Baixe o player Flash para assistir esse vídeo.
Paulo Markun: Boa noite. A crise recente na aviação brasileira afetou o transporte aéreo, prejudicou milhares de consumidores e recriou dúvidas sobre a pontualidade e, principalmente, sobre a segurança das viagens. Controladores de vôo tiveram uma redução no número de aviões que eles precisam monitorar e, com isso, os atrasos e cancelamentos se tornaram rotineiros. Especialistas apontam a falta de investimento no setor e as empresas acumulam prejuízos. O entrevistado desta noite comanda a empresa líder do mercado nacional de aviação, e também do internacional entre as companhias aéreas brasileiras. Ele é Marco Antonio Bologna, presidente da TAM Linhas Aéreas e também do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias. O Roda Viva começa num instante.
[intervalo]
Paulo Markun: Marco Antonio Bologna comanda uma empresa que completou 30 anos em 2006. Nessas três décadas o Brasil viu desaparecer algumas de suas companhias aéreas e também viu surgirem outras em meio às dificuldades que atingiram o setor, abalado agora também pelos problemas na operação aérea. Mas a conjuntura atual é ao mesmo tempo de otimismo e de crise. A TAM, que se tornou líder nacional, está ampliando sua presença no mercado internacional.
[Vídeo. Narração de Paulo Markun. Imagens de aeronaves da TAM - externas (no solo e em vôo) e por dentro, do aeroporto de Congonhas e de Marco Antonio Bologna]
Em trinta anos, a TAM passou de uma pequena empresa de táxi aéreo para líder do mercado doméstico de aviação civil. Voa para 48 destinos no Brasil, incluindo todas as capitais e o Distrito Federal. As operações para o exterior abrangem vôos diretos para seis destinos entre Estados Unidos, Europa, Argentina e Chile. Com a TAM Mercosul, vai a outros cinco destinos na América do Sul. O diferencial da empresa sempre foi a tentativa de encantar o cliente. O maior desafio da companhia aconteceu após o acidente com o avião Fokker 100 em Congonhas [queda de uma aeronave da TAM cerca de dois minutos após a decolagem do aeroporto de Congonhas (SP), que vitimou 99 pessoas entre passageiros (90), tripulantes (6) e pessoas atingidas no solo (3); o acidente aconteceu em 31 de outubro de 1996]. Os familiares das vítimas ainda buscam indenização na Justiça. Desde julho de 2003, a empresa lidera o mercado doméstico por causa da crise enfrentada pela Varig [Viação Aérea Rio Grandense S.A; empresa brasileira de aviação fundada em 1927, que entrou em crise financeira nos anos 1990, com uma dívida acumulada por vários anos, estimada em mais de R$ 7 bilhões. Em 2003, o governo tentou promover sua fusão com a TAM, que não chegou a bom termo. Após várias tentativas de recuperação e venda, em 9 de abril de 2007 a Varig foi adquirida pela empresa Gol Linhas Aéreas, concorrente da TAM]. Em julho de 2006, passou a liderar também o mercado internacional entre as companhias aéreas brasileiras. Em março de 2001, Marco Antonio Bologna aceitou o convite para trabalhar na companhia como vice-presidente de finanças e gestão, e diretor de relações com o mercado. Em janeiro de 2004, foi escolhido presidente da companhia, e em novembro assumiu também a direção do Snea, Sindicato Nacional das Empresas de Aviação. Marco Antonio Bologna é engenheiro de produção formado pela USP, com extensão em serviços financeiros pela Manchester Bussines School.
[Fim do vídeo]
Paulo Markun: Para entrevistar o presidente da TAM e do Sindicado Nacional das Empresas Aeroviárias, nós convidamos Guilherme Barros, editor da coluna Mercado Aberto do jornal Folha de S. Paulo, Hélcio Estrela, diretor editorial da revista Aviação e Revista, Valtécio Alencar, editor chefe da revista Aeromagazine, Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do grupo O Estado de S. Paulo, Sidnei Basile, diretor, secretário editorial e de relações institucionais do grupo Abril, Darcio Oliveira, editor de negócios da revista Isto É Dinheiro, Amauri Segala, repórter especial da revista Época Negócios. Também temos a participação do cartunista Paulo Caruso, registrando em seus desenhos os momentos e os flagrantes do programa. O Roda Viva, você sabe, é transmitido pela rede pública de televisão para o país inteiro. Para você participar, você pode fazer a sua pergunta, a sua crítica, a sua sugestão, pelo telefone. O número é (0XX11) 3677 1310. O fax é outra alternativa: 3677 1311, ou ainda pela internet, você acessa o site do programa e manda o seu e-mail. O endereço está aí na telinha www.tvcultura.com.br /rodaviva. Boa noite, presidente.
Marco Antonio Bologna: Boa noite. Boa noite a todos. É um prazer estar aqui e poder atender as respostas sobre essa crise do transporte aéreo.
Paulo Markun: Eu vou começar pela pergunta que eu fiz ao ministro da Defesa, o Waldir Pires [(1926-), assumiu o Ministério da Defesa em março de 2006 e, em função da crise no setor aéreo, foi substituído por Nelson Jobim], e que eu acho que não obtivemos aqui uma resposta definitiva - espero que a gente consiga algum dia aclarar o telespectador -: de quem é a responsabilidade por essa crise?
Marco Antonio Bologna: Bom, essa crise na verdade tem um time line, uma história, que começa em 2000. A partir dessa época, o transporte aéreo começou a entrar num processo de crise. Em 2001, essa crise foi bastante aguda, lembrando os episódios de 11 de setembro [atentados terroristas, atribuídos à organização fundamentalista islâmica Al-Qaeda, que ocorreram em nos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001. Nessa data, quatro aviões comerciais foram sequestrados e dois deles chocaram-se contra as torres do edifício World Trade Center, no bairro de Manhatan, Nova Iorque], e em 2002 nós atingimos um estado onde as companhias aéreas entraram num processo de muita dificuldade, de muita debilidade financeira. Então, [em] 2003, quando o novo governo [Lula] assumiu, um novo plano nacional de aviação civil foi necessário, lembrando que teve a tentativa de uma fusão entre nós, a TAM, e a Varig. Nessa época surgiu, foi feita, em outubro de 2003, uma reunião do Conselho Nacional de Aviação Civil, que disciplinou 18 resoluções que deveriam ser executadas para propiciar um desenvolvimento auto-sustentado, moderno e eficiente da aviação no Brasil. Então eu diria... onde foi o erro? As resoluções foram editadas, ou seja, o planejamento, o diagnóstico e o planejamento foram feitos; errou-se em não executar essas 18 determinações.
Paulo Markun: O senhor deixou o sujeito dessa frase oculto. Quem errou?
Marco Antonio Bologna: Quem? Acho que é sempre normal um governo planejar e falhar na execução. Temos que entender por que não se executou. Eu acho que os motivos [por]que não se executou é que outros percalços apareceram pelo caminho. O principal, a crise da maior companhia aérea existente no Brasil, que era a Varig, tirou a atenção da não execução dessas resoluções, o que demandou muito tempo, por parte do regulador, do poder concedente, em endereçar uma solução que passava por mudanças de legislação, passava até por aspectos de resolver encontro de contas do passado e coisas do tipo.
Guilherme Barros: As obras não deixaram de ser feitas, né? O governo ampliou aeroportos, fez bastante obras de fachada nos aeroportos, aumentaram os fingers [nome dado aos corredores móveis que se acoplam às portas das aeronaves e conduzem os passageiros ao interior do aeroporto, substitutos das escadas que ligam o avião ao solo] em Congonhas, enfim, esse plano parece que foi deixado de lado.
Marco Antonio Bologna: Não, eu diria que a Infraero [empresa pública federal brasileira de infraestrutura aeroportuária criada em 1972, responsável pela administração dos principais aeroportos do país], ela acabou tendo, através... a partir de 2003, a Infraero teve um programa de modernização dos aeroportos bastante denso, bastante robusto. Eu diria que ele não foi um plano simplesmente de cosmético na parte de fingers, ele buscou investimento também em pista, ou seja, a parte de terra, ela foi endereçada. A parte de conforto também, voltada ao passageiro, foi. Então, aquilo que coube à Infraero nos investimentos aeroportuários acabou acontecendo de uma maneira bastante significativa. O que não aconteceu é a execução daquilo que deveria ser, o que não é visível. Então, aquilo que estaria nos investimentos feitos no controle da aerovia que acabou dando esse problema no controlador do espaço aéreo.
Guilherme Barros: E por que não foram feitos esses investimentos?
Marco Antonio Bologna: Eles não foram feitos, eu diria, por cinco motivos. Nós temos, nessas 18 resoluções, três que são... que se tivessem sido executadas, elas teriam endereçado, e esse problema hoje não estaríamos vivendo. A primeira resolução, número cinco, ela estabelecia, de uma forma muito clara, determinava... como o Conselho Nacional da Aviação Civil é interministerial, determinava a todos ministérios, incluindo o Ministério da Fazenda, o não contingenciamento de nenhum recurso proveniente do próprio setor - que são as taxas aeroportuárias de navegação e comunicação -, que a este ano de 2006 chega ao montante de R$ 950 milhões. Então, houve contingenciamento de recursos como [em] outros setores também aconteceu. A resolução de número 11, ela estabelecia um plano nacional aeroviário que [estabelecia que] haveria a integração de todos os agentes do sistema, desde a Infraero, o Decea [Departamento de Controle do Espaço Aéreo; organização brasileira subordinada ao Ministério da Defesa e ao Comando da Aeronáutica, responsável pelo controle estratégico do espaço aéreo brasileiro], o setor, inclusive estimulando a iniciativa privada nos investimentos necessários de infraestrutura. E a Resolução 15, que é a mais específica para o momento atual, ela determinava ao DAC [Departamento de Aviação Civil; órgão brasileiro criado em 1931 pelo então presidente Getúlio Vargas para estudar, orientar, planejar, controlar, incentivar e apoiar as atividades da aviação civil, pública e privada. O órgão foi extinto e absorvido pela Anac em março de 2006] - à época, hoje é Anac [Agência Nacional de Aviação Civil] e Decea - que capacitasse recursos humanos e colocasse o efetivo necessário para os controladores do espaço aéreo.
Ricardo Gandour: O senhor, além da TAM, agora comanda o sindicato das empresas. A sua empresa tem planos já publicados de expansão para o ano que vem. Com base nesse diagnóstico, qual é a agenda que o senhor pretende implementar à frente do sindicato, no interesse das companhias?
