe Patury: Não, porque veja bem, o senhor...

Mauro Chaves: [interrompendo] O senhor também esqueceu, não é? O senhor esqueceu também há pouco...

Felipe Patury: O senhor assinou um acordo de 2,4 milhões, e o senhor esqueceu.

Mauro Chaves: O senhor disse que ele não era o Marcos... não era avalista, que o senhor esqueceu e depois lembrou.

José Genoino: Não, eu não disse que era avalista. Vai com calma, não vem botar coisa na minha boca...

Mauro Chaves: O senhor disse que não era.

José Genoino: Vamos ser transparentes...

Mauro Chaves: O senhor negou.

José Genoino: Mauro Chaves, eu sei o que eu falo. Então, deixe-me lhe falar o que eu falei aqui. Eu disse que assinei o contrato em confiança ao Delúbio Soares, e não conhecia Marcos Valério. Foi isso que eu falei, e quando eu informei aos leitores da Veja que tinha passado a informação não correta, foi porque eu perguntei, no prazo de uma hora; eu fui extremamente atencioso com o jornalista. Aliás, vocês sabem, me ligam direto, eu atendo direto, disponibilidade total, e às vezes eu pago um preço por essa disponibilidade total.

Alexandre Machado: [interrompendo] Genoino.

José Genoino: O que eu falei? Uma hora depois eu perguntei na secretaria: tem este empréstimo, este aval? Não. Aí eu informei no dia seguinte. Aí eu ordenei, eu conversei com o Delúbio no sentido de dar a informação, e ele mesmo corrigiu, dando a informação verídica, é isso.

Alexandre Machado: Genoino.

José Genoino: Veja bem, Patury. Nós estamos fazendo um processo de levantamento das nossas contas, o que está registrado, o que está documentado. Está tudo documentado, está tudo documentado...

Alexandre Machado: Genoino.

José Genoino: E vamos prestar contas de tudo para a sociedade.

Merval Pereira: Esse apoio ao PTB, tem dinheiro nisso, não é? Custa dinheiro.

José Genoino: O PT apoiou, nas alianças com o PTB... Claro [que custa dinheiro], nas campanhas de televisão, [na compra] de camisetas, [na contratação] de shows...

[sobreposição de vozes]

Mauro Chaves: Vai dinheiro nisso...

José Genoino: Lógico, nós ajudamos em dinheiro [na campanha eleitoral] em Juiz de Fora...

[Charge de Paulo Caruso com Genoino se equilibrando em um monociclo. Ao seu redor, voam garrafas de malabarista, nas quais lemos: “passagens, shows, assessorias, camisetas, campanhas”. Genoino diz: “O PT só faz acordos políticos!”]

[sobreposição de vozes]

Merval Pereira: Foram [entregues] quatro milhões [para o PTB]?

José Genoino: Agora ele fala que o PT... falar em 20 milhões, falar em quatro milhões? Agora [ele, Roberto Jefferson] precisa dizer quem passou. Aí, veja bem, tem que dizer quem passou esse dinheiro...

Sérgio Lírio: Isso era distribuído como? Era direto...

José Genoino: O PT não passou dinheiro para o PTB.

Sérgio Lírio: Mas essa ajuda era como? Era direto para o candidato? Não passava pela cúpula do partido? Como se negociava o dinheiro?

José Genoino: Olha, a ajuda... Veja bem, como é que é feito isso aí? A direção nacional repassa, nas campanhas eleitorais, considerando que é [uma campanha] municipal, para o comitê financeiro das cidade. O comitê financeiro das cidades teve a ajuda da direção nacional. Esse comitê financeiro tem uma co-responsabilidade nas coligações, com os partidos da aliança, seja pelas contribuições da direção nacional, seja pela sua capacidade de arrecadação no estado.

Alexandre Machado: Genoino.

Sérgio Lírio: Mas não é o Roberto Jefferson que decide para quem é que você manda esse dinheiro... Não é com a cúpula do PTB que se decidia para onde esse dinheiro ia?

José Genoino: Nós fizemos um acordo político-eleitoral com o PTB. Esse acordo político-eleitoral, nós tivemos, inclusive, dificuldades em muitas cidades. E ele foi muito sincero e franco quando disse, na época da matéria da Veja, que algumas vezes, ao solicitar o dinheiro para mim, eu disse que não tinha nem para os [candidatos] do PT.

Florência Costa: O Roberto Jefferson já está falando há bastante tempo sobre essa questão do dinheiro. Já não era tempo então do PT... o senhor falou agora que não sabe exatamente quanto deu para o PTB...

José Genoino: Não, nós sabemos. São as campanhas que nós realizamos. Agora, veja bem...

Florência Costa: O valor exato, são quatro milhões? O valor exato, é isso que eu pergunto.

José Genoino: Nós estamos... [o valor] está nas prestações de contas de cada município. Por exemplo, eu sei que Juiz de Fora [MG], São João do Meriti [RJ], Patos de Minas [MG], dá em torno de 180 mil. Veja bem, nós estamos respondendo a essas questões; agora, eu estou respondendo no bate-pronto. Eu agradeço, inclusive, essa oportunidade de, na televisão, poder estar divulgando aqui, na televisão...

Alexandre Machado: [interrompendo] Deixe-me perguntar...

José Genoino: Porque eu já recebi outras propostas, mas eu preferi a televisão.

Alexandre Machado: Deixe-me perguntar a propósito disso. Você dizia agora há pouco que você atende os jornalistas, isso tudo. Isso é verdade e faz parte até da sua história de relacionamento com a sociedade e com os jornalistas. E este é um dos momentos mais delicados da história do PT e do governo Lula; e eu lhe pergunto: o senhor não sente falta da presença do deputado José Dirceu nesta cruzada, neste momento? Pois ele saiu do governo, disse que iria mobilizar a militância do partido, disse que cruzaria o país numa cruzada para defender o partido e, desde então, ele submergiu. Ele desapareceu; parece que ele não existe neste noticiário, quando ele era um personagem central da crise da coordenação política do partido.

José Genoino: Em primeiro, lugar foi bom você tocar nesse assunto, porque eu quero fazer aqui, em nome da presidência do PT, com meu respeito, a minha homenagem a um grande companheiro, que eu o conheço [desde] antes da fundação do PT, e a quem eu tenho o maior respeito. Um companheiro de luta, de coragem, de lealdade. O José Dirceu saiu do governo; está exercendo o seu mandato na Câmara dos Deputados; vai participar de todas as investigações. E ele está ajudando o PT e ajudando a bancada do PT. Agora, veja bem: o que se colocava quando ele saiu? Colocavam-se várias especulações...

