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Memória Roda Viva

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Antônio Britto

19/9/1988

O jornalista, constituinte ativo e então candidato à prefeitura de Porto Alegre pelo PMDB, comenta a abertura política, a morte de Tancredo e as campanhas eleitorais

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Augusto Nunes: Boa noite. Começa aqui mais um Roda Viva pela TV Cultura de São Paulo. O programa Roda Viva é transmitido ao vivo, simultaneamente pela rádio Cultura AM e pelas TVs Educativas da Bahia e do Piauí. O programa é, ainda, retransmitido pelas TVs Educativas de Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Espírito Santo. Os telespectadores que desejarem encaminhar perguntas ao nosso convidado desta noite poderão fazê-lo pelo número 252-6525. Repito 252-6525. As perguntas serão anotadas pela Bernardete, pela Iara ou pela Lolita e, em seguida, retransmitidas ao nosso entrevistado do Roda Viva desta noite, que é o deputado federal Antônio Britto. Antônio Britto já era uma figura... há alguns anos, já era uma figura muito conhecida de milhões de brasileiros, por ser um dos mais importantes repórteres da TV Globo. Depois do episódio da agonia e morte do presidente Tancredo Neves, como porta-voz do presidente eleito que não assumiria, Antônio Britto tornou-se um rosto ainda mais conhecido dos brasileiros. Foi eleito deputado federal em 1986, pelo PMDB [Partido do Movimento Democrático Brasileiro] do Rio Grande do Sul; foi... sem dúvida, tem sido um dos constituintes mais ativos no Congresso em Brasília e é, no momento, candidato a prefeito de Porto Alegre pelo PMDB. Sobre todos esses assuntos do passado, do currículo - relativamente curto, mas muito rico - de Antônio Britto, nós conversaremos ao longo desta Roda Viva, que terá a participação dos seguintes jornalistas: José Barrionuevo, editor de política do jornal Correio do Povo, de Porto Alegre, e da TV Guaíba; Cecília Pires, repórter de política do jornal O Estado de São Paulo; Carlos Nascimento, editor-chefe e apresentador do Jornal da Cultura; João Batista Natali, repórter de política do jornal Folha de São Paulo; Fátima Turci, repórter da sucursal paulista do Jornal do Brasil; Carlos Tramontina, apresentador do jornal Bom Dia São Paulo da TV Globo; Tão Gomes Pinto, repórter da revista Isto É Senhor e Carlos Brickmann, editor chefe do jornal Folha da Tarde. Teremos, também, a participação do cartunista Paulo Caruso, que vai registrar algumas cenas desta nossa conversa. E agradecemos, também, à presença aqui nos estúdios da TV Cultura de convidados da produção. Bom, até porque muitos de nós trabalhamos com o Antônio Britto e porque o conhecemos também profissionalmente, acho que nós vamos nos dispensar de um tratamento mais cerimonioso. Então, eu vou chamá-lo de Britto, como eu o chamo já há alguns anos. Britto, eu dizia na apresentação do programa que a sua carreira política é relativamente curta e muito rica. Pois bem, entre outras coisas, nesses... o quê?... três anos... menos de três anos, como deputado federal, você viveu uma época em que o PMDB se tinha transformado, praticamente, no partido único do Brasil, tamanha a sua força em todos os estados, e vive, hoje, um momento em que o PMDB apresenta, pelo menos em algumas regiões importantes do Brasil, um desgaste muito acentuado. O que [é] que aconteceu para que o partido vivesse essa trajetória, nesses pouco mais de dois anos em que você é deputado federal?

Antônio Britto Filho: Olha, Augusto, eu acho que há dois fenômenos que precisam ser avaliados. O primeiro é o desgaste natural do partido que chega ao poder. No Brasil, especialmente no Brasil pós-período autoritário, onde houve um esvaziamento brutal do que seja, minimamente, um aparelho estatal qualificado para gerir a coisa pública, para enfrentar a demanda social, e onde, ao mesmo tempo, cresceu enormemente a demanda, o partido que chegasse ao poder enfrentaria uma dificuldade enorme, ainda mais agravada pelo fato de que o primeiro período pós-liberdade foi um período onde a sociedade, corretissimamente, se organizou, se mobilizou e saiu a cobrar a conta atrasada. Então, quem chega ao poder encontra um Estado desaparelhado, uma enorme demanda social, e essa demanda se articulando, se organizando e sendo mais efetiva. Esse é o problema geral. A esse problema geral, que já dificultaria, normalmente, o exercício do poder, o PMDB acresceu outro, [e] esse sim é responsabilidade sua. Eu acho que o PMDB, muito corretamente, desenvolveu as políticas de aliança, lá, antes, para poder fazer aquele primeiro esforço de liberalização, ainda no governo Geisel. Depois, para poder fazer vencer a tese das  [eleições] diretas, não deu certo, para fazer eleger Tancredo. Mas em 86, às vésperas de uma Constituinte [Assembléia Constituinte], o PMDB acabou não se preocupando com uma questão que, hoje, o infelicita. O PMDB se tornou uma porta larga demais e generosa demais para abrigar, primeiro, os que, de olho na Constituinte, queriam chegar à Constituinte para poder defender o seu interesse. Esses foram para a porta do PMDB, como militantes de qualquer outro partido. E segundo, aqueles que procuravam reciclar a passagem pelo período autoritário e acabaram vindo para dentro do PMDB, exclusivamente porque o PMDB lhe servia como legenda, lhe servia do ponto de vista do interesse eleitoral. Acho que o PMDB sofreu por isso. O exercício dentro da Constituinte mostrou isso. Mas, apesar de tudo, me parece que o partido - e por isso eu permaneci nele, e por isso eu defendi que correto era eu permanecer nele -, o partido tem, dentro dele, todas as condições de se reorganizar, desde que enfrente essa questão.

Augusto Nunes: Natali. Um minutinho só, Carlinhos. Em seguida, Carlinhos Brickmann. João Batista Natali.

João Batista Natali: Britto, você fez um diagnóstico do PMDB muito parecido com o diagnóstico que poderia ter sido delineado por qualquer... Eu vou chamá-lo também de você, na medida em que somos colegas, e o Augusto Nunes abriu a brecha... Você fez um diagnóstico para o PMDB que poderia ser muito parecido com qualquer deputado, ou constituinte, ou senador constituinte que saiu do PMDB para entrar para o PSDB [Partido da Social Democracia Brasileira]. Esse tipo de crítica não deixa você... um pouquinho... pouco à vontade, pelo fato de continuar num partido que votou majoritariamente pelas eleições, apenas em 1989, e não em 88, como era a sua posição, como era a posição do senador Mário Covas? Não deixa você pouco à vontade pelo fato de ter sido um dos mais fiéis, um dos mais leais liderados do senador Mário Covas, vice-líder do senador Mário Covas na Constituinte? Você nunca teve nenhum tipo de ímpeto, de impulso, para sair do PMDB? Ou será que não foi uma espécie de... digamos, de levar em conta uma questão muito mais regional, na medida em que o governador Pedro Simon [Pedro Jorge Simon (1930), advogado, professor universitário e político brasileiro, baseado no Rio Grande do Sul e filiado ao PMDB] permaneceu no PMDB e você não poderia ficar dissociado dele? Então, explica para gente, por que você ficou no PMDB, depois de tudo isso que você falou do PMDB?

Antônio Britto: Olha, eu acho que essa é uma questão extremamente interessante, né? Primeiro, porque ela envolve, na forma como é colocada, uma avaliação de que partido é alguma coisa que se define em termos de meses, em termos de dois ou três anos. Eu parto de um outro pressuposto. Eu acho que uma das tragédias deste país é o fato de que tu não consegue consolidar o partido, que tu não consegue discutir dentro do partido, que tu não consegue ter um partido que tem momentos diferenciados, tem luta interna, mas vai, até pela luta interna, se consolidando. No Brasil, o partido continua sendo objeto descartável: não serve hoje, troca logo. Não importa que amanhã tenha que destrocar. Eu tenho o maior respeito, o maior respeito pessoal pelo senador Covas, pelos companheiros que saíram do PMDB. Mas, especialmente, nos momentos em que eles tomavam a sua definição, eu entendi que o correto era [eu] permanecer dentro do PMDB e evitar que um patrimônio como o PMDB fosse entregue ou a uma extinção ou a um predomínio de setores que não representam o que o PMDB sempre foi, o que o PMDB ainda pode ser e o que o PMDB, eu tenho certeza, virá a ser ao longo do tempo. Essa foi a minha razão fundamental. E eu continuo achando que isso é correto.

[...]: Britto...

Augusto Nunes: Carlinhos primeiro, depois Carlos Nascimento.

Carlos Brickmann: Seu PMDB [era o] do Fernando Henrique, do Montoro [(1916-1999) André Franco Montoro, professor universitário, advogado e político brasileiro filiado ao PMDB, governou o estado de São Paulo de 1983 a 1987. Foi, ao lado de Tancredo Neves e Ulysses Guimarães, uma das maiores lideranças pela redemocratização do país e pela campanha das Diretas Já] e do Covas ou era do Prisco Viana [(1932) Luiz Humberto Prisco Viana, político brasileiro, ocupou dois ministérios durante o governo Sarney, tendo depois se candidatado ao governo da Bahia] e do Roberto Cardoso Alves [(1927 - 1996) político brasileiro, foi deputado federal por quatro mandatos e exerceu o cargo de ministro da Indústria e Comércio de 1988 a 1990. De reputação conservadora]?

Antônio Britto: Você não tem nenhum direito de ter essa dúvida, até porque deve ter acompanhando as votações da Constituinte...

Carlos Brickmann: Pois é. Por isso que eu estou perguntando.

Antônio Britto: O meu PMDB é o PMDB do Waldir Pires [Francisco Waldir Pires de Souza (1926), político brasileiro nascido na Bahia, ajudou na fundação do PMDB, durante a abertura política. Exerceu vários ministérios e foi governador da Bahia de 1987 a 1989. Em sua carreira política, foi considerado o maior adversário de Antonio Carlos Magalhães], do Pedro Simon, do Ulysses [Ulysses Guimarães] e, até o momento em que deixaram, o PMDB também do Covas, do Fernando Henrique.

Carlos Nascimento: Eu queria falar um pouco...

Augusto Nunes: Carlos Nascimento.

Carlos Nascimento: ... de maneira pessoal com o Britto. Nós trabalhamos juntos na TV Globo, você como repórter político e eu como repórter geral. Hoje eu estou reencontrando você, aqui, com os cabelos já um pouco brancos e na condição de candidato a prefeito de Porto Alegre. O episódio Tancredo Neves, que nós vivemos juntos durante quase quarenta dias foi uma mudança significativa na vida de nós dois. Eu lhe pergunto: eu sabia, desde antes, que você tinha queda, tinha vocação para política. Agora, me parece claro que o acontecimento Tancredo, sem ligar, evidentemente, à questão do infortúnio com a sua ascensão política, acelerou a sua entrada na vida política ou não?

Antônio Britto: Pois olha, a televisão é uma coisa tão fantástica... Eu dizia agora há pouco, antes de a gente entrar aqui: "se alguém nascer e esquecer de avisar a televisão, e a televisão só souber vinte anos depois, o sujeito acabou de ganhar vinte anos de vida.". É um pouco isso [o] que aconteceu comigo. Em minha vida inteira eu fiz política estudantil, política sindical, política! Minha vida inteira. Mas, como eu passo a ser conhecido a partir da televisão, e como eu passo a fazer política - para a maioria das pessoas depois de ter feito televisão, porque as pessoas não sabiam que antes eu tinha feito política -, então fica decretado que [o Britto] passou a fazer política depois que a televisão [o] inventou ou [o] tornou minimamente conhecido...

