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Memória Roda Viva

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Osmar Serraglio

25/7/2005

O dia-a-dia da CPI dos Correios: a condução das investigações, o manuseio da documentação, os depoimentos e as expectativas quanto ao encaminhamento das conclusões, são os principais pontos desta entrevista

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Paulo Markun: Boa noite, a CPI dos Correios avança nas investigações e até quarta-feira deverá ter os 120 nomes de pessoas que retiraram dinheiro das contas do publicitário Marcos Valério [Fernandes de Souza, apontado como operador financeiro do escândalo do mensalão]. A análise da documentação reunida pela CPI, com o cruzamento de dados, também vai começar a identificar a origem desse dinheiro. O Roda Viva, no debate sobre os desdobramentos da crise, entrevista, hoje, uma das figuras de maior importância da comissão, o responsável pelas conclusões finais das investigações. Nosso convidado é o deputado federal Osmar Serraglio, relator da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios.

[Comentarista]: A criação de uma CPI é uma batalha, e a indicação do presidente e do relator é outra. A CPI dos Correios, criada depois de uma queda de braços entre oposição e governistas, também enfrentou disputa para a definição da presidência e da relatoria. O governo venceu. O senador Delcídio Amaral, do PT do Mato Grosso do Sul, foi eleito o presidente da comissão, e Osmar Serraglio, deputado federal do PMDB do Paraná e da base aliada, foi indicado o relator. Gaúcho de Erechim, advogado e professor universitário, Osmar Serraglio entrou para o MDB em 78. Depois, filiou-se ao PMDB em 81, permanecendo até hoje no partido, pelo qual cumpre, atualmente, o segundo mandato de deputado federal. Com a sua marca de serenidade e calma, o deputado e relator tem se destacado na tomada de depoimentos da CPI dos Correios. É ele quem dá início aos questionamentos, resumindo as acusações e buscando ligações entre personagens e fatos. Por ser o responsável pela conclusão das investigações, o relator sempre alerta os depoentes sobre a importância do depoimento e o compromisso com as respostas. No depoimento de Delúbio Soares [o tesoureiro da campanha presidencial de Lula, acusado de pagar o “mensalão”], o relator foi além, leu um trecho do discurso de Cícero, notável tribuno do senado romano, que 63 anos antes de Cristo denunciou a conspiração de Catilina [traidor de Roma], que Osmar Serraglio comparou a Delúbio: “Até quando a Catilina abusará da nossa paciência? Por quanto tempo ainda, há de zombar de nós essa sua conduta? A que extremos se há de precipitar a tua audácia sem freios? Nem os temores do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para a reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto desses senadores, nada disso conseguiu perturbar-te? Oh, têmpora, oh moris, oh tempus, oh costumes!”.

Paulo Markun: Para entrevistar o deputado Osmar Serraglio, nós convidamos José Nêumanne, editorialista do Jornal da Tarde; o professor Ovídio Rocha Barros Sandoval, autor do livro CPI ao pé da letra; Tereza Cruvinel, colunista de política do jornal O Globo; Eliane Cantanhêde, colunista do jornal Folha de S.Paulo; Ana Carvalho, subeditora da revista IstoÉ; Andrei Meireles, repórter especial da revista Época e Fausto Macedo, repórter de política do jornal O Estado de S.Paulo. Temos também a participação do cartunista Paulo Caruso, registrando em seus desenhos os momentos e flagrantes do programa. O Roda Viva é transmitido em rede nacional para todos os estados brasileiros e também para Brasília. Para participar, você pode utilizar o nosso telefone, fazer a sua pergunta, a sua crítica, a sua sugestão. É (0xx11) 3252-6525 ou o fax (0xx11)3874-3454. Nosso endereço na internet é rodaviva@tvcultura.com.br. Boa noite, deputado.

Osmar Serraglio: Boa noite, é um prazer muito grande estar com vocês aqui.

Paulo Markun: O prazer é nosso. O senhor deu uma declaração agora há pouco, que já está nos principais veículos da internet, o Jornal da Cultura já exibiu, os telejornais da noite, dizendo que a documentação que chegou ou que vai chegar nesta quarta-feira na CPI é pólvora pura, por quê?

Osmar Serraglio: Pelas informações que nós temos, é que elas correspondem àquilo que se está aguardando, para que se tenha uma definição conclusiva, a propósito da existência ou não, eu não diria de mensalão no sentido de um pagamento mensal, mas, enfim, de saques que beneficiaram políticos, porque só o fato de estar sob a competência do Supremo é a confirmação de que envolve parlamentares, e o que nós temos de informações através do pessoal que atuou, da Polícia Federal, é que realmente existem relações que foram utilizadas nas informações que transitaram entre o Banco Rural, em Belo Horizonte, e Brasília, e que corresponderiam àqueles que seriam os receptadores do numerário de que nós estamos atrás, da busca, enfim, dos que efetivamente sacaram dinheiro do Banco Rural.

Paulo Markun: Quer dizer, vamos ser mais específicos então, deputado: tem uma lista de deputados que receberam dinheiro do Marcos Valério, é isso? 

Osmar Serraglio: A expectativa é essa. 

Paulo Markun: Sei. E o que a CPI faz com esse tipo de informação? 

Osmar Serraglio: Bom, a partir do momento em que nós tivermos, que nós obtivermos esses documentos, nós teremos duas condutas: uma é em relação à identificação, é bom que a gente esclareça, nós temos uma CPI, a CPI dos Correios, que ela investiga esse vínculo existente entre parlamentares e o numerário liberado, mas para efeito de, por via transversa, você alcançar a possibilidade dos contratos terem sido superfaturados, e daí nós termos a corrupção configurada dentro da administração pública. Porque a perseguição dos parlamentares é objeto da CPI do Mensalão. Para que se tenha uma noção cronológica dessa nossa atuação. Nós atuamos até o momento em que o dinheiro é colocado dentro dos cofres da empresa privada. O pouco que nós vamos além disso é verificar se a liberalidade com que ela atua com esses recursos é um indicativo de que havia dinheiro em demasia, e que, portanto, por que isso não é comum, saber-se de onde e porque eles ali estariam sobejando.

Paulo Markun: Agora, as duas coisas são crimes, quer dizer, tanto alguma empresa privada dar dinheiro para um deputado, quanto pior, talvez, essa empresa privada ser uma espécie de porta de entrada para dinheiro público ser financiador de parlamentares, é isso?

Osmar Serraglio: As duas coisas são possíveis.

Paulo Markun: E são críveis.

Osmar Serraglio: E críveis. E até, de certo modo, confessadas, embora nós tenhamos duas versões, porque o deputado Roberto Branco confirmou que ele teria recebido dinheiro da Usiminas através de uma empresa do Marcos Valério. O Marcos Valério disse que isso é fantasia, e que na verdade se está procurando uma alternativa para justificar e passar uma imagem de legalizado o dinheiro em relação a esse parlamentar. São as diversas questões que nós precisamos discernir dentro da investigação. Enquanto investigação, nós não podemos pôr de lado nada do que se aventa, ou seja, nós não temos pré-julgamento, e essa foi uma das dificuldades que nós tivemos no começo, inclusive, que aparentava que nós estávamos demorando no, enfim, na perseguição daquilo que se imaginava que devesse ser objeto da...

Eliane Cantanhêde: Agora, deputado.

Osmar Serraglio: ... objeto da CPI.

Eliane Cantanhêde: Não seria importante amanhã, no depoimento da dona Renilda, que é mulher do Marcos Valério, já ter essa lista, quer dizer, ouvir a Renilda sem a lista não significa que vai ser mais tarde necessário convocá-la de novo? 

Osmar Serraglio: Nós tivemos esse tipo de discussão várias vezes. Eu próprio, no começo, insistia, por exemplo, quando nós fomos ouvir os diretores dos Correios, que nós não tínhamos praticamente elemento nenhum para que fossem questionados, mas a CPI ao mesmo tempo em que ela tem essa parte técnica em que nós nos de debruçamos, ela tem o aspecto da visibilidade, e ali, o que se vê e o que se procura é a contemporamento [provavelmente em lugar “contemporização”] entre aqueles que querem imediatamente ter oportunidade de colocar as pessoas, porque eles imaginam que só pelo fato de se colocar na berlinda, eles abram o cofre e informem, e aqueles que acham que o melhor de tudo é isso que a senhora está aventando. Nós precisamos de uma busca efetiva, do máximo de dados para que não seja baldada [não se concretizar] a oitiva [informação que se transmite por ouvir dizer].

Andrei Meireles: Por que está demorando tanto a chegar o sigilo bancário, esses documentos do Banco Rural que mostram, aí, que parlamentares receberam dinheiro das empresas do Marcos Valério? Por que está tudo demorando? Há um boicote do governo? O que está havendo? 

Osmar Serraglio: Eu não diria um boicote, mas, de certo modo, nós fomos um pouco tolerantes na medida em que fomos conferindo com outras CPIs em relação às quebras de sigilo. Mas eu confesso que a partir, vamos dizer, desta semana, enfim, eu comecei a perceber, ou pelo menos atuar com certa descrença em relação a que isso fosse unicamente uma demora em razão...

Paulo Markun: O senhor acha que há má vontade deliberada, não vou dizer boicote?

Osmar Serraglio: Começo a pensar que sim, principalmente em relação ao Banco Rural, porque o Banco Rural até agora não nos passou as informações sobre a origem e o destino. Isso é fundamental para nós.

Fausto Macedo: O senhor não acha que já passou da hora de botar na cadeia, Delúbio Soares, Silvio Pereira, esse pessoal da antiga cúpula?

Osmar Serraglio: Marcos Valério.

Fausto Macedo: Porque o Marcos Valério, por exemplo, tudo indica que ele já queimou informação importantíssima para a investigação.

Osmar Serraglio: Eu acho que o quadro enquanto necessário para que se fundamente uma prisão preventiva existe, porque o Marcos Valério destruiu documentos, isso é típico da situação de obstrução da Justiça. Essa própria história agora montada, que eu não posso dizer que ela não tenha procedência, mas ela é um demonstrativo evidente de que houve, de certo modo, um engenho entabulado graças ao fato dele estar fora da cadeia, o que permitiu que se encontrassem, hipoteticamente, aspas, não posso pré-julgar.

José Nêumanne: Explicitamente, na reportagem da Folha de S. Paulo, domingo, quando ele [Marcos Valério] disse que tem quilos de documentos, se ele tem quilos de documentos, é o caso de prendê-lo para ter acesso aos quilos de documentos.

Tereza Cruvinel: Que dia que a CPI vai deliberar sobre seu pedido de prisão preventiva, que é uma proposta que a gente sabe que está lá dentro, colocada na CPI?

Osmar Serraglio: Então, quero colocar duas coisas bem claras: o fato da CPI deliberar ou não sobre o pedido da prisão preventiva, o que ela vai deliberar é pedir ao Ministério Público, para que o Ministério Público, se ele entender conveniente...