Marco Antonio Bologna: Quer dizer, primeiro vai ficar claro que nós não estamos conversando com o poder concedente a partir da crise. Essa colocação da não aplicabilidade das 18 resoluções, a gente vem debatendo e dizendo ao governo sucessivamente - e diria até que de forma quase que catequetética -, mas pelos motivos que eu citei acabaram sendo adiadas. Hoje, como presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias, acho que a plataforma, ela é muito clara, ela é de ajuda; nós temos que ter ações emergenciais de momento. O lado positivo é que o transporte aéreo, hoje, ele está saneado, ele é eficiente, ele é lucrativo, ele tem um plano de frota - como você disse - muito claro das companhias aéreas, e o Brasil há três anos que cresce a taxas chinesas [isto é, muito altas] em termos de transporte aéreo. Então, eu diria que a plataforma principal é [ter] ações imediatas de curto prazo, mas um planejamento de maior longo prazo que seja dentro de uma proposta de um transporte aéreo saudável, eficiente e auto sustentável.
Amauri Segalla: Voltando à questão da segurança, antes do acidente da Gol [colisão no ar entre o Boeing 737-800 da Gol e o jato Legacy, no dia 29 de setembro de 2006, na região do norte do Mato Grosso. Morreram 154 passageiros, todos do Boeing; os 7 ocupantes do Legacy, que conseguiu pousar no Pará apesar das avarias na asa e na cauda, não sofreram ferimentos] as companhias aéreas sabiam que era precário o controle do tráfego aéreo no Brasil?
Marco Antonio Bologna: O controle do espaço aéreo no Brasil, ele é seguro, ele nunca foi precário. Os investimentos que foram feitos no Brasil - é bom recordar, até tem um investimento muito grande no passado recente, que foi o investimento do Sivam [SIstema de Vigilância da Amazônia, criado em 1994, visa monitorar o espaço aéreo da Amazônia], que basicamente faz parte aí do controle de toda região amazônica -, então hoje o Brasil possui quatro centros integrados em defesa aérea e controle de tráfegos chamados Cindactas [Centros Integrados de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo, que interagem para vigiar e controlar a circulação aérea no território brasileiro]. Então, esses investimentos na área de equipamentos, na área de radares, eles aconteceram. Do ponto de vista de... Você citou o acidente, toda parte de relatórios de possibilidades de perigos é algo normal que acontece na aviação por um procedimento, então todo avião, ele tem uma zona que a gente chama, assim, uma área, uma bolha de preservação em torno dele. Qualquer evento que aconteça, que interfira nessa aproximação, ele tem que ser relatado; então tudo isso é público por parte das companhias aéreas. O transporte aéreo brasileiro tem taxas que são bastante comparáveis com os melhores países: o Brasil está na categoria um no controle do espaço aéreo. O que houve por parte... quando aconteceu o episódio do acidente, no dia 29 de setembro, é que isso aconteceu exatamente no Cindacta I, que cobre 75% do espaço aéreo da América do Sul. Então, essa... e o procedimento quando isso acontece é você retirar ou a tripulação de vôo ou o controlador de controle, para se iniciar um processo de investigação das causas [que são a] raiz desse acidente. Então houve uma retirada naquele momento de quase vinte controladores do maior centro de controle brasileiro, e o que não tinha naquele momento era reserva; não havia um backup efetivo.
Sidnei Basile: Mas, presidente, eu queria saber uma coisa do senhor: é verdade que cresce a taxas chinesas a demanda; agora, a impressão que fica para o cidadão aéreo, particularmente para o consumidor dos serviços do transporte aéreo, é que a infra-estrutura é africana - né? -, para dizer o mínimo, para ser benevolente. E também os dados parecem mostrar que as pessoas estão simplesmente fugindo [enfatiza] do avião, né? Estão fugindo. A pesquisa dos agentes de viagens indica que a tendência para este ano é nós termos dez pontos percentuais a menos de pessoas que pretendem embarcar em aviões nas suas férias de fim de ano do que no ano passado. Tudo isso que nós revisamos aqui, até agora, pertence ao passado, já aconteceu de fato. Há algo a fazer para restaurar a confiança do consumidor, numa área onde a questão da confiança é fundamental?
Marco Antonio Bologna: Com certeza. Primeiro, a gente tem que lembrar a importância do transporte aéreo no Brasil. O Brasil é um país de extensão continental, os outros modais de transportes não atendem, ou seja, o transporte rodoviário também se encontra numa situação, eu diria, aproximadamente 20% transitável para um país de longas distâncias. O transporte ferroviário, ele não é feito para passageiro. E lembrando também que o transporte aéreo, ele tem não só a pessoa que vai lá em cima, como a carga que vai nos nossos porões. Essa carga é de alto valor agregado. São cargas eletroeletrônicas, todo farmacêutico, ou seja, a insulina que chega no Chapuri, no Acre, ela vai de avião; então a importância, o efeito multiplicador do não funcionamento adequado do transporte aéreo tem reflexos muito significativos na economia, principalmente no Brasil, onde 70% das pessoas estão viajando a negócios. Então, a pergunta é: o que fazer? Eu acho que falar que é africano o nosso transporte...
Sidnei Basile: [Interrompendo] Talvez fosse melhor se ele fosse soviético, daqueles tempos em que os Tupolevs [aviões fabricados pela empresa russa de defesa e aeronáutica Tupolev, fundada em 1922, com sede em Moscou] caíam.
Marco Antonio Bologna: Exatamente, exatamente. Eu acho que aí o ponto é que nunca houve uma discussão mais de, vamos dizer assim, de integração intermodal. Os aeroportos acabam ficando em lugares de dificuldades de acesso, essa é uma discussão antiga que desde [19]85 se discute, de fazer uma ligação por trem ou por metrô para o aeroporto de Cumbica, e nunca foi executada. Então, o Brasil nunca endereçou um transporte intermodal eficiente. Agora, o transporte aéreo é o mais rápido e o mais fácil de a gente poder recuperar. Os investimentos básicos em radares são feitos. Eu acho que é [preciso realizar] ações imediatas, recuperar a capacidade de planejamento do setor, olhando para a frente e pressupondo esse crescimento que virá, pela importância que esse setor tem e pelo dinamismo que ele oferece, a facilidade, dado que o mais caro está investido, que é a frota. A frota nacional é uma das mais modernas do mundo, [os] equipamentos [são] de ponta. Então, eu acredito que a recuperação está muito ligada a pessoas. Mais fácil recuperação de infraestrutura, nós não temos que construir estradas, nem aerovias, né? É capacitar pessoas, que é um bom problema.
Paulo Markun: [Interrompendo] Mas, eu só queria fazer uma observação e chamar em seguida umas perguntas dos telespectadores, de usuários, na verdade, do sistema pelo Brasil afora, porque a comparação que tem sido feita - não sei se justa ou injustamente - é com o apagão [interrupção do fornecimento de energia elétrica que se deu em 11 de março de 1999, atingindo dez estados brasileiros e o Distrito Federal. Entre junho de 2001 e o início de 2002, o país adotou um programa de racionamento de energia para evitar o risco de novos apagões] que nós vivemos aqui. No caso do apagão houve uma mobilização que envolveu indústrias, consumidores que tinham alguma coisa a fazer - nesse caso do avião não tem nada a fazer, salvo, de repente, ir por outro meio - e governo, de maneira muito intensa. Quer dizer, houve assim, realmente, quer dizer, foi uma coisa de falta de planejamento, um estrago na economia, na vida das pessoas, mas a sociedade e o governo reagiram em conjunto. Eu não vejo esse tipo de situação acontecendo agora. O senhor acha que está acontecendo?
Marco Antonio Bologna: É, nós não temos como substituir um avião por lâmpadas frias [Marco Antonio sorri], como aconteceu no plano que a mobilização do consumidor...
Paulo Markun: Ou um controlador de vôo por um robô.
Marco Antonio Bologna: Por um robô. Não temos isso para fazer. Então, o que houve realmente é um grande desconforto aeroportuário, né? E aliado a esse fato do controlador, porque o que aconteceu, no fim, foi de eles trabalharem de uma maneira, de um espaçamento maior entre decolagens, até tornou, do ponto de vista do espaço aéreo, muito mais seguro, o que levou, obviamente, a um desconforto enorme pelos horários de vôos nos aeroportos. E aliado a esse fato... a gente tem que lembrar que é extremamente recente a crise da Varig, a perda de oferta da Varig ou a indisponibilidade das áreas aeroportuárias que estão até hoje em discussão no Judiciário, que acabaram dando um gargalo físico nesses aeroportos. Então, acho que essa mobilização que você citou por época do apagão elétrico, que até você usou como sinônimo o apagão aéreo, ela está vindo a partir do momento [em] que surgiu essa questão, ou seja, eu acho que a ficha caiu; hoje existe um grupo permanentemente numa sala de crise do comando geral da aeronáutica onde estão participando autoridades portuárias do setor e, com certeza, a gente deve endereçar uma melhora agora no período da alta, vamos estar mais preparados com contingências e planejado mais longo prazo, voltando às 18 resoluções básicas de outubro de 2003.
Paulo Markun: Eu queria rodar um VT das questões dos usuários que acham que funcionam com uma espécie de reforço ao que a gente já falou até agora. Vamos ver.
[Vídeo]
Virginia Silva – MG: Eu gostaria de saber de quem é a responsabilidade com os passageiros em relação aos atrasos?
Regina Calábria – MG: O que [é] que a TAM pode fazer quanto aos atrasos - né? -. para sanar esses atrasos ou mesmo minimizar?
César Bueno – RS: Qual é o plano da TAM em relação a um plano de contingência com a crise da aviação hoje no Brasil?
Paulo Daglelani – RS: Eu gostaria de saber se no período de Natal e fim de ano... se há uma expectativa de se manterem esses atrasos, ou se essa situação já vai estar regularizada nos principais aeroportos.
[Fim do vídeo]
Marco Antonio Bologna: Bom, falou-se [sobre] de quem é a responsabilidade, quais são os planos de contingência e como é que vai ser o Natal.
Paulo Markun: Mas, principalmente, se os atrasos vão continuar.