Augusto Nunes: Agora, Britto...antes da pergunta do José Barrionuevo, agora, o Devanir Simão, de Osasco, quer saber: “Em que medida o fato de ter sido porta-voz do Tancredo Neves tem ajudado você na sua atual campanha política em Porto Alegre?”.

Antônio Britto: Olha, eu acho que a gente, nós todos, jornalistas, nós precisamos enfrentar, com muita clareza, algumas coisas que estão postas diante dessa situação de jornalistas que se candidatam. Primeiro: sob pena de nós próprios ajudarmos a uma discriminação odiosa, política também é lugar para jornalista ou jornalista também deve fazer política. Segundo: eu não entendo que caiba a nós, jornalistas, ou a qualquer outro segmento, levar para a política, se valer, de qualquer forma, do que sejam recursos escusos, indevidos e tal. Terceiro: cada um de nós, quando vai para a política, [seja] médico, jogador de futebol, enfermeira, [ou] jornalista, leva o quê? Leva aquilo que tiver amealhado de respeitabilidade junto à sociedade. Uma pessoa que trabalha lá num bairro, que constrói com dificuldade as suas amizades, as suas influências, ela evidentemente tem mais dificuldade para consolidar um número mais amplo de influências do que alguém que vai à televisão. Mas cuidado com isso. A televisão consolida... a televisão consolida o respeito a quem se fizer respeitar e consolida o contrário a quem fizer o contrário. Eu tenho muito orgulho de ter trabalhado com o doutor Tancredo. Eu tenho muito orgulho da forma como todos vocês conheceram, todos acompanharam e alguns, como o Nascimento, de forma mais intensa; eu tenho muito orgulho de ter podido dar uma contribuição à classe dos jornalistas e ao país em um momento que era muito delicado.

Carlos Nascimento: Mas se não fosse o episódio...

Augusto Nunes: [Interrompendo] Carlos, você só completa e depois a gente completa a roda.

Carlos Nascimento: Ok. Se não fosse o episódio do Tancredo, você acha que você estaria hoje aqui, na condição em que está?

Antônio Britto: Eu espero, eu esperava e continuarei sempre esperando que [eu] estivesse aqui.

Carlos Nascimento: Ok.

Antônio Britto: Até porque, Nascimento, é uma coisa muito engraçada, sabe? Quando eu me candidatei a deputado federal, as pessoas diziam assim: "Bem, está certo, ele foi jornalista, ele foi porta-voz.", a maioria tinha gostado e tal. "Mas será que ele vai ser político?". Bem, eu estou hoje aqui, sentado, depois de um ano e meio na Constituinte, na qual eu tenho o maior orgulho, maior tranqüilidade em relação ao tipo de atividade que desenvolvi. Eu acho que é muito ruim - sabe? -, quando tu tentas rimar política com individualidade. São duas coisas que não dão certo nunca. Mas foi possível fazer um bom trabalho na Constituinte.

José Barrionuevo: Britto, ...

Augusto Nunes: Depois o Tramontina.

José Barrionuevo: Eu vi diversas manifestações tuas no seguinte sentido: antes da evasão de lideranças do PMDB para o PSDB, antes do adiamento... dos adiamentos das convenções do PMDB... alertando que o PMDB não poderia ser prisioneiro de si mesmo e até, num determinado momento, desceste a Porto Alegre acompanhando Fernando Henrique Cardoso, fazendo um cerco no governador Pedro Simon, pensando no futuro do PMDB. Eleito prefeito, Britto, até quando vais continuar prisioneiro do PMDB?

Antônio Britto: Tu parte de um pressuposto que eu não tenho. Tu parte do pressuposto de que o PMDB não vai tirar nenhuma lição do que lhe aconteceu. Eu não parto desse pressuposto. Eu acho que o fenômeno eleitoral, ele acaba amortecendo, ele acaba entorpecendo um pouco a vida interna dos partidos; ele acaba, de alguma forma, colocando um pouco de pano quente em cima das dificuldades internas, em cima das diferenças de posições. Mas não se enganem, não. Assim que passar a eleição, a própria eleição [enfatiza] contribuirá para que todos [enfatiza] os partidos... Porque tem uma coisa muito engraçada também: nós estamos falando de uma crise partidária absoluta, total, generalizada, ou alguém sabe de um partido que escape disso? Mas tudo bem, vamos falar da [crise] do PMDB; eu sou do PMDB. Então, eu acho que, passada a eleição, é inevitável que o país, especialmente os partidos, tenham de enfrentar a sua realidade. E nessa hora eu vou continuar com a mesma tranqüilidade, com a mesma coerência, cobrando isso.

Augusto Nunes: Tramontina.

Carlos Tramontina: Britto, a população elegeu o PMDB, tornou o PMDB o partido mais importante do Ocidente hoje, se é que a gente pode usar alguma coisa que já foi do PDS [Partido Democrático Social, partido político de direita, herdeiro direto da Arena, que sustentava o regime militar] antes, em cima da expectativa de mudança. Só que hoje, em muitos pontos do país, as pessoas se queixam, os trabalhadores se queixam que o cassetete democrático dói tanto quanto o cassetete da ditadura. Principalmente professores grevistas e trabalhadores em greve. [Eles] Se queixam que o decreto-lei [decreto, com força de lei, emanado diretamente do poder executivo; tão legítimo quanto uma norma administrativa e poder de lei, desde sua edição, sanção e publicação no jornal oficial. No Brasil, o decreto-lei deixou de existir a partir da Constituição de 1988, quando foi substituído pela medida provisória] - que era tão odiado pela oposição quando o PMDB era oposição e não era poder, não era governo - continua sendo usado até hoje. A propaganda... o dinheiro público é aplicado descaradamente na propaganda de pessoas. Você acha que o PMDB tem conserto em função dessa situação? Que é que... você tem uma expectativa otimista em relação ao futuro do partido?

Antônio Britto: Que coisa interessante os teus três exemplos. O cassetete democrático, usado pelo PMDB, fica absolutamente proibido, inconstitucional, inexistente a partir de um texto constitucional que assegura o mais amplo do direito de greve, maioria do PMDB. O problema da propaganda [é que] fica proibido que o detentor de cargo executivo cite o seu nome em qualquer ato de propaganda de ação de governo. E isso foi determinado pela Constituinte; e o PMDB é maioria dentro da Constituinte. E qual é o terceiro?

Carlos Tramontina: O terceiro é o uso do dinheiro público na propaganda.

Antônio Britto: Não, esse eu já respondi. Tem um terceiro.

Carlos Tramontina: Decreto-lei...

Antônio Britto: O decreto-lei deixa de existir a partir da Constituinte e nós passamos para a fórmula italiana. Enviado o projeto de uma medida provisória [ato unipessoal do presidente da República, sem a participação do legislativo, que só posteriormente será chamado a discuti-lo e aprová-lo], ela passa a valer trinta dias depois; o decurso de prazo funciona contra o executivo, e nenhum dos atos ocorridos ao longo daqueles trinta dias tem qualquer valor. Então, Tramontina, eu estou levando o raciocínio por aí, para mostrar o seguinte: nós todos aprendemos - né? -, é o nosso ofício - né? -, que a busca da verdade é uma coisa que ou tu fazes no esforço de pluralidade ou tu não chega a nada. A nossa profissão é a profissão que mais ensina a democracia, porque ela é a profissão em que nós todos aprendemos que a mentira não tem pai, que a verdade não tem pai e que isso aí se vai buscar de várias fontes. O PMDB, sim, tem problemas, o PDMB, sim, tem erros. E eu fui o primeiro, quando estava virado para lá... que aqui a gente dá essa volta... [refere-se às posições dentro da roda do programa; Augusto Nunes ri discretamente] Quando eu estava virado para lá, eu fui o primeiro, eu sou o mesmo; eu virei para cá, mas continuo o mesmo. [O PMDB] Tem sim problemas. Agora, tem sim, também, coisas importantes que foram feitas. Olhe, eu acho importante a gente prestar atenção nessa Constituição, e aí eu só quero acertar a regra do jogo. Se o PMDB é o responsável pelo que não deu certo, porque é maioria, quem será o responsável pelo que deu certo?

Carlos Brickmann: Espera um pouquinho, ele não está dizendo que é o responsável porque é a maioria. Ele está falando de pessoas que estão aplicando a lei. O José Sarney, por exemplo, eu não sei se ele é maioria, eu sei que ele é presidente de honra do PMDB e aplica decreto-lei. E lutou contra a eleição direta-já. O Orestes Quércia gasta dinheiro do povo em propaganda e ele é do PMDB. Aí não é questão de maioria, é questão de pessoas.

Antônio Britto: Essas pessoas, façam ou não façam o que tu estás dizendo, e quaisquer outras pessoas, para todo o sempre, enquanto essa Constituição durar, não farão. É uma contribuição ótima, porque, acima das pessoas, ela se dá institucionalizando padrões novos de comportamento.

Tão Gomes Pinto: Britto, ...

Augusto Nunes: Tão.

Tão Gomes Pinto: Você, no início, falou que o PMDB, muito corretamente, desenvolveu uma política de alianças por ocasião do episódio da eleição do doutor Tancredo Neves. Até para que o doutor Tancredo fosse eleito. Será que essa política de alianças foi uma armadilha terrível? E eu queria saber de você se você acha que com o doutor Tancredo seria, de alguma forma, diferente do que é hoje. A política de alianças foi armada pelo doutor Tancredo.

Antônio Britto: Eu tenho aí, Tão, uma pequena divergência não conceitual. Eu gostaria de, rapidamente, te convidar para voltar um pouco atrás. Quando se sente que o regime autoritário começa a definhar, do ponto de vista da sua força de manter a situação, tu tens dois esforços - né? -, que percorrem o mesmo caminho, mas com origens absolutamente diferenciadas. De um lado, são setores que tinham estado permanentemente ligados e servis ao regime autoritário, buscando uma saída; e de outro lado tu tens a sociedade, os partidos que vinham fazendo oposição, setores conseqüentes e tal, avançando no sentido das diretas. Foi derrotada a Emenda Dante de Oliveira [apresentada no Congresso Nacional pelo Deputado Dante de Oliveira, do Mato Grosso, em março de 1983, a proposta de Emenda Constitucional n° 5 propunha eleição direta para a Presidência da República. Rejeitada na Câmara dos Deputados, na madrugada do dia 26 de abril de 1984, porém, dava início à maior mobilização popular já vista no Brasil - o movimento pelas "Diretas Já"] E na madrugada do 26 de abril de 1984, num restaurante de Brasília que todos nós freqüentamos, ambiente de grande tristeza, de profundo aborrecimento pelo que tinha acontecido; chegou, lá pelas três da manhã, um cidadão. Encontrou aquele jornalista desconsolado, os políticos desconsolados, democratas desconsolados e disse: “Olhe, nós perdemos isso aí, mas o regime autoritário também acabou.”. Doutor Tancredo, que é esse senhor, tinha razão, no sentido de que mesmo com a derrota das diretas [o regime autoritário] tinha acabado. Muito bem, vamos agora refazer a história. O PMDB, o doutor Tancredo, resolvem não fazer uma aliança com os setores liberais; então, isolar os progressistas e jogar os liberais não importa, se para junto dos setores autoritários ou para uma terceira alternativa. O doutor Paulo Salim Maluf [(1931-) empresário, engenheiro e político brasileiro filiado ao Partido Progressista. Foi, por duas vezes, prefeito de São Paulo, além de governador do estado e secretário dos Transportes. Enfrenta graves problemas com a Justiça, após denúncias de crimes de corrupção e evasão fiscal. Mesmo assim, atualmente, exerce o cargo de deputado federal, até 2011] seria o presidente da República.

Tão Gomes Pinto: Certo.

Antônio Britto: Eu continuo preferindo a outra hipótese.

Tão Gomes Pinto: Agora, você acha que com o doutor Tancredo seria, de alguma forma, melhor?