Alexandre Machado: [interrompendo] Não, ele colocou, não é? Ele disse que iria fazer uma cruzada.

José Genoino: Mas ele está organizando o seu gabinete; está organizando a sua vida parlamentar; isso tem um tempo e é isso que ele está fazendo. Ele está se preparando para os depoimentos dele, portanto ele está absolutamente normal, e eu expresso aqui a minha total confiança no companheiro, que vai enfrentar bem essa crise.

[Charge de Paulo Caruso mostra Genoino, de costas e um pouco de perfil, dizendo: “...Depois do PTB vem aí o PTMDB!”. Nas duas siglas, o segmento “PT” está destacado em vermelho]

Alexandre Machado: O senhor acha que está o.k.; está o.k. assim?

José Genoino: Está ótimo, está ótimo. Não existe areia no nosso relacionamento. Tentam plantar, tentam cutucar...

Alexandre Machado: Não, não estou plantando, eu só estou perguntando.

Eliane Cantanhêde: Aliás, só uma coisa, por falar em areia no relacionamento, no encontro do 12° Fórum da Esquerda Latino-Americana, foi muito curiosa a reação do presidente Lula. O senhor estava ao lado dele, ele mal lhe cumprimentou; o senhor acabou de falar e, na televisão, ficou muito nítido que o senhor veio cumprimentá-lo e ele fez assim [gesticula, indicando que Lula cumprimentou Genoino com distanciamento, sem olhar para ele]. E eu estava assistindo com amigos, e eles comentaram: “Puxa, o Lula demitiu o Genoino ao vivo” [risos].

José Genoino: Primeiro, o Lula não demite ninguém no PT, porque o PT tem autonomia no seu funcionamento.

Eliane Cantanhêde: “Demite”, deputado [faz sinal de aspas com as mãos], o senhor entendeu o que eu falei.

José Genoino: Segundo, Eliane: se eu tivesse conversado muito com o Lula ali [gesticula com as mãos, aludindo a uma conversa entre ele e Lula], o que vocês iam dizer na manchete e [sobre] a cena? [Imagina a manchete] “Está discutindo a crise com o Lula, há um clima de tensão” etc e tal.

Merval Pereira: O senhor conversou antes com ele? Antes daquela cena?

José Genoino: Não deu tempo.

[sobreposição de vozes]

Paulo Markun: Não tem areia [entre você e o Lula]?

Eliane Cantanhêde: Deputado, as pessoas se olham no olho quando se cumprimentam, não é? As pessoas não fazem assim...

José Genoino: Olha, não adianta colocar areia no meu relacionamento com o presidente Lula.

Eliane Cantanhêde: Como é que foi a sua conversa com ele anteontem?

José Genoino: Primeiro eu vou falar da minha relação...

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Com ele?

José Genoino: Depois eu respondo a sua pergunta. Eu tenho uma relação de confiança, de admiração e de muito respeito pelo companheiro Lula.

Mauro Chaves: [interrompendo] O senhor conta tudo para ele, como o José Dirceu disse que contava?

José Genoino: Tenho essa relação. Portanto, já que eu usei a palavra na discussão, nós temos uma relação de confiança e afinidade muito grande. E eu lutarei, tudo o que for possível, para viabilizar o projeto do governo do presidente Lula. Nós conversamos sobre o Fórum São Paulo, nós conversamos sobre a agenda do PT, sobre as reuniões. Isso eu informei, mas nós não discutimos quem devia sair, quem devia entrar, coisa nenhuma. Isso foi especulação, porque nessa hora há boato, tem especulação...

Eliane Cantanhêde: Ele não opinou, presidente?

José Genoino: Portanto, não tem, eu quero deixar isso claro: não tem problema na relação da presidência do PT com o presidente Lula.

[Charge de Paulo Caruso onde Eliane Cantanhêde encara Genoino, que também a encara, com dedo em riste]

Merval Pereira: O pessoal do PT é o menos curioso do mundo, ninguém pergunta nada para ninguém.

Eliane Cantanhêde: Nem do presidente Lula com o José Dirceu?

José Genoino: Nem do presidente Lula com o presidente do PT.

Eliane Cantanhêde: [A relação de Lula] Com o José Dirceu também está às mil maravilhas?

José Genoino: Nós temos relações de companheiros e de confiança. Estamos trabalhando em várias frentes diferentes, mas...

Mauro Chaves: [interrompendo] Eu queria só saber: assim como o José Dirceu conta tudo para o Lula, como ele disse, tudo, o senhor também conta tudo para o Lula?

José Genoino: Olha, o PT é uma instância separada do governo. O PT, Mauro Chaves, tem a autonomia nas suas competências e nas suas definições.

Mauro Chaves: Sim, mas [o Lula] tem uma ligação com o presidente do PT, grande.

José Genoino: Não; tem assuntos de governo e assuntos do PT. E o presidente [Lula] é cioso em respeitar a autonomia e a esfera própria do PT. Esse tem sido o nosso relacionamento. Portanto, vamos deixar claro: aquilo que muitas vezes se cobra, corretamente, que tem que separar sempre, o presidente Lula sempre foi cioso naqueles assuntos que são do PT, de ele respeitar o PT, a autonomia do PT.

[inserção de vídeo]

Paulo Markun: De radical a moderado, de agitador a articulador, José Genoino, ao presidir o partido que governa o Brasil, recorreu à frase de Ulysses Guimarães, que dizia que: “A arma do bom político é a saliva”. Acreditando no poder da conversa, vem dedicando tempo integral a mediar sucessivas crises, dentro e fora do partido. Primeiro foi com os radicais com quem, para o PT, não bastou conversa. Acabaram expulsos por contrariar projetos do governo e as novas posições do partido. Depois veio o constrangimento do caso Waldomiro Diniz. Amigo e assessor de José Dirceu, Waldomiro foi acusado de pedir doações eleitorais ao empresário de loterias Carlos Cachoeira, em 2002, antes do governo Lula. A denúncia apareceu em 2004 e só não virou CPI, de imediato, porque os governistas conseguiram barrar. Mas o dia-a-dia do PT no Congresso, depois, tornou-se cada vez mais difícil. Perdeu na votação de projetos; perdeu na disputa pela presidência da Câmara Federal, não conseguindo sequer um cargo na nova mesa diretora da Casa. Finalmente, o vai-e-vem de petistas em relação a vários temas – CPI dos Correios, denúncias de Jefferson, queda de Dirceu e a manutenção em seus cargos dos integrantes do partido diretamente acusados – mostrou que sempre é possível piorar o que já está ruim.