Marco Antonio Bologna: Primeiro, quanto à responsabilidade, é óbvio que essa responsabilidade é clara, ela é do provedor do serviço. Portanto, é do governo, certo? Hoje, houve uma deficiência nunca esperada pelo setor, que ocorresse na magnitude que ocorreu, essa magnitude explicada por um episódio extremamente nefasto, um acidente que aconteceu no dia 29 de setembro, que levou... foi o estopim dessa crise do controlador. Então, primeiro, acho que fica muito claro que nós, transportadores... os atrasos originaram por motivos de força maior. Nós até que tentamos minimizar o desconforto, mas muitas vezes nem fisicamente era possível, porque nós não tínhamos a principal coisa que é o que o consumidor quer: a informação. Essa informação não existia para o operador, de qual era o horário que o vôo decolaria e se ele decolaria, e o desconforto físico em que você não tinha nem espaço num restaurante ou num hotel próximo, próximo ao aeroporto, para viabilizar, minimizar o desconforto. Então, acho que esse é o que explica o primeiro motivo. O segundo, qual é o plano de contingência? É óbvio que nenhuma companhia aérea tinha um plano de contingência para esse tipo de crise que se apresentou. Ela foi... foi muito expressiva; não havia um plano montado para isso, é óbvio, porque se tivéssemos, seria duvidar do sistema de controle como um todo, de não existência de um trabalho de contingência pelo próprio controlador do espaço aéreo. Agora, obviamente, sentando todos juntos, tendo um discurso único, ou seja, falar, ter primeiro uma informação clara por parte da Infraero, da companhia aérea, do controlador do espaço aéreo sobre os vôos, isso já está minimizando, ao longo destes últimos dias, esse tipo de informação. As companhias, evidentemente, sobretudo isso aprenderam. No caso específico da TAM, nós partimos para um plano maior de contratação de pessoal de aeroporto, de maior facilidade no despacho e naquilo que seria o nosso check-in, e para o Natal está todo mundo se preparando, que é um motivo, é um período de alta, então eu diria que a crise aguda como foi no finados e no fim de semana sucessivo, em seguida ao finados, não deverá se repetir no Natal e no Ano Novo. Nós estamos tendo essa informação por garantia do controlador. Está sendo colocado no Cindacta de Brasília um reforço de 32 controladores e algumas alternativas integradas, e [também] revisão da malha aérea nacional que minimize os impactos nos aeroportos.
Paulo Markun: Nós temos dois colegas ainda aqui que não fizeram perguntas. De todo modo vou fazer um intervalo, porque, digamos, é de praxe, lembrando que a entrevista desta noite poderá ser encomendada em DVD, a partir de amanhã. O site é www.culturamarcas.com.br, o telefone é 0XX11 - 3081 3000. Daqui a instantes nós voltamos com o programa que tem hoje na platéia Paulo Castelo, diretor de alianças e relações institucionais da TAM, Daniel Frederico Tompson de Moura, consultor de turismo, e Ricardo Soares, artista gráfico. A gente volta já, já.
[intervalo]
Paulo Markun: Estamos de volta com o Roda Viva, que esta noite entrevista Marco Antonio Bologna, presidente da TAM Linhas Aéreas e também do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias. Vamos ver mais algumas observações de usuários do sistema pelo Brasil afora.
[Vídeo. Imagens de passageiros em aeroportos, dirigindo perguntas a Marco Antonio Bologna]
Kátia Cumprido – BA: A gente que voa muito, que está sempre viajando lá e cá, a gente queria ter segurança, né? Agora, com essa onda dos controladores de vôo, a gente não ter segurança para a poder voar, então a pergunta é esta: o que pode ser feito e o que as companhias aéreas podem contribuir nesse sentido para a gente poder voar com segurança?
João Simeoni – RS: Eu gostaria de saber, como usuário freqüente da TAM, se os aviões realmente têm o nível de confiabilidade que a gente imagina que eles tenham?
Wagner Reis – SP: Como é que a TAM está trabalhando, neste momento em que o país está numa crise muito grande nessa questão do tráfego aéreo, como é que a TAM está atuando para a proteger os interesses dos seus clientes de tal maneira que a gente consiga ter a tranqüilidade dos nossos vôos?
[Fim do vídeo]
Marco Antonio Bologna: Bom, ele falou agora de segurança, eu só queria completar um pouco o que os demais falaram... é quanto ao quesito de pontualidade, lembrando que na aviação nunca existe 100% de pontualidade. Os melhores indicadores mundiais são de 96% de pontualidade, o que significa que 4% dos vôos, independentemente de crise de controlador, eles atrasam. O Brasil tem mais ou menos mil vôos por dia, de vôos comerciais, portanto, 40 vôos atrasam normalmente, em situações normais. Nesse caso específico agora é que surgiram esses índices de 60% de vôos atrasados em um dia. [Quanto a]O quesito segurança, o transporte aéreo brasileiro é extremamente seguro: as aeronaves são de ponta, são todas aeronaves modernas; o Brasil hoje, com a aviação comercial, ela tem todos os seus equipamentos com três níveis de redundância. São tecnologias avançadas, com controle... falando um pouco de termo técnico, o chamado sistema TQS, que é um sistema que evita a colisão no espaço aéreo. Os indicadores brasileiros de acidentes são muito baixos. Em comparativo mundial, ele é de um nível bastante aceitável comparado a países desenvolvidos, o que faz que o Brasil esteja na categoria um de nível de segurança. Então, acho que essa... [para] transmitir a segurança para o passageiro é que existe um sistema de proteção de vôo, tanto por parte das companhias aéreas... No caso específico da TAM, nós temos o sistema de safety: são vinte pessoas que reportam diretamente à presidência, que tem um sistema preventivo para a situações que saem de controle; lembrando que nossos pilotos, eles não são kamikazes [isto é, suicidas, como os pilotos japoneses chamados kamikazes, que, no final da Segunda Guerra Mundial promoviam ataques suicidas contra inimigos, em aviões carregados de explosivos], então a grande garantia que a gente tem também é por parte do nosso pessoal de operações que traz para nós [informações de] que os vôos estão acontecendo dentro das realidades necessárias e das contingências pré-estabelecidas. Nós vamos ter também... procuramos adicionar ao nosso sistema de segurança a informação precisa, o estímulo ao tripulante, [para] que ele relate de forma bastante coesa tudo aquilo que vem acontecendo para o nosso departamento de safety.
Hélcio Estrella: Presidente, duas perguntas: uma ao presidente do SNEA [Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias] e outra ao presidente da TAM. Presidente do SNEA... é que a decisão da Justiça, ao congelar bens intangíveis, no caso da Varig, está causando parte dessa má imagem da aviação comercial. Está sendo feita alguma coisa... foi feita ou está sendo feita alguma coisa para isso? E a segunda pergunta é que parte do problema eu suponho que seja do low cost, low fare [baixo custo, baixa tarifa; é a política de venda de passagens aéreas mais baratas em virtude dos menores custos, promovidos por práticas como a maximização das horas diárias de vôo das aeronaves ou mesmo pela suspensão ou redução serviço de bordo], que está gerando uma má qualidade de serviços aeroviários no Brasil, de um modo geral. O serviço caiu bastante. A sua posição, que defende uma regulamentação de mercado, visa a esse interesse do passageiro?
Marco Antonio Bologna: Sim, na primeira pergunta, como presidente do SNEA, quanto aos ativos, o processo de recuperação judicial da Varig, ele é inusitado, ele partiu de uma nova lei, da lei de recuperação judicial, aonde o legislador, no uso legítimo dele, o juiz federal... o juiz empresarial do Rio de Janeiro acabou colocando um acervo de intangíveis, ou seja, concessão, direito de vôos, horários de vôos, redesignações internacionais, bem como áreas aeroportuárias, como os bens que foram arrematados em leilão. Então, isso criou, evidentemente, uma inovação, quer dizer, ele passou a ser o poder regulador nesse momento, o que levou a uma discussão judicial, que... enquanto aquela arrematação não se concluir por um processo de concessão da nova Varig, todas essas áreas ou todos esses direitos estão congelados, e leva, evidentemente, a um gargalo que foi o episódio mais expressivo no mês de julho, a percepção de imagem do setor, no mês de julho, que também foi de muita confusão aeroportuária por esse motivo. Como SNEA, o que a gente vem agindo é em discussões junto à Justiça do Rio [de Janeiro] e junto à ANAC, o poder concedente, que a gente chega a um bom termo; e acreditamos que a sensibilidade do judiciário vai acontecer antes da alta e poder desengargalar as áreas de aeroporto, pelo menos. Do ponto de vista como presidente da TAM, você abordou o caso do low fare, low cost. Na verdade, a aviação, ela...
Paulo Markun: Só para explicar.
Marco Antonio Bologna: É, para a explicar, a low fare, low cost é a política de tentar buscar tarifas mais baratas, baseadas num custo operacional mais barato. Então, a aviação, ela vem se popularizando. Num transporte aéreo, muito de glamour... eu diria que ele é um transporte aéreo muito bem expressado num filme que a gente pode assistir, que é O Aviador [filme lançado em 2004, dirigido por Martin Scorcese, que conta a história de um jovem milionário que se dedica à indústria do cinema e da aviação], com Howard Hughes [nome do personagem principal, representado pelo ator Leonardo DiCaprio], que mostrava toda aquela época do glamour do transporte aéreo. Portanto, um transporte eletista, um transporte feito para ricos.
Guilherme Barros: Que acabou, obviamente.
Marco Antonio Bologna: É. Isso... com a popularização, você tem que buscar eficiência; isso para gerar preços competitivos. Esse é o motivo pelo qual a gente cresce à taxa chinesa, porque os preços ficaram mais acessíveis. Quem voava de avião voa mais vezes e quem não voava passou a voar.
Amauri Segalla: Até que ponto a entrada da Gol no mercado mudou a estratégia de negócios da TAM?
Marco Antonio Bologna: É, obviamente que sempre um concorrente leva a uma dinâmica, a Teoria dos Jogos aí se aplica em a gente poder reagir a alguma ação feita por um concorrente. Mas, terminando o conceito do low cost, a aviação como um todo, no mundo como um todo, ela buscou uma popularização e o extremo do filme [O] Aviador é assistir a O Terminal [filme de Steven Spilberg, lançado em 2004, sobre um cidadão da cidade fictícia Krakozhia, na Europa Oriental, que toma um vôo para Nova Iorque e, ao chegar, descobre que seu país sofrera um gole de Estado, o que lhe impede de entrar nos Estados Unidos e também de retornar a seu próprio país], e o Tom Hanks [ator que representa o personagem principal do filme Viktor Navorski]... Quando você vê as condições de aeroporto, não só no Brasil, mas também nos Estados Unidos, também elas são bastante desconfortáveis, com o acumulo de tráfego aéreo que acabou surgindo no mundo como um todo. Então, o transporte se popularizou, e se popularizou por alguns quesitos, que foram eliminações de classes, [o fato de que] os mercados domésticos não trabalham mais com classe executiva, trabalham mono classe, a aviação internacional vem diminuindo o número de assentos para a classe... primeira classe, isso em função de que as pessoas também querem pagar menos pelo transporte aéreo. A entrada de um concorrente com uma nova proposta, é evidente que isso trouxe não só no Brasil, mas ao mundo, todo um repensar por parte de todas as empresas aéreas na busca de produtividade. E a principal produtividade que se tem são três ações: a primeira, é o uso intensivo da principal máquina ou do bem de capital, que é o avião. Então, toda empresa hoje busca trabalhar com uma máquina ou bem de capital em vários turnos; então é a maior utilização horária por dia de um avião, é o maior diluidor de custo possível. Segundo, a segunda forma de redução de custo é desintermediação do canal de vendas; então se buscou o canal de venda direta, a plataforma baixa utilizando não mais os sistemas mainframes [sistemas de computação centralizados, para o processamento de grandes volumes de informações, por milhares de usuários ao mesmo tempo] ultrapassados, as centrais de distribuições do passado, e sim trabalhando de uma forma na web. E terceiro, os processos administrativos, a busca e eficiência da menor complexidade empresarial, da busca de trabalhar de uma maneira mais digitalizada no seu processo de decisão, lembrando que nós somos uma atividade que opera 24 horas por dia, sete dias por semana.