Augusto Nunes: Um minutinho, Tão. Por favor, Britto, antes que você responda e antes que, também, a Fátima e a Cecília façam as perguntas, vários telespectadores fizeram uma pergunta que, basicamente, é essa que o Tão fez agora. Quer dizer, o Ítalo Belão, de Perdizes, pergunta se a política e a conduta do governo Sarney seriam as mesmas do que teria feito Tancredo. Aliás, outros telespectadores, como o Valter de Castro, de São Bernardo do Campo e Osmar Correia, do Bom Retiro, querem saber se você votou nos cinco anos para o Sarney. Eu gostaria que você juntasse tudo na sua resposta. E Gisele, simplesmente, da Faculdade Anhembi do Morumbi, pergunta: “Por que não se fez... Por que o partido que, afinal, não morreu com o Tancredo, não fez o que o Tancredo prometeu?”. Agora, antes que você responda, nós temos um trecho gravado de um discurso histórico do presidente José Sarney, que acho que vai ajudar a fundamentar a sua resposta. Você pode acompanhar por aqueles monitores.

[Inserção de vídeo] [Discurso de José Sarney por ocasião do enterro de Tancredo Neves]

José Sarney: Tancredo Neves será, sem dúvida, nos momentos e nas encruzilhadas de dificuldades, inspiração, e será força, porque neste país, em nenhum instante de sua história, tantas esperanças se somaram a tantas dificuldades. Neste momento, em sua honra e em sua memória, diante deles, como presidente deste país, eu penso nos pobres, penso nos humildes, penso nos que sofrem, penso nos que estão sedentos de Justiça! E é desse pensamento que nós vamos extrair o barro de construção e da construção da Nova República.

[Fim do vídeo]

Augusto Nunes: Pois bem, foi cumprida essa promessa [feita] à beira da sepultura do Tancredo Neves? E, antes disso, é bom você esclarecer se votou ou não nos cinco anos e por quê? [Uma das crises do governo Sarney aconteceu quando da proposta de aumento de seu mandato de quatro para cinco anos, que foi aprovada pelo Congresso]

Antônio Britto: Eu acho que, fazendo uma coisa eu faço a outra. Fazendo uma coisa eu faço a outra. Eu votei quatro vezes pelos quatro anos e digo que votei quatro vezes pelos quatro anos porque era membro da Comissão de Sistematização. Depois, evidentemente, fazia parte do plenário da Assembléia Nacional Constituinte, e tinha a posição, que, na verdade, encerra a minha maior frustração com essa Constituinte. Tinha a posição do parlamentarismo e dos quatro anos, do parlamentarismo já...

Augusto Nunes: Está respondida a pergunta...

Antônio Britto: Está respondido. Isso revela claramente, porque revela no concreto o juízo de valor que eu faço sobre o governo. Eu tenho o maior respeito pessoal pelo presidente Sarney. Eu sou, por temperamento e por caráter, [uma] pessoa que acha que, um dia, no Brasil, vai passar essa história de fazer política na base do bate-boca, na base da individualidade da pessoa; eu acho que não é por aí. Tenho o maior respeito pessoal, tenho o maior respeito político pelo fato de que, apesar das pressões, apesar das dificuldades, o presidente Sarney encaminhou e ajudou, deu uma contribuição importante na questão política, nas eleições, na Constituinte. E acho que assim que o chamado fogo das paixões amainar, isso acaba aparecendo. Mas, evidentemente, o governo perdeu força política, perdeu organicidade política, perdeu sustentação política, e sem isso política administrativa nenhuma acaba dando certo. A primeira condição, por exemplo, para que uma política econômica dê certo, é que as pessoas pensem que ela vai dar certo. Essa é a primeira condição. Uma condição psicossocial, uma condição subjetiva? É. Mas é a primeira condição. Então, eu achei que o processo de transição acabou ficando pronto antes do fim do governo. Era preciso abreviar o governo, sob pena de, perigosamente, se chegar à situação que se tem hoje.

Augusto Nunes: Fátima Turci e depois Cecília Pires, fechando a roda.

Fátima Turci: Minha pergunta era outra... Depois desse discurso, depois que você falou, eu tenho uma série de colocações. Quer dizer, na medida em que você coloca que você tem o maior respeito pelo presidente Sarney, eu acho que você teria que ter, na minha opinião pelo menos, teria que ter respeito pelos atos que essa pessoa, enquanto governante, executa. Como [é] que a gente pode ter respeito por uma pessoa que prometeu pensar nos pobres e que... - aí eu gostaria de uma avaliação sua -, mas, na minha avaliação, não fez mais do que o programa do leite [programa de distribuição gratuita de leite para gestantes e crianças de famílias carentes criado na década de 1980 pelo então prefeito de Natal, Garibaldi Alves Filho, e nacionalizado pelo presidente Sarney]? Como a gente pode ter respeito por uma pessoa que faz uma promessa lembrando alguém que fez tantas outras promessas a nível social, se essa pessoa, assim, quer uma ferrovia Norte-Sul [ferrovia brasileira cujas obras foram iniciadas em 1987, no governo Sarney. Na época, o jornal Folha de S.Paulo denunciou fraude no processo de licitação. As obras acabaram sendo paralisadas pouco depois]? Como [é] que a gente vai ter esse respeito, se você mesmo colocou [que] a condição de um programa econômico dar certo é você pensar que ele vai dar certo? Mais do que a população brasileira inteira pensou que o Plano Cruzado podia dar certo - e ele podia até, não vamos aí discutir questão econômica -, podia se as autoridades econômicas fizessem o plano com seriedade. Então, faltou o respaldo dessa pessoa. Então, juntando tudo isso, eu gostaria que você fizesse uma certa análise desse governo Sarney e dissesse [se] o seu permanecer o apoio do PMDB a esse governo não vai ser ônus muito caro para você, se a debandada, a revoada para os tucanos [como são chamados os membros do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), devido a seu símbolo ser um tucano, nas cores azul e amarelo] para você não seria mais vantajosa. Então, juntando essas duas coisas.

Antônio Britto: Ao contrário do nosso amigo Gérson [ex-jogador de futebol brasileiro que atuava no meio-de-campo e foi campeão do mundo em 1970. Protagonizou uma campanha de cigarros, na qual dizia: "Gosto de levar vantagem em tudo", frase que se tornou um símbolo da malandragem e da corrupção e ficou popularmente conhecida como "lei de Gérson"], eu acho que não é importante levar vantagem em tudo. Acho que não é importante levar vantagem em tudo. E eu acho outra coisa. Eu acho que a gente vai ter que dar uma contribuição ao país, nós todos, procurando olhar as coisas além de uma semana... além de uma semana, que é o prazo de análise, em profundidade média, aqui no país. Vamos recolocar algumas questões. Primeiro: eu tenho o maior respeito pessoal pelo presidente Sarney. Acho que não é possível olhar um momento como aquele, não entender a circunstância do momento, acho que não é possível ter uma atitude incorreta em relação a isso. Em segundo lugar: quando voto quatro anos [de duração para o mandato presidencial], eu estou emitindo o juízo político que ultrapassa a questão da pessoa por quem tu podes ter a maior simpatia ou maior antipatia. Agora, isso não é metiê político nem instrumento político, a relação afetiva, o respeito ou o não respeito. Politicamente, eu entendo - e por isso eu votei [no mandato de] quatro anos -, eu entendo que o governo tendo tido, dentro de si, força política para encaminhar a transição política, e encaminhar corretamente... Não foi ele que fez a transição, mas deu a sua contribuição. Não teve dentro de si condições de executar a obra administrativa, sem a qual a transição política ficará permanentemente pendurada. Em outras palavras, eu acho que a gente está vivendo um momento muito curioso. Em qualquer lugar do mundo - e basta relembrar os processos recentes de transição - o final da transição, a chegada à democracia foi o reencontro festivo da população com a atividade política. Exatamente essa síntese. A transição devolve o país à democracia e a democracia é o chamamento à política, para que a política conduza as coisas. No Brasil a política fez, com muito sacrifício, com muita dificuldade, a política fez a obra da transição política. Mas nós estamos, neste momento, com um grande fosso, com um grande espaço, com um grande gap na nossa frente. Porque a política não se revela, até agora, instrumento eficiente para uma mudança, não no país formal, no país institucional, mas no país real, no país concreto, sem o qual, ou sem a qual mudança nós vamos viver permanentemente tentando reinventar ou inventar alguma coisa que em quase em todos os lugares do mundo deu problema, que é tu teres uma democracia formal que tenta se sustentar, apesar [enfatiza], independente ou contra a democracia real, que se dá com valores, com distribuição de renda, com dignidade para as pessoas e tal.

Augusto Nunes: Britto, a Cecília Pires vai fechar a roda e, em seguida, a ordem de entrada em cena fica liberada. Cecília.

Cecília Pires: Britto, eu queria lhe perguntar o seguinte: apesar de você ter um comprometimento e uma história relativamente curta com o PMDB, nós temos assistido nessa eleição, talvez como em nenhuma outra, o fenômeno, o aparecimento de candidatos vindos dos meios de comunicação. Então, nas quatro capitais em que o PMDB tem chances de ganhar, pelo menos duas,  [n]o teu caso, e [n]o caso de Salvador, com o Fernando José [Fernando José Guimarães Rocha, radialista e político brasileiro, foi prefeito de Salvador entre 1989 e 1993], são fenômenos de pessoas com comunicação de massa, pessoas conhecidas nacionalmente. Isso não torna... isso não cria um risco de esse tipo de político se tornar desvinculado dos compromissos políticos partidários? Isso não transforma os candidatos em candidatos de si mesmos, sem muita vinculação com programas partidários, com ideologia - certo? -, quer dizer: qual é o risco que nós corremos dentro desse tipo de fenômeno?

Antônio Britto: Vocês acabaram de responder essa pergunta, agora há pouco, quando em uma das perguntas falavam exatamente do meu envolvimento, da minha adesão, da minha permanência, do fato de eu ter sido vice-líder, né? Eu, se estivesse - vamos falar claro -, eu, se estivesse chegando à política e não tivesse passado pela Constituinte, eu aí falaria das coisas que fiz, das coisas que penso. Hoje, graças a Deus, não é necessário isso. Basta lembrar a vocês - e vocês conhecem isso muito bem porque acompanharam de forma intensa -, basta lembrar o tipo de atividade que eu tive na Constituinte. O que eu acho - sabe? - é que nós jornalistas não devemos cair no preconceito contra a inserção de qualquer atividade [gesticulando e elevando a voz], de gente de qualquer atividade, na política. Que bom que está dando para todo mundo fazer. Quem vai ficar fazendo? Quem o povo decidir que vai ficar fazendo. É enorme o número de pessoas que, tendo notoriedade, num país de baixíssima formação política e cultural, chega. São raríssimos os casos...

[...]: Britto, ...

Fátima Turci: [Interrompendo] Britto, eu queria entrar em uma questão...

Antônio Britto: ... dos que ficam...

Fátima Turci: Eu queria entrar em uma questão... meio urgente, segundo os empresários têm reclamado. Parece que a Constituinte vai deixar aí duas espécies de vácuo, que eles estão chamando de vácuo de poder, a partir de 6 de outubro, questão de três meses, e o vácuo institucional, pela questão de não votação das leis ordinárias e complementares, né? A própria Federação das Indústrias [a Fiesp, maior entidade de classe da indústria brasileira] hoje mesmo começou a elaborar um estudo nesse sentido e, tentando apresentar soluções para os constituintes. O que você pensa disso? Vamos ter esse vácuo mesmo, vácuo de poder, na medida em que a Constituinte vai tirar poder do governo federal e os outros governos não vão ter [poder]? O que você está pensando nesse aspecto?