Paulo Markun: Mas muda tudo né, deputado? Se nós temos uma solicitação.

Osmar Serraglio: ...ela solicita ao Judiciário.

Paulo Markun: Muda tudo.

Osmar Serraglio: É claro que há uma certa pressão popular, e provavelmente isso irá, a gente sabe que os juizes são, enfim, julgam de forma dura lex sed lex [do latim, “a lei é dura mas é lei”], mas também são influenciados pela opinião pública. É bem provável.

Ana Carvalho: Deputado, o senhor acredita que alguém vá, de fato, parar na cadeia? Porque a experiência que a gente tem com CPI, é que a CPI pune exemplarmente e politicamente, mas, criminalmente, todas as pessoas julgadas na CPI, a grande maioria, nenhuma delas parou na cadeia. E todos os crimes, quando chegaram à Justiça, eles foram derrubados, ou por falta de prova, enfim, bate com o código, a forma de apuração não está de acordo com a lei. Então, o senhor acredita que realmente alguém vá ser punido com cadeia? É, porque o roubo de shampoo dá um ano de cadeia neste país.

Osmar Serraglio: Eu não diria. É que nós estamos reduzindo o foco para a CPI, mas tem um grande sonegador que está na cadeia.

Ana Carvalho: Mas não está na hora de mudar isso?

Osmar Serraglio: Quem é o rico deste país que está na cadeia?  Claro que está na hora, mas isso é uma questão que você precisa modificar a cultura nacional, você precisa agilizar a Justiça, que são os instrumentos nossos, que são manuelinos ainda, afonsinos [relativos a D. Manuel I de Portugal (1469-1521) e reis da primeira dinastia de Portugal que usaram o nome de Afonso, ou a sua época].

Ana Carvalho: Agora, existe...

Fausto Carvalho: ...na CPI que o senhor vai relatar, o senhor vai ter coragem de colocar no seu relatório o envolvimento dos seus pares, inclusive do seu partido?

Osmar Serraglio: Sem problema nenhum. Eu acho que hoje, o mínimo que eu devo ter em relação à população é a sinceridade e a coragem de evidenciar que nós estamos passando por um momento muito triste, e que aqueles que são os responsáveis por isso, precisam ser alijados, pelo menos, da vida pública. E o que couber a esse parlamentar...

Ovídio Rocha Barros Sandoval: Um fato interessante é que existe uma distorção do que seja na realidade uma CPI. CPI investiga, CPI não julga. CPI não pode prender ninguém. CPI só faz a investigação do fato determinado, e muitas vezes a gente vê que o fato determinado é abandonado, e surgem outros fatos que passam a ser objeto de investigação. Se nós examinarmos isso, dentro da técnica da verdadeira CPI, como a Constituição coloca, não poderia nem mesmo a CPI dos Correios examinar o fato determinado do mensalão, porque não é o fato determinado que fez com que a CPI surgisse. Então, nós temos que ter também dentro de nós a seguinte verdade: CPI não julga, CPI investiga, CPI examina o fato determinado. E vai ser no relatório final da CPI, aprovado dentro do colegiado da Comissão Parlamentar de Inquérito, que vai ser o documento final e o documento fundamental para as providências que vêm depois. Então, nós temos que ter isso diante dos nossos olhos.

[sobreposição de vozes]

Osmar Serraglio: E há uma coisa muito importante...

Ana Carvalho: ... essas providências. Exatamente. Mas o que eu estou perguntando ao deputado é exatamente isso: se depois desse processo todo, com todo o indicativo da CPI, como já tivemos vários indicativos, várias CPIs que indicavam processos criminais da maior gravidade, eu perguntei a ele, se ele acredita que realmente alguém vá ser preso, porque é, repito...

Osmar Serraglio: É que eu, na verdade, preciso acreditar, senão eu desacredito dos objetivos do meu trabalho.

Ana Carvalho: Porque a pessoa que rouba um shampoo de um supermercado pega um ano e meio de cadeia, saiu isso na Folha de S.Paulo. Quer dizer, e quem movimenta 160 milhões, se locupletando [enriquecendo] com dinheiro público?

Tereza Cruvinel: Deputado, é bom especificar que a lista né, a que a gente se referiu no começo deste bloco do programa, é a lista de fax, de ordens de pagamento emitidas, lá do Banco Rural, que foi apreendida pela Polícia Federal e está em poder do Supremo. A CPI deve ter acesso a ela nas próximas horas, mas o senhor, pelo visto, pelas suas declarações de hoje, o senhor teve acesso, pelo menos parcial, a ela.

Osmar Serraglio: Não, não tive.

Tereza Cruvinel: O senhor confirma que o número de parlamentares envolvidos pode chegar a 100? E eu lhe pergunto assim: ao encaminhar para a CPI do Mensalão, essa parte da investigação, o senhor já vai recomendar tantas cassações?

Osmar Serraglio: Não, primeiro que eu não tive acesso a esses documentos. Nós estivemos no Supremo, e quando nós estivemos no Supremo com o ministro Jobim, o presidente, os documentos estavam na Procuradoria Geral da República. Agora, as informações que nós temos são através de, vamos dizer, aspas, vazamento.

Tereza Cruvinel: Do Supremo?

Osmar Serraglio: Não, da Polícia Federal, de que realmente se trata da relação, e até porque há um indicativo que confirma isso.

Tereza Cruvinel: Os seus vazamentos falam em 100?

Osmar Serraglio: E há indicativo disso, porque fora isso, esses documentos não estariam no Supremo, e se eles estão no Supremo é porque há parlamentares envolvidos.

Paulo Markun: Mas se tiver um parlamentar envolvido, já vai para o Supremo?

Osmar Serraglio: Sim, já vai.

Tereza Cruvinel: Eles estão no Supremo por conta daquela manobra do Marcos Valério de citar dois parlamentares no depoimento ao procurador geral.

Osmar Serraglio: Que também é verdade. Ele citou dois parlamentares: o Roberto Jefferson [ver entrevista no Roda Viva] e o bispo [Carlos] Rodrigues.

Tereza Cruvinel: Com esse...

Paulo Markun: Está tudo ligado. 

Osmar Serraglio: Mas não seria por isso. Há a constatação dos nomes de parlamentares.

Tereza Cruvinel: A segunda parte da pergunta: o senhor já vai encaminhar para a CPI do Mensalão com recomendação de cassação de todos?

Osmar Serraglio: Eu não sei se recomendação de cassação, porque daí, de certo modo, nós estaríamos invadindo. Nós precisamos ter um certo cuidado para evitar briga de competência entre as duas CPIs...

Tereza Cruvinel: Mas não dá para trabalhar junto?

Osmar Serraglio: ... e até visibilidade. Nós pretendíamos até trabalhar juntos. Eu acho que isso foi em relação àquilo, que se manifestou agora no começo da minha apresentação, nós passamos por um momento que dá um testemunho público de que nós estamos agindo de uma forma imparcial. Por quê? Porque nós fomos carimbados inicialmente de CPI chapa branca [referência aos veículos oficiais, que usam a chapa branca, identificando seu uso a serviço de órgãos governamentais].

Paulo Markun: Injustamente?

Osmar Serraglio: A prova de que foi injustamente é que quando se pretendeu instalar a CPI do Mensalão, a oposição que supostamente seria quem nos estariam chamando de chapa branca, exigia, queria e lutou para que nós fôssemos os condutores da CPI do Mensalão, o que é um diploma para nós, de que nós estamos atuando de forma imparcial.

Paulo Markun: Deputado, eu vou exibir uma pergunta feita pelo ator Fúlvio Stefanini, vamos ver.

[VT com Fúlvio Stefanini]: Deputado, diante do momento que nós estamos atravessando, dessa aflição que tomou conta do país inteiro, os acontecimentos, eu gostaria de saber o seguinte: essa investigação, essa CPI ou essas CPIs, elas estão caminhando como se fossem uma verdadeira novela, elas têm uma linguagem quase que novelísticas. Todos aguardamos qual o próximo capítulo. Então, a minha pergunta é o seguinte: uma vez concluído esse processo todo, o que poderia eventualmente acontecer com todos os implicados? Porque é claro que nós, como cidadãos, queremos e almejamos que todos aqueles que estejam evidentemente implicados, que sejam punidos exemplarmente, eles precisam ser punidos. O povo brasileiro espera isso dessa CPI. Então, a minha pergunta é essa: o que vai acontecer daqui pra frente, uma vez esclarecido todo esse processo? O que vai acontecer?

Osmar Serraglio: Olha, o que vai acontecer é que nós iremos proceder o relatório final, quando nós chegarmos a isso, indicando todas as pessoas que são envolvidas, as provas que os comprometem. E qual o andamento disso? Sob o aspecto criminal, isso será direcionado ao Ministério Público e, quanto à cassação, nós teremos que encaminhar ao Conselho de Ética, que é onde se procede o processo de cassação, para finalmente ser concluído no plenário da casa.

Andrei Meireles: Mas deputado, o que acontece é o seguinte: caracterizando o mensalão, todo esse material vai para a CPI do Mensalão. O que vai ficar fazendo a CPI dos Correios? Vai investigar o governo?

Osmar Serraglio: A idéia é essa. A idéia é que nós vamos aprofundar a investigação do governo, de tudo aquilo que de certo modo se vincule a contratos, enfim, é aquilo que sempre se diz, até, em relação à CPI, que sabe-se onde ela começa e não se sabe onde ela termina. Então, evidentemente, vai haver, está havendo já, uma pressão para que nós, devagarinho, ampliemos e fujamos do quadro demonstrado pelo vídeo [referindo-se à pergunta de Fúlvio Stefanini], que se nós formos nos ater juridicamente, efetivamente, nós estaríamos impossibilitados disso. Mas, quando às vezes, se ultrapassou esse limite ou gerou conseqüências, provavelmente a gente avance. 

Andrei Meireles: Mas o senhor vê uma possibilidade? E se comprovar algum envolvimento do presidente da República, será essa a CPI que vai investigar?

Osmar Serraglio: Se ele estiver envolvido no que diz respeito ao pagamento de parlamentares, será a dos parlamentares. Se for a nossa, em relação a contratos, diretorias, a ocupação desses cargos, a razão de ser da ocupação desses cargos, aí, será com a nossa.

Eliane Cantanhêde: Agora, eu queria voltar um pouquinho à questão dos bancos. Porque talvez esteja aí essa tentativa da CPI de chegar ao governo. Esse processo todo dos bancos de negarem informações, porque o senhor citou só o Banco Rural, mas o senhor também reclamou muito do material do Banco do Brasil. Eu queria saber do senhor, primeiro: se o sistema financeiro brasileiro tem credibilidade, tem sistema de controle sobre tudo isso; um. Dois: se há algum tipo de processo para negar informações, para proteger o governo.