Sidnei Basile: Quantas empresas cabem no mercado brasileiro nessas [enfatiza] condições de competitividade? Pelo visto, as duas [TAM e Gol] estão dando conta do recado. Se a Varig voltar vai ser um problema. Como o senhor vê, como alguém do setor?
Marco Antonio Bologna: Bom, esse setor, ele, comparado com qualquer país, a qualquer parte do mundo, nós temos uma dinâmica de fornecimento que é bastante oligopolizada [organizada em forma de oligopólio, isto é, com poucas empresas dominando a oferta no mercado, de tal forma que cada uma precise considerar os comportamentos e as reações das outras ao tomar suas decisões de mercado]. Primeiro, a nossa cadeia de suprimento, de fornecimento, nós temos basicamente hoje no mundo dois grandes provedores de avião [Boeing, empresa norte-americana, e Airbus, consórcio europeu] e um grande provedor nacional, que é a Embraer [Empresa Brasileira de Aeronáutica, entre as maiores empresas mundiais do setor aeroespacial, fundada em 1969]. Então, você tem muito pouco poder de negociação com o seu fornecedor. Segundo, a nível de aviônico, você acaba caindo em duas mãos aí, quantos fornecedores são. Provedores de aeroporto, no Brasil é um provedor de aeroporto fazendo a referência, que é a terceira taxa aeroportuária mais cara do mundo. Você tem também provedores de tecnologia bastante concentrados. Então, isso leva à necessidade de você ter escala para poder ter poder e capacidade de negociação. Então, isso leva a buscas, por ser intensivo, em capital, em tecnologia, em mão-de-obra, treinamento, especificamente, e energia, a ter que trabalhar com uma escala alta. Então, se você for olhar, nos Estados Unidos e na Europa há um nível de poucos operadores. Então, Canadá é um exemplo, ele opera hoje basicamente com dois grandes operadores: a Air Canada e Westjet. Se você for para a Austrália, muito parecida com Brasil a [sua] distribuição de tráfego aéreo, você tem a...
Sidnei Basile: Se depender de TAM e Gol, Varig não volta, portanto? [Sidnei ri]
Marco Antonio Bologna: Não, você tem aí um trabalho e o próprio mercado americano, quando você olha por setor ou por hubs [aeroportos que atuam como centro de distribuição de vôos, onde os passageiros mudam de aeronave em trechos ligando extremos da rede. A logística das rotas é chamada hub-and-spoke, lembrando raios de uma bicicleta ligados ao ponto central (hub)], você tem sempre dois, ou no máximo três, operadores fortes. Eu diria que o Brasil, como troncal, [n]ele cabe[m] duas a três operadoras. Mas tem uma grande oportunidade que é o transporte aéreo regional. O Brasil tem mais de seis mil municípios e hoje nós estamos falando em 50 municípios troncais, ou seja, há necessidade também de incentivar a aviação regional.
Darcio Oliveira: Eu queria voltar um pouquinho na crise do controle do tráfego aéreo. Você disse que era uma questão de contratação de pessoas, mas os equipamentos também não estão defasados? Tem radares do Cindacta I que têm 40 anos de idade. Quer dizer, é preciso fazer um investimento em infraestrutura também?
Marco Antonio Bologna: [Em] Tecnologia sempre é preciso fazer investimento, lembrando que a era digital traz um nível de atualização tecnológica que ela é... isso você vê na sua residência, você vê com o brinquedo dos seus filhos e que você depende de estar investindo constantemente. Então, acho que houve, em função de retenções dos recursos, houve deficiência de investimentos. Sempre cabe lembrar também que, mesmo não tendo um sistema de radar, existe um sistema de comunicação. Por isso que sempre se fala em navegação e comunicação. Então, existindo alguma área [em] que não há uma cobertura por parte de radar, sempre tem um recurso ou um terceiro recurso para a fazer o trabalho de comunicação.
Darcio Oliveira: O Brasil está preparado para a [comunicação aeroespacial] via satélite?
Marco Antonio Bologna: O Brasil tem que se preparar até 2010. Nós temos que fazer entrar no CNS-ATM, que é um sistema que será via satélite, e lembrando até que quando nós viajamos sobre o oceano, nós não temos supervisão de radar, nós só temos o trabalho de comunicação que é feito por sistema de satélite.
Valtécio Alencar: Bologna, essa crise recente do controle, ela revelou alguns problemas com a categoria dos controladores de vôo - né? -, assim, eles têm... parece que o número de controladores é subdimensionado para o país, eles ganham pouco, reclamam que ganham pouco, têm uma carga de trabalho muito grande e eles dizem que uma das questões principais é o fato de eles estarem vinculados a um regime militar. Então, hoje, a gente ouve aí as associações de classe, representantes deles, pedindo uma desmilitarização do controle do tráfego aéreo. Você acha que isso é uma solução? E como [é] que a gente poderia fazer isso, já que o Brasil tem um sistema de controle integrado?
Marco Antonio Bologna: Bom, primeiro vou falar em nome do efetivo, depois a gente fala de capacitação, remuneração e qual a modalidade da categoria que deveria ser dada. Primeiro, no número de efetivos, o Brasil tem quatro Cindactas, basicamente são quarenta setores de cobertura de supervisão de espaço aéreo. [Em] Cada console você tem que ter dois controladores, um supervisor; então você já começa a inferir dados turvos. Eles trabalham no Brasil seis [horas] por 42 de folga. Então, isso dá um total ideal ao redor de três mil e trezentos, três mil e quinhentos controladores. Portanto, nós estamos com um gap aí na faixa de trezentos controladores, que é o que aconteceu quando você teve uma retirada muito rápida de um Cindacta único. Então, o que está sendo feito hoje... primeiro, houve uma medida provisória que permitiu a recontratação de seiscentos controladores que já tinham saído, que tinham se aposentado, estão voltando; houve um remanejamento que se chama comissionamento, [a] saída de outros Cindactas para o Cindacta I, que é o principal - lembrando que não é só Brasil que transita por Brasília, é todo o tráfego da América do Sul - e ouve também, você deve estar ouvindo falar dos tubulões, que é aquele [procedimento] de você tirar setores da administração do controle central e deixar para os próprios controles de aproximação, como é a ponte aérea. A ponte aérea Rio-São Paulo, ela trabalha entre as próprias torres de aproximação, ela não vai ao Cindacta. Então, essa é uma maneira de contornar o problema. Quanto à remuneração, realmente hoje você tem três categorias, você tem desde efetivo militar de controlador, você tem efetivo civil, trabalhador do setor público, você tem civil trabalhador da Infraero... Então, deveria ter uma equalização na política de cargos e salários, quer dizer, então, o que eles reivindicam é legítimo, está certo? A remuneração é baixa. Se você for comparar com um controlador dos Estados Unidos, ele ganha hoje na faixa de dez mil dólares, está certo? O Brasil controla...
Valtécio Alencar: [Interrompendo] Dez vezes menos, praticamente.
Marco Antonio Bologna: Dez vezes menos praticamente. Lá [nos Estados Unidos] eles controlam... você lembrando que eles controlam quinze vezes mais também, a nível de volume de tráfego. Então, eu acho que é necessária uma maior capacitação, é necessária uma melhor remuneração, e o que é importante: dinheiro tem; o setor é auto-suficiente, ele recolheu 950 milhões este ano em termos de tarifa. É questão de vontade. Até lembro que quando nós quisemos colocar um cosmonauta no ar se editou uma medida provisória e se colocaram recursos do tesouro na ordem de dez milhões de dólares para fazer isso. Então, aqui tem recurso, e é uma questão de decisão. Quanto ao conceito, desmilitarizar ou não, há prós e contras. Então, eu acho que essa decisão não deveria ser tomada num momento de crise. Ela deveria ser tomada de uma maneira pensada, porque o Brasil optou por uma integração da defesa do espaço aéreo com o controle aéreo e é difícil você compartilhar os dois sistemas. Por outro lado, se isso for feito... tem maneiras de fazer, o mercado americano fez isso, desmilitarizou, mas deve ser feito com planejamento adequado e não resolvido num momento de crise.
Ricardo Gandour: Bologna, a sua companhia chegou a colocar pianos de cauda na sala de embarque no tempo em que se teve uma inserção muito forte no mercado, se diferenciou nos serviços de bordo etc. De uns anos para cá a gente vê um modelo [de] baixo custo, que você descreveu, aparecer aí como aparente vencedor desse modelo competitivo. Pergunto a você: esse modelo é um modelo daqui para a frente? É um modelo que vai suprir a lacuna, pelo menos por um instante aí, deixada pela Varig no mercado? Vai voltar a aparecer o nível de serviço, dito... chamado de premium? Qual o futuro do modelo de serviço da aviação?
Marco Antonio Bologna: Primeiro vamos definir o conceito de serviço. O serviço, ele se altera pela... ele é dinâmico de acordo com o comportamento do passageiro ao longo do tempo. Então, antes, obviamente, você tinha uma época em que a precificação da passagem, ela levava em conta uma série de serviços que hoje o consumidor atribui outros pesos do que ele atribuía no passado. Então, hoje, o principal objetivo que um passageiro quer - que até é um motivo da discussão - ele quer a pontualidade e regularidade. Então, não adianta você colocar o piano e não ser regular e pontual, certo? E, hoje em dia ,até nem o piano a gente pode colocar mais, porque [sobre] as áreas da Infraero, ela [a Infraero] que tem o poder de questionar e de fazer, se a gente quisesse ter um piano, não poderia ter mais. Então, eu acho que os atributos são: primeiro, pontualidade e regularidade; segundo, aviões modernos - a necessidade de ter aviões modernos é algo que o passageiro quer -, ele [o passageiro] quer também ter atendimento rápido e facilitado no aeroporto, ele gosta de uma fidelização, e o último quesito que ele acaba buscando, obviamente - que esses [são] os fundamentais, que eu citei -, é também ter uma diferenciação no serviço de bordo. Quando você vai para a um segmento de mercado como é o de longo curso, onde o vôo é de etapa longa, dez, doze horas, você não poderia servir barras de cereais - né? -, porque seria complicado esse número de horas voadas. É um mercado extremamente segmentado. Então, você nota que os serviços mantêm um padrão bastante diferenciado, principalmente quando você vai na primeira classe, ou na classe executiva, ou na classe econômica. No mercado doméstico - e principalmente no Brasil, onde a etapa média é de uma hora e trinta [de vôo] -, essa diferenciação acaba caindo, onde? Basicamente no atendimento, na pontualidade e regularidade, no atendimento oferecido por parte, principalmente no aeroporto e no relativo conforto a bordo. A TAM é uma empresa que investe nesses três quesitos como diferenciação, que também cobra um pouco a mais por isso. Mas o comportamento hoje do consumidor é não pagar muito mais por isso. Ele acaba... nós imaginamos que ele não paga mais que 9,99% acima da tarifa mais baixa para ter esses diferenciais em produto, que é estratégia da TAM: mais conveniências, a preços competitivos. Para tal tem que ter custos operacionais baixos.