Antônio Britto: Eu acho que a gente vai ter um período inevitável em qualquer país que tenha passado por uma Constituinte. É preciso, agora, trazer à legislação complementar, à legislação ordinária, à legislação estadual e à legislação municipal todas as conseqüências do fato Constituinte, da decisão Constituinte. O contrário seria ou não ter Constituinte ou pressupor - o que obviamente seria um absurdo - que a Constituinte, além disso, fizesse todo o detalhamento. Então, esse é um fato inevitável; esse é um fato inevitável. Agora, diante do fato inevitável, nós temos duas possibilidades. Na primeira possibilidade, o processo de adaptação da legislação brasileira à decisão Constituinte se dá de forma emperrada, lenta, demorada; e o país vai sofrer muito com isso, e algumas decisões importantes da Constituinte vão virar o dispositivo de 46 da participação dos lucros [artigo 157 da Constituição Federal de 1946, que previa a participação direta e obrigatória do trabalhador nos lucros da empresa e que nunca foi regulamentado] ou o salário mínimo de 67, ou nós constituintes entendemos que a tarefa Constituinte não terminou. Em alguns dos casos, eu acho que ela ainda nem começou, porque a legislação complementar cobrada pela população como essencial, para que a Constituição não fosse ainda mais detalhista, ou vem ou deixa o vácuo. Então, o que vai acontecer? Que tipo de consciência, que tipo de atitude, que tipo de esforço vai ser feito? Na medida de um ou de outro esforço - aliás, o primeiro caso é o não esforço [Antônio Britto sorri] - é que a gente vai ter ou não o vácuo, uma situação prolongada de intranqüilidade. Neste momento, o que se tem é uma situação inevitável de adaptação.

João Batista Natali: Você me permite, eu vou pegar carona na penúltima pergunta que a Fátima fez, porque eu tenho sempre a impressão de que cada vez que você fala de PMDB você tem uma concepção meio idealizada do PMDB, aquilo que Mário Covas também enunciava quando ele estava no partido. Eu estou...

Antônio Britto: Mas tu não tens nada contra sonho, não é? [Antônio Britto sorri]

João Batista Natali: Absolutamente não. Eu estou simplesmente mantendo a minha hipótese de que você é um grande tucano infiltrado dentro do seu partido, e que simplesmente esse tucano não está conseguindo abrir as asas, porque o seu governador, - entende? - não está realmente tomando esse mesmo tipo de opção. Eu queria te fazer uma pergunta muito, muito, muito clara: entre dois candidatos à Presidência da República, em quem você votaria? Mário Covas ou Ulysses Guimarães?

Antônio Britto: Votaria no Ulysses Guimarães.

João Batista Natali: Meu Deus...

[Risos]

Antônio Britto: O que você tem contra?

João Batista Natali: Nada, simplesmente...

Antônio Britto: Eu posso te entrevistar um pouco?

João Batista Natali: É que eu vou contar para o Mário Covas que foi essa a sua resposta.

[Risos]

[Sobreposição de vozes]

Antônio Britto: Não há por que ter essa dúvida... Não há por que ter essa dúvida...

Augusto Nunes: Entre todos os candidatos...

Antônio Britto: Só me permite terminar.

Augusto Nunes: [Interrompendo] Não, só o seguinte: todos esses telespectadores querem saber o seu candidato ideal à Presidência. Então, já que o Natali colocou duas opções, entre todas, você mantém a opção pelo Ulysses? É o seu candidato à Presidência?

Antônio Britto: Vou te responder, vou responder a vocês, voltando um pouco atrás. Eu acho isso extremamente curioso e divertido. Nós temos, no Brasil, uma experiência partidária extremamente mal sucedida por "n" razões [inicia contagem nos dedos]: formação política brasileira, interrupções do quadro institucional, rupturas permanentes, fragilidades dos próprios partidos. E nós temos tido um remédio convencional: zera e faz de conta que vai começar de novo. Não começa! PSDB, por exemplo, no meu estado [Rio Grande do Sul], tem alianças com o PT [Partido dos Trabalhadores], com o PFL [Partido da Frente Liberal], com o PDT [Partido Democrático Trabalhista], com o PC [Partido Cristão]. O que é a criatura e o que é o criador? Será que o processo político brasileiro obriga que cada partido, não importa qual é a intenção, caia nessa? Vamos ver como é que está a coisa em Belo Horizonte, como é que está no Rio de Janeiro. Então, vamos olhar esse fenômeno um pouco mais amplo. No dia em que eu achar que o PMDB perdeu qualquer condição de, ao longo de um processo interno, minimamente contribuir para a etapa que vem aí, bem, eu não estarei saindo do PMDB, o PMDB terá acabado. Agora, eu não vou fazer isso por razões eleitorais. E quero te dar uma informação. Pelo menos no meu estado, no Rio Grande do Sul, as pessoas têm muito clara a avaliação de que, neste país, nenhum partido... nenhum partido escapa hoje do desgaste do poder que, evidentemente, é sempre mais atual para quem está no poder. E em segundo lugar: da dificuldade interna. E eu tenho feito a campanha mostrando a forma como eu me comportei, a forma como eu votei, a forma como penso, a forma como eu tenho procurado trabalhar. E, olhem, as pessoas não têm se queixado.

Carlos Tramontina: A sua opção pela candidatura Ulysses Guimarães seria por aquilo que ele poderia fazer como presidente da República ou simplesmente porque ele é o homem, ele seria o candidato do PMDB?

Antônio Britto: Pelas duas coisas, veja bem. O dia [em] que eu achar que o partido não me serve... [se] não me serve o partido, não me serve nada que ele decida. O que é preciso é acabar com essa cabotinice no país, de ficar com a parte que interessa, com a parte que convém. Eu acho que a gente, para construir vida partidária sem a qual não vai construir vida democrática,...

[...]: Britto, ...

Antônio Britto: ... vai ter que dar um pouquinho mais de seriedade a estar dentro de, participar de, fazer parte de.

Carlos Nascimento: Britto, ...

Carlos Brickmann: Britto, você...

Carlos Nascimento: Um momento, Brickmann... Deixa, deixa... eu preciso entrar nessa deixa aí...

[Risos]

Carlos Nascimento: Britto, eu e mais cinco sonhadores jornalistas acabamos de ser informados, há meia hora, que perdemos a segunda concorrência para uma emissora de rádio em uma cidade do interior de São Paulo, porque nela entramos, ingênua e candidamente, achando que com a nossa competência e boas intenções éramos candidatos fortes o suficiente para merecer do governo um canal de rádio onde pudéssemos exercer o nosso trabalho. Ao longo de todo esse acontecimento, nós percebemos que, na verdade, não se tratava de competência e nem de condição técnica, ou jornalística, ou o quer que fosse, e sim de tramóias e apoios políticos. Agora... e muitos desses acordos deveriam ser feitos dentro do Congresso. Nós recebemos, especificamente, a proposta de um deputado, que se ele tivesse uma certa participação em uma das emissoras ele poderia exercer um trabalho a nosso favor. Isso foi recusado, nós perdemos e tudo mais. Agora, anuncia-se que, com a nova Constituição, essa questão da concessão de canais vai passar muito mais pelo Congresso Nacional. Eu pergunto: encontrou-se um caminho mais democrático para a distribuição dos canais de rádio e televisão ou colocou-se o bode para tomar conta da horta?

Antônio Britto: Olha, acho que precisa, Nascimento, é voltar um pouco ao que é o sistema hoje, né? A partir dos anos 60, quando se dá, do ponto de vista tecnológico, do ponto de vista comercial, a grande expansão, a grande explosão da instalação de emissoras de televisão, tecnologia nova, Embratel e tal, e das emissoras de rádio, mais adiante vem a FM, esse período de implantação dessa rede gigantesca que hoje há, de duzentas emissoras de televisão e mais duas mil [emissoras] de rádio, coincidiu com o quê? Coincidiu com o período autoritário. Esse período autoritário acabou agravando o que já era um defeito da legislação, até a Justiça se faça, anterior ao período autoritário. E, na verdade, você, para conseguir uma emissora de rádio ou de televisão, dependia de duas pessoas: do presidente da República e do ministro das Comunicações. Ora, quem depende de dois para conseguir...

Carlos Nascimento: Eu já sei, então eu já sei de quem é a culpa. [Carlos Nascimento sorri]

Antônio Britto: Se depende de dois para conseguir, depende de dois o resto da vida.

João Batista Natali: [Interrompendo] Britto, tem uma pergunta...

Antônio Britto: Só para terminar essa resposta, ...

João Batista Natali: Você me dá licença, sim?

Antônio Britto: Só posso terminar a resposta?

João Batista Natali: Pois não, que é muito importante, tá? Depois você me passa.

Antônio Britto: Eu sei, não estou querendo comparar importância, só para terminar a frase. Bem, o que se faz na Constituição? Eu fui o mediador, o negociador dessa... dessa... Nós partimos para a idéia de que a partir de agora todas  [enfatiza] as concessões e todas as renovações, quer dizer, tudo o que foi concedido passará pelo Congresso. Isso é um mecanismo que, evidentemente, vai diluir forças e interesses, desinteresses, clarissimamente, até por uma lei da matemática.

Carlos Nascimento: Mas está dentro do Congresso, hoje, a maior somatória de interesses para conseguir canais de rádio e televisão. São os próprios deputados, os próprios parlamentares os maiores interessados.

Antônio Britto: Nascimento, nós temos duas alternativas na vida e no país: a primeira é acreditar que ele não vai melhorar - e aí, doutor, eu te aconselho a não abrir rádio -...

[Risos]

[Sobreposição de vozes]

Antônio Britto: ... e a segunda é achar que vai acontecer o que já está acontecendo...

[Sobreposição de vozes]

João Batista Natali: Britto, depois eu queria entrar nesse assunto que eu acho que é muito importante. E eu vou colocar uma coisa que, talvez, tenha sido extremamente polêmica, em relação à sua participação como constituinte. Certo dia, folheando aquele livrão [faz o gesto dando a dimensão do livro], com todas as emendas que estão sendo apresentadas, eu quis saber qual tinha sido o parlamentar que havia proposto que as concessões apenas não seriam renovadas se houvesse uma objeção de dois terços dos congressistas na Câmara e no Senado, o que é praticamente impossível. Você, para derrubar uma concessão, digamos, para que o canal 5 de São Paulo seja tirado da TV Globo, você precisa do voto de dois terços do Congresso. E eu encontrei o seu nome, certo? Isso significa que você foi... veja bem, eu estou pressupondo e queria que você me explicasse... Isso significa que você foi a pessoa encarregada de manter uma espécie de perpetuação das atuais concessões que foram dadas por essas duas pessoas a partir da década de 60, com toda essa explicação altamente pejorativa, esse quadro altamente negro que você está dando do autoritarismo. Por que você fez isso? Foi por um acaso, digamos, para fazer as pazes com o doutor Roberto Marinho, que não colocava a sua imagem no ar depois que você foi favorável ao parlamentarismo, depois que você foi favorável aos quatro anos do presidente Sarney, quando a TV Globo estava interessada em fazer com que os cinco anos fossem aprovados? Me perdoe a secura com que eu estou perguntando para um amigo.

Antônio Britto: Eu sempre te vi lá na Constituinte muito ocupado. Seguramente, por [estar] muito ocupado tu não folheastes as outras páginas...

João Batista Natali: Era uma emenda de conjunção, uma emenda que somava outras propostas, mas eu quero uma delas...