Osmar Serraglio: Olha, quanto ao Banco do Brasil, eu hoje aceito que houve uma interpretação equivocada, ou nós nos dirigimos de uma forma não muito clara. Por que eu digo isso? Porque quando nós reclamamos, em quatro, cinco dias nós recebemos toda a documentação. Então, hoje, em relação ao Banco do Brasil, nós temos a origem e o destino de tudo o que diga respeito à movimentação que nós estamos investigando. Agora, por que a gente insiste em relação ao Banco Rural? Porque há muita coisa não bem explicada. Por exemplo, nós temos tabulações e material que eles nos encaminham, que são conflitantes. Em matemática não existe isso, você tem relações que elas não podem ter essas discrepâncias. Isso, em relação ao Banco Rural. Agora, quanto ao sistema, a gente está percebendo que ele efetivamente tem muitas falhas. Por exemplo, não há uma conseqüência mais grave em relação ao Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras], dos saques que não são comunicados. Nós estamos percebendo que existem saques que ultrapassam os limites, cuja obrigação é dar notícia ao sistema. Em dinheiro, e eles não são comunicados.

Paulo Markun: E o senhor acha que o Coaf já sabia disso?

Osmar Serraglio: O Coaf, e aí, mais uma vez a falha, o Coaf nos passou a relação daquilo que ele tinha de conhecimento e já demonstrava que estava com valores inexplicados.  Ué, como é que ele recebe esses dados e não se tem procedência ainda?

Paulo Markun: O senhor poderia dar um exemplo, assim, hipotético, só para a gente entender?

Osmar Serraglio: Não é hipotético. Nos dados que nós recebemos do Coaf, constam lá milhões de reais: 200, 300 milhões de reais atípicos, na movimentação do Marcos Valério.

Tereza Cruvinel: O senhor está dizendo que o Coaf com esses dados não...

Osmar Serraglio: E eles reconhecem isso, e não se vê nenhuma providência.

Tereza Cruvinel: Isso que o senhor está dizendo, é que o Coaf foi omisso, também? De posse dessas informações não fez nenhum movimento?

Osmar Serraglio: Eu não posso afirmar porque eu não cheguei a esse nível de conhecimento, se se trata de omissão da instituição ou uma falha legal, que não diz a providência que se deva tomar.

Paulo Markun: E a Receita?

Osmar Serraglio: A Receita em relação à...?

Paulo Markun: A Receita Federal, a Receita.

Osmar Serraglio: ...à CPI, ela tem sido muito expedita, muito rápida, tem nos dado as informações e tem contribuído, também.

Paulo Markun: Deputado, nós vamos fazer um...

Osmar Serraglio: Só que nós, ninguém de nós conhecia o emaranhado que é. Nós já estamos na vigésima primeira empresa do senhor Marcos Valério.

Paulo Markun: Vigésima primeira empresa.

Tereza Cruvinel: Vigésima primeira? Meu Deus!

Paulo Markun: Nós vamos fazer um rápido intervalo nesta entrevista, lembrando que o programa desta noite poderá ser encomendado em DVD a partir de amanhã, pelo site www.culturamarcas.com.br , ou pelo telefone: (0xx11) 3081-3000. Por este telefone, você encomenda o programa de hoje ou qualquer outro programa dos 950 e tantos, já apresentados em dezoito anos de Roda Viva. E nós voltamos daqui a instantes, que hoje à noite tem na platéia: Enrique Svirsky, secretário executivo adjunto do Instituto Socioambiental; Sandra Lanza, repórter e apresentadora do programa Q3 da All TV; Wagner Sampietro, gerente de vendas da Sonopress; Juca Rodrigues, editor da IstoÉ Dinheiro On-Line, e informo que na próxima quarta-feira, depois de amanhã, onze horas da noite, pela primeira vez na história do programa, o Roda Viva será exibido e apresentado fora de São Paulo, ao vivo de Brasília, com um programa especial sobre a crise e a CPI. Quarta-feira, onze da noite. A gente volta já, já.

[intervalo]

[Comentarista]: A escolha do deputado Osmar Serraglio do PMDB para relator da CPI dos Correios, quebrou uma tradição de equilíbrio entre governo e oposição, nos dois principais cargos de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Osmar Serraglio, da base aliada, foi escolhido pelo senador Delcídio Amaral, do PT, presidente eleito da comissão. Com a presidência e a relatoria em mãos governistas, a CPI dos Correios foi chamada imediatamente de "comissão chapa branca",  mas isso não se configurou. Criada especificamente para investigar suposto esquema de corrupção nos Correios, a CPI ampliou as investigações e, a contragosto dos governistas, começou a apurar as denúncias do mensalão, ouvindo o acusador e os principais acusados. O relator Osmar Serraglio vem falando sobre a necessidade da comissão se dedicar, agora, à análise de tudo o que foi reunido. Cópias de todas as informações deverão chegar também à CPI do Mensalão, criada na semana passada e que deverá trabalhar em conjunto com a CPI dos Correios.

Paulo Markun: Eu recomeço com a pergunta de José Dantas, de Imperatriz, do Maranhão, que é empresário. Ele diz o seguinte: “a esposa de Marcos Valério não conseguiu habeas corpus preventivo, mas conseguiu o direito de mentir ou deixar de responder corretamente às perguntas. Para que, então, vai servir o depoimento dela na CPI?”.

Osmar Serraglio: É, na verdade, nós vamos ter a mesma dificuldade que tivemos com os outros dois que a antecederam. E a negativa, eu li a decisão do ministro [da Justiça, Nelson] Jobim, o presidente, é porque ela pretendia não comparecer. Então, a negativa é no sentido de que ela deva comparecer. Só que comparecendo, ela fica dispensada da prestação do compromisso, ou seja, ela não é testemunha, portanto, ela tem o direito de silenciar. Agora, também, ela deve saber que o silêncio pode ser interpretado contra os interesses dela.

Fausto Macedo: Senhor relator, eu gostaria de fazer uma pergunta. Deputado, o mensalão, se ele já está caracterizado, o que o governo conseguiu aprovar? Já foi, está sendo investigado? O que o senhor votou que interessou para o governo. O mensalão não era uma contra partida? Uma troca nos bastidores? Já existe,  como que a gente associa os pagamentos às coisas aprovadas? Já está comprovada?

Osmar Serraglio: A CPI vai fazer essa tabulação, está fazendo, para ver até onde. Há certa coincidência, mas nós não temos todos os valores ainda. Em relação aos saques, nós estamos tentando verificar em que sentido eles coincidem com momentos importantes, em que eventualmente o governo estivesse com dificuldades no Parlamento.

Tereza Cruvinel: Com a mudança de partidos, também? Há uma grande influência de mudança de partidos.

Osmar Serraglio: Não, isso é uma das grandes mazelas da nossa política, né? Mas nós, mesmo essa reforma que está posta, eu pertenci à comissão da reforma política, é uma pena, mas é uma ilusão total. Porque a coisa mais importante que havia e que é preciso que se faça é mudar a Constituição. Se vocês observarem a reforma política que está em estudo, ela está infraconstitucional, é só lei, portanto, nós não estamos mudando a fidelidade [partidária], ninguém vai perder mandato. A única coisa que nós estamos colocando é que vai impedir por certo tempo de ser candidato, mas precisava, nós precisaríamos mudar o sistema. O mundo inteiro desenvolvido pratica o voto distrital, e nós não temos o voto distrital.

Tereza Cruvinel: E o financiamento [das campanhas]?

Osmar Serraglio: O financiamento.

Tereza Cruvinel: Deputado, inúmeros leitores, pessoas que escrevem para o e-mail da gente, blog, essas coisas, perguntam: porque não quebram o sigilo bancário de todos os deputados que mudaram de partido naquele período, que coincide com os grandes saques? O senhor não acha oportuna essa investigação?

Osmar Serraglio: Eu imagino que não há como não fazer isso, essa é a minha opinião. Eu acho que a CPI do Mensalão não terá como chegar a seu final sem proceder isso. Porque esse é um dos indicativos principais.

José Nêumanne: Deputado, eu gostaria de lhe propor aqui uma questão pré-histórica: o professor Demétrio Magnoli [sociólogo e doutor em geografia humana, integrante do Grupo de Análises de Conjuntura Internacional (Gacint) da USP] e a sua colega, a Denise Frossard [política e juíza de direito brasileira, ficou conhecida nacionalmente por condenar 14 contraventores e membros do crime organizado no Rio de Janeiro, em 1993. Foi candidata em 1998 para o Senado. Em 2002 foi eleita deputada federal e em 2006 concorreu, pelo PPS, ao governo do estado do Rio de Janeiro. Fundadora da ONG Transparência Brasil], têm insistido muito que havia uma camarilha, e que essa camarilha se transformou numa quadrilha, quando ela tomou o Estado de assalto. É claro que não é o PT, mas uma camarilha dentro do PT e nos partidos aliados. Eu tive a pachorra de ir ao arquivo do jornal O Estado de S.Paulo, e lá eu descobri uma matéria de Luiz Maklouf Carvalho, 1996, em que o ex-guerrilheiro Paulo de Tarso Venceslau contava uma história que eu acho que pode ser muito útil para o senhor, porque ele contava uma história que acontecia nas prefeituras do PT em 1995, e que era exatamente a mesma coisa que está acontecendo agora. O ex-guerrilheiro Paulo de Tarso Venceslau era secretário de Finanças da prefeitura de São José dos Campos, cuja prefeita era Ângela Guadagnin, e hoje é da “tropa do abafa”, lá da CPI. E ele foi demitido porque levou a denúncia ao presidente do partido, que era o senhor Luis Inácio Lula da Silva. Ele levou a denúncia de que um sujeito chamado Roberto Teixeira, em cuja casa o senhor Luis Inácio Lula da Silva morava de graça, passava o fim de semana no sítio, tinha um esquema muito semelhante a esse do Marcos Valério. Era diferente em gênero e número, desculpe, em grau e número, mas em gênero, era igual. Era um sistema de assessorias às prefeituras do PT.  Ele denunciou isso, foi demitido. O PT abriu um inquérito, que evidentemente, deu em nada. Em 1996 ele deu essa entrevista para o Luis Maklouf de Carvalho e foi expulso do partido. Então, eu acho que é um caso pré-histórico, mas que pode lançar muita luz sobre toda essa tremenda documentação que o senhor está estudando agora.

Osmar Serraglio: É um indicativo de que esse precedente possa ser um, algo que tenha norteado a conduta do partido enquanto ocupante do poder. Agora, eu, nesse mesmo sentido, eu confesso que nós ouvimos falar de que a razão de ser, porque o Waldomiro Diniz [assessor de José Dirceu], de certo modo, ele tinha know-how a esse respeito de cooptação, que teria procedido isso, ou no Rio de Janeiro, até em Brasília, onde ele teria atuado. Em que sentido? Ele ia agregando os parlamentares com formas de convencimento não tão claras, e é nesse sentido que os partidos, e aí, voltando àquele assunto anterior, que os partidos com 20, 30, de repente, mudaram para 40 integrantes. Qual a explicação para isso? Os belos olhos do líder? Não existe isso.