Paulo Markun: Genoino, a pergunta é de Leonides de Carvalho, que eu acho que vale tanto para a situação de agora quanto para a CPI dos Bingos. Por que é que o PT tentou, de todas as formas, bloquear a criação dessas CPIs?

José Genoino: Veja bem, a CPI, em qualquer regime, em qualquer governo, é um instrumento da minoria para investigar o governo. Quando nós somos governo, nós acreditamos e confiamos nas investigações do governo. Quando discutimos essa questão no diretório nacional e na bancada, nós adotamos uma posição não fechada em relação a CPI. Nós discutimos com os parlamentares que era necessário acompanhar a evolução dos fatos, acompanhar a divulgação de certas denúncias para se chegar a uma CPI. Alguns companheiros assinaram independente da bancada.

Paulo Markun: Mas o [senador] Eduardo Suplicy, por exemplo, chegou a ser retirado da chapa depois de ter assinado.

José Genoino: Não, isso aí... Veja bem, eu sou da tese, Paulo, que eu prefiro acertar com o coletivo, e levar o coletivo à minha posição, do que simplesmente agir individualmente. Nós negociamos no diretório nacional; negociei com o Suplicy, com o Chico Alencar, para a gente ter uma posição na bancada e ir tratando a CPI de acordo com a evolução... Nós não fechamos contra; estávamos trabalhando com isso aí. E deixamos claro, no processo do requerimento da CPI, como precisar o requerimento, como deixar mais claro. Portanto, foi essa a negociação que nós fizemos com a bancada.

Florência Costa: Mas o senhor não reconhece que hoje essa postura, por exemplo, do senador Suplicy foi a mais correta? Quer dizer, de pedir a CPI?

José Genoino: Eu digo, Florência, com toda a sinceridade, eu digo para você que não é a mais correta, porque a bancada provou que ela poderia chegar e assinar a CPI, viabilizar, e estar participando da CPI...

[Charge de Paulo Caruso mostra Genoino usando uma estrela do PT como escudo. Ele diz: “Atirem a primeira pergunta!”]

Merval Pereira: Presidente.

José Genoino: Se a gente tem paciência, se a gente quer acertar com o coletivo, se a gente dialoga com o coletivo, se a gente convence o coletivo, isso é melhor, é mais eficaz, é mais transformador, e foi o que a bancada achou.

Florência Costa: Mas a opinião pública está tendo uma percepção...

Merval Pereira: [interrompendo] Pois é, esse é o problema...

Florência Costa: Há uma percepção de que o PT não está querendo investigar...

José Genoino: Veja bem, com a opinião pública, a gente dialoga, a gente discute, a gente explica, a gente debate...

Alexandre Machado: [interrompendo] Presidente Genoino.

José Genoino: Olha, já teve momentos que a opinião pública criticava muito o PT; teve momentos que a opinião pública aceita o PT. Nós estamos numa luta política...

Florência Costa: [interrompendo] Mas não como neste [momento], não é, deputado? Não como esse.

José Genoino: Luta política é assim: o PT aprendeu a navegar contra a maré; o PT aprendeu a vencer várias dificuldades, e é isso.

Paulo Markun: Mas a maré é do PT hoje....

Merval Pereira: Genoino, sabe que eu estou com a sensação aqui de que, toda vez que você fala sobre as decisões, você fala para dentro do partido, está fechado dentro do partido. Todos vocês, aliás, estão fechados dentro do partido e só pensam de acordo com os interesses do partido e pela cabeça que vocês têm de 30 anos de luta. Então, é o coletivo, não pode ter individualismo... Agora, vocês estão controlando o país. O país é que... Não é o partido mais...

José Genoino: [interrompendo] Então vamos discutir...

Merval Pereira: É o Estado brasileiro...

José Genoino: Ótimo, Merval.

Merval Pereira: E vocês estão pensando no Estado brasileiro com a cabeça do PT...

José Genoino: Não, Merval.

Merval Pereira: Do partido de vocês.

José Genoino: Então, ótimo, foi boa a sua pergunta. O PT, nos 30 meses de governo, foi o principal partido de sustentação do governo Lula. E nós pensamos no país para realizar reformas que estavam emperradas no Congresso há 10, 15 anos. Nós pensamos no país para ter uma política econômica, no primeiro ano, dura, que deu debate, deu desgaste, e estão aí os resultados dela. Nós pensamos no país quando não saímos por aí perseguindo adversários. Essa onda... criou-se uma onda contra o PT; [a idéia de que] o PT tomou conta da máquina do Estado, mito mentiroso.

Mauro Chaves: Veio do nada isso?

José Genoino: É do nada...

Mauro Chaves: Ah, é?

José Genoino: Eu vou lhe dar um número, Mauro Chaves. Existem 19 mil cargos comissionados. No governo, quando a gente assumiu, tinha 18 mil, no governo Fernando Henrique Cardoso. Baixamos, no primeiro ano, para 17 mil. Depois subiu para 18 [mil] e agora tem 19 mil. Sabe quantos o governo Lula alterou? [Foram] 5.314, [isto é] 27%.

[...]: Não é muito? Para mim é muito.

José Genoino: Não, não, [essa] foi a média dos governos anteriores, de cargo comissionado de livre contratação, cinco mil. Mas [...] portanto foram só cinco mil. Depois criaram...

Mauro Chaves: [interrompendo] E o número de ministérios? Foi de quanto para quanto?

José Genoino: Olha... Ministérios, Mauro Chaves?

Mauro Chaves: É. Foram para 35. Quantos eram?

José Genoino: Tem ministério ali que é secretaria em nível de ministério, e é correto ter, porque este governo reconhece o papel das mulheres, dos negros, a importância dos direitos humanos e deu o status [de ministério], que é importante. Isso aparece como número grande.

Mauro Chaves: Se era correto, Genoino, por que vão reduzir agora? O Lula vai reduzir.