Paulo Markun: Eu tenho que chamar um intervalo, mas eu queria fazer uma pergunta aqui do empresário Adilson Soares, aqui de São Paulo, que ele diz o seguinte: "Já que uma das mais significativas receitas do negócio aeroviário é justamente essa tarifa, que no Brasil é caríssima, o que é que explica o fato - segundo ele, eu ignoro se isso aconteceu - de a TAM ter deixado de pagar isso por uma decisão judicial durante longo tempo?
Marco Antonio Bologna: Não, o que existiu... nós temos vários ativos intangíveis em discussão com o governo, que foram as famosas defasagens tarifárias do Plano Cruzado. Esse é um ativo discutido tanto pela Varig como pela Vasp [extinta empresa de aviação brasileira, sediada em São Paulo, fundada em 1933 e oficialmente declarada falida em 2008. Nesse meio tempo, a empresa empreendeu estratégias ambiciosas no mercado internacional, passou por problemas com dívidas, obsolescência da frota, pressões da concorrência e o fim de suas operações de transporte aéreo (em 2004)], como pela Transbrasil [companhia aérea brasileira fundada em 1955 e extinta em 2001, que experimentou um período de expansão nos anos 1980, sofreu prejuízos com os planos econômicos baseados no congelamento de preços e, nos anos 1990 dedicou-se ao mercado internacional. Após o falecimento de seu fundador, Omar Fontana, em 2000, a empresa deteriorou-se rapidamente], já parada, quanto pela TAM, que chega ao redor de seis bilhões e meio que o setor discute contra o governo. No ponto de vista... outra discussão que se tem com relação ao ICMs [imposto Sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços] e por parte de discussão entre o setor, fora esses planos econômicos, congelamento tarifário, ou de um ICMs recolhido indevidamente, cobrado indevidamente, há uma discussão também do adicional tarifário. Esse aí não está... [corrigindo-se] está sendo recolhido. Existe uma discussão de mérito, então não procede [o fato de] que não está sendo recolhido. Todas as tarifas...
Paulo Markun: Ele não chegou, não houve um período em que deixou de ser recolhido?
Marco Antonio Bologna: Não, houve um período, no ano de 2002, quando a crise foi aguda - final, começo de 2002 - [em] que a Infraero lançou um programa de securitização - que era uma forma de parcelar as tarifas atrasadas de aeroportos - estendido àqueles que estavam inadimplentes, que não era o caso da TAM. Isso foi estendido, na época, à Vasp, à Transbrasil e à Varig. Depois foi feito um programa que era para dar, vamos dizer assim, isonomia de tratamento aos operadores, porque aquele que era inadimplente tinha um prazo de pagamento, o adimplente não tinha, que era o nosso caso e da Gol, e surgiu também um programa para a todas as companhias que foram... hoje não existe mais, esse programa foi quitado, todo mundo paga o corrente-dia, inclusive a nova Varig.
Paulo Markun: Nós vamos fazer um rápido intervalo no Roda Viva, que esta noite tem na platéia Felipe Gomes, presidente da Rapedi - Associação Paulista dos Estagiários de Direito -; Paul Lew, presidente da Câmara Brasil-China de Desenvolvimento e Intercâmbio Econômico e Comércio Exterior; Ednilson Roberto Marques, analista setorial do site Aviação Brasil; e Alice Ferraz, empresária. E a gente volta já, já.
[intervalo]
Paulo Markun: Voltamos com o Roda Viva, que hoje discute os problemas do mercado e da operação aérea nas empresas de aviação do Brasil. O entrevistado é o engenheiro de produção Marco Antonio Bologna, presidente da TAM Linhas Aéreas e também do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias. Presidente, tem notícia por aí de empresas aéreas e companhias fabricantes de avião discutindo voar em pé para vôos curtos. [Marco sorri] Isso é ficção científica de má qualidade ou é o futuro da aviação?
Marco Antonio Bologna: Não, acho que é um pouco de especulação. Não existe nenhum projeto.
Paulo Markun: Porque está faltando pouco. Em muitos aviões é quase isso. [discretos risos gerais]
Marco Antonio Bologna: É que mudou a concepção, na evolução da tecnologia, de cadeira, de assento. Você acabou indo para o adensamento maior dentro dos aviões. Então se chegou ao limite. No caso de um Airbus 320 [aeronave destinada a rotas curtas], o limite que você chega é 180 assentos por avião; você chega num Boeing 737-800 [avião comercial a jato equivalente ao Airbus 320, produzido pela fabricante Boeing] a 187 assentos. Isso leva a uma concepção de cadeira que acaba dando essa sensação que você falou lá, não chega a...
Paulo Markun: [Interrompendo] Não, mas eu li essa notícia em tom de seriedade.
Marco Antonio Bologna: Era um estudo feito, que você iria quase como - pela Airbus, inclusive -, você iria como [em] uma montanha russa, que você vai em pé, preso, fazendo aquilo que você faz na Disney, mas não existe nada no curto prazo para esse fim. Obviamente que se buscam determinadas evoluções de tecnologia, até um uso mais efetivo do transporte. Então... isso não só no transporte aéreo, mas também de trem, de trem bala, de velocidade de trem, tudo isso acaba sendo discutido.
Paulo Markun: Agora, só para ficar nessa área - porque sei que os colegas aqui da área econômica vão caminhar em outra direção -, eu recentemente fiz um vôo internacional de 12 horas e havia, para atender 100 passageiros, duas funcionárias, ou tinha 300 passageiros, alguma coisa assim; se não eram 100 eram 80. Então, a qualidade do serviço que é oferecido para a classe econômica em vôos internacionais - inclusive, isso não é na companhia que está em crise, não tem nada a ver com a crise da Varig - é muito ruim. O senhor não acha que...
Marco Antonio Bologna: Não, isso não é verdade, porque existe uma regulamentação - talvez estava desregulamentado - e você tem que ter o número de comissárias exatamente pelo número de portas que tem o avião, exatamente pelo quesito... lembrando que a comissária e o comissário têm como primeiro dever o aspecto de segurança. Então, não pode ter menos tripulação do que o necessário pelo número de portas, o que dá, na média, um atendente para cada cinqüenta pessoas. Então é algum problema específico de um vôo, porque em geral o dimensionamento do serviço de bordo, principalmente numa etapa longa de 12 horas é para a dar o atendimento, fazer todo o curso do serviço com um número determinado por convenção coletiva, inclusive, entre o sindicado dos empregadores...
Paulo Markun: [Interrompendo] Há quem fiscalize?
Marco Antonio Bologna: Há o Sindicato Nacional dos Aeronautas, que fiscaliza e obriga que haja não só essa parte de adequação do efetivo como, às vezes, tripulação de revezamento. Num vôo longo você tem que levar dois comandantes, dois co-pilotos, inclusive estabelecendo também o conceito de descanso nesses vôos, com áreas reservadas. Você deve vistos alguns bancos às vezes de aviões que são reservados à tripulação para descanso, sendo uma equipe de revezamento ou composta.
Amauri Segalla: Bologna, voltando à questão da segurança, existem de fato os buracos negros no espaço aéreo brasileiro, aqueles pontos cegos que não são detectados nem pelo controle interno, nem pelos aviões?
Marco Antonio Bologna: Não, não existe nenhum local onde você não tem um procedimento específico de vôo. Então, mesmo que você não tenha uma área de cobertura de radar - lembrando que, sei lá, há cinco, seis anos atrás você não tinha cobertura de radar na Amazônia e a gente voava, né? Voava baseado num sistema de comunicação. Então, hoje o que está sendo colocado - e até pelo próprio setor, pelo próprio controlador, pelo próprio comando geral da aeronáutica - é que existem algumas deficiências em algumas zonas onde é feito o trabalho da contingência, em que você usa o seu sistema de comunicação ao invés de usar o sistema puro de navegação. Então, procedimentos para voar existem e todos esses pontos são observados, são levados por relatórios de reporte, tanto por parte do controlador, que [é] basicamente quem faz esse reporte... 40%, por estatística, vêm do controle do espaço aéreo, um terço vem por parte dos nossos pilotos do setor e esses são todos reportados e serão corrigidos, vêm sendo corrigidos na medida em que eles são identificados.
Sidnei Basile: Bologna, detalhe, você, que eu me recorde, trabalhou em cinco bancos, já, né? O Chase, o Credit Lyonais, o Loyds, no SRL, Banco Itamarati, não é isso? Perdi algum? Não, né?
Marco Antonio Bologna: Não, foi isso.
Sidnei Basile: É uma coisa curiosa, né? Você, em banco, você trabalha com segurança, liquidez, não sei o quê, é uma cultura realmente de uma relação custo-benefício muito bem medida e tudo; aí vai você trabalhar num setor - eu estava aqui notando - em que as empresas quebram e que dependem de regulação e dos rumores do governo em altíssimas doses, em que a demanda é instável e que o preço do petróleo está numa montanha russa e que... bom, os controladores e a insegurança dos consumidores, como é que fica o bancário nisso, hein?
Marco Antonio Bologna: Eu diria que é por isso que é fascinante, né?
Sidnei Basile: Como é que é esse choque de culturas?