José Nêumanne: O programa do partido. [risos]

Osmar Serraglio: O programa. Não existe isso.

Paulo Markun: Agora, deputado o senhor está no segundo mandato. O senhor já tinha ouvido falar de mensalão? 

Osmar Serraglio: O senhor fala. Agora, lá para trás?

Paulo Markun: Sim, sim.

Osmar Serraglio: Não.

Paulo Markun: Nem no primeiro mandato?

Osmar Serraglio: Não, mensalão, não.

Tereza Cruvinel: Algo parecido?

Osmar Serraglio: Sinceramente, não.

José Nêumanne: Mensalão, parece um termo criado pelo Roberto Jefferson, quer dizer, uma coisa adaptada à previdência.

Osmar Serraglio: Mas eu falo o conteúdo dessa expressão.

Tereza Cruvinel: É a mesada, a mesada.

Osmar Serraglio: Não, realmente, não.

Paulo Markun: E nem dinheiro para comprar deputado? 

Osmar Serraglio: Também, não. Não sei se eu falei durante o programa ou antes, eu gostaria de saber se isso realmente é um iceberg que nós agora detectamos, ou se é uma novidade, realmente. Porque sempre tivemos dificuldades, ainda que no pouco tempo que eu sou parlamentar, tive de evidenciar certas coisas, nós testemunhamos ao longo dos mandatos as objeções postas à criação de CPIs, e sempre fica a dúvida, porque de um lado se coloca esse aspecto de que uma CPI carimba automaticamente alguém. É difícil alguém se limpar, só pelo fato de ter sentado numa CPI.

Tereza Cruvinel: Deputado...

[sobreposição de vozes]

Tereza Cruvinel: Na legislação passada o senhor foi contra a CPI da compra de votos na reeleição, não foi? 

Osmar Serraglio: Eu não diria isso, mas.

Tereza Cruvinel: O senhor se lembra da CPI?  O senhor já era deputado?

Osmar Serraglio: Nessa passada?

Tereza Cruvinel: É.

Osmar Serraglio: Pode até ser, não nego, não. Mas eu não saberia lhe dizer.

Tereza Cruvinel: O senhor não achava necessária aquela CPI?

Osmar Serraglio: Eu... depende do momento, do enfoque, do que se pretende.

Tereza Cruvinel: Hoje o senhor acha que a raiz pode ter estado ali? O senhor fala, o senhor acabou de dizer que era importante saber se isso já ocorreu no passado. 

Osmar Serraglio: É, hoje, quando eu vejo o que eu estou assistindo, eu começo a acreditar em muita coisa que eu não acreditava, percebe?

Tereza Cruvinel: Mas, deputado...

Osmar Serraglio: Então, a minha visão, hoje, é que se eu pudesse refazer, eu realmente acho que a gente poderia ter evitado que nós chegássemos a isso a que nós chegamos, se nós tivéssemos tomado providências em outras CPIs, como essa da votação. Salvo engano, foi essa que conduziu até o [senador] Álvaro Dias a ser excluído do PSDB, porque assinou.

Tereza Cruvinel: Sim, mas eu pergunto ao senhor, já que o senhor está querendo, está levantando a questão, será que isso é novidade ou já existia? A CPI vai analisar as movimentações financeiras do Marcos Valério para trás, 1999, principalmente 2002, até porque já sabiam que ele movimentou bastante dinheiro.

Ana Carvalho: Até essa remessa para o exterior nós vamos examinar, que foi lá para trás, antes de 2000?

Osmar Serraglio: Sim, do Banestado.

Tereza Cruvinel: Estão dizendo lá na CPI que vocês não estão analisando de 2003 para trás.

Ana Carvalho: É exatamente isso que eu queria saber.

Osmar Serraglio: Analisando, nós estamos. Apenas o que está acontecendo é que o que parece que estamos analisando, aquilo que vem para a imprensa, e o que vem para a imprensa é o que alguns vão lá, pensam e trazem correndo. Agora, o que está sendo feito de cruzamento...

Tereza Cruvinel: Porque nós não temos uma informação, não sai uma informação na imprensa de antes de 2003. E nós sabemos, né, que a lavanderia já operava.

Ana Carvalho: E é isso que todo mundo quer saber: é quando isso começou, como começou, onde começou, ainda que pegue a dita oposição.

Osmar Serraglio: Nós temos a declaração de imposto de renda de todas as empresas de cinco anos, inclusive do Marcos Valério, da esposa dele, o sigilo bancário. Nós estamos pegando dos últimos cinco anos.

Tereza Cruvinel: Mas a movimentação financeira, também?

Osmar Serraglio: Também. 

Fausto Macedo: E a quebra dos contratos?

Osmar Serraglio: Nós temos o movimento financeiro desde 2000.

Fausto Macedo: E a quebra dos contratos do PT, empréstimos com a rede bancária, isso vai ser pedido? Os empréstimos que o PT alega ter feito? 

Osmar Serraglio: Nós já temos, inclusive, eu tenho uma – eu vou falar com a ressalva de que quem está nos ouvindo saiba que é uma informação que eu não gosto de antecipar, estilo – a gente percebeu e depois vai analisar e pode haver alguma deficiência técnica, mas nós localizamos onze contratos, onze financiamentos do PT.

Tereza Cruvinel: Em nome do próprio PT?

Osmar Serraglio: Do próprio PT.

Tereza Cruvinel: Onze? Fora os do Marcos Valério? Fora os das empresas do Marcos Valério?

Osmar Serraglio: Fora do Marcos Valério. É coisa que nós precisamos [indicamos].

Tereza Cruvinel: Onze?

Osmar Serraglio: Onze.

Tereza Cruvinel: Mas, nesses empréstimos, o Marcos Valério aparece como avalista?  

Osmar Serraglio: Então, é uma coisa que nós precisamos. Que nós precisamos, e com detalhe importante, que eles estão pagos. E aí, vem a nossa investigação: como é que eles foram pagos? Percebe que pode haver o quê? O Marcos Valério faz um financiamento, se bem que não foi [ele], [foi] o PT; o PT vai num banco porque tem aproximação, faz um financiamento, aí vem um dinheiro de fora e quita o débito, isso só em torno de 50 milhões, são valores.

Fausto Macedo: 50 milhões de reais? 

Osmar Serraglio: Valores que nós incluímos hoje. Mas repito, nós iremos tirar a limpo. Mas agora, a informação neste momento é essa.

Paulo Markun: E o Marcos Valério é avalista também? Só para a gente entender.

Osmar Serraglio: Nós estamos com isso. Só que a gente se surpreende, fica com medo, como aconteceu quando nós...

Paulo Markun: Só para a gente não dar a informação...

Osmar Serraglio: Fomos verificar do Banco do Brasil que já estava em 50 milhões. Aí, quando eu cheguei nos técnicos, eu vi, me deram a tabulação, eu vi e falei: “Mas saque de nove milhões, saque em dinheiro de nove milhões?  Será que não tem algum equívoco?”.

Paulo Markun: E tinha?

Osmar Serraglio: Aí, nós chamamos o pessoal do Banco do Brasil, e eles também não souberam, que fique bem claro, no primeiro momento, não souberam identificar. Mas se colocaram à disposição, tanto é que agora nos mandaram toda a documentação para que nós possamos...

Paulo Markun: E quem fez o saque, deputado? 

Osmar Serraglio: Quem fez o saque? 

Paulo Markun: Dos nove milhões.

Osmar Serraglio: Eu não lembro se estava identificado, mas aqueles saques em dinheiro que nós...

Paulo Markun: No Banco do Brasil?

Osmar Serraglio: No BMG.

Paulo Markun: Só para esclarecer, que eu acho que nós estamos nos perdendo aqui, eu queria alertar os colegas do seguinte...

Osmar Serraglio: Não no Banco do Brasil, perdão, no Banco do Brasil.

Paulo Markun: ... o deputado está dando informações extremamente importantes. Se a gente se atropelar aqui, uns aos outros, nós não vamos obter a informação até o final, que ele tem toda disposição a dar, ao contrário de quem vai na CPI. Então, eu queria entender é o seguinte: o senhor menciona que esses onze contratos de financiamento, que são os contratos do PT com bancos, somam 50 milhões? Era isso que se falava em menos de 20 milhões, segundo as informações oficiais do PT, não é isso?

Tereza Cruvinel: É, porque só sabiam de dois.

Eliane Cantanhêde: Só se sabiam de dois contratos.

Osmar Serraglio: Mas esses são do PT.

Paulo Markun: Do PT, então? 

Osmar Serraglio: Do PT.

[sobreposição de vozes]

Eliane Cantanhêde: E todos os 50 foram pagos?

Osmar Serraglio: Eles chegam a 50 milhões, e 47 milhões estão pagos.

Eliane Cantanhêde: 47 dos 50?

Osmar Serraglio: É, então agora precisamos investigar como é que, de onde é esse recurso para pagar.

Eliane Cantanhêde: Pois é. Isso que eu queria lhe perguntar. Dá licença, deixa só eu perguntar uma coisa.

Osmar Serraglio: Nós estamos olhando na tabulação informática, por quê? Porque nós não temos os dados.

Tereza Cruvinel: Do contrato.

Osmar Serraglio: Do ingresso e nem da saída no Banco Rural.

Eliane Cantanhêde: Deputado...

[sobreposição de vozes]

Osmar Serraglio: Hoje, numa entrevista que eu dei, porque eu sei que repercute, e para todos que estavam lá, eu insisti nesse detalhe: que eu acho que nós mandamos no dia doze deste mês, um pedido para o Banco Central, reclamando do Banco Rural, que até agora não recebemos e nós precisamos disso.

Eliane Cantanhêde: Deputado, logo que o senhor assumiu esse cargo de relator, o senhor disse que era muito importante, muito esclarecedor convocar o ministro Luís Gushiken [político petista paulista e ex-ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência], por causa das relações do ministro Gushiken tanto com as estatais, como com os contratos de publicidade, como com os fundos de pensão. Uma grande suspeita é que parte desse dinheiro venha de fundos de pensão. O senhor, ao longo desse trabalho, acha que a sua idéia inicial, ou sua suspeição inicial está se confirmando? 

Osmar Serraglio: Olha, eu, estaria antecipando uma investigação que nós estamos procedendo. Eu acho o seguinte: nós só teremos isso mais claro quando nós recebermos os documentos do Banco Rural, e muito embora, repito, nós estamos recebendo, e também, de novo, falando demais, nós estamos com suspeita de fraude no sistema de informatização do que nós estamos recebendo. Então, daqui a pouco, nós teremos que baixar uma diligência no Banco Rural, para que nós possamos eventualmente apreender, enfim...