José Genoino: Veja bem, o nosso governo, no primeiro ano, reduziu o número de DAS; depois abriu o concurso para recuperar a Polícia Federal, para recuperar o Ibama, para recuperar o Incra. E não fizemos loteamento, não fizemos aparelhamento. E colocaram outro mito mentiroso contra o PT, que é bom deixar claro aqui. Nós nomeávamos para receber o dízimo, mito mentiroso. Eu vou lhe dar o número aqui; é importante esse número, eu estou com ele aqui no bolso, porque eu sabia que essa questão...

Merval Pereira: [interrompendo] O Supremo proibiu o dízimo.

José Genoino: Não, eu vou explicar. Primeiro, o PT não desconta nada. O PT não desconta nada na folha de pagamento; a pessoa contribui diretamente...

Mauro Chaves: É contribuição voluntária.

José Genoino: A pessoa contribuiu diretamente ou autoriza o desconto em banco. Sabe quantas pessoas do executivo, de livre contratação, contribuem com o PT, de DAS? [São] 779; dos órgãos vinculados, 182; e do legislativo, 469, que é o maior número de cargos comissionados. Mas a idéia e o mito que passou é o de que nós aparelhamos, e não aparelhamos. Qual foi o servidor que foi perseguido do governo anterior pelo nosso? Os petistas até diziam que tinha muita gente do governo anterior.

Mauro Chaves: [interrompendo] O senhor está dizendo que os cargos são todos [ocupados por] técnicos, é isto?

José Genoino: Nós tínhamos dois critérios.

Mauro Chaves: O PT só colocou técnicos nos ministérios, não houve contratações políticas nem nomeações, mas só técnicas, é isso que o senhor está dizendo?

José Genoino: Eu estou dizendo para você que quando os partidos negociaram – e é legítimo na democracia e em qualquer país democrata do mundo os partidos fazerem reivindicações –, o PT fez e os partidos fizeram. Essas indicações passavam por dois critérios: competência e a vida das pessoas. E muitas pessoas não passavam; iam duas, três vezes e se trocavam. E nós tivemos vários problemas, seja no PT, seja fora do PT. Até cheque sem fundo era motivo para a pessoa não passar pelo levantamento que se fazia no Tribunal de Contas, nos cartórios etc.

[...]: E o [Maurício] Marinho?

José Genoino: Não houve aparelhamento. Foi bom você colocar o Marinho. O Marinho é um cargo de carreira, 23 anos [de carreira]. Não tem nada a ver com o PT nem foi indicado pelo PT.

Felipe Patury: Mas ele dizia que era filiado ao PTB.

José Genoino: Veja bem...

[sobreposição de vozes]

José Genoino: Aliás, se criou uma outra inverdade, que é importante eu dizer claro aqui para os trabalhadores do serviço público que são comissionados. Alguns grandes escândalos da República partiram de cargos de carreira, porque têm proteção de estabilidade, de não demissão, de aposentadoria. De onde partiu a CPI do Orçamento? José Carlos Alves dos Santos, quem era ele? Funcionário de carreira. Quem é o Marinho? Funcionário de carreira. É claro que nós temos que ter uma política de diminuição dos cargos comissionados, para profissionalizar o Estado. Isso é uma tarefa fundamental e eu tenho colocado isso, inclusive, nos meus artigos que escrevo quinzenalmente no [jornal] O Estado de S. Paulo .

Mauro Chaves: E o senhor não vai dizer que é um potencial de corrupção maior entre os funcionários de carreira. É bom deixar claro...

Eliane Cantanhêde: O senhor está dizendo que o funcionário de careira é mais passivo?

[Charge de Paulo Caruso mostra Mauro Chaves de perfil. Ao seu lado, há um tucano de perfil. Ressalta-se a semelhança entre o nariz do entrevistador e o bico do tucano]

José Genoino: Não, eu não estou dizendo isto. Estou falando que se culpa o funcionário comissionado. O problema da corrupção pode acontecer com o comissionado ou com o funcionário de carreira. O problema da corrupção tem ser combatido como nosso governo está combatendo. Está aí o papel do Ministério Público; esta aí o papel da Polícia Federal; está aí o papel da Controladoria Geral da União; estão aí as investigações que correm tranquilamente, de maneira autônoma...

Mauro Chaves: [interrompendo] O senhor não acha que as cotas dos partidos, isto não ajuda na corrupção? As cotas partidárias?

José Genoino: E nós temos que fazer uma mudança...

Paulo Markun: [interrompendo] Genoino.

José Genoino: Nós temos que fazer uma mudança no sistema político- eleitoral: financiamento de campanha, votação em lista...

Paulo Markun: [interrompendo] Sabe quem diz isso também?

José Genoino: Isso é fundamental.

Paulo Markun: Quem diz isso é o Roberto Jefferson. Ele tem dito; disse aqui no Roda Viva .

José Genoino: Não...

Mauro Chaves: Estamos todos de prova.

José Genoino: Aliás, toda essa matéria foi discutida no Congresso, e um dos opositores...

Merval Pereira: [interrompendo] Era o PT, o PTB, o PL, o PP, e o PT foi contra...

José Genoino: Foi bom você colocar [isso], Merval; foi bom você colocar...

Merval Pereira: [interrompendo] Para ajudar os partidos da base aliada.

José Genoino: Você sabe o que eu fiz como presidente do PT? Na eleição da presidência da Câmara dos Deputados, que o PT perdeu, eu procurei a direção do PSDB, procurei a direção do PFL e propus um acordo: vamos respeitar a proporcionalidade, elegendo um candidato do PT, e vamos fazer uma agenda de consenso pontual. Ponto um: votar a reforma política, independente da resistência de partidos da base aliada. Dois: rodízio nas relatorias, de medida provisória etc. Três: vamos estabelecer um processo negocial dentro da Câmara. Fiz essa proposta, conversamos vários dias, e recebemos um não.

Eliane Cantanhêde: Mas espere aí. Quando o Luís Eduardo Magalhães, do PFL, foi candidato a presidente da Câmara, você concorreu contra ele. Quando, sei lá, o Inocêncio [Oliveira] foi candidato, vocês concorreram contra ele. Quando o Aécio [Neves] foi presidente, o PT também não apoiou. Por que eles teriam que apoiar vocês?