Marco Antonio Bologna: O setor financeiro... primeiro, a minha carreira acabou... você citou, você lembrou bem, a gente já se conhece daquela época em que foi um setor que passou por um processo muito intenso de consolidação. Então eu diria [que] minhas mudanças de emprego foram fruto desse processo de consolidação do compra-compra bancário. É... o setor bancário, ele trabalha, como você falou, com segurança, rentabilidade, liquidez. São três coisas que às vezes vão andar juntas, às vezes aqui no Brasil essas coisas acabam andando juntas, sobretudo na aplicação do título público [em que] você tem segurança, uma boa rentabilidade e extrema liquidez. Então, acho também que é um setor de risco. O setor financeiro trabalha com risco de crédito, com risco de alavancagem, risco de transformação de moeda... então, o nosso setor é muito parecido, a gente trabalha com risco de alavancagem de recursos, risco de crédito, transformação de moeda, com um quesito adicional que é a energia, que é uma comodity [produto ou serviço primário ou com pouca diferenciação, geralmente utilizado como insumo da produção]. Eu acho que isso, para o bancário, é até mais fácil de entender. Você tem capacidade de fazer cobertura de exposição de risco cambial ou de risco de comodities, como o petróleo. A grande dificuldade desse setor, de a gente trabalhar, é trabalhar com... é você ter o seu, [corrigindo-se] a sua filial voando, ela não estar parada no lugar sempre na hora [em] que deveria estar. Então, quanto ao aspecto logístico, é que ele é mais complicado, o que leva também ao uso intensivo de tecnologia no gerenciamento desses processos. Então eu acho que o bancário, ele se sai bem nesse setor, e a adrenalina, ela é interessante no setor.
Guilherme Barros: Bologna, vocês, as companhias, estão perdendo - me parece - quatro milhões por dia com essa crise. Eu queria saber se vocês já decidiram se vão buscar algum tipo de ressarcimento contra o governo - já que você disse que foi [ele, o governo] o responsável por essa crise - [gostaria de saber se] vão buscar judicialmente, ou algum tipo de acordo, e se estão prevendo também ações do outro lado, ou seja, daqueles que foram prejudicados, dos usuários que foram prejudicados com essa crise em razão dessa operação, dessa greve branca, enfim, do que se pode chamar aí dessa... de todo esse atraso, de todo esse caos que aconteceu nos aeroportos?
Darcio Oliveira: Eu vou pegar uma carona aqui. Vocês pleitearam a redução de uma carga tributária para o querosene de aviação. Isso continua como compensação financeira?
Marco Antonio Bologna: Primeiro, o consumidor... a maior preocupação que o setor tem... acho que o maior dano que pode acontecer é quanto ao dano de imagem, que a gente está vivendo. Você tem uma queda, como o Sidnei citou, de demanda já por parte do tráfego [por motivo de] lazer, ou seja, as pessoas acabam adiando pelo desconforto. Tanto que, às vezes, nem pelo aspecto segurança, mas o desconforto, de imaginar ter um desconforto no aeroporto. Então, o dano de imagem é imponderável. O consumidor, eu acho que ele tem... nós somos absolutamente solidários com eles [os consumidores], eles têm total razão em reclamar, eu acho que eles devem reclamar, a gente deve satisfação, o sistema como um todo deve satisfação e nós operadores somos parte integrante dele. Então, esse consumidor vai buscar os seus direitos. Eu acredito que isso já está acontecendo através do Procon [Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor]. Nós entendemos, obviamente, que nós não fizemos esse desserviço, porque nós somos... eu já falei isso até na audiência pública no Senado, que o setor... as linhas aéreas não são sádicas, muito menos masoquistas com nós mesmos, com nosso efetivo que vivenciou esse drama de aeroporto. Então, eles vão buscar o direito e nós vamos chamar a responsabilidade daquele que foi o motivo de força maior, que foi por parte do controlador do espaço aéreo que não permitiu que nós executássemos o serviço conforme o combinado, conforme o vendido. Então, nós fizemos um cálculo; esse cálculo entre [enumera nos dedos] horas voadas, você ficar fazendo orbitagem de avião por tempo, tempo de solo, hora extra de pessoal do aeroporto, custo de hospedagem, alimentação, translado de todo consumidor, chegou a um cálculo estimado no setor que isso foi uma perda de R$ 4 milhões por dia, afetado naquele período crítico. Nós fizemos, através do sindicato, um ofício ao órgão regulador, que é a Agência Nacional da Aviação Civil [Anac] e pedindo ressarcimento disso; e demos como uma idéia, como um possível período de relief [forma de amenizar], dar algum tipo de desconto em vez de querer mover uma ação contra a união de ressarcimento, mas ter um período, ter um ressarcimento através de algum pagamento. Estamos aguardando um posicionamento por parte da Anac, que está fazendo a articulação junto ao governo. A partir da resposta da agência, o sindicato vai transmitir isso a seus associados e cada um tomará uma decisão. Se [es]tiver tudo bem, se tiver [sido] feito o ressarcimento, ótimo; se não, vai-se entrar com recurso, porque é legítima essa discussão, cabe recurso contra a União e cada um tomará a sua decisão soberana como empresa individual.
Ricardo Gandour: Bologna, um pouquinho sobre estratégia de crescimento daqui para diante. Você falou, agora há pouco, que um concorrente com modelo de tarifa agressiva pode... freqüentemente força a outra empresa, como a sua, a se adaptar. Vocês estão aí com... agora chegando novas aeronaves com mais assentos, espaço menor entre poltronas. A TAM vai caminhar para a esse modelo de tarifas mais baixas?
Marco Antonio Bologna: A TAM já caminhou para um modelo de tarifas competitivas. A gente trabalha com gerenciamento de receitas, ao longo... lembrando que o avião, [corrigindo-se] a indústria aérea não estoca mercadoria. Nós somos uma empresa que [quando] o vôo saiu, as cadeiras foram junto. Então tem uma alta perecibilidade no nosso estoque de produto; então você acaba criando um sistema de gerenciamento de tarifas que tenta otimizar o aproveitamento do vôo, ou seja, tem horário de pico, tem horário que é fora de pico, tem tarifa de fim de semana, e vendo esse conceito todo de tarifa planejada que acabou estimulando o tráfego aéreo de uma maneira geral... Então, a TAM é uma empresa hoje que procura atender aos diversos segmentos de consumo do setor. Você tem desde alguém que pode viajar num vôo noturno, num corujão, que é uma tarifa extremamente barata, por quê? Porque o avião iria ficar parado - a gente só vai [fazê-lo] voar para [cobrir] o custo variável - até aquele que quer voar de última hora no [horário de] pico, acaba pagando uma tarifa mais alta. Então, na média tarifária... até hoje tirou a diferença de tarifa média que ela tinha em relação ao concorrente de menor preço, que era [de] 25, 30% de diferença. Hoje a gente tem aproximadamente 10% de diferença nesse preço, que é o que alguém está disposto a pagar a mais para poder ter um serviço de uma malha aérea de melhor distribuição, ter vôos mais diretos, menos conexão, ter um relativo conforto a bordo, ou seja, a gente também aumentou o número de cadeiras, mas mantendo um diferencial; a gente investiu muito no programa de fidelização, lembrando que a TAM até tem um desconto indireto para cada dez vôos, você acaba ganhado um trecho adicional, e também a parte de entretenimento de bordo e uma parte de um serviço de bordo diferenciado que a gente não caminhou para o sistema de trabalhar totalmente com nenhum tipo de serviço ou trabalhar com a famosa barra de cereal [como lanche servido a bordo].
Valtécio Alencar: Bologna, aproveitando que estamos falando de crescimento, as previsões dos fabricantes da Boeing, Airbus, para os próximos dez anos, por exemplo, dizem que a América Latina deve apresentar um crescimento até superior do que a média mundial e que dentro da América Latina, lógico, o Brasil vai ser o país que deve mais crescer nesse período. Como é que você vê isso e relaciona com a infra-estrutura aeroportuária que a gente tem no país? Nós temos uma infra-estrutura preparada para agüentar esse crescimento, já que a gente vem crescendo nos últimos três anos, como você disse aí, a taxas chinesas?
Marco Antonio Bologna: É verdade que todos os fabricantes olham alguns mercados potenciais de crescimento. Quais são esses mercados? [São] Sempre quem tem alta extensão geográfica e alto nível populacional, e baixa penetração de pessoas que voam. Então, basicamente, quando você olha o famoso BRIC, que é o [nome dado ao conjunto de países que inclui] Brasil, Rússia, Índia e China, são os típicos países onde você tem essa combinação: extensão geográfica, alto nível populacional e baixa penetração do transporte aéreo. A Rússia nem tanto é colocada, porque ela tem uma excelente infra-estrutura ferroviária; a Índia tem uma estrutura ferroviária, mas bastante depreciada hoje. Então, os três mercados de maior olhar hoje sobre os fabricantes são a China, evidentemente - que lá ainda está no transporte cicloviário, está caminhando não só para o avião, mas para outros modais -, você tem a Índia, com grandes investimentos, e, na América do Sul, pelas características geográficas do Brasil, sem dúvida o Brasil. O Brasil tem 190 milhões de habitantes; este ano a gente vai para aproximadamente 42 milhões de passageiros transportados/ano, o que leva a uma freqüência de três a quatro vezes por pessoa. Nós estamos falando em 14, 15 milhões de brasileiros que têm acesso ao transporte aéreo. Então, sendo... querendo ser pessimista, só tem 15 milhões. Sendo otimista, dá para a ter 190 milhões, principalmente pela facilidade. Aí, obviamente que tem que endereçar esses gargalos. Por isso que é importante, como o Guilherme falou, não é olhar para trás, é olhar para a frente, [é] o que nós vamos fazer. Eu acho que neste momento, com tudo o que aconteceu, eu acho que estou muito confiante, que a autoridade caiu a ficha -, e o que a gente tem que fazer não é tão complicado como construir estradas, ou portos, ou fazer ferrovias: é uma questão de adequar um serviço de controladores, uma remuneração condizente com a responsabilidade que eles têm e, ao mesmo tempo, no trabalho do aeroporto, é muito mais uma adequação do intermodal do que só olhar especificamente o aeroporto. Tem um dado importante que é o terminal São Paulo. A gente tem a maior concentração de tráfego aéreo; está aqui. Não é uma discussão você tirar tráfego de Congonhas [aeroporto localizado no distrito do Campo Belo, cidade de São Paulo], ir para a Guarulhos [aeroporto mais movimentado do Brasil, localizado na cidade de Guarulhos, distrito de Cumbica, a 25 Km do centro de São Paulo]. É discutir o terminal como um todo, tem que ter a terceira pista de Guarulhos, tem que se pensar numa integração com Viracopos [aeroporto situado a 20 Km de Campinas (SP) e 99 Km de São Paulo] e aí entra novamente a discussão de como chegar a esses aeroportos de uma maneira eficiente e rápida.
Hélcio Estrela: Presidente Bologna, falando em gargalo, o senhor acredita na tendência de manutenção do sistema de hub, que prejudica seriamente o passageiro?
Marco Antonio Bologna: É, depende daquelas... da característica da malha de cada país. Você sabe que os Estados Unidos, como eles têm...