Paulo Markun: Não vai ser tarde?

Tereza Cruvinel: Quer dizer, o banco estaria fraudando esses dados que são passados para a CPI, é isso? 

Osmar Serraglio: É, agora nós encaminhamos para a Polícia federal, que ela tem sistemas de filtragem que pode evidenciar se, de fato, nós recebemos a informação fraudada.

[sobreposição de vozes]

Ana Carvalho: Esses empréstimos foram em que período?

Paulo Markun: O senhor falou em saque de nove milhões, e os outros? 

Osmar Serraglio: Não, eles tinham chegado a 50 milhões.

Paulo Markun: Tudo bem. Um de nove? 

Osmar Serraglio: Tudo no Banco do Brasil, daí essa curiosidade. Primeiro, porque quatro só evidencia dois saques em dinheiro do Banco do Brasil, que também é uma coisa que a gente precisa tirar a limpo, se realmente eles só sacavam no Banco Rural e no BMG. Aí, quando vimos isso, quando viesse essa soma toda e entre eles um de nove milhões, eu chamei a atenção de quem estava procedendo essa tabulação.

Fausto Meireles: De quando é esse saque, relator?  Época de campanha eleitoral, ou não?

Osmar Serraglio: Eu agora não lembro, mas, a meu ver, é ali por 2003, 2004, mas eu não gravei isso.

Tereza Cruvinel: Mas o banco esclareceu que era o quê? Foi saque em dinheiro vivo? Quantas malas de dinheiro...?

Osmar Serraglio: Não, aí nós chamamos o pessoal. Pela documentação que nós recebemos, não havia realmente como identificar. Nem o técnico do Banco do Brasil soube, foi quando nós ajustamos que eles teriam que nos mandar a documentação toda, do movimento exato do dia, do caixa, os registros de baixa, e isso chegou hoje, quer dizer, isso aconteceu quarta ou quinta-feira da semana passada, e hoje o Banco do Brasil já nos encaminhou.

Ovídio Rocha Barros Sandoval: Agora, deputado, eu gostaria de fazer uma pergunta a V.Exa., toda essa investigação que a CPI está fazendo, ela está batendo em parlamentares. A CPI é formada por parlamentares; [em função desta] batida de frente com outros parlamentares, não há dúvida nenhuma, pela nossa experiência, poderão existir influências um tanto quanto nada ortodoxas. A CPI está preparada para enfrentar essas influências, dos outros parlamentares que estariam envolvidos? Até mesmo, é duro dizer, até mesmo o problema de sabotagem?

Osmar Serraglio: Olha, eu acho que pelo menos a intenção nossa, eu tenho reafirmado isso, eu acho que esse Parlamento não tem como se sustentar se ele não mostrar à população que em momento nenhum ele cedeu. Nós precisamos zelar para que se nós cometermos equívoco, que fique muito evidente que foi um equívoco, e que não foi nada aceito, enfim, nenhuma interferência que nos tivesse mudado do rumo. A população só quer uma coisa muito simples, a população quer saber a verdade, e nós precisamos ser esse instrumento.

Paulo Markun: Deputado, nós vamos ver agora uma pergunta do cantor e compositor Tom Zé [ver entrevista com tom Zé no Roda Viva].

[VT com Tom Zé]: Desde o Império, que grupos econômicos provocam comoções nacionais para se substituírem no poder. Quando eu era criança, isso já comportava a presença de interesses internacionais, e foi assim que os Estados Unidos da América do Norte instituiram o tal do ponto quatro, que através da Aliança para o Progresso intervinha na vida brasileira, nomeava "testas de ferro" para defender os interesses americanos. Foi um desses testas de ferro, [o jornalista e político] Carlos Lacerda, que nos anos 50 derrubou Getúlio Vargas para se vingar, derrubou o PTB para se vingar de Getúlio Vargas, por ter inventado o lema  “O petróleo é nosso”, que desencadeou a fundação da Petrobras. Muito bem, nobre deputado, poderia o senhor tomar uma perspectiva histórica mais ampla, que eu sei  que o senhor é uma pessoa legal, e na posição de relator, tomar uma perspectiva histórica mais ampla e abrangente e nos dar uma esperança de saber quantas décadas ou séculos este país ainda será submetido a essas santas cruzadas que provocam comoções nacionais, impeachments, quedas de governo, ameaça de desordem institucional, enfim, quantas décadas e séculos seremos vítimas dessas cruzadas que, até hoje, a não ser pela substituição de grupos econômicos no poder, foram, em termos reais, absolutamente inócuas para a vida nacional? 

Osmar Serraglio: Tom Zé, eu acho o seguinte, lamentavelmente, eu acho... e até quando me manifestei com o Delúbio, eu traduzi isso... eu tinha uma esperança enorme de que nós tivéssemos virado essa página, que nós tivéssemos um novo tempo, e que ainda sem questionar, e, efetivamente, se nós fomos ou não fomos conduzidos por grupos econômicos, se nós fomos explorados ou não, era um tempo novo, diferente. O povo tinha uma confiança enorme de que nós, enquanto nação, queríamos imprimir um rumo que nos orgulharia, e, lamentavelmente, é triste reconhecer isso, mas talvez, sofrendo, dizem que apanhando a gente se corrige, a gente toma um rumo, aprende e, talvez, isso aconteça.

Eliane Cantanhêde: Isso é uma grande catarse?

Osmar Serraglio: É, realmente é uma grande catarse, porque tudo a que o Tom Zé fez referência,  a esperança é que tivesse terminado, e exatamente deu no que deu, o reverso. É isso que choca. Acho que ninguém, ninguém consegue assimilar o que aconteceu, parece impossível que toda essa confiança que se tinha numa ética, numa política séria, enfim, essa pregação ao longo dos anos, quando a população vai às ruas achando que ganhou, finalmente, aparentemente, incidiu num equívoco.

Eliane Cantanhêde: Por que o senhor fala em tese e não cita a sigla PT?

Osmar Serraglio: Eu tenho pena, eu tenho falado isso, eu conheço muitos petistas sérios, eu tenho pena dos petistas sérios, e também eu tenho uma leitura, de que essa história de que é necessário que se preserve o PT, eu não acho necessário que se preserve o PT, eu acho que tem que se preservar são as boas pessoas, se for o caso de se extinguir o PT, que se extinga.

Eliane Cantanhêde: E o presidente Lula?

Osmar Serraglio: Em relação a esse...?

Eliane Cantanhêde: Isso. O senhor disse que tem pena das pessoas sérias do PT, e que o senhor não gosta de citar o PT, portanto. E o presidente Lula? 

Osmar Serraglio: O Lula, olha, eu não tenho assim muito conhecimento para que eu possa avançar no que eu vou dizer em relação à participação dele ou não, mas não é que eu queira chamar de absenteísta, nada. Eu acho o seguinte: o Lula praticou, de certo modo, o tal do semipresidencialismo. Se nós pegarmos o histórico, nós, a Constituição de 1988, que eu não participei, mas a constituinte de 88 ela construiu tudo com o sistema parlamentarista. Na última hora, inverteu. Mas deixou instrumentos que são característicos do parlamentarismo. Para carimbar de vez: as medidas provisórias. E o que aconteceu? A meu ver, o Lula atuou como se nós estivéssemos num parlamentarismo, em que sentido? Delegou tudo a um primeiro-ministro, todos nós falamos isso. Havia um cidadão que comandava tudo que era o ministro José Dirceu, e ele, o Lula, era estilo

[...]: "Rainha da Inglaterra" [gíria para governante que não detém o poder].

Osmar Serraglio: ... eu tenho perguntado, não quero falar da “rainha de Inglaterra”, que dá a impressão de...

Eliane Cantanhêde: Chefe de Estado.

Osmar Serraglio: Mas quem é o presidente da Alemanha? Quem é o presidente do Itália? A gente ouve muito raramente uma referência a eles, e quem comanda o governo é o primeiro-ministro. O Lula era um chefe de Estado, e no parlamentarismo isso fica claro: chefe de Estado e chefe de governo. Ele atuou como chefe de Estado, circulando o mundo, levando mensagens.

Eliane Cantanhêde: E ele deve ser absolvido por isso? 

Osmar Serraglio: Oi? 

Eliane Cantanhêde: Ele deve ser absolvido por isso?

Osmar Serraglio: Na medida em que, efetivamente, não estiver vinculado aos atos que tenham sido praticados. Eu acho que realmente, se ele não chegou a se aproximar e saber, ele deve ser absolvido.

Eliane Cantanhêde: Mas absolvido por ter delegado excessivamente no regime presidencialista? Ele é o presidente.

Osmar Serraglio: Mas é uma prática de governo, né? Não quer dizer que ele estivesse impossibilitado, é claro que quem escolhe assume o ônus da escolha.

[sobreposição de vozes]

Tereza Cruvinel: A palavra não é certa, porque absolvido é se tivesse uma acusação contra ele, mas acho que a pergunta é assim: isso configura um crime?

Eliane Cantanhêde: Não, não. Não é isso, eu não perguntei absolvido no sentido de crime, eu perguntei se ele deveria ser absolvido porque delegou, por que deixou tudo acontecer. Ele deveria ser absolvido não criminalmente, mas absolvido pela responsabilidade que ele tem sobre esse processo?

Osmar Serraglio: Eu não saberia afirmar, mas acho que na medida em que ele confiou e achou que alguém estivesse atuando corretamente, ele não tem uma responsabilidade direta, mas, enfim, mais grave, mas que minimamente é responsável, sim.

Fausto Macedo: Mas no mérito, ele já sabia do mensalão? Isso, várias pessoas já declararam. Não só Jefferson. Já não é suficiente para incluí-lo?

Osmar Serraglio: Pois é, aí, quando você observa, ele diz o seguinte: que ele tomou conhecimento. De duas vezes a que o Roberto Jefferson fez referência, ele confirmou uma, e naquela em que ele confirma, ele disse que comunicou ao líder, não sei se era ao líder Arlindo Chinaglia, e ao Aldo Rebelo, e eles foram à Câmara, e na Câmara, já teria sido arquivado. Porque ele tomou conhecimento agora, em 2005, salvo engano, mas já teria sido arquivada...

José Nêumanne: Igualzinho à denúncia do Paulo de Tarso Venceslau, igualzinho. O PT fez uma sindicância e descobriu que não havia nada. Agora, eu quero lembrar – o senhor disse que tem pena dos petistas – eu quero lembrar dois petistas que morreram, que foram crimes que a polícia considera comuns: Toninho, do PT de Campinas, e Celso Daniel, de Santo André, que podem ter sido... a viúva do Toninho do PT desconfia de que ele tenha sido vítima de algo parecido. Ela tentou entregar um abaixo assinado ao presidente, mas infelizmente, ela não conseguiu.