José Genoino: Mas sabe qual é a diferença, Eliane? A diferença, e você como jornalista em Brasília sabe muito bem... eu era candidato do PT, e paguei o preço de não ir para a mesa. O PT não aceitava candidato avulso e nunca lançou. Eu era candidato do PT; o Aleluia era legítimo para ser candidato do PFL. Eu era candidato do PT e negociei, e conversei muito com o Luís Eduardo [Magalhães], aliás, é uma pessoa que eu continuo respeitando...

[sobreposição de vozes]

José Genoino: Agora, veja bem, eu estou dizendo que propus um acordo, como agora eu estou propondo aos partidos um acordo em torno da reforma política.

Eliane Cantanhêde: [ao mesmo tempo] Mas espere aí; se não podia ter acordo naquela época, por que tem que ter acordo com o PT agora?

José Genoino: Vamos votar, para entrar em vigor em 2006: prazo de filiação por fidelidade, fidelidade por prazo de filiação, mudar o regimento das casas para que o tamanho das bancadas que saem das urnas...

Paulo Markun: [interrompendo] Genoino.

José Genoino: E votar a federação de partidos. E votar, para 2008, o financiamento público e a votação em lista. Nós só vamos mudar o sistema político brasileiro quando tiver financiamento público e votação em lista.

Paulo Markun: O PT estabeleceu...

José Genoino: [interrompendo] Não é financiamento privado com incentivo fiscal.

Paulo Markun: O PT estabeleceu uma regra na relação com o Congresso, que foi facilitar de diversas maneiras o crescimento de partidos da base aliada e manter o núcleo do PT relativamente coeso e íntegro. Eu digo “relativamente” porque houve adesões que são aí discutíveis.

José Genoino: [interrompendo] Ao PT, não!

Paulo Markun: [com desconfiança] Eu acho que teve até governador.

José Genoino: Na bancada, não; pode citar [alguma adesão discutível] da bancada.

Paulo Markun: Até governador.

José Genoino: Não, cite [alguém] da bancada. E nós tiramos. Paulo Markun, vamos dar nomes aos bois...

Paulo Markun: Deixe-me só terminar a pergunta.

José Genoino: Dê nome aos bois; eu respondo tudo dando nome aos bois.

Paulo Markun: Só [vou] terminar a pergunta. No início do governo Lula, o senhor deu uma entrevista para a Patrícia Villalba e Conrado Corsalette, do Estado de S. Paulo, cujo título era “Até Lênin fez concessões a multinacionais”. E lá pelas tantas, eles lhe perguntaram: “Como é que se sentiria o deputado José Genoino, no Congresso, tendo como aliado Roberto Jefferson, que foi da tropa de choque de Fernando Collor?” E o senhor declarou o seguinte: “Eu estaria muito feliz, como estou na presidência do PT, para defender um governo. Em relação a essas pessoas, você sabe que, desde minha experiência parlamentar, eu era criticado porque me dava muito bem com todo mundo. O deputado Roberto Jefferson apoiou o Lula no segundo turno, apóia e vota com o governo. Está sendo bom para quem? Para o PT e para o governo Lula”. Eu pergunto: não foi uma tática errada, essa, de se apoiar em partidos que não tinham nenhuma ligação com as idéias do PT? E que veio dar aonde deu?

José Genoino: Paulo, o povo brasileiro, quando votou no Lula, não votou na maioria da Câmara e na maioria do Senado.

Paulo Markun: Sim, o PT chegou a 20%...

José Genoino: Diziam que o governo Lula não ia se viabilizar, porque o PT não tinha capacidade de fazer alianças. Nós construímos uma aliança com os partidos que apoiaram o Lula no segundo turno, inclusive o PTB. Ampliamos essa aliança com o PMDB, e nós devíamos ter incluído o PMDB desde aquela época no governo, porque nós tínhamos um programa, que era a estabilidade para o país crescer; melhorar emprego e renda, respeitando os termos da "Carta aos Brasileiros” [assinada pelo candidato Lula, em 2002, assegurando que, caso eleito presidente, o PT respeitaria os contratos nacionais e internacionais]; viabilizar os programas sociais, que nós unificamos no [programa] Bolsa Família, com sete milhões de famílias, aumentamos a renda média para 75 mil; recuperar o papel público das estatais e dos bancos públicos – foram recuperados: BNDES é banco de fomento, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, os bancos regionais –; e votar as reformas pendentes no Congresso: votamos a reforma da Previdência, a reforma do Judiciário e agora precisa retornar a reforma tributária. Estas alianças, elas foram importantes para o governo, que tem maioria. Não é só para aprovar o que o governo quer, é também para impedir que se aprovem coisas contra o governo. E a esquerda já fez alianças, inclusive em guerra. O Vietnã estava em plena guerra e fazia aliança pontual com quem estava matando; a China fez alianças...

[Charge de Paulo Caruso mostra Genoino inclinado, como se fosse cair de costas. Ele diz: “Eu propus acordos!”; e em seguida: “Recebi um não!”. A palavra “não” está pintada em vermelho e em grandes dimensões]

Paulo Markun: [interrompendo] Sim, o Stalin fez aliança para...

José Genoino: Nós temos que ter objetivos...

Eliane Cantanhêde: Deputado.

José Genoino: Eu negocio. Eu usei um lema, que também está nessa entrevista [no Estado de S. Paulo]. Eu negocio com qualquer pessoa, mas eu sei qual é o lado da mesa e qual é a cadeira em que eu me sento...

Eliane Cantanhêde: Deputado.

José Genoino: Portanto, o mal não é das alianças. Agora, nós temos que definir, mudando o sistema político partidário, fazer alianças com critérios, fazer alianças mais precisas, isso nós temos que fazer. O PT é um aprendizado permanente...

Mauro Chaves: [interrompendo] E faz parte disso...

José Genoino: O PT muda o Brasil, e o Brasil ajuda a mudar o PT.

Mauro Chaves: Isso envolve o troca-troca? Aliciar os deputados de outros [partidos] e trazer...

José Genoino: [interrompendo] Isso é a sua avaliação. O PT não aliciou ninguém...

Mauro Chaves: Ah, ninguém?

José Genoino: O PT não aliciou ninguém...

Mauro Chaves: As mudanças de números de bancadas...

José Genoino: Você é meio peremptório no julgamento, Mauro Chaves.

Mauro Chaves: Não, Genoino...

Eliane Cantanhêde: Você aprendeu isso no PT, hein, Mauro Chaves?

[sobreposição de vozes]

Mauro Chaves: Veja bem, houve um aumento numérico de bancadas.