Paulo Markun: Pessoal, vamos... - mais uma vez eu vou fazer aqui o papel do advogado do diabo - vamos explicar o que é o sistema de hub para as pessoas que não são do ramo. [Marcos sorri]
Marco Antonio Bologna: Está certo. O hub é um lugar de concentração de tráfego aéreo, de concentração e distribuição de vôos, quer dizer, os vôos...
Paulo Markun: É um super aeroporto que leva um monte de gente...
Marco Antonio Bologna: Que transfere, que faz as conexões de vôos, é o chamado hub-and-spoke, que você acaba fazendo a distribuição a partir dessa concentração feita no hub. Então, primeiro a característica de malha, né? Os Estados Unidos, por ser um país de extensão também continental - mais ou menos 260 milhões de habitantes - e lá, em vez de... não só aqui, eu falei 190 milhões para 42 [milhões de passageiros transportados ao ano]; lá [os Estados Unidos] estão com 280 [milhões], [segundo o] último censo, [com] quase 700 milhões de passageiros transportados [ao ano], ou seja, você tem quase que duas [vezes] e meia [da] população voando; ou seja, eles voam muito freqüentemente. Então, isso cria densidade de tráfego intensa, lembrando que os investimentos lá são distribuídos, você tem densidade de negócios e de lazer norte, sul, leste, oeste, o que leva aos conhecidos vôos pendulares. Então, você sai de Nova York para a Los Angeles, volta e fica fazendo pêndulo. O Brasil não tem essa condição de distribuição de tráfego. Ainda o lazer lá [nos Estados Unidos] é 40% [por motivo de] negócio, 60% é lazer. Então, o americano viaja muito como turismo, preenchendo os vales de horário de pico e fora de pico. No Brasil, ainda você tem como 70% [dos vôos por motivo de] negócio, e todo mundo... exemplo - né? - [do que ocorre no trecho entre] São Paulo e Brasília: de manhã todo mundo quer ir para Brasília e no fim da tarde todo mundo quer voltar de Brasília para São Paulo. Então você tem que fazer o hub em Brasília, porque, quando você chega com o avião lá, não tem como voltar para a fazer o pêndulo, acaba distribuindo vôos para norte e nordeste; ou seja, o modelo brasileiro ainda requer a necessidade de hub, apesar das companhias aéreas estarem cada vez mais criando os vôos over hub, ou seja, passar Porto Alegre-Brasília direto, ou fazer um vôo direto [para] Salvador, sem ter que cambiar por Brasília.
Hélcio Estrela: O ponto a ponto era uma tendência na aviação brasileira na década de [19]90. Uma tendência crescente, que depois se modificou.
Marco Antonio Bologna: Para o conceito de hub, exatamente para uma maior eficiência no uso. Seria o exemplo da TAM: nós temos 650 vôos diários. O limite era ter 650 aviões, cada um fazendo um vôo pendular. Isso não se justificaria, daria um preço, um custo de capital muito alto. Então, para ter uma malha eficiente, acabou se caindo no conceito do trilho do avião, que acaba...
Paulo Markun: E prejudicou o vôo regional.
Marco Antonio Bologna: Não, o vôo regional é uma outra discussão.
Paulo Markun: Não, eu vou citar, por exemplo... é uma outra discussão, mas tem a ver. O estado de Santa Catarina, onde eu moro, diversos pontos do estado, que eram servidos, inclusive, pela TAM, desapareceram.
Marco Antonio Bologna: Desapareceram, pelo seguinte motivo, né? O que aconteceu com o transporte aéreo? Primeiro, você tinha uma aviação regional existente até como legislação. Houve uma desregulamentação, o que incentivou a haver concentração de vôos onde tem maior densidade de tráfego. Então, efetivamente, se abandonaram destinos sem ter um incentivo de uma aviação regional. Aí novamente é um novo erro de política. Então nós, inclusive no sindicato, a gente tem como plataforma a volta da aviação regional. O que tem que ser feito na aviação regional? Primeiro, você tem que ter uma equalização; os custos de operar com baixo número de assentos torna, às vezes, o preço da passagem inviável para aquele par de cidade. Então, tem que ter uma equalização de custos e receita. No passado, havia a famosa suplementação tarifária. A TAM nasceu como uma regional em [19]76, no sistema integrado do transporte aéreo regional que oferecia essa forma de equalização. Hoje tem um projeto de lei no Congresso que cria uma Cide, uma contribuição de interferência de direito econômico, que é para criar um fundo que compense isso para a uma regional. Tem que ter um prazo de exploração definido em número de anos, de cinco a dez anos, que incentive o investimento, para evitar que alguém vá lá, levante tráfego e depois encoste lá um Airbus da TAM, porque ele abriu a picada. Então ele tem que ter um direito de exclusividade...
[...]: [Interrompendo] [...] seria impossível...
Marco Antonio Bologna: ... um direito de exclusividade de exploração. E, por último, que ele também tivesse uma adequação de número de assentos, incentivar a criação... até a própria Embraer é partidária desse projeto de lei. Então, é necessário ser feito isso, e nós, empresas troncais, temos total interesse para sermos alimentados por esses vôos e distribuir. A TAM já faz isso hoje com cinco empresas menores; a gente atende 48 destinos com nossos equipamentos, e vamos a 74 destinos em parceria com cinco empresas menores que são, vamos dizer, quase regionais.
Guilherme Barros: Uma companhia internacional hoje poderia entrar no Brasil para fazer essa... aumentar a concorrência na aviação regional?
Marco Antonio Bologna: Não, o controle do capital no Brasil... primeiro, ele é mantido na mão de brasileiros, como é em qualquer outro país. O próprio mercado americano também tem uma restrição muito clara ao controle de capital - a participação de capital estrangeiro -, como a Europa tem, como a Índia tem, como a Rússia tem, como a China tem. Por quê? É uma infra-estrutura, essa infra-estrutura voa, então você tem uma dificuldade de localização da infra-estrutura, todos os países adotaram, principalmente quem tem uma grande extensão continental, que é o caso do Brasil. Então, quanto ao controle de capital, tem que ser mantido na mãos de brasileiros naquilo que seja capital votante. Então 80% do capital votante, com direito a voto, tem que ser na mão de brasileiros e a gestão também tem administração feita por brasileiros. Quanto a céus abertos, que seria essa discussão, naquilo que é entre países, cada dia há uma maior flexibilidade. O sindicato é partidário da multidesignação. Antigamente você tinha o conceito de mono bandeira, só uma companhia de um país poderia operar o [...]. Hoje, a tendência de flexibilização e de haver vários operadores bilaterais, e de serem multidesignados, nós somos partidários disso. Aí, quanto à cabotagem [termo comumente usado para navegação, para referir-se a trechos dentro de um mesmo país], que é aquele transporte interno, isso nenhum país com a extensão que o Brasil tem admite a cabotagem feita por empresas estrangeiras, porque daí seria uma concorrência muito complicada, porque ele viria aqui com custo de capital extremamente mais baixo, com tamanho de escala muito maior e tendo um... não tendo um controle efetivo - lembrando também que isso afetaria muito também o mercado do trabalhador. O Brasil também tem por legislação, como os outros países, que sejam os equipamentos operados também por pilotos brasileiros, para poder gerar emprego no local.
Paulo Markun: Presidente, vamos fazer mais um rápido intervalo. E a entrevista desta noite é acompanhada na platéia por Júlio César, advogado; Carla Costa, jornalista especializada em tecnologia e criação de portais; Airton Dornelas, gerente geral do Hotel Holiday In Anhembi; e Alexandre Barros, diretor e editor chefe do site Aviação Brasil. A gente volta já, já.
[intervalo]
Paulo Markun: Estamos de volta com o Roda Viva, que esta noite entrevista Marco Antonio Bologna, presidente da TAM Linhas Aéreas e do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias. Vamos a mais algumas perguntas e questões colocadas pelos usuários do sistema.
[Vídeo. Imagens de passageiros nas ruas e em aeroportos, dirigindo perguntas a Marco Antonio Bologna]
Cláudio Carneiro – CE: Eu queria saber do presidente da TAM como é que ele vê as promoções e a concorrência das empresas aéreas.
José Carlos de Souza – MG: Eu queria saber como são definidos os preços das passagens.
Rogério Leal - MG: Gostaria de saber por que existe diferença de preços de passagens para o mesmo trecho entre as companhias aéreas.
[Fim do vídeo]
Marco Antonio Bologna: Bom, perguntou basicamente de preço, e a primeira pergunta era com relação a...
Paulo Markun: Promoções, quer dizer, o que é que...
Marco Antonio Bologna: ...às promoções. Bom, acho que as promoções vieram para ficar. O setor trabalha com um sistema de gerenciamento de preços baseado no horário do vôo, horário de pico, horário fora de pico, fim de semana, ou seja, existe hoje uma forma dinâmica de precificar ao longo do dia. Para [se] ter uma idéia, hoje a TAM administra diariamente no seu inventário ao redor de 180 mil preços, pelo... quinze classes tarifárias para a 650 vôos numa projeção de trinta dias. Então, dinamicamente, esses preços são revisados, ao redor de 38 mil diariamente. Então, a busca de preenchimento de vôo é feita dessa maneira, ou seja, criam-se promoções para incentivar determinados momentos onde o avião partiria sem assentos. Então, a tendência é de segmentação de preços. A pergunta que ele também colocou, por que, para o mesmo trecho, para o mesmo lugar, você tem diferença de preço? Porque as diferenças de modelos de companhias... até agrega[-se] mais valor de serviço, uma outra companhia não agrega, acaba tendo uma precificação diferente. O que eu aconselho sempre ao usuário é que ele pesquise, pesquise preço. Não é verdade que uma empresa é mais barata do que a outra, existem oportunidades, existem promoções. Entrem nos portais, entrem nos sites. Os sites mostram essa facilidade hoje, o uso da eletrônica permite, né? Então, as promoções... [é preciso] estar atento a elas, elas estão sempre surgindo. Cada dia mais nós vamos ter isso no transporte aéreo.
Paulo Markun: Por que não se usa no Brasil... - eu vou usar uma expressão que obviamente não é tecnocrática e do setor - por que não se usa a "xepa" [mercadorias vendidas em fim de feira livre, mais baratas e de qualidade inferior] do avião? Isso em vários países significa o seguinte: se na beira da hora de embarcar o sujeito tem ainda lugar lá, a pessoa vai e compra com dinheiro, inclusive, em alguns casos, obviamente, no caso de países mais desenvolvidos basicamente com cartão de crédito ou de débito, e embarca por um preço mais barato. Aqui é exatamente o contrário na grande parte dos casos. Se você quiser embarcar na última hora é mais caro. Por quê?