Osmar Serraglio: Eu acho que são investigações que têm que ser realizadas. A sociedade não aceita encobrir. Não acompanho porque são coisas de São Paulo, não sei como é que elas estão sendo questionadas e também investigadas e por quem, mas nós temos instituições neste país que têm credibilidade enorme, o Ministério Público, a Polícia federal, enfim, um dia serão responsabilizados, se forem lenientes.

Paulo Markun: Deputado, nós vamos fazer um rápido intervalo, lembrando que o programa de hoje pode ser encomendado amanhã em DVD, através do site, que é www.cultura marcas.com.br, e pelo telefone (0xx11) 3081-3000. Lembro também que na quarta-feira, depois de amanhã, a partir das onze da noite, estaremos transmitindo um Roda Viva especial ao vivo de Brasília, para discutir os desdobramentos, aí, das questões da CPI. Era um programa que a gente gostaria muito de ter feito no Congresso Nacional. Infelizmente, depois de já termos sido autorizados verbalmente, houve uma reversão de expectativas, como foi dito, e o programa será feito no estúdio, em Brasília. E, na nossa platéia esta noite aqui, no nosso estúdio, estão: Marina Ferreira Lima, filiada ao PSDB de São Paulo, Humberto Dias, membro do diretório estadual do PFL, e Kowa Irra, integrante da executiva do PSDB de São Paulo. A gente volta já, já.

[intervalo]

[Comentarista]: O relator Osmar Serraglio, em cada sessão da CPI, como é o primeiro a perguntar, também é o primeiro a esbarrar nas manobras que cada depoente encontra para tentar escapar das perguntas. Em geral, os convocados se apresentam e manifestam respeito à comissão e disposição de colaborar. Mas ao longo dos depoimentos, como ocorreu com os principais acusados, omitem informações, dizem que vão entregar comprovantes depois ou simplesmente não respondem, traindo o compromisso inicial.

[VT da CPI com depoimento de Maurício Marinho, funcionário dos Correios]: Senhores senadores e deputados, eu não vim aqui para falar mentira, eu vim aqui para falar a verdade (...) Na fita, falei coisas que não são verdades. Muitas das coisas que eu falei são verdades, muitas das coisas não são verdades. Mas do que eu assumi o compromisso aqui, eu estou falando a verdade (...) Estou aqui para falar da verdade. Não conheço, eu não participei de assuntos financeiros.

[VT da CPI com depoimento de Delúbio Soares]: Compareço a essa CPI atendendo à convocação, para poder explicar os fatos que aí estão. Eu já expliquei.

[VT de membro da CPI]: Mas eu não entendi. Eu gostaria que V.Sa. explicasse de novo.

[VT com Delúbio Soares]: Me reservo o direto...

[VT com membro da CPI]: Perfeito. V.Sa. não quer explicar, é isso?

[VT com Delúbio Soares]: Sim.

[VT com depoimento de Marcos Valério]: Mesmo tendo o direito de calar, me coloco à disposição para esclarecer qualquer fato. Estou aqui para colaborar com a CPI. Não me furto o direito e o dever de fazer isso (...) Eu não saberia te responder, porque eu não sou contador. Infelizmente eu não tenho conhecimento técnico, mas eu posso te mandar um relatório por escrito. Que eu saiba os meus saques não foram tão vultosos assim, não. (...) Eu não faço transferência para o exterior, eu, pessoa física, não. 

Paulo Markun: O Fúlvio Stefanini mencionou, aí, a novela da CPI. Essa é a parte visível da CPI, que a gente acompanha, graças à TV Senado, à TV Câmara, que exibem isso, e às outras emissoras que muitas vezes transmitem até uma boa parte disso, como é o caso da TV Cultura, que já o fez. Agora, tem uma parte oculta que é essa que o senhor mencionou, em que há uma grande quantidade de documentos, de provas, e até de outras investigações. O senhor acha que o enredo dessa novela pode mudar, no sentido de que a verdade realmente apareça em função da parte oculta que a gente não vê?

Osmar Serraglio: Olha, eu espero que sim, que a gente, como eu disse, alcance a verdade. Nós temos um espectro enorme de situações nas quais nós incidimos a investigação inicialmente. Para se ter uma noção, poderia ser, e agora nos restringindo, para que nós pegássemos o fio da meada e nós tivéssemos a possibilidade de aferir o que efetivamente estava por trás de toda essa briga dos Correios, porque, só para ter uma noção: poderia ser uma briga efetiva, e aí, cada coisa que eu vou falando, o senhor vai percebendo que estou evocando alguém que declarou isso perante a CPI. Poderia ser a briga de um comerciante com um funcionário. Poderia ser grupos de fornecedores brigando entre si pela fatia dos Correios. Poderia ser briga de ocupação de espaços nas diretorias. Poderia ser o governo, e aí vem a versão Roberto Jefferson, que o pretendia desestruturar. Então, seria a Abim [Agência Brasileira de Inteligência] investigando e jogando o problema pra cima do PTB. Poderia ser briga de partidos, que estariam também pretendendo espaços dentro dos Correios. Poderia, ser de novo, ser a própria Abim fazendo, aí, o segundo enfoque deles, buscando corrupção que haveria dentro dos Correios.

José Nêumanne: E poderia ser tudo isso?

Osmar Serraglio: E poderia ser tudo isso.

José Nêumanne: Poderia ser tudo junto. [risos]

Osmar Serraglio: Exatamente, e nós direcionamos, investigamos e continuamos a... nós gostaríamos, efetivamente, de saber qual foi a razão de ser, o que há por trás disso tudo. Porque se vocês perceberem, quem foi filmar é o mesmo cidadão que filmou para o Cachoeirinha.

[...]: Carlinhos Cachoeira [empresário de loterias, envolvido com a CPI dos Bingos].

Osmar Serraglio: Então, é uma coisa daquelas, coisa de Sherlock Holmes [personagem criado pelo escocês, Sir Arthur Conan Doyle, tornando-se símbolo mundial do detetive investigativo] coisa de dado, feito...

José Nêumanne: Romance, espionagem.

Osmar Serraglio: De espionagem, muito. E pode ser aí, que embora seja algo alcançável com muita facilidade, dizer que era uma briguinha, como dizia o Artur Wascheck [empresário que participava de licitações junto aos Correios], ele chegava lá: “Mas foi uma briga minha com o funcionário”. Mas ele estava sendo utilizado, o inocente útil, numa briga enorme, porque são milhões. Existem contratos lá de bilhões de reais nos Correios.

José Nêumanne: Mas, deputado, só uma coisinha em relação a essa questão dos documentos, que me ocorreu agora: tem um colega, eu peço desculpa que eu não vou me lembrar, eu li numa revista semanal, criou um termo muito engraçado que foi o “sermão do Pedro Simon”. Tem sempre a hora que chega o belo sermão do [senador] Pedro Simon [ver entrevista com Simon no Roda Viva]. E o Pedro Simon, ele sempre compara, eu não sei se o senhor acompanhou bem a CPI do PC Farias, e ele sempre compara essa CPI com a do PC. Eu escrevi um livro sobre a CPI do PC Farias. E eu sinto falta nessa CPI agora, de uma figura que tinha na CPI do PC Farias, que era uma figura bastante esclarecedora, que eram os petistas do Banco Central, que faziam vazar as informações para a imprensa e para a própria CPI. E hoje, é claro, que não existem mais, porque os petistas são...

Osmar Serraglio: Eu acho que dentro da estrutura burocrática, não está vazando. Agora, na CPI, tudo é público.

Fausto Macedo: Relator, mas a quem interessa o sigilo sobre esses papéis?

Tereza Cruvinel: Todos os vazadores, são os mesmos, fazem o mesmo que eles faziam.

Fausto Macedo: Como se sabe que são papéis que tratam de bandalheiras, a quem interessa manter isso guardado? Vamos divulgar isso logo.

Tereza Cruvinel: Não é, deputado? Os petistas de antigamente, hoje, são pefelistas e tucanos. Vazam do mesmo jeito, te deixam irritado, deixam o presidente irritado. O vazador só trocou de partido.[risos]

Fausto Macedo: Não, não. Eu estou falando é do burocrata do Banco Central, passava as informações sigilosas.

Osmar Serraglio: Eu queria deixar uma coisa clara, tanto é que se conversar com os deputados, pode ver que todos eles sabem que eu facilito. Agora, o que eu tenho receio, é que eu, pessoalmente, venha a ser responsabilizado amanhã, como aquele que permitiu a quebra de um... e é um crime formal.

Andrei Meireles: Deputado, quando o senhor foi... o senhor é um deputado discreto na Câmara. Apareceu sendo indicado pelo TCU [Tribunal de Contas da União], e as notícias da época é que haveria o apoio do ministro José Dirceu, porque o senhor deixaria de concorrer à Câmara, e o Zeca Dirceu [político paranaense,  foi prefeito da cidade de Cruzeiro do Oeste onde nasceu quando o pai estava driblando a polícia da ditadura militar] , o filho dele, pegaria os votos. Isso é uma coisa. Depois, o senhor é ligado, tem relações de amizade com o deputado José Borba, que é acusado de ter ido lá, no Banco Rural, e de ser um dos beneficiários do tal do mensalão. Eu pergunto ao senhor: como é que o senhor chegou à relatoria?

Osmar Serraglio: Olha, é que eu sou um deputado muito modesto, no que diz respeito a evidenciar o que faz, mas eu vou lhe passar algumas informações. Por exemplo, no primeiro mandato eu cheguei a vice-presidente na Comissão de Constituição e Justiça. Se você olhar aquele “De olho na Câmara”, da Folha de S.Paulo, é que depois...

Eliane Cantanhêde: “De olho no Congresso”.

Osmar Serraglio: “De olho no Congresso”. Você vai ver que houve um ano em que eu fui o deputado que mais teve projetos relatados e aprovados na Câmara Federal. Para ver quanto que eu produzia, que eu produzo no trabalho. Eu sou vice-presidente, primeiro vice-líder do PMDB, há mais de dois anos. O primeiro vice-líder. Aí, vocês não vêem. Por que vocês não vêem? Porque existe um líder que está ocupando a mídia. Mas quem está lá, estudando tudo o que tem que fazer nos projetos, mantendo o contato com os deputados é esse parlamentar, que está recebendo os segmentos sociais. Quando vão lá em Brasília, querem saber qual é a posição do PMDB, pergunte na bancada do PMDB com quem que eles vão conversar. Eles vão conversar com o deputado Osmar Serraglio, que é quem recepciona as reivindicações e dá o andamento e o encaminhamento.

Fausto Macedo: Mas o senhor queria ir para o TCU?

Osmar Serraglio: Então, eu tenho esse trânsito, tanto...