Antônio Britto: Deixa eu te responder. Tu não pudeste, exatamente, por muito ocupado, ler todas as emendas. Nós apresentamos, um conjunto de deputados, deputados de todas as facções, de todos os grupos, um conjunto de emendas que nos permitissem, quando chegasse a hora da negociação, ter todas as alternativas. Eu também sou o autor da emenda que determinava os dois quintos, que determinava a renovação pura e simples, que quase impedia a renovação, todas elas. Eu vou te mandar de novo o livro para tu, agora com um pouco mais de calma, folhear. E na última hora se criou a seguinte situação: concessão nova, faz o processo, manda o projeto, vai para o Congresso, se o Congresso aprovar, ok; se [o Congresso] não aprovar, morreu o assunto. Como é que fica, no entanto, a renovação? Bem, se a renovação não vai para o Congresso, não adiantou nada, está certo? Ficou eternizado esse lote aí, que nem é lote, esse número fantástico de duas mil, duas mil e tantas emissoras. Se vai para o Congresso para renovar e tem um caso tranqüilo, pacífico e tal, pode haver a aprovação por parte de liderança, isso e aquilo. Agora, não renovar significa cassar, não renovar significa fechar. Será que é correto fechar, por votos simbólicos, numa tarde de sexta-feira? Não, não é, porque renovar, conceder ou não conceder, eu estou lidando com a expectativa de direito, não existe alguma coisa, e eu darei ou não. Mas fechar é um ato mais forte. Espera um pouquinho, como é que faz? Não pode ser uma coisa muito forte, porque senão nunca, não renova. Mas também não pode ser um nada, porque senão, para qualquer dissabor de briga paroquial, cassou. Aperta daqui, aperta dali, na última hora... e a idéia foi minha, surgiu a idéia de que a cessão que não renova... quer dizer, a cessão que, na prática, cassa tem que ter a decisão de pelo menos dois quintos, o que é...

João Batista Natali: [Interrompendo] Você não cassa, Britto, você simplesmente abre, novamente, a concorrência pública.

[Sobreposição de vozes]

Augusto Nunes: Natali, eu só queria que você encerrasse, porque a gente vai ter que fazer um intervalo. Por favor, Britto, seja breve.

Antônio Britto: Se eu não renovo a tua concessão, como em qualquer serviço público, tu deixas de operar esse serviço público; isso é óbvio.

Augusto Nunes: Nós teremos agora um ligeiro intervalo. O programa Roda Viva com o deputado federal Antônio Britto, do PMDB do Rio Grande do Sul, volta já, já.

[Intervalo]

Augusto Nunes: Retomamos aqui a conversa com o deputado federal Antônio Britto, convidado do Roda Viva desta noite. Britto, como você verá pelas cópias das perguntas que nos chegam - você vai receber todas depois do programa -, muitos telespectadores traduzem uma desconfiança, que é compartilhada por boa parte do povo brasileiro, de que houve alguma coisa não revelada no episódio da agonia e morte do Tancredo Neves. Então, por exemplo, o Antônio Santos Barreto, da Freguesia do Ó, pergunta: “O que ficou de oculto sobre a morte de Tancredo Neves que o senhor gostaria de revelar agora?”. Teresinha Santos, da Vila Brasilândia, diz: “Na época em que Tancredo Neves estava no hospital, como é que você se sentia cada vez que tinha que dar uma notícia não verdadeira?”. Enfim, ficou a impressão de que, sobretudo muitos médicos integrantes da equipe que cuidou do Tancredo Neves, não diziam a verdade. Então, basicamente, como é que você se sentia quando não podia revelar, digamos assim, toda a verdade? E a grande pergunta que ainda fica hoje no país é se há alguma coisa que você, que conviveu tão estreitamente com o Tancredo Neves, ainda não disse e poderia revelar agora.

Antônio Britto: Olha, Augusto, essa tem sido uma pergunta extremamente freqüente nos últimos três anos. Eu adotei como norma jamais propor o assunto, jamais voltar ao assunto, em respeito ao assunto e para não permitir qualquer margem de exploração política disso. Eu tenho um grande orgulho: eu me elegi deputado federal, fiz trezentos mil votos no Rio Grande do Sul; na minha cidade, Porto Alegre, de cada dez votos um foi para mim, sem ter em qualquer momento, em qualquer peça, em qualquer instrumento de campanha, usado a imagem do presidente Tancredo. E acho que isso é o mínimo de respeito que eu e que o país, nós todos, devemos ao presidente. Fiz o livro logo após o episódio...

Augusto Nunes: Assim morreu Tancredo.

Antônio Britto: ... porque achava que não haveria condições de encerrar o episódio, de encerrar a participação no episódio sem contar, rigorosamente, tudo o que [eu] sabia...

Augusto Nunes: No livro você contou tudo o que sabia?

Antônio Britto: Tudo o que sabia. E acho que esse episódio, ele vai revelar ao Nascimento, à Fátima, ao Tão... enfim, todos participaram ativamente, tu, todos participamos ativamente da cobertura... O episódio vai mostrar o quê? Vai mostrar que algumas decisões médicas tomadas, ou que poderiam ser tomadas, ou que deveriam ser tomadas, que só alguém médico e que estivesse presente saberá do acerto ou não. Eu não sou médico, não quis ser médico, e não quis ser médico no período em que era porta-voz. Definimos uma regra de jogo muito clara: eu tenho 36 anos e a vida tem sido generosa comigo. Um grande orgulho que eu tenho, foi uma coisa assim singela, uma coisa que aparentemente não comoveria muita gente, mas que se deu aqui em São Paulo. Pouco depois do episódio da morte do doutor Tancredo, o Sindicato dos Jornalistas - que é o foro onde eu, permanentemente, enquanto jornalista, quero ser avaliado -, o Sindicato dos Jornalistas promoveu uma reunião de homenagem à forma de como eu tinha cumprido o meu dever de jornalista, colocado a serviço de uma instituição, o Palácio, a Presidência da República. Então, naquilo que não envolvia questão médica, tudo o que [eu] sabia, [eu] disse. Naquilo que envolver a questão médica, não vou ser eu a dizer.

Fátima Turci: Britto, pegando três aspectos: a emoção do povo brasileiro no episódio, na agonia e morte do presidente Tancredo Neves, a participação ativa desse mesmo povo brasileiro quando do Plano Cruzado; e pegando hoje, por exemplo, o que o Nascimento colocou, o descrédito do brasileiro frente a mudanças - e daí você colocou duas opções, ou a gente acredita ou não acredita -, quer dizer, o país tem condições, o povo, de se estimular, de reagir e reagir bem. O que os políticos, o que você enquanto constituinte, você enquanto prefeito, se for eleito, o que os políticos podem fazer e estão fazendo, de fato, para melhorar este país, para evitar fatos como a gente está cansado de ouvir, de corrupção, para evitar essa decepção constante que a gente tem enfrentado?

Antônio Britto: Olha, Fátima, essa é... A tua pergunta me permite entrar na área [com] que eu mais tenho me preocupado, que mais me chateia, que mais me ocupa, que mais me tira o sono. Eu gostaria de voltar um pouquinho ao que eu disse antes que nós tivéssemos o intervalo. O que ocorre neste momento no país? E e não é na verdade no país, é no Terceiro Mundo. Antes do programa, o Tão fazia, corretissimamente, essa referência. O que ocorre? O Brasil consegue, [...] e a política não é o que os políticos fazem, a política é todo ato de participação que a sociedade e os indivíduos façam. A política consegue criar uma situação nova, uma situação extremamente importante para todos nós, do ponto de vista da institucionalização, da construção do país formal, como eu chamo. Nós todos aqui nos criamos sabendo o que é medo. Nós tivemos o medo dentro da redação. Nós todos sabemos qual é a diferença entre aquela situação [da ditadura militar] e a situação de hoje. A Constituição assegura a nós um conjunto de liberdades políticas, de garantia de direitos individuais que nos colocam ao nível do que há de mais democrático em qualquer país que recém tenha até se reinstitucionalizado, como Portugal, como Espanha, como a Grécia. Agora, até quando isso dura se, acima dessa camada de verniz formal que foi passada, o país, materialmente, concretamente, realmente, não se democratizou? Ou será que alguém é capaz de supor um país estável democraticamente sem ter dado pelo menos a dignidade? Eu sempre digo, a gente recuperou a liberdade da boca, a liberdade dos olhos, a liberdade de ouvido, nós não recuperamos a liberdade da barriga e do bolso. Qual é a crise sobre a política? É que a política não tem se transformado no Brasil. Parte pela herança recebida, parte pela demanda brutal que se acumulou, mas parte pelos problemas da própria política, não tem se mostrado como um instrumento eficiente para gerir a coisa pública com austeridade, com dignidade, com competência, para poder encaminhar, corretamente, algumas questões. E eu quero te contar uma experiência. Eu tenho passado pelas vilas da minha cidade, Porto Alegre, dizendo o seguinte: "vou administrar, se eleito na prefeitura, que não tem condições de atender tudo a todos. Eu não faço promessas.". Pois olhem, as pessoas neste país são tão fantásticas que as pessoas estão se alegrando, e isso mostra quanto a política tem dificuldades com a não promessa. Então, a política está diante desse desafio. A nossa geração, não a geração etária, a nossa geração, a próxima geração, os próximos prefeitos, os próximos governadores, o próximo presidente da República, conseguem dar à atividade política a competência gerencial, e gerencial não é técnica, gerencial no seu conjunto, na sua acepção mais ampla de transformar concretamente o país e agora democratizar a dignidade; ou nós teremos um período terrível pela frente. Eu acredito muito em política, eu gosto muito de política, eu tenho procurado fazer política com muita seriedade. E acho que a gente vai construir. Para concluir isso... me perdoem que tome um pouco mais de tempo nisso. Será que nós não vamos conseguir interpretar corretamente o quanto há de positivo no descrédito? O descrédito finalmente ampliou a exigência; não saiam! Os que saíam a prometer camiseta, jogo de terno de futebol, rancho, não saem porque não tem mais ninguém disposto a trocar voto por isso. Se esse não é em cima de um fato ruim, a promessa do fato positivo... bem, eu não sei o que é fato positivo.

Cecília Pires: Agora, parte dessa descrença, que a Fátima está colocando, essa necessidade de... de sanear um pouco a política, ela não se deve em grande parte, também, ao PMDB, que deixou um grande vácuo na política porque decepcionou a população? Nesse sentido, eu quero perguntar se você acredita no PMDB; que tipo de PMDB você está pregando hoje? É o PMDB do Prisco Viana, é o PMDB do Carlos Santana, ou seja, eu quero saber qual é a sua perspectiva de futuro para o PMDB. Se você diz que seu objetivo dentro do PMDB não é eleitoral, eu quero saber, em uma perspectiva de futuro, o que você prega para o PMDB? Uma decoração? Uma definição mais ideológica? Certo? A saída, expulsão até, desses elementos que compactuaram com o poder, que compactuaram com as benesses do poder e que fizeram também dessa política uma política da entrega da camiseta, da concessão de rádio, dos pequenos favores? Eu quero saber o que você prega agora para uma convenção do PMDB que está aí, e que parece que vai virar apenas uma maneira de corroborar o presidente da... o candidato a presidente do PMDB; e parece que não vai discutir os problemas.

João Batista Natali: Só pegando um pouquinho de carona na pergunta da Cecília: o PMDB da camiseta não é só o PMDB da camiseta, é o PMDB da máquina estatal, em São Paulo...[...]

[...]: E hoje é o da camisinha...

[Risos]

[Sobreposição de vozes]

João Batista Natali: Exatamente!

Cecília Pires: Exatamente! Literalmente!

[Risos]

João Batista Natali: Tem o PMDB de São Paulo, que está profundamente competitivo em defesa da máquina, em favor do seu candidato. Em Belo Horizonte o PMDB está sendo, absolutamente, uma vergonha. Eu duvido que você, como peemedebista, não sinta uma espécie de ruborização de saber o que está acontecendo em Belo Horizonte. Na Bahia, também, está sendo uma coisa extremamente danosa. Então, você está falando de um PMDB... sempre um PMDB que eu não estou entendendo direito aonde é que esse PMDB está.

