;

Memσria Roda Viva

Listar por: Entrevistas | Temas | Data

Michel Temer

15/11/2004

O presidente do PMDB falou sobre independκncia partidαria, futuro do PMDB e coligaηυes

Baixe o player Flash para assistir esse vνdeo.

     
     

Paulo Markun: Boa Noite. Ele preside um partido político histórico que já atravessou muitas tempestades  da política brasileira. Comemorou vitórias e amargou derrotas, já se uniu e se dividiu várias vezes. Foi oposição e situação, ofereceu e retirou apoios e agora ameaça romper com o governo e buscar seu próprio caminho. O Roda Viva entrevista, esta noite, o deputado federal Michel Temer, presidente nacional do PMDB [Partido da Movimento Democrático Brasileiro]. 

[Comentarista]: Com quase 20 anos de vida política, Michel Temer tornou-se uma conhecida liderança do PMDB e um dos mais atuantes articuladores da chamada ala governista do partido. Advogado, duas vezes secretário da Segurança Pública de São Paulo  e cinco vezes deputado federal, ele era o líder do partido em 1997, quando disputou e ganhou a eleição para presidente da Câmara Federal, sendo reeleito para o cargo dois anos depois.  Em 2001, foi eleito do presidente nacional do PMDB, conseguindo reeleição em março de 2004.   Com fama de conciliador, há anos mantém discurso interno de defesa e busca da unidade do PMDB. O partido que mistura sua história à própria história recente do Brasil. Desde sua criação, em 1980, é marcado por divisões internas, esvaziamentos, crescimentos e novas divisões.  Abrigando vários tipos de ideologias e correntes políticas, o PMDB atuou nos últimos anos, ora como aliado, ora como opositor de governos.  E volta a viver essa situação agora em relação ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.  PMDB e PT se distanciaram nas últimas eleições. Em São Paulo, não foi possível uma coligação com Marta Suplicy [ex-prefeita, pelo PT, da cidade de São Paulo entre 2001 e 2005, nomeada ministra do Turismo em 2007]. Restou ao partido uma chapa com Luiza Erundina [primeira prefeita eleita por um partido de esquerda da cidade de São Paulo, em 1998, pelo PT.  Deputada federal pelo PSB] do PSB [Partido Socialista Brasileiro] e o próprio Michel Temer concorreu como vice-prefeito.  A coligação obteve 3,96% dos votos no primeiro turno. No restante do país, a legenda ganhou em apenas duas capitais: Goiânia, com o veterano Íris Rezende [ex-vereador e prefeito de Goiânia, ex-deputado e governador de Goiás, ex-senador, ministro da Agricultura durante o governo Sarney e ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso] e Campo Grande com Nelsinho Trade. Quanto ao futuro, o mais próximo é 2006 e o PMDB já se divide.  Seus dois ministros no governo, Eunício Oliveira, das Comunicações, e Almir Lando, da Previdência, não concordam com a ala que quer se desligar da administração Lula e buscar um caminho independente.  O partido antecipou para 15 de dezembro a convenção nacional que vai tomar a decisão. 

Paulo Markun: A convenção do PMDB é em 12 de dezembro. Para entrevistar o presidente do PMDB, Michel Temer, convidamos Tereza Cruvinel, colunista de política do Jornal O Globo, Luciano Suassuna, diretor de redação da revista Isto é Gente, Luiz Carlos Azedo, repórter de política do jornal Correio Brasiliense, Fernando Rodrigues, repórter especial da sucursal da Folha de S. Paulo em Brasília, Ilton Caldeira editor assistente político do Jornal Valor Econômico. Acompanham a entrevista em nossa platéia, os seguintes convidados: Nádia Faraoni da ONG Ação da Cidadania, Carlos Eduardo Leão, estudante de jornalismo da faculdade Cásper líbero, Bianca Santana estudante de ciências sociais da USP, Evanize Sidol, da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, Valter Rodrigues de Carvalho, mestrando em ciências sociais na PUC, Cristiano Lafetá, jornalista, Suellen Rodrigues, estudante de jornalismo das Faculdades Integradas Alcântara Machado, Diana Pelegrini aluna de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero, Maria Lídia Bueno Fernandes, geógrafa e antropóloga, Galdes Torquato, jornalista e consultor político, José Domingos Vasconcelos, do Instituto Ágora, de defesa do eleitor, e Luciana Escuate Lupe, aluna de ciências sociais de USP. O Roda Viva é transmitido em rede nacional para todos os estados brasileiros e também para o Distrito Federal pela Rede Pública de Televisão. Boa noite, deputado. O que faz com que, desta vez, a disposição do PMDB de buscar caminho independente, se afastar do governo, ter candidatura própria seja para valer, já que em outras ocasiões se falou nisso e nunca se consumou esta disposição?

Michel Temer: Olha, Markun, você sabe que nós, ao longo do tempo, temos procurado manter certa unidade do PMDB. Uma unidade que, como o vídeo demonstrou, não foi conseguida ao longo do tempo. E um dos primeiros momentos dessa unidade, eu devo reconhecer, foi exatamente quando nós nos dispusemos a fazer uma chapa para a executiva nacional compondo as várias correntes do partido que foi exatamente no momento da minha reeleição.  E agora, passado um ano, um ano e pouco que o PMDB resolveu aderir ao governo, eu tenho mantido contato primeiro com governadores. Fiz uma conversa individual pelo telefone com os governadores, depois uma conversa aqui em São Paulo e verifiquei um consenso absoluto no sentido de que o PMDB busque um caminho próprio, um projeto próprio. E o passo seguinte, como você sabe, foi fazer uma reunião com os diretórios estaduais, lá em Brasília, juntamente com os governadores, deputados, senadores e lá, digamos assim, a tese pelo projeto próprio do PMDB também foi avassaladora. E daí, vai resultar no dia 12 de dezembro uma convenção nacional para o PMDB escolher seu caminho. E eu devo registrar que ao longo dessas eleições, como se faz, elas realmente influenciaram porque, ao longo desse tempo, em primeiro lugar se verificou que o PMDB esteve sozinho, em solitário, digamos assim, em muitos municípios, lançando candidaturas