Fausto Macedo: O senhor queria ir para o Tribunal de Contas da União? Contava com o apoio de José Dirceu?

Osmar Serraglio: Então, um detalhe importante, que apoio eu tenho? Eu sempre falei isso, porque saiu na imprensa que eu tinha o apoio, e eu sempre perguntava assim: “Pelo amor de Deus, me mostrem um, um deputado na casa que tenha dito o seguinte: eu vou votar no deputado Osmar Serraglio porque houve uma indicação de José Dirceu, ou ele pediu, ou fez alguma, que ele tenha mexido uma palha?”. Mas é simples, é só vocês verem o resultado que houve na eleição. E eles, o PT sempre teve um candidato.

Andrei Meireles: Mas e o Zeca Dirceu? Não teve nenhum acordo com o Zeca Dirceu para 2006? O filho do ministro.

Osmar Serraglio: Sabe, eles associaram ao seguinte: o Zeca foi candidato a prefeito de Cruzeiro do Oeste, que é uma cidade onde eu fui... porque ele já foi candidato a deputado federal e não se elegeu, e eu sou o que foi mais votado dos que se elegeram em Cruzeiro do Oeste, que é a cidade dele. Em Cruzeiro do Oeste o PMDB apoiou o Zeca Dirceu, então, passaram a informação que eu queria a eleição dele, para tirar ele da jogada e sair do caminho, daí me ajudar a chegar ao Tribunal de Contas da União. Mas eu, como agora, deixando um pouquinho a modéstia de lado, eu tinha qualificação para chegar lá. Eu sou professor universitário há mais de vinte anos, professor de direito administrativo. Eu tenho mestrado na PUC de São Paulo com um orientador que é Celso Antonio Bandeira de Melo, quem o conhece sabe o quão exigente ele é, e foi ele que me convidou para ser professor da PUC em São Paulo. Eu vinha, eu lembro que quando ele me convidou, eu falei: “Mas, professor, o senhor tem gente de dentro de São Paulo, que fez inclusive mestrado comigo, fácil, sai lá da Praça da Sé e vem aqui lecionar. Eu moro no interior do Paraná. Eu fico...”.

Fausto Macedo: Deputado, quanto é que custou a campanha do senhor?

Osmar Serraglio: Quanto custou minha campanha? É muito modesta.

Fausto Macedo: Porque outro dia, um senador falou que custou um milhão e setecentos mil reais, a campanha dele. E a do senhor?

Osmar Serraglio: A minha, eu não tenho, assim, um parâmetro, mas em torno de 400, 500 mil.

Fausto Macedo: É bastante dinheiro.

Osmar Serraglio: Eu sou um deputado que não faz shows...

Fausto Macedo: Quem é que doou para o senhor?

Osmar Serraglio: Quem faz – eu já fiz três campanhas, eu perdi a primeira e ganhei as outras duas – é sempre uma banda, muito pequena. A banda não é essas que vocês ouvem falar por aqui, é um conjunto musical da minha cidade. Sempre é o mesmo, que faz o...

Fausto Macedo: Mas quem são os doadores do senhor?

Osmar Serraglio: Os doadores meus? Eu poupo bastante e tem os que me apóiam, mas nenhuma empresa. Eu vou dar um exemplo, para vocês verem o que aconteceu comigo. No mandato do Fernando Henrique, nas eleições, eu recebi, não vou identificar demais para não... um comunicado que um banco queria me dar 30 mil reais para a minha campanha.

Fausto Macedo: Não era o Rural? Nem o BMG? [risos]

Osmar Serraglio: Eu vou dar o nome: esse BMRo, aí não sei.

Fausto Macedo: ABN.

Osmar Serraglio: ABN. Eu não tenho nada contra ele, nada, nem sei quem, nada, eu não atuo nessa área. Queria dar 30 mil para mim, eu recebi esse comunicado. Eles conferiram com os meus funcionários. Aí, eles queriam saber como é. Eu falei: “Olha, 30 mil reais, se eu botar na minha declaração 30 mil reais, amanhã ou depois o pessoal vai dizer o seguinte: qualquer votação que eu tiver, eles vão dizer que eu votei assim ou assado porque eu recebi os 30 mil reais de um banco”. Seria o único recurso externo ao meu convívio. Eu faço rifa de carro para arrecadar dinheiro para campanha. É assim que eu faço. Faço almoço.

Eliane Cantanhêde: Deputado, o Painel da Folha de S.Paulo deu , eu não me lembro se foi ontem ou se foi hoje, segunda-feira, a informação de que o deputado, o senador Delcídio está tendo problemas, está se sentindo vigiado, e há suspeitas de que ele pode estar sendo investigado pela Abim.

Osmar Serraglio: Eu li também, e fazendo referência que eu que estaria pedindo. Eu não. Eu só soube do fato quando eu li o jornal. Eu não pedi nada em relação ao meu telefone, nada.

Eliane Cantanhêde: E o senhor está se sentindo investigado, o senhor já sentiu algum carro na espreita, algum telefonema fora de hora? O senhor está sentindo algum indício de que está sendo investigado?

Osmar Serraglio: Eu nunca tinha ouvido um certo ruído no meu telefone, mas como eu não entendo nada disso, agora há uns dois, três dias atrás...

José Nêumanne: Seguindo essa pergunta da Eliane, o senhor já se sentiu alguma vez pressionado, por alguém do seu partido ou do seu governo, para tomar alguma atitude, como por exemplo, sai muito na imprensa que o Delcídio recebe telefonemas, o pessoal do partido e do governo pressionam muito ele. O senhor se sente, alguém já o pressionou?

Osmar Serraglio: Não, não é querer defender partido, nem nada, ninguém. Eu não sei se eu tenho uma visibilidade que eles eventualmente tenham receio, mas eu tenho reafirmado tanto que eu acho que é tão importante que a gente proceda de uma forma incontroversa, que não tem essa possibilidade.

Paulo Markun: Aliás, essa é a pergunta de Paulo Cabral de Melo, professor de história, de Belo Horizonte. Ele pergunta o seguinte: quais os pontos em que o senhor acha que essa crise se difere das outras já vividas, e se o senhor tem, como relator da CPI, noção da importância desse relatório para o momento que o país está vivendo?

Osmar Serraglio: Eu penso que sim. E talvez até isso não produza o resultado que a gente pense enquanto propositura minha.

Paulo Markun: Como assim?

Osmar Serraglio: Eu acho o seguinte: nós, a CPI, quem sabe a teoria da CPI, sabe que a razão de ser de uma CPI não é tanto punir, isso tem que acontecer e é uma conseqüência necessária, mas a verdadeira razão de ser de uma CPI é a propositura, para que esses fatos não se repitam. E é aí que eu quero concentrar o meu trabalho, mostrando essas mazelas todas, de onde elas advêm.

Tereza Cruvinel: Então, agora o senhor vai me dar um aparte, chegando a essa parte das conclusões da CPI, que são a proposição de mudanças institucionais que possam nos levar à superação dessas coisas. Eu acho que o Tom Zé o senhor e eu entendemos diferente. O Tom Zé estava falando dos grandes interesses econômicos que sempre movem as cruzadas moralizantes no Brasil, né, quer dizer, os problemas existem, não é que eles não existem, mas interesses econômicos em algum momento explodem um sistema financeiro de um partido, não explodem o de outro.

Osmar Serraglio: Exatamente.

Tereza Cruvinel: Então, você cria crise de acordo com grandes interesses econômicos. A entrada nas contas do Marcos Valério, né, é o ponto em que a CPI ainda não nos apresentou grandes informações.

Paulo Markun: Quem está botando dinheiro lá.

Tereza Cruvinel: É. E a gente tem vagas informações sobre grandes interesses. Aí, Nêumanne lembrava ainda há pouco, o tal sermão do senador Pedro Simon, que agora já não faz mais, ele também mudou. Ele também não faz mais o sermão que ele fazia tanto dos corruptores, como da CPI do Collor, CPI dos Anões. Ele cansou, ficou rouco de pedir uma CPI que mostrasse também os corruptores, né? Porque essa é outra face da nossa podridão institucional, da nossa corrupção sistêmica, que se reproduz sempre. O senador Pedro Simon depois das duas CPIs que nós tivemos, pediu muito isso, que se mostrasse o outro lado, e as outras CPIs terminaram com a cassação de "anões", quer dizer, o impeachment de Collor, algumas cassações no caso do PS Dólar, que foi umas vendas de troca de partidos, mas as pessoas que pagaram nunca apareceram, quer dizer, o senhor tem essa preocupação de revelar também à sociedade brasileira quem é que põe dinheiro na conta do Valério, quem é que se aproxima de todo partido que está no poder para tirar proveito e fazer negócio com o Estado?

Osmar Serraglio: Eu estou em busca disso, e se eu alcançar isso pode ter convicção de que os nomes virão à tona.

Tereza Cruvinel: E nós estamos alcançando?

Osmar Serraglio: Para ter uma noção, com um pouco de dificuldade, é aquilo que eu disse, por exemplo, nós pedimos no dia 12, e que já era o segundo pedido insistindo que o Banco Central exigisse do Banco Rural, que é isso que nós queremos, a origem dos recursos, porque nós temos condições de identificar se eventualmente existem grupos econômicos jogando dinheiro dentro de um...

Tereza Cruvinel: O senhor confirma uma grande empreiteira, cinco grandes bancos, um grande operador de telefonia. Tudo isso o senhor já conhece?

Osmar Serraglio: Conheço, você fala em relação especificamente a esse evento?

Tereza Cruvinel: Os corruptores?

Osmar Serraglio: É difícil... quando eu falo investigando, significa que eu tenho limites também para ficar evidenciando. Eu acredito que nós chegaremos nisso. Percebe? Uma investigação supõe certas restrições nas revelações. De forma que de alguma maneira eu me contenho no que eu conheço.

Tereza Cruvinel: É o momento, não é para sair espalhando tudo.

Osmar Serraglio: Exatamente.

Tereza Cruvinel: Mas ao final, o senhor tem essa preocupação de que nós não terminemos só com a cassação dos recebedores de mensalão?

Osmar Serraglio: Não, nós queremos identificar como funciona o mensalão, para que não só responsabilizemos aqueles que atuaram, quanto criemos um sistema que evite isso.

Tereza Cruvinel: Mas pelo que eu entendi...

Osmar Serraglio: Aliás, é o que o Nêumanne fez referência às filiações partidárias. Nós precisamos mudar isso. Isso já é uma... quer dizer, fidelidade partidária é um caminho.

José Nêumanne: Pelo que eu entendi, mais do que dinheiro de empreiteira, era “dinheiro da viúva” [referência aos fundos de pensão], mesmo, dinheiro do Estado.

Tereza Cruvinel: Eram as estatais?

Osmar Serraglio: Mas olha, lembra o que eu falei?...