José Genoino: [interrompendo] Se você quiser, eu falo.

Mauro Chaves: Houve um aumento numérico de bancadas, uma coisa escandalosa...

José Genoino: Espere aí, deixa eu lhe responder.

Mauro Chaves: Só que os partidos não chegaram para engrossar o PT, [mas para engrossar] a base aliada do PT. O PT não teve nenhuma participação nisso?

José Genoino: O PT está com a mesma bancada que saiu da eleição.

Mauro Chaves: Sim, isso sim.

José Genoino: Segundo, alguns partidos esqueceram suas bancadas, que dentro desse sistema político-eleitoral tem acontecido. Por exemplo, quando o PSDB ganhou a eleição, tinha 54 deputados; quando terminou o primeiro mandato, estava com 100. Esse sistema é que produz isso, porque são deputados que vão apoiar o governo, são deputados que solicitam espaço no governo, é esse tipo de coisa. Não houve, o PT não participou de troca-troca de partido.

Paulo Markun: Nem o governo? Nem o governo do presidente Lula?

[...]: Nem o governo estimulou?

José Genoino: O PT não participou...

Paulo Markun: Nem a Casa Civil?

[sobreposição de vozes]

José Genoino: Se os partidos negociaram com esses parlamentares, para ter espaço no governo, isso é legítimo na democracia.

[inserção de vídeo]

Paulo Markun: No centro da crise política entre o governo e seus aliados no Congresso, José Genoino tem pela frente uma outra batalha: sua reeleição na presidência do Partido dos Trabalhadores. As dificuldades vividas atualmente tornam ainda mais tensa a disputa interna pelo cargo, que se dará em setembro, através de eleições diretas com a participação de mais de 800 mil filiados. A oposição, fundamentalmente da ala esquerda do PT, não aceita as alianças com o PTB, PP e PMDB no Congresso. E quer ir mais longe: pretende desvincular governo e partido, tudo ao contrário da ação de Genoino, que trabalha pela ampliação de alianças e tem procurado dar ao partido e ao governo a mesma cara.

Paulo Markun: As eleições [no PT] estão mantidas e o senhor continua sendo candidato à reeleição?

José Genoino: A melhor coisa para o PT é realizar com a sua base, com os seus filiados, uma eleição direta, para ouvir, para dialogar, dar todas as prestações de contas, todas as explicações, dialogar politicamente sobre essa rica experiência do PT, de dois anos e meio de governo Lula, uma experiência vitoriosa do que estamos fazendo com os programas sociais; do que estamos fazendo com a economia, que é assunto polêmico no PT; do que estamos fazendo com a política de aliança, que é assunto polêmico no PT; do que estamos fazendo com a política externa deste país...

Paulo Markun: Que não é tão polêmica dentro do PT [risos].

José Genoino: Não, mas isso aí se discute; tudo dentro do PT se discute.

Merval Pereira: [A política externa] É polêmica na sociedade...

José Genoino: Tem alguns setores reacionários [da sociedade] que são contra, não é? [risos] E aí nós temos que fazer esse debate, fazer essa discussão. O PT não teme o debate, não teme a discussão. A melhor coisa para o PT é fazer essa eleição direta. Nós vamos fazer essa eleição direta...

Eliane Cantanhêde: Deputado, eu tenho uma pergunta que ficou do outro bloco, deputado. Será que você pode virar para cá um pouquinho?

José Genoino: Claro, Eliane, com todo respeito [risos].

Eliane Cantanhêde: Obrigada. O senhor falou assim por alto, ficou assim meio no ar, que até o Vietnã negociava com quem estava matando. Eu queria saber: o que é possível o [ministro da Justiça] Márcio Tomas Bastos, o [ministro da Fazenda Antonio] Palocci e o próprio presidente Lula estarem conversando neste momento com a oposição, especialmente com o PSDB?

José Genoino: Em primeiro lugar, eu acho que deve haver negociação pontual em torno de agenda de votações, como a reforma tributária, como a reforma política, que é fundamental. Se nós não votarmos a reforma política para entrar em vigor em 2006, nós não vamos construir instituições sólidas para isso. Então eu acho que tem que haver diálogo com a oposição. Diálogo com a oposição não é adesão, diálogo com a oposição não é governo conjunto. A oposição e o PSDB, legitimamente, estão disputando contra nós, têm outro projeto, têm outros nomes, têm outros candidatos, querem precipitar o debate sucessório de 2006. Uma prova disso é que o próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso falou: “Vamos fazer uma grande negociação desde que, em 2006, o presidente Lula diga que não é candidato”. Nós não estamos colocando 2006 na agenda.

Mauro Chaves: Genoino, o que o senhor acha disso que Fernando Henrique falou?

José Genoino: Olha, isso é uma confissão de que o problema para o PSDB é 2006, porque vamos fazer uma negociação pontual sem colocar 2006...

[sobreposição de vozes]

Eliane Cantanhêde: Mas em torno do que se pode conversar?

José Genoino: Olha, pode se conversar, por exemplo, sobre a reforma tributária, que é um bom tema; pode se conversar sobre a regulamentação das agências, que é um bom tema...

Eliane Cantanhêde: Deputado, espere aí, os telespectadores vão ficar confusos, porque a gente tem uma crise, uma crise grave, até pode chegar ao Palácio do Planalto; o chefe da Casa Civil caiu; o senhor acha que está no momento de a oposição e o presidente discutirem reforma tributária?

José Genoino: Veja bem.

Eliane Cantanhêde: Vamos falar sério.

José Genoino: Vamos falar sério.

Eliane Cantanhêde: O que é possível negociar em termos de crise de estabilidade política?

José Genoino: Deixe-me lhe falar. O país esta funcionando, deixa eu lhe falar...

Eliane Cantanhêde: Institucionalidade.

José Genoino: Eliane, o país está funcionando, a política econômica está demonstrando que, mesmo com essa crise política, ela não foi afetada. Estão aí os indicadores, estão aí os números, os resultados são positivos, estão aí os programas sociais. O país tem uma agenda, ao lado do enfrentamento da crise política. Como enfrentar a crise política? Vamos fazer uma investigação eficaz, sem fazer uma guerra, uma queda-de-braço, até porque uma investigação, quando tem uma queda-de-braço, ela não é eficaz. Isso pode se conversar, portanto o diálogo com a oposição sempre é um procedimento democrático.