Antônio Britto: Eu vou te ajudar a achar o caminho dele.

[Risos]

Antônio Britto: Eu posso ir contigo ao Rio Grande do Sul, onde um governador diz publicamente e age em cima disto, proibindo qualquer vinculação de máquina a qualquer candidatura de PMDB. Eu posso te levar a Pernambuco, na figura extremamente honrada de Miguel Arraes [(1916-2005) - Miguel Arraes de Alencar foi advogado, economista e político brasileiro, personalidade de destaque no cenário nacional e, mais tarde membro e importante líder do PSB - Partido Socialista Brasileiro. Foi prefeito de Recife, deputado estadual, federal e, por três vezes, governador de Pernambuco], e dá para ir a vários lugares, nós podemos fazer um roteiro ótimo pelo país...

[Sobreposição de vozes]

Carlos Brickmann: Aí é onde o governador está apoiando o candidato de outro partido?

Antônio Britto: Eu tenho o maior respeito pela figura do governador Waldir Pires [(1926) político brasileiro, nascido na Bahia, onde foi governador de 1987 a 1989]. Desconheço e não vou fazer análise, porque desconheço mesmo as peculiaridades locais em relação a esse assunto. O que eu acho interessante é a gente, quem sabe, ampliar um pouquinho a análise. Eu acho natural, e faria exatamente a mesma coisa. Então, eu tenho um compromisso comigo mesmo de achar natural que se centre a análise na questão do PMDB, porque afinal foi o PMDB que foi votado, e foi o PMDB que assumiu instâncias crescentes de poder. Mas eu estou um pouco mais preocupado do que isso, sabe? Eu estou um pouco mais preocupado do que isso. O que eu vejo no país é a democratização chegar com uma falência generalizada de instituições. A imprensa é uma, os partidos são outra, a máquina estatal em geral, o distanciamento em alguns lugares da classe operária em relação aos seus sindicatos é um problema sério, e a apatia generalizada. E aí eu quero fazer uma observação para vocês: os nossos queridos economistas nos brindaram, ao longo dos anos, com a figura da economia informal. Quer dizer, o cidadão quer produzir, tenta produzir, não consegue produzir dentro desse mecanismo que está aí, e ele se exila dentro do país, e ele vai para a informalidade na economia. Será que nós não estamos observando neste momento no país uma sociedade também informal, que acredita muito mais até em mecanismos não institucionalizados de participação do que nos mecanismos institucionalizados? Será que a gente não está tendo, crescentemente - e isso é perigoso, e isso é ruim - uma informalização também da atividade ao nível da sociedade, da organização das demandas, da pressão? Os partidos estão em xeque e, mais do que os partidos, o conjunto geral de instituições, as mesmas pesquisas...

Tão Gomes Pinto: [Interrompendo] Britto, vamos voltar... vamos voltar...

Augusto Nunes: Espera aí.

Tão Gomes Pinto: Você falou em democracia formal. Você não acha que o que está em xeque, realmente, é essa democracia formal? Eu lhe coloco uma questão, que eu estive agora em Buenos Aires e começam a surgir na imprensa brasileira interpretações das mais variadas sob um fenômeno que está ocorrendo na Argentina. É o surgimento de um candidato peronista [na Argentina, o partido Justicialista (PJ) é chamado de Partido Peronista porque foi fundado pelo general Juan Domingo Perón, cujo sobrenome batizou este movimento político: o peronismo] que está com 41% de preferência nas pesquisas, que é tido como um sujeito até de direita, da direita do peronismo, o que não é bem exato. E eu, conversando lá na Argentina com os representantes credenciados do PMDB deles...

Augusto Nunes: O candidato é o Carlos Menem?

Tão Gomes Pinto: Carlos Saúl Menem. Conversando com o pessoal... os radicais, os chamados radicais, que é o PMDB de lá, o PMDB do doutor Alfonsín [Raúl Ricardo Alfonsín (1927-2009), advogado e político argentino, presidente de seu país de 1983 a 1989], o que se sente é o seguinte: a democracia formal não atende lá a respostas... não tem respostas para as questões essenciais da sociedade. E quais são elas? [enumera nos dedos] Crise econômica, inflação, salários aviltados, injustiça social, dependência externa, acima de tudo. Então eu acho que o ataque todo que se faz ao PMDB deveria se dirigir - eu estou até te ajudando -, deveria ser dirigido a essa democracia “jaquetônica". O doutor Raúl Alfonsín usa jaquetões, como algumas pessoas usam no Brasil [Sarney também era conhecido por seus jaquetões]. Eu diria até que os dele são melhor cortados do que o nosso jaquetão de plantão. Mas lá faliu. Então, o que volta da Argentina? É o peronismo, representado por esse Carlos Saúl Menem, que é um homem provinciano até, um homem até com atitudes demagógicas, e a classe média argentina, desiludida, vai votar no peronismo. Você não acha que o Brasil também pode passar por um processo semelhante? Quando você fala que é preciso fortalecer o PMDB, fortalecer as instituições partidárias, é muito bonito, é um discurso até comovente. Mas é sem liderança. Eu aprendi até coisas do Perón. Perón dizia: “Política se faz com conhecimento, sentimento e mística”. A mística morreu no dia em que você leu aquele boletim no Incor [Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde Tancredo Neves ficou sob tratamento]. De lá para cá nós perdemos a mística. Nós precisamos recuperar isso; na América Latina infelizmente é assim. Uma democracia européia, de pensamento liberal, clássico, essa não! Parece que aqui [uma democracia como a européia] não vigora. Então, eu queria colocar para você uma pergunta. Você não vê aí a possibilidade de um conterrâneo seu começar a surgir com mais força ainda no cenário político, chamado Leonel de Moura Brizola?

Augusto Nunes: Aliás, Britto...

Antônio Britto: Pensei que era o Simon...

[Risos]

Augusto Nunes: Britto... Britto, não; até vamos um pouco além, quer dizer, esse descrédito não pode levar um homem providencial novamente, entre aspas, "saído dos quartéis"? Porque o Tão está até apresentando uma opção civil, mas eu pergunto: existe a opção militar?

Antônio Britto: Olha, eu acho que a... eu assinaria em baixo de grande parte do que o Tão colocou. E eu queria dividir a resposta em dois aspectos distintos, até para usar a terminologia da qual o Tão se valeu. Primeiro é que, haja o que houver, quando a gente fala, eu pelo menos estou falando em democracia formal, eu não estou falando em democracia representativa, estágio que a Constituinte sepulta ao criar mecanismos de participação direta. Quer dizer, democracia formal, classicamente, quer dizer uma forma de organização da sociedade, do Estado, onde se trabalhava basicamente em cima do conceito de representação. Isso aí morreu, isso acabou. Ou a democracia representativa acresce, como a Constituinte indica, elementos de participação ou ela realmente fica... a camada de verniz em cima da desorganização, em cima do problema todo. Agora, nós estamos usando o conceito "democracia formal" em um outro sentido também. Qual é? É a organização da sociedade a partir de uma Constituição, organização da sociedade e de um Estado a partir de uma Constituição feita, ótima, muito bem, mas incapaz... incapaz de ser acompanhada. Aí sim, a implementação de um conjunto de políticas que transforme concretamente o país. E aí, só aí, dando estabilidade. Eu vejo esse risco porque... olhe, tem partido para cá, tem partido para lá, eu confesso que eu não sei mais exatamente quantos são: [segundo] a minha última conta eram 32. Seja o que for, nós temos quatro grandes vertentes de pensamento no país, e o curioso é que tu não podes dizer "esses são os partidos desta vertente e esses são da outra.". Dentro de cada partido tem de uma, tem de duas ou às vezes das quatro. Tu tens...

José Barrionuevo: [...] Os partidos efetivamente vão... O PMDB [vai] do rosa mais suave aí ao vermelho escarlate. É importante situar o Britto dentro desse PMDB, o Britto dentro da política, uma definição ideológica clara do Britto. E os meios de produção, com quem devem ficar?

Augusto Nunes: Agora, Barrionuevo, eu acho que começa no rosa suave... ou tem alguma parte verde no PMDB?

[Risos]

Augusto Nunes: Porque, pelo desenho que você está dando, o PMDB já começa à esquerda. [Augusto Nunes sorri]

Antônio Britto: Olha, eu vou tentar te responder me valendo do que eu me imaginava fazer...

[Sobreposição de vozes]

José Barrionuevo: Partindo dos meios de produção, que eu acho que é a divisão de águas...

[Risos]

Carlos Brickmann: Qual é a cor do Robertão [Roberto Cardoso Alves]?

Antônio Britto: O quê?

Carlos Brickmann: Desse rosa suave ou o vermelho escarlate, qual é a cor do Robertão?

Augusto Nunes: É brincadeira, né?

[...]: Eu temo decepcionar vocês, mas eu sou daltônico.

[Risos]

Antônio Britto: Eu não sou não. Eu não sou não. Tu tens quatro grandes vertentes, hoje, que estão aí desalojadas ou alojadas dentro de partidos, fora de partido. Tu tens uma vertente de transformação revolucionária, com base em uma opção socialista ou comunista: não me filio a ela. Tu tens, e é essa que me assusta, a vertente conservadora, que na verdade está muito satisfeita com o verniz formal e acha que deu para a viagem, está pronto; estão enganados. Tu tens a vertente populista, que está pensando em, de novo, dizer para a população: “Olhem, fiquem aí que a gente resolve! Aguardem por instantes que a gente resolve!”. Essa vertente populista, ela trabalha em dupla com a conservadora. A única dúvida que a gente sempre tem é qual é a que vem antes; a gente sabe que a outra vem depois. Isso é o ciclo histórico da América Latina. E tu tens uma quarta vertente, na qual eu me filio e na qual eu tenho procurado trabalhar. Eu acho que o país vai precisar ter instrumentos fortes que organizem a vontade majoritária deste país, que é de centro-esquerda, que é progressista, que é reformista, que trabalha no sentido de alterar, dentro do país, relações, algumas até básicas, dentro da sociedade.

Fátima Turci: Quem é que... ?

Augusto Nunes: Britto,... Por favor, Fátima... Antes de a Fátima fazer a pergunta, Natali também quer fazer. A Ana Cristina de Andrade Radi, que é da Faculdade Anhembi Morumbi - aliás, nós agradecemos a presença aqui na platéia de alunos da Faculdade Anhembi Morumbi - pergunta o seguinte: “Como é que se pode ter um país estruturado politicamente...” - isso liga ao que você está dizendo - “... se grande porcentagem da população é analfabeta e desinformada?”. E quer saber também: “O que você pensa do voto aos 16 anos?”. E ela observa que boa parte dos pertencentes a essa faixa etária não tem consciência política a ponto de poder eleger com convicção o seu governador... ou outros candidatos.

Antônio Britto: Essa questão do analfabetismo, falta de estrutura...

Augusto Nunes: De informação...

Antônio Britto: ... de informação é evidente, ela acaba sendo causa e conseqüência e ela é um problema que vai ter que ser obviamente enfrentado. Agora, eu gostaria de me fixar um pouco mais na segunda parte da pergunta da Ana, né? A questão dos 16 anos, que acabou aprovada, ela passou por uma dificuldade muito grande.

Augusto Nunes: Você votou a favor...

Antônio Britto: Votei a favor...

Augusto Nunes:  ...do voto aos 16?

Antônio Britto: ...na comissão de sistematização; e depois [eu] já estava afastado, já estava licenciado. Eu sou... eu sou...

Augusto Nunes: Único.