Tereza Cruvinel: O dinheiro dos contratos de Marcos Valério é infinitamente menor do que a movimentação do Marcos Valério, não é? Aí, um de vocês ali da outra bancada falou dos fundos de pensão, acho que tem que se ver. Agora, tem muito dinheiro privado, ali.

José Nêumanne: Com interesses do governo.

Tereza Cruvinel: É claro que com interesse, não por identidade ideológica.

[sobreposição de vozes]

Tereza Cruvinel: Se percebe essa manipulação?

Andrei Meireles: ...do BMG com o crédito de consignação de aposentados. Que ele ficou.

Osmar Serraglio: Sim, três meses exclusivo, depois que ele se firmou, que começaram a dar. Claro que a gente percebe a manipulação do poder público nisso.

Andrei Meireles: Porque aí estaria a triangulação.

Osmar Serraglio: O Banco Popular emprestou 20 milhões e gastou 22, 24 milhões de publicidade.

Tereza Cruvinel: Muito mais do que a finalidade. [risos]

Osmar Serraglio: Sabe, então, isso não há dúvida de que “há algo de podre”, como disse Shakespeare, “no reino da Dinamarca”.

Paulo Markun: Deputado, nós vamos ver a pergunta do jurista Miguel Reale Jr.

Osmar Serraglio: É uma honra ouvir o nosso grande jurista.

 [VT com Miguel Reale Jr]: Deputado Osmar Serragio, a CPI dos Correios tinha um objeto determinado, no entanto os fatos vieram de forma avassaladora, demonstrando várias vertentes, que acabaram por envolver diretamente a cúpula do partido do PT, o partido que por sua vez se identifica com o palácio do governo, e ao mesmo tempo há agora uma CPI do Mensalão. Não seria o caso de se unirem as duas CPIs para ter a mesma produção de prova, a mesma avaliação e o mesmo relatório final? Para dar uma resposta efetiva a essa perplexidade que toma conta da nação?

Osmar Serraglio: Olha, eu dou razão. Até, nós passamos um tempo enorme esperando que isso acontecesse. Agora, é um julgamento político. Por ser um julgamento político, essa visibilidade que o deputado Osmar Serraglio está tendo hoje no Roda Viva, ela é disputada. Portanto, quanto mais CPIs, também há aqueles... mas é uma verdade... [risos]

Tereza Cruvinel: CPI também é show, né, deputado?

Osmar Serraglio: Como é a visibilidade, se perceberem a condução... eu estudo muito antes de ir para os questionamentos, portanto, tudo que alguém abordou, eu leio todos os depoimentos, tudo o que se possa imaginar, e o que se ouviu, pelo menos que tenha chegado próximo de mim, eu jogo no questionamento, isso, eu demoro uma hora, uma hora e pouco. Porque, depois, nós passamos quatorze horas repetindo quase que as mesmas coisas. Não quer dizer que são exatamente as mesmas, sempre tem algum acréscimo, não nego, o adensamento que ocorre, mas é muito limitado em relação ao tempo que a gente fica. Aí, vem a resposta para o jurista, o Reale Jr.

Paulo Markun: Seria mais eficiente junto. Deputado, nós vamos fazer mais um rápido intervalo. Eu lembro que na quarta-feira, depois de amanhã, onze da noite, teremos um Roda Viva transmitido ao vivo de Brasília, para discutir exatamente os desdobramentos da CPI, até, inclusive, em função do depoimento de amanhã e também das revelações que certamente se avizinham, como o próprio relator já adiantou, e informo que a entrevista de hoje está sendo acompanhada em nossa platéia por Walter Ilhoshi, subprefeito do Jabaquara, Silvio Silva, integrante do diretório estadual do PSDB de São Paulo, Rafael de Falco Neto, da Garrido Marketing, Cláudio Monteiro, diretor da corretora Fator e professor da Fundação Getúlio Vargas. Informo também, que pelo nosso endereço eletrônico, que é rodaviva@tvcultura.com.br, todas as pessoas interessadas em acompanhar o programa aqui da platéia podem se cadastrar e disputar aqui a possibilidade de participar, assim como a gente tem convidado representantes de diversos partidos políticos dos mais variados, para participar aqui da nossa platéia e acompanhar ao vivo o programa. A gente volta já, já.

[intervalo]

[VT com Hortência, ex-jogadora da seleção brasileira de basquetebol. Ver entrevista no Roda Viva]: Causou-me espanto quando eu li nos jornais que havia sumido alguns documentos importantes da CPMI. E me causou mais espanto ainda quando eu li, pela segunda vez, que novamente sumiram documentos importantes, né, de todo esse processo. Qual é a pergunta que eu faço: nós podemos realmente confiar nesses integrantes da CPMI, já que esses documentos foram, não vou usar o termo roubados, mas eles foram "sumidos", né, de dentro do Congresso? Quer dizer, podemos ou não podemos confiar naquelas pessoas que estão ali debatendo todo esse problema? 

Osmar Serraglio: Olha, Hortência, eu lamento que isso tenha acontecido e, com certeza, é uma mancha que nos macula, tanto que nós criamos, na semana passada, uma comissão de sindicância, para averiguar efetivamente a quem responsabilizar, até para que nós não nos desmoralizemos. Estamos introduzindo um sistema...

Paulo Markun: Os documentos somem e chegam à imprensa ou somem e somem: desaparecem.

Osmar Serraglio: Agora, graças a Deus, são documentos que são reproduções e que nós estamos conseguindo, né, as cópias dos originais onde estão. Mas o que nós estamos introduzindo agora é um sistema bem mais rígido em relação ao acesso, porque nós, com essa vontade de demonstrar que nós estamos sendo abertos, francos, muitas vezes, eu sou o último a saber que existe um documento na CPI. Por quê? Porque eu entro às nove horas, dez horas e saio à meia noite. Enquanto isso, os deputados já estão lá recebendo os documentos, investigando sem nenhuma restrição, acesso para todo mundo. Até, o que se diz na CPI em relação a documentos, pode crer, não corresponde à realidade em relação ao acesso, o que eu quero dizer com isso? Às vezes, um senador, um deputado reclama. Todos [têm acesso], nenhuma restrição em relação à ninguém. Agora, eles precisam descer e ir lá onde estão os documentos, porque o que está faltando um pouco é essa abordagem, essa busca, esse estudo dos documentos.

Eliane Cantanhêde: Mas eu fiquei curiosa com a pergunta do Markun, está aí, é curioso: os documentos somem, alguém pega o documento para passar pra imprensa?

Osmar Serraglio: Passar pra imprensa.

Eliane Cantanhêde: Ou alguém pega o documento simplesmente para proteger alguém? E some com o documento?

Osmar Serraglio: Olha, não, um documento, dois documentos na verdade, eles foram aparecer na imprensa, que eram os cheques.

Paulo Markun: Mas retornaram para o acervo que a CPI tem em mãos?

Tereza Cruvinel: Eles permitiram, né, deputado, a manipulação.

Osmar Serraglio: Houve um caso, houve um caso em que eu não vou identificar quem.

Tereza Cruvinel: Eles permitiram a seleção da divulgação de sacadores. Então, se o partido queria, ele permitiu que alguns e não todos...  Aquele mesmo documento do Coaf, ele virou um instrumento político, não é? O senhor concorda?

Osmar Serraglio: Exatamente.

Tereza Cruvinel: Então, vazou. Quem quis vazou o nome de quem quis.

Osmar Serraglio: Aquele primeiro documento era a lista que nós tínhamos dos saques. No primeiro dia, desapareceu. Claro que nós obtivemos outros, mas foi imediatamente pra imprensa, e foi o próprio, quer dizer, a formatação, uma cópia, isso que nos surpreende.

Fausto Macedo: O senador Delcídio queria presidir essa CPI? 

Osmar Serraglio: No começo, ele...

Fausto Macedo: Ele não me parece à vontade, já declarou isso, já confidenciou isso a várias pessoas?

Osmar Serraglio: No começo, ele tinha uma certa resistência, até porque ele é líder do PT, e daí há uma margem, uma interpretação de um vínculo um tanto quanto exagerado.

Paulo Markun: Deputado, pergunta de José Maria Alencar, do Recife, que diz o seguinte: “segundo informado na última edição da revista Veja, o relator José Mentor, da CPI do Banestado, preparou o relatório final sem nenhuma menção ao Banco Rural, apesar de farta documentação, incriminando aquele banco. Como é possível e que garantia que nós temos de que não vai acontecer algo semelhante na CPI dos Correios?”.

Osmar Serraglio: Eu espero que quando passar e fechar minha CPI, e alguns meses ou anos passarem, ninguém jamais cogite de levantar uma suspeita dessas sobre mim. Eu faço um compromisso público que o que me couber fazer, nada será subtraído. Não quero dizer que ele tenha sido subtraído, isso é uma investigação que tem que ser feita, mas em relação à CPI dos Correios, a população do Brasil pode ter absoluta convicção de que nós iremos atuar da forma mais responsável possível.

Paulo Markun: O senhor não lutou para ser o relator dessa CPI, né?

Osmar Serraglio: Não, com certeza, não.

Paulo Markun: E o que o senhor pretende com isso?

Osmar Serraglio: Eu fui escolhido pelo partido. O partido tinha que indicar um deputado do PMDB, e eu tenho...

Paulo Markun: O senhor é peemedebista e emedebista lá atrás.

Osmar Serraglio: Exatamente.

Paulo Markun: Agora, é um partido que tem interesse.

Osmar Serraglio: E no PMDB eu tenho uma certa... em todas as vezes, confiram isso, em todas as vezes que se pretende... eu pertenci ao Conselho de Ética, quando começaram na corregedoria a investigação, me colocaram na corregedoria dessa investigação antes de criar a CPI. No PMDB é o seguinte: quando precisam de alguém que tenha conhecimento jurídico, e que de certo modo tenha uma, difícil falar, mas, enfim, tenha um pouco de credibilidade, não quer dizer que os outros não tenham, mas em relação a mim, eu não diria que tenha muita, mas tenho credibilidade, tanto é que já está circulando [uma conversa] para eu ser o líder do PMDB; e eu nunca pedi para ser um, nunca mexi uma palha, e sei, já vários peemedebistas vieram perguntar se podem trabalhar pelo meu nome, que vai ter uma eleição em agosto.

Paulo Markun: Deputado, eu queria agradecer muito a sua entrevista e ressaltar uma característica dela, que foi a maneira pela qual o senhor respondeu, ou não respondeu as perguntas. Respondeu àquelas que tinha condições de responder, e não respondeu... ao contrário de muitas pessoas que passam por essa cadeira e que parecem estar respondendo, mas nem sempre respondem. E queria lembrar a quem está em casa, que quarta-feira onze da noite, teremos um Roda Viva especial ao vivo de Brasília. Agradecer aos nossos entrevistadores e dizer para você boa noite, e até quarta-feira, pela primeira vez.

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