[Charge de Paulo Caruso onde Genoino aparece jogando ao chão comida em grãos para atrair um tucano. A ave, desconfiada, diz: “Obrigado, não!”]

Florência Costa: Mas ampliar o rumo das investigações, como o PT está fazendo, não é perigoso então? Se o senhor está querendo estender a mão para a oposição, para o PSDB...

José Genoino: Olha, em primeiro lugar, o PT não está ampliando o leque de investigação. Não está ampliando, até porque, em qualquer investigação, a ampliação não depende dessa ou daquela decisão; a ampliação depende da ligação dos fatos. Portanto, o PT... qual é a tarefa do PT nesse terreno aí? É participar das investigações, apoiar as investigações, e a verdade toda é a maior aliada do PT.

[...]: Genoino.

José Genoino: Agora, esse processo que o país esta vivendo tem que ter pontes. Você ter pontes com a oposição, é importante ter. Pontes [com a oposição] não é acordo de governo, não é acordo eleitoral, é você ter [...]. Uma das coisas que têm faltado no Congresso Nacional são pontes de diálogos. Eu participei de muitos momentos no Congresso Nacional que tinha pontes. E eu faço sempre essa homenagem ao Luís Eduardo [Magalhães], que ele, mesmo naquele período do Collor, eu tinha ponte com ele, como eu tenho pontes com outros deputados do PSDB...

[...]: Genoino, Genoino.

José Genoino: Então isso é possível, isso não significa coalizão, não significa entrar no governo. O PSDB tem um projeto contra o nosso, e o nós temos um projeto contra o deles. Isso é da democracia, isso é da disputa política.

Sérgio Lírio: E se a ponte for essa idéia do déficit nominal zero, que é basicamente desvincular a receita de saúde e educação. Se a ponte com PSDB... se a agenda for essa...

José Genoino: [interrompendo] Em primeiro lugar, “se” essa agenda... O nosso governo é democrático e discute todas as sugestões de todas as possibilidades...

Alexandre Machado: Genoino, Genoino.

José Genoino: Isso está em discussão, agora você não pode discutir “se”. Eu sou contra a desvinculação da dotação orçamentária para a saúde. Eu acho que uma das grandes medidas é o SUS, é a política de saúde pública, uma das grandes medidas do governo é o Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica], e foi correto. O governo tem feito um esforço muito grande para garantir a negociação com os movimentos sociais, no caso do MST [Movimento dos Sem-Terra] e da Contag [Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura]. Então nós temos que... o governo tem que mediar uma política de estabilidade com crescimento e, ao mesmo tempo, do atendimento da agenda social do país.

Alexandre Machado: Genoino, o deputado Fernando Gabeira [eleito em 2002 pelo PT/RJ, abandonou o partido em 2003 e  filiou-se ao Partido Verde (ao qual pertencera entre 1986-2001), pelo qual foi novamente eleito deputado federal em 2006 - ver entrevista com Gabeira no Roda Viva], que tem sido bastante crítico em relação à atuação do PT, ele publicou hoje [4/7/2005] no jornal O Globo, um artigo [intitulado “Democracia com cartas marcadas”] em que ele diz que, assim como no período da ditadura o exercício político era cerceado pela repressão, hoje o exercício político é cerceado pelo dinheiro, pelo excesso de dinheiro que estaria comprando a posição dos deputados. Então ele diz, nesse artigo, que não adianta o deputado se esmerar nos argumentos e discutir, debater e trazer argumentos novos, que isso, durante a discussão flui naturalmente e, quando chega na hora da votação, há um jogo de cartas marcadas. Esse, aliás, é o titulo desse artigo de Fernando Gabeira, porque os deputados estão vendidos e estão com uma posição predeterminada pelo suborno [segundo o artigo]. Você poderia fazer um comentário em relação a este artigo?

Florência Costa: Só um adendo... O deputado Roberto Jefferson, quando falou na CPI, me impressionou muito, porque ele falou: “Todos somos iguais”, diante da CPI e ninguém falou nada, ninguém retrucou, nenhum deputado do PT...

José Genoino: É, foi preciso..., justiça seja feita a uma matéria do jornal O Globo de domingo, revelando, na prestação de contas dos deputados e senadores, que não era aquilo que ele falou na CPI...

Alexandre Machado: Alguns deles não tinham...

José Genoino: Aí, sobre esse tema de campanha, nós temos que votar a reforma política e o financiamento público de campanha. Agora vou voltar ao Gabeira. Olha, Alexandre, eu digo para você que é com um sentimento de tristeza, muita tristeza, muita tristeza mesmo, que eu ouvi alguns comentários do Gabeira, muita tristeza. O Gabeira nos conhece; o Gabeira conhece o José Dirceu; o Gabeira conhece a minha vida; o Gabeira sabe quem que nós somos, e não é de agora, é de antes do PT; e o Gabeira sabe que, em muitos momentos, nós metemos a cara para defendê-lo...

[Charge de Paulo Caruso representa Genoino, montado em um cavalo, como Dom Quixote; e Lula, em um cavalo menor, como Sancho Pança. O primeiro diz: “Vejo pontes!”; o segundo responde: “Serão moinhos?”]

[...]: Mas eu acho...

José Genoino: Ele, no mínimo, devia dialogar conosco; no mínimo, devia mediar. Há um poço de ressentimento, de raiva, e ele quer obcecadamente... então eu fico triste...

Paulo Markun: Mas não tem uma certa justificativa? Na hora em que expulsam...

José Genoino: [interrompendo] Eu fico triste; estou desabafando.

Florência Costa: Ele ficou uma hora esperando, quando ele saiu...

José Genoino: Uma hora não.

Florência Costa: Quando ele ficou na Casa Civil.

Paulo Markun: Genoino.

José Genoino: Florência, ele ficou meia hora [esperando]. Veio cobrar de mim... ele ficou uma hora e veio cobrar de mim. Eu disse: “Gabeira, eu fiquei 30 anos esperando...”

Florência Costa: Mas não é só ele que está cobrando; tem muitas pessoas cobrando. Se fosse só o Gabeira... mas é uma infinidade.

José Genoino: Pois é, agora deixe-me falar. Sabe o que eu disse para ele, quando ele disse que saiu do governo do PT porque ficou uma hora esperando? Eu disse: “Gabeira, eu fiquei 30 anos esperando para poder chegar no poder. Eu fiquei cinco anos na cadeia esperando para chegar...

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Agora, deputado.