Antônio Britto: Eu sou um deputado que, tendo sido escolhido como candidato, se licenciou da Constituinte, ou seja, eu estava fazendo campanha sem, nesse momento, receber nada dos chamados cofres públicos, mas a razão fundamental não foi essa. É que eu, candidato e constituinte, de duas uma: ou prejudicava a Constituinte com a ausência ou não fazia campanha. O meu suplente assumiu, votou o tempo todo, e eu me dediquei à campanha e sou muito feliz por isso. Da mesma forma que, também em Porto Alegre, me afastei dos espaços que tinha de rádio e televisão no dia em que fui indicado candidato à prefeitura, por entender que isso seria rigorosamente incompatível em uma eleição majoritária. O que me parece que não ficou resolvido na questão dos 16 anos é exatamente a questão da responsabilidade. Eu morria de medo e continuo morrendo de medo dessa tese de [que] já que o jovem avança neste país, no seu preparo, na sua maturidade, o que é uma verdade muito mais paulistana, carioca e de alguns lugares... não que a geração toda não avance, mas as pessoas acabam fazendo uma leitura fascista disso aí, para chegar aqui... então tudo bem, aos 16 já pode ser processado, já pode ir para a cadeia etc. Eu morria de medo disso. Morria de medo disso e acho que esse problema ficou ainda complicando muito a discussão do direito de cidadania, do direito de voto.

[Sobreposição de vozes]

Carlos Nascimento: Eu preciso...

Augusto Nunes: Carlos, é que a Fátima tinha feito sinal, depois o Natali, agora vocês podem... Carlos, pronto! A Fátima está cedendo o direito à voz.

Carlos Nascimento: Eu tenho que sair para fazer o jornal, que começa daqui a pouco, mas...

[Risos]

Carlos Nascimento: E eu estava comentando com a Fátima que nós estamos sendo muito bonzinhos com você. E como você falou...

Antônio Britto: [Interrompendo] Eu não concordo...

[Risos]

Carlos Nascimento: E como você falou em campanha agora há pouco, em recursos e coisas e tal... você nunca foi um cara rico - né? - , sempre foi um jornalista, que viveu aí do seu salário. Aonde é que você está arrumando dinheiro para fazer a campanha, que hoje não é barata?

Augusto Nunes: Aliás, Britto, um telespectador perguntou - eu não tenho agora aqui a cópia e você vai receber, como eu disse -, pergunta se é verdade que você recebe ajuda de uma companhia de ônibus, cujo nome ele não aponta, de Porto Alegre.

Antônio Britto: Companhia de quê?

Augusto Nunes: Companhia de ônibus, transporte coletivo, empresa de ônibus.

Antônio Britto: Nós estamos vivendo no país um momento muito interessante, porque não foi ainda aprovada... eu espero não ter chance de lutar pela aprovação disso, diretamente, porque quero me eleger prefeito. Mas não foi aprovada a legislação, que a Constituinte abre caminho, para que se moralize essa questão dos fundos partidários. O fundo partidário [também conhecido como Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, é administrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e destinado à manutenção dos partidos políticos. A maior parte dos recursos provém do Orçamento da União] constou na Constituição, no artigo que disciplina a atividade dos partidos. Mas é preciso colocar isso à luz do Sol. O que se tem hoje? O que se tem hoje é o partido obtendo os recursos através de doações. Eu tenho uma regra extremamente simples com isso. Primeiro: não participo de qualquer tipo de busca de recursos, isso é uma tarefa sempre de partido e isso é em todos os partidos.

Carlos Nascimento: [Interrompendo] Mas pode não ser uma busca honesta, e você...

Antônio Britto: Segundo: tenho a maior confiança em quem faz isso e acho que são pessoas extremamente honestas, não se preocupem com isso. E em terceiro lugar... e em terceiro lugar... estou falando das pessoas que fazem [busca de recursos], no meu partido, em Porto Alegre...

Carlos Nascimento: Ah, bom!

Antônio Britto: ... no meu partido, em Porto Alegre.

Augusto Nunes: Um bilhão de cruzados em Porto Alegre.

Antônio Britto: E em terceiro lugar: eu acho ruim que nós todos, se me permitem... já que está indo para o jornal é sugestão de pauta... eu acho que uma boa conseqüência dessa eleição, dos custos que ela tem, é a gente, ano que vem, agilizar, precipitar, pressionar, no sentido em que essa questão se defina, como em outros países. Eu dou o exemplo da Alemanha. Na Alemanha, a cada voto o partido recebe uma dotação, que é o mecanismo democrático...

[...]: Do Estado.

Antônio Britto: ... do Estado. Ora, isso estabelece um elemento de transparência, de moralização, extremamente oportuno. A legislação alemã, que eu conheço, que eu estudei, ela, evidentemente, tem algumas coisas que teriam de ser adaptadas a peculiaridades do próprio sistema eleitoral brasileiro, da dimensão de território etc e tal. Mas é um caminho. Esse caminho, várias vezes tentaram percorrer nos últimos anos e acabaram nunca concluindo. Agora, eu acho que isso é rigorosamente indispensável.

João Batista Natali: Britto, você me dá a liberdade... me dá a liberdade, também, de voltar a essa pergunta, porque eu acho, também, que você não respondeu. Eu concordo com o Nascimento de que nós estamos sendo profundamente amáveis e generosos com você, que é um colega nosso.

Antônio Britto: Eu não esperava outra coisa.

[Risos]

João Batista Natali: Então, eu gostaria, por favor, de fugir a essa regra - entende? -, porque eu tenho impressão de que o programa está ficando chato demais. Nós estamos falando no princípio dos princípios e talvez com ele todos nós concordemos. Há um deputado, na Assembléia Nacional Constituinte, chamado Victor Faccioni [Victor José Faccioni, jornalista, contador, economista e advogado, foi eleito deputado federal pelo Rio Grande do Sul, participando da Constituinte de 1988], que foi companheiro seu de combate pelo parlamentarismo, ele votou várias coisas junto com você. E outro dia, eu estranhei quando eu entrei no plenário - para ser muito mais preciso, foi na quarta-feira da semana passada -, [e] ele estava fazendo um pequeno discurso que eu atentei, depois eu fui pegar na taquigrafia para saber exatamente qual era o teor das acusações que ele lançava contra a campanha do candidato do PMDB à prefeitura de Porto Alegre. Era uma coisa muito pesada. Eu gostaria então que... Já que o Nascimento propôs pauta, quer dizer, então, em lugar de entrar a pauta para a Folha [de S. Paulo] amanhã, eu gostaria já de gastar essa pauta com você. É verdade que a LBA, Legião Brasileira de Assistência, está distribuindo óculos para pessoas carentes de recursos com base no fato de que o seu Comitê fica no mesmo prédio da LBA? O pessoal chega lá, pega o ticket de óculos e depois sobe lá para cima e pega o vale para conseguir fazer os óculos? Isso daqui é uma coisa, veja bem, na hora em que eu ouvi falar nisso daqui, que foi denunciado pelo PDS de Porto Alegre... então, obviamente, eu não constatei esse fato pessoalmente. Mas eu acho que fica muito mais interessante a gente se fazer de advogado do diabo...

[...]: E dentadura também.

João Batista Natali: Quer dizer, é uma tentativa de corrupção e de...

Carlos Brickmann: E dentadura também.

João Batista Natali: E dentadura também?

[Sobreposição de vozes]

Antônio Britto: Ô Natali, nós temos em Porto Alegre um fenômeno muito interessante que ocorre... acho que em todos os lugares. Nós tivemos dez pesquisas realizadas pelos diversos órgãos de comunicação, diversos patrocinadores, diversos momentos. Nas dez pesquisas, o meu nome sempre apareceu em primeiro lugar.

João Batista Natali: O que não é uma resposta, Britto.

Antônio Britto: Eu estou começando a resposta.

João Batista Natali: Certo.

Antônio Britto: Eu estou começando a resposta. Então, logo depois de cada pesquisa a gente tem a tentativa fantasiosa de criar fatos. Quem me conhece, como tu, por exemplo, sabe que eu não faço desse jeito, não tolero esse tipo de coisa, não entro nesse tipo de coisa, isso é rigorosamente mentira, tanto é que nunca conseguem apresentar coisa nenhuma. Qual é a verdade dos fatos? A verdade dos fatos é que a LBA, no Rio Grande do Sul, foi dirigida, nos últimos três anos, por uma advogada chamada Mercedes Rodrigues, que revolucionou a assistência social no Rio Grande do Sul, incluindo, na questão da assistência social, palavras que o assistencialismo e o paternalismo nunca admitiram. Por exemplo: mobilização comunitária, participação comunitária, [enfatiza] a comunidade definindo o que deva ser feito. Para tu teres uma idéia, isso gerou em Porto Alegre, em um ano e meio, a construção de 87 creches que não foram doadas, que não foram trocadas, foram construídas junto com a comunidade. A LBA continua realizando um trabalho que eu vou adorar muito o dia que não seja necessário neste país, de assistência às pessoas. Em nenhum momento, até pelo tipo de caráter e pelo tipo de conduta política das pessoas envolvidas comigo, na minha candidatura, em nenhum momento isso seria utilizado. Até porque - sabe? - a população no Brasil, e de forma particular no Rio Grande do Sul, há muito tempo me parece - e isso está muito claro nessa eleição - abandona a idéia de que por aí tu construas fatos eleitorais, fatos dessa razão. Depois vieram as denúncias, e aí houve um pouco de equívoco, ou do deputado que fez a denúncia ou tu não tiveste tempo de ler bem. Há uma história cômica que mostra bem a fantasia em que algumas pessoas entram na eleição, que é a famosa história do prédio. O PMDB, há um ano e meio, tem sede num prédio. A Seac [Secretaria de Ação Comunitária] se instala no mesmo prédio. Na frente desse prédio tem um quartel, do lado tem um banco; do outro lado sei lá o que tem. Então, aí se criou uma idéia de que as pessoas... Nós teríamos comitê no térreo para que o cidadão, antes de ir no Seac, passasse pelo comitê; aí seria devidamente instrumentado politicamente. Eu tenho procurado fazer a campanha em Porto Alegre com a maior seriedade...

[Sobreposição de vozes]

João Batista Natali: A acusação do ticket do leite [...]

Antônio Britto: É que tu falaste em óculos...

Tão Gomes Pinto: A Seac é aquela do Anibal Teixeira [Aníbal Teixeira de Souza (1933), político brasileiro, nascido em Belo Horizonte. Foi ministro do Planejamento do governo José Sarney, de 1987 a 1988], onde tudo começou?

[Risos]

Antônio Britto: Me parece que o doutor Aníbal foi...

[Sobreposição de vozes]

Antônio Britto: Agora, tem feito um trabalho, eu não sei como é que é em outros estados. No Rio Grande do Sul, o trabalho do leite, por exemplo, tem uma coisa muito interessante... como é que eles fizeram lá? Eu achei bom que eles fizessem assim. Eles chamaram a Associação Comunitária. Então, a Associação Comunitária é que distribui. Isso faz com que, em Porto Alegre, por exemplo, haja gente [enumera nos dedos] do PDS, do PFL, do PT, do PDT, do PMDB, que, sendo presidente das associações - e não dá para intervir nisso, a comunidade escolhe afinal quem quiser para presidente da associação -; sendo presidente de associações, são o elemento conveniado - não como pessoa física, mas enquanto representante da associação - para isso. Então tem candidato do PFL, tem candidato do PDS, tem candidato do PT, tem candidato do PDT. Está muito democrático.

Augusto Nunes: De preferência do PMDB.

Cecília Pires: Eu queria voltar só a essa pergunta, porque não foi respondida desde o início. Você falou de perspectivas futuras. De como, democraticamente e honestamente, um candidato poderá fazer campanha no futuro. Você está licenciado da Constituinte, portanto não está causando qualquer ônus aos cofres públicos. Como é que você está sustentando a sua campanha?