Marco Antonio Bologna: É, isso é pelo seguinte motivo: ainda pela densidade que nós temos de consumidores, a nossa "xepa" é muito mais a promoção. Quer dizer, a "xepa" é o quê? É o assento que não foi vendido, não foi distribuído, você acaba fazendo uma pesquisa do seu inventário e chega à conclusão [de] que era melhor lançá-lo... como um típico exemplo, o corujão. Ter um avião dormindo em Guarulhos à noite, um avião dormindo em Salvador à noite. Então, já que eles estão dormindo, troca eles [faz o gesto de trocar]; é a chamada troca de cabeceira ao longo da noite, e cobra simplesmente o custo variável que leva. O preço de uma passagem aérea São Paulo-Salvador era ao redor de 10% maior do que de ônibus, sendo que não tem o inconveniente do tempo do ônibus e não tem ainda que pagar alimentação em cada estação [em] que ele acaba parando ao longo da estrada. Então, no fundo, ele é mais competitivo. Aquele último que você falou, esperar o último [...]... porque se você leva isso ao extremo, quando não tem volume de tráfego como é o americano - lá tem até o denied boarding [impedimento de viajar para alguns passageiros de vôos cujo número de assentos é menor que o de passagens vendidas] que você pode comprar -, você levaria o sistema, induziria o sistema hoje a todo mundo esperar o último minuto, certo? Então, a sua administração de inventário não seria eficiente, porque você ficaria em aberto com o vôo sem nenhuma confirmação de reserva, todo mundo esperando na porta do avião, porque naquele momento a gente iria abrir pelo preço mais barato. Então, a dinâmica do gerenciamento de receita, dada uma escala maior de pessoas voando, permite o chamado... o que o americano chama de last minute [último minuto]. [N]O Brasil ainda não dá para a fazer isso senão induziríamos a todo mundo esperar o último minuto.
Ricardo Gandour: Bologna, como é que você vê a estratégia de um concorrente seu que freqüentemente, ou às vezes, lança promoções de [passagens a] um real, dez reais, promoções relâmpago? Como é que você vê essa estratégia?
Marco Antonio Bologna: Eu acho que é saudável, porque toda essa... a nível de promoção, ele tem uma disciplina. As companhias não são autofágicas, elas não criam promoções que sejam predatórias. [É] óbvio que quando você lança uma promoção, como [em] qualquer outro setor, ele tem um número limitado de itens colocado à disposição. Mesmo uma promoção, sei lá, de uma empresa de eletrodomésticos... ele vai dizer: "Tem tantos eletrodomésticos.", está limitado o número, esse número é conhecido. Na aviação, ele também é um número limitado, mas ele não é um número conhecido, de uma maneira clara; você tem... depende de você entrar no site ou ligar para o seu agente de viagens e saber se tem ou não aquela promoção disponível. Por quê? Porque nós vamos trabalhando... como o avião levanta vôo, é diferente do estoque do eletrodoméstico que fica, dá para ser estocado. A gente... quando o avião foi, ele foi embora. Então, se aquela promoção não está colando e você está vendendo fora da promoção, você vai preenchendo assentos e diminuindo os assentos disponíveis àquele preço.
Ricardo Gandour: Aí falou o presidente do sindicato ou o presidente da TAM? A TAM faria isso também?
Marco Antonio Bologna: Depende da forma como você aborda. Eu acho que isso tudo tem um lado de marketing na forma de trazer. O que a TAM procura fazer em vez de trabalhar com promoções pontuais é trabalhar no conhecimento de calendário do usuário. Então nós lançamos... ao longo de 2004, a gente chamava de tarifas festivas que buscavam os calendários específicos de feriados, nós chamamos depois, ao longo do ano, de “voe mais”; então a memória do nosso cliente é que ele vá procurar sempre nas datas festivas as promoções da TAM, e ele encontra, e a gente deve estar lançando uma novidade ainda que deverá ser mais abordada ao longo do final deste ano.
Guilherme Barros: [Interrompendo] Bologna, só uma coisa: a Varig tinha aqueles acordos Star Alliance, né? A TAM... - eu não sei como está isso -, mas a TAM pensa, no vácuo da Varig, buscar esse... também essa...?
Marco Antonio Bologna: O que você está falando são as alianças globais. As alianças globais hoje basicamente são três; existiam cinco no mundo, depois se consolidaram em três, que são: One World, Star Alliance e Sky Team. A TAM... lembrando primeiro [que] para você fazer parte de uma aliança... por que é importante estar numa aliança? É a conectividade de vôo e o compartilhamento de um programa de milhagem. Isso cria a vantagem de você voar em diversas operadoras do mundo e ter conectividade de vôo, e as tarifas integradas nessa aliança. Então, para a TAM, primeiro precisa lembrar que ela... até 2 de maio de 2005 a gente ficou na tentativa de uma fusão com a Varig. Então, não havia nenhuma oportunidade de discutir uma aliança até aquele momento. A partir de 2 de maio de 2005, quando a gente partiu para uma estratégia única, de nossas próprias pernas, nós começamos a nos fortalecer, a endereçar uma capitalização na companhia, um plano de frota claro para a empresa; e no ano de 2005, final de 2005 para 2006 é que nós definimos a maneira muito clara, a nossa estratégia de crescimento no mercado internacional. Então, enquanto você não tem também uma estratégia de crescimento de longo curso, não faz muito sentido entrar numa aliança. Neste momento, então, qual é a estratégia da TAM? É fazer acordo com parceiros em cada bilateral, em cada destino que a gente opera. Por quê? Porque o grande ativo que a TAM tem, neste momento, é a distribuição na América do Sul, lembrando que o continente é um continente de destino final. Então, para a nós, neste momento, a nossa estratégia é trabalhar por bilateral e entender melhor a dinâmica de custo e benefício dessas alianças, e avaliá-las no momento oportuno, mais futuramente.
Darcio Oliveira: Bologna, vocês compraram recentemente três Boeings 777-300, acabando aí com uma hegemonia da Airbus na frota de grandes aviões da TAM. [Houve] Problemas com a Airbus? [É a minha] primeira pergunta. E, segundo, por que as companhias brasileiras não operam com jatos brasileiros?
Marco Antonio Bologna: Primeiro a TAM comprou... corrigindo, nós compramos quatro Boeings Triple Seven 300 ER, que é o maior da família triple seven para entrega. Esses quatro aviões, no ano 2008, por que nós fizemos essa compra? Nós, em função dessa oportunidade que surgiu, de um crescimento mais acelerado da expansão internacional da TAM, em função de destinos que estão disponíveis, ou seja, Londres, que nós iniciamos este ano, mais freqüência para Paris, a ida ao mercado de Milão... temos interesse efetivo de voltar para o mercado alemão... a gente precisava reforçar o nosso planejamento de frota - né? - , frota de aviões de grande porte. Segundo, nós fizemos aí, para qual avião definir, nós queríamos avião de maior capacidade; de novo mais assentos por avião para trabalhar com custo mais competitivo e ter um mix de crescimento de rota mais efetivo, porque quando você tem um [Boeing] 330 com 223 assentos, você bota dois e você vai para 450 assentos, praticamente... ou aí é melhor, em vez de ter dois aviões, é aí um avião com 350 assentos. Então, [o] problema [é] mais de produtividade da máquina. Então, nós abrimos uma concorrência tanto para a Airbus... que nós somos o maior operador da América Latina, temos excelentes relações com a Airbus, abrimos uma concorrência para a esse tipo de avião e dentro do nosso pedido de proposta também nós tínhamos uma necessidade de ter uma entrega de alguma operação ponte que nos levasse de hoje até 2008 para atender os tráfegos que nós estávamos ganhando, que vêm a ser fazer o vôo Rio-Paris e fazer o vôo de Milão ainda dentro do primeiro semestre do ano que vem. Então, por condições competitivas, concorrenciais, quem ofereceu a proposta completa a melhor custo, a melhor... tanto em termos de tecnologia, de preço de condições, foi a Boeing, e ela ganhou essa licitação na TAM, o que fez a Boeing colocar um pé dentro da TAM. Então, não é questão de problemas, pelo contrário; a Airbus tem um excelente produto, a nossa família de aviões do mercado doméstico é integralmente de Airbus, que entra aí na sua segunda colocação: por que não compra aviões brasileiros? Então lembre que a Embraer, o seu maior avião, o Embraer MB 190 ou 195, ele chega aí a 120 assentos, no máximo, e a gente decidiu, por uma questão aí de comunalidade de frota, por integração e por olhar os mercados, a dinâmica concorrencial e o crescimento de mercado, de ter também o maior número de assentos para trabalhar no mercado doméstico... ou seja, o menor avião que a TAM tem hoje é de 144 assentos, que é o Airbus 319. A concorrência que nós fizemos em junho deste ano era entre o Embraer 190 e Airbus 318, que é um avião para cem lugares. Acabamos optando em não ter mais um avião de cem assentos e ir para um avião maior de 144. Então, eu acho que a aviação regional vem incentivar muito o produto brasileiro, e até para a TAM, se a gente amanhã, mantendo a liderança, não está descartado a gente vir a conversar novamente com a Embraer para algum segmento de menor densidade, utilizando o equipamento que é de excelência e com tecnologia de ponta, que é a Embraer.
Paulo Markun: Presidente, nosso tempo acabou. Eu vou fazer um desafio para o senhor, uma resposta rápida a uma pergunta complexa, que é o seguinte: overbook [venda de passagens em quantidade maior que o número de assentos da aeronave, o que protege as companhias aéreas de desistências, mas pode também impedir o embarque de passageiros no caso de lotação da aeronave], atrasos e uma série de situações; o consumidor se sente impotente diante do mercado tão oligopolizado como é o mercado de aviação, quer dizer, se eu vou comprar um outro produto, se eu vou usar um outro serviço, as opções, na maioria das vezes, são maiores. Qual é a saída para isso?
Marco Antonio Bologna: A saída é [que] cada vez mais a tecnologia vai estar trazendo essa... vai tirar todos esses gargalos. Lembro também que o overbook é decorrente do no show. É a única indústria na qual você tem o direito de não comparecer, reservar e ter o direito do reembolso integral. Então, acho que a evolução da forma da relação consumidor-operadora e a tecnologia que manterá maiores informações de inventário vão cada vez mais tornar o transporte aéreo algo mais simples de entendimento, de facilidade no seu uso, e eu tenho certeza de que todas essas chamadas mazelas da aviação cada dia mais serão menores e muito mais fáceis de serem absorvidas.
Paulo Markun: Ok, muito obrigado pela sua entrevista. Obrigado aos nossos entrevistadores e a você que está em casa. Nós estaremos aqui na próxima segunda-feira às 10h40 da noite, com mais um Roda Viva. Uma ótima semana e até segunda.