José Genoino: Eu fiz uma greve de fome na Casa de Detenção, para ser transferido para o Carandiru. Por que sair do PT e fazer aquela declaração por causa de uma hora?

Merval Pereira: Não, mas não foi por causa de uma hora [que ele saiu do PT], o senhor sabe que não foi.

José Genoino: O Gabeira...

Merval Pereira: Ele tinha divergências sérias com o governo do PT. Ele disse isso.

José Genoino: O Gabeira, com toda sua história, deveria dizer: “Eu tenho divergências”...

Merval Pereira: Ele já disse isso. Disse claramente.

José Genoino: Claro, então ele não pode sair, Merval, vamos ser claros, Merval, a pessoa não pode sair atirando dessa maneira.

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Mas deixe-me lhe perguntar, esse sentimento...

José Genoino: Agora, eu acho que ele está no papel dele; eu estou apenas desabafando, estou apenas desabafando, porque ele conhece essas pessoas...

Eliane Cantanhêde: Só uma pergunta. Esse sentimento de tristeza, o senhor estende também para Cristovam Buarque, Eduardo Suplicy, Heloísa Helena e aqueles 14 [deputados do PT] que votaram a favor da [criação da] CPI [dos Correios]?

[Charge de Paulo Caruso mostra Fernando Gabeira, de braços abertos, com expressão de quem quer se pronunciar. Ele diz: “Tudo eu?”]

José Genoino: Não, eu acho que são companheiros que se manifestam livremente, é um direito de se manifestar. Sobre a senadora Heloísa Helena, eu prefiro não comentar, eu prefiro não comentar, porque...

Eliane Cantanhêde: [interrompendo] Não é tristeza, é raiva?

José Genoino: Não, eu prefiro não comentar, porque ela sabe, no seu coração, ela sabe, na sua alma, o que significa uma acusação infundada e como o PT foi forte para defendê-la.

Paulo Markun: Genoino, nosso tempo está acabando e eu tenho uma última pergunta, que eu acho que é obrigatória, e que é relativa às acusações do coronel Luís Paulo Macedo Carvalho, que participou aí da repressão e disse que chegou a propor que fosse publicado um livro branco, dando a história oficial, e disse que basta conversar com os oficiais da Brigada Pára-Quedista, que ouviram pedir que você não fosse evacuado da área, com medo de morrer por causa da guerrilha, e que teria "aberto o bico," como se fala no jargão da informação. São as mesmas acusações recentemente repetidas num evento lá no Congresso Nacional com a participação do deputado Jair Bolsonaro.

José Genoino: E depois usadas pelo deputado...

Paulo Markun: Roberto Jefferson, exatamente.

José Genoino: [emocionado] Olha, Markun, eu vou ser muito claro e franco. Essas pessoas não sabem o que é pau-de-arara, cadeira do dragão, choque elétrico, afogamento, e você não poder nem gritar, porque seus gritos não são ouvidos, porque as paredes estão com isopor. Aqui eu estou falando, eu estou gritando, eu estou dialogando. Que coisa boa é a democracia. As pessoas não sabem disso, as pessoas não sabem que eu fiquei um ano incomunicável, que eu fiquei cinco anos preso. E as pessoas que dizem isso, que não é a opinião de outros militares, e é só ver o livro, o documentário da Taís [Morais] e do Eumano [Silva], documentos, relatos [refere-se ao livro Operação Araguaia: os arquivos secretos da guerrilha (2005)]. Quando eu tive a prisão quebrada, a incomunicável, eu pedi exame de corpo de delito. Eu pedi exame de corpo de delito, e a Justiça Militar negou. A guerrilha durou dois anos. Eu fui preso de manhã; à noite eu ia encontrar com meus companheiros. Esses companheiros ficaram dois anos lá. A tortura é um processo dramático em que você separa o corpo e a mente. Você fica tentando, entre o corpo e a mente, mediar. “Isso aqui eu posso falar, não prejudica; isso aqui eu posso falar, não prejudica”. Você não revela seus pontos fracos, porque senão aumenta, e foi esse processo que eu vivi. Portanto eu acho que isso é uma baixaria anti-humana, porque é querer legitimar a tortura. E eu cumpri pena de cinco anos; nenhuma informação eu forneci, nesse clima de tortura, que prejudicasse a guerrilha. E eu quero falar agora com os ex-presos políticos, os que sobreviveram, porque os heróis morrerem; os ex-presos políticos... tem um, tem outro [aponta para duas pessoas que estão no programa], tem dois aí.

[...]: O Markun também [foi preso político].

José Genoino: Quando você é interrogado, você tem duas opções. Markun, duas opções... Alguns são heróis, porque chegaram lá e disseram: “Eu não falo nem o meu nome”. E eu conheci alguns heróis que morreram. Esses são heróis; eu não sou herói. Outros ficam ganhando tempo, ficam administrando. Administrar a vida na tortura, esse é um processo dilacerante que, lamentavelmente, num momento como este, vir colocar [em pauta], mexe muito comigo. E eu quero dizer para você que é duro, [fala com veemência] é duro viver o que eu vi, é duro segurar a barra pesada que eu segurei, é duro passar pela Oban [Operação Bandeirante, que foi um centro de informações, investigações e de torturas montado pelo Exército brasileiro em 1969], pelo DOI-Codi, ficar incomunicável. É duro a minha advogada poder se comunicar comigo, porque chamou vários presos, e vir agora esse tipo de irresponsabilidade. E tem espaço para divulgar isso, e não me dão espaço para divulgar essas coisas. É muito duro, Paulo Markun. Me desculpem a emoção, mas não dá para agüentar isso calado, não dá. Eu sei o que foi amarrar [presos] em árvores, eu sei o que é queimadura, estão aqui [dá um tapa em sua perna] as queimaduras, porque até hoje tem marca. E até hoje eu tenho um problema de pesadelo e de pressão alta, exatamente por causa da tortura. E aí vir jogar, misturado com a investigação de CPI... isso é uma baixaria, [é] inaceitável, [e vindo] da boca desses militares, que não representam o conjunto das Forças Armadas, e, principalmente da boca desse deputado [Jair Bolsonaro]. Desculpe.

Paulo Markun: Obrigado pela entrevista, Genoino. Obrigado aos nossos entrevistadores. Nós ficamos por aqui e voltamos na próxima segunda-feira com mais um Roda Viva . Uma ótima semana e até lá.

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