Antônio Britto: A minha campanha eu não sustento - ai de mim! -, quem sustenta é o partido. A mim eu estou sustentando, sou um sujeito que aprendi como jornalista - né? - a viver com muita moderação. Então, com alguns sacrifícios, eu me mantenho muito bem e muito feliz.

Carlos Tramontina: E o preço da campanha, Britto?

Antônio Britto: Não tenho idéia.

Carlos Tramontina: Você não sabe?

Antônio Britto: A Justiça Eleitoral fixou, a Justiça Eleitoral fixou, porque isso daí, eu vou te dizer como é que funciona.

Carlos Tramontina: Sim, mas toda vez a Justiça Eleitoral fixa o valor que o partido pode gastar em uma campanha... e a gente sabe que o partido gasta cem, duzentas, quinhentas vezes mais, e é uma pouca vergonha, na verdade.

Carlos Brickmann: Tem a história da bolsa, não é?

Carlos Tramontina: Porque a lei prevê um gasto “x”... Outro dia eu conversei com o dono de uma gráfica e ele falou assim: “O partido? O partido nem aparece aqui, eles mandam a ordem para fazer trezentos milhões de impressos, e vêm as empresas aqui, que têm o interesse de eleger o candidato.... e a empresa paga tudo, eu só faturo para as empresas, eu não faturo para partidos.”

Antônio Britto: Olha, eu não sei como tem funcionado em outros estados. A lei, na verdade, não fixa, e a justiça também não fixa, em um primeiro momento. O que há é o seguinte: cada partido indica um representante ou dois, eu não lembro agora, que vão compor a comissão financeira de fiscalização de um partido no outro e junto à Justiça Eleitoral, obviamente. Na primeira reunião desse comitê interpartidário ou pluripartidário de finanças tem lá... todo o partido que apresentou candidatos tem a obrigação e o dever de indicar representantes. Então é feita uma fixação dos limites de despesas. Em Porto Alegre, me parece que foram sessenta milhões [de cruzados] a campanha de cada partido e há uma outra cota, que eu lhe confesso que não sei quanto, de cada vereador, não lembro o valor...

[Sobreposição de vozes]

Carlos Tramontina: Mas, na prática, uma mão lava a outra.

Antônio Britto: Deixa eu só completar a resposta, eu vou chegar a onde vocês querem. Calma! Eu vou chegar lá. Então esse é o valor fixado. Terminada a campanha, cada partido se reúne, faz a sua contabilidade, leva à Justiça Eleitoral, e um partido fiscaliza a contabilidade do outro partido. O PT fiscaliza a de todos os outros, PDS fiscaliza a de todos os outros. Eu acho, quero ser bem claro com isso, eu acho que esse sistema está todo errado! Está todo [enfatiza] errado! Porque, não é possível que alguém caia agora na ingenuidade de supor que campanha não custa, nem caia na falta de escrúpulos de utilizar a campanha para comprometer a moralidade, a austeridade de dispensares disso. Na essência, a coisa está errada é na origem, que é a seguinte: tem que tornar transparente, tem que tornar cristalino, aquelas palavras todas que a gente sabe, o ato de obter a doação, e eu acho que a gente tem que caminhar perto, pelo menos, da legislação alemã.

José Barrionuevo: O cálculo modesto em Porto Alegre... o cálculo modesto, e acho que é uma campanha mais barata em Porto Alegre, até porque em São Paulo deve ser um terço, um quinto de São Paulo, é um bilhão de cruzados.

Antônio Britto: Campanha de quê?

José Barrionuevo: Candidato a prefeito, campanha de Antônio Britto Filho.

Carlos Brickmann: Britto,...

[Sobreposição de vozes]

Antônio Britto: Posso dizer só mais uma coisa: lá não gasta isso não. Não gasta não.

Carlos Brickmann: Você revelaria aqui quem financia a sua campanha?

Antônio Britto: Eu posso pedir para o pessoal do partido conversar contigo.

Carlos Brickmann: Você agora, neste momento, você não sabe?

Antônio Britto: Não, porque eu não tenho nenhuma ingerência sobre isso, e faço questão de não ter.

Carlos Brickmann: Você faz questão de não saber?

Antônio Britto: E faço questão de confiar na honestidade das pessoas, mas pode ficar tranqüilo que lá... É a tradição gaúcha, inclusive, justiça se faça, o Barrionuevo sabe bem disso, no Rio Grande do Sul - sabe? - , os padrões de austeridade, de dignidade, de cuidado com a atividade política, em geral têm sido muito preservados.

João Batista Natali: Britto, eu fiquei sabendo - veja bem - que uma produtora independente foi sondada para fazer a propaganda eleitoral gratuita do PMDB para a tua campanha, que vai começar no dia 29 e vai até as vésperas das eleições. Essa produtora independente pediu alguma coisa tipo oitocentos mil dólares.

Antônio Britto: Oitocentos quantos?

João Batista Natali: Mil dólares. Veja bem, então eu não sei quanto isso aqui dá em OTNs [Obrigações do Tesouro Nacional, título da dívida pública emitido entre 1986 e 1989 e utilizado como referência de valor. Foi extinta pelo Plano Verão e substituída pelo Bônus do Tesouro Nacional, BTN], agora eu tentei fazer o cálculo, mas eu sou muito ruim de aritmética. Então, esses oitocentos mil dólares não foram aceitos porque já estavam cobertos por uma produção muito mais sofisticada, que era superior a essa. Essa produtora independente, só para te dar algumas indicações, ela pegou a campanha do PMDB de uma grande cidade do interior de São Paulo, que eu não vou mencionar agora.

Antônio Britto: Eu acho que aí, essa parte eu conheço bem, porque essa coisa de rádio e televisão a gente acabou se acostumando a trabalhar, eu acho que aí quem te deu a informação...

João Batista Natali: Foi o dono da produtora que conversou com uma das pessoas que você falou.

Antônio Britto: Como se dizia, labora em terrível equívoco, porque há mais de quatro meses o partido tinha definido como fazer. Tem muita gente que se oferece para fazer. Tem gente que, até por curiosidade, pergunta quanto sairia, mas no específico, aí não. Porque há mais de quatro meses está definido...

Fátima Turci: Por falar em dinheiro, eu queria uma dica de dinheiro de campanha, especificamente, como está o dinheiro, como  [é] que a Constituinte deixa a transparência dos orçamentos públicos? Como [é] que vocês conseguiram melhorar essa questão, que eu acho que, daí sim, afeta bem diretamente o bolso de cada brasileiro?

[Sobreposição de vozes]

Augusto Nunes: Britto, por você... se a Cecília quiser fazer a pergunta, porque é a última pergunta.

Cecília Pires: Eu só queria complementar o que a Fátima está colocando. Você foi um dos poucos candidatos que realmente brigaram para ser o candidato a prefeito. A maioria não queria, principalmente porque a prefeitura de Porto Alegre, o próprio estado do Rio Grande do Sul, está em uma situação financeira caótica e todo mundo sabe disso. Então, complementando, essa transparência que você está colocando sobre o orçamento das prefeituras... será que esse orçamento ampliado da Constituinte vai cobrir as dívidas imensas da prefeitura? O que você pretende fazer com tão pouco dinheiro, em uma prefeitura que está absolutamente quase à beira da falência?

Augusto Nunes: Britto, a última resposta, por favor.

Antônio Britto: Não, não é o caso de Porto Alegre, me desculpe, mas aí...

Augusto Nunes: Última resposta.

Antônio Britto: Última resposta.

Augusto Nunes: Sua última resposta.

Antônio Britto: Não é o caso de Porto Alegre. Porto Alegre tem a seguinte situação: Porto Alegre vai fechar o ano com um orçamento de vinte bilhões. Até dois meses atrás, ou seja, até antes do início do período eleitoral, o nível de endividamento era muito baixo; a folha de pessoal ativo e inativo, total de vinte mil funcionários, ocupava em torno de 58% do orçamento; a capacidade de investimento era em torno de 14[%] a 16%, o que na média brasileira é bom, embora seja ainda pouco; a reforma tributária vai acrescer, obviamente, recursos. Mas eu acho que qualquer planejamento sobre o ano que vem... qualquer planejamento sobre o ano que vem não é sério, não é factível, se não for possível antes saber o que vai acontecer com a chamada operação desmonte [ação do Tribunal de Contas dos Municípios e do Ministério Público Estadual, cujo objetivo é apurar a situação das gestões municipais e atuar preventivamente contra o desmantelamento da máquina pública].  Porque se ela se der nos termos em que vem sendo aí apregoada nós vamos ter um ano rigorosamente terrível para qualquer governo estadual, para qualquer governo municipal. E nós vamos ter, pior, a suspensão de algumas obras, aí sim, sociais, corretas e claras, sem as quais a gente vai ter muita dificuldade; vai ter muito problema. Porto Alegre tem condições, por ser uma cidade grande, mas ainda sem ter chegado ao nível das dificuldades, dos mega problemas que afetam, por exemplo, uma cidade como São Paulo... Porto Alegre tem condições de, com um trabalho integrado, austero, com a ampliação da capacidade de investimento, com a busca de recursos, enfim, com uma gerência moderna, com uma gerência eficiente, Porto Alegre tem condições de dar um atendimento a tudo? Não. A quase tudo? Não. Mas tem um bom projeto de obras, tem um bom projeto de investimentos públicos. Eu, se não acreditasse nisso, não seria candidato. Eu acho que a minha geração, eu acho que aqueles que, como eu, têm 36 anos, estão postos diante das duas opções que eu já disse aqui: ou acreditam que toda essa descrença que, de alguma forma, as perguntas de vocês também transmitem - e é justo que aconteça -, toda essa descrença nos leva à conclusão da inviabilidade - e aí, vão chamar um pai da pátria ou um ditador de plantão -; ou a gente entende que, apesar de tudo estar avançando, do ponto de vista ainda formal, do ponto de vista institucional, que a gente sai desse episódio todo, com instrumentos para chegar ao real, mais fortes do que nunca na história brasileira. Ou a gente acredita que tem futuro, transforma essa descrença e esse descrédito em instrumento permanente de cobrança e de entusiasmo para construir alguma coisa, ou a gente está se aposentando do país, está se exilando dentro do país. O tempo de brasileiro exilado passou e os exilados eram fora do país. Vai ser muito triste ver um Brasil exilado dentro do Brasil, eu não acredito nisso, eu luto contra isso.

Augusto Nunes: Os pós-modernos, não é?

Antônio Britto: Eu luto contra isso e eu quero dizer a vocês: eu tenho esperança. Eu tenho esperança e eu chamo a atenção de vocês para isso. O descrédito está gerando uma resistência a determinadas práticas políticas, que vai contribuir para aperfeiçoar a política; aliás, já está contribuindo. Basta ler o jornal, basta ver os cuidados, basta ver o que está acontecendo. No caso do Rio Grande do Sul, por exemplo, olhe! É emocionante! E eu acho que isso não é um fenômeno gaúcho, é emocionante ver...

Augusto Nunes: Britto, conclua, por favor...

Antônio Britto: ... o quanto, Augusto, as pessoas evoluem. Eu tenho fé nisso, não sou ingênuo a ponto de achar que o futuro está feito e está pronto. Mas nós temos condições de construir um futuro.

Augusto Nunes: Nossos agradecimentos ao deputado federal Antônio Britto, que é, no momento, candidato a prefeito pelo PMDB de Porto Alegre. Muito obrigado ao Britto.

Antônio Britto: Obrigado.

Augusto Nunes: Obrigado aos nossos entrevistadores, aos convidados da produção, entre os quais os alunos da Faculdade Anhembi Morumbi, aos telespectadores que nos telefonaram - repito sempre que é impossível transmitir ao nosso convidado todas as perguntas que nos chegam, mas o deputado Antônio Britto vai receber cópias das perguntas que recebemos esta noite. O programa Roda Viva volta na próxima segunda-feira, às 21h25. Boa noite.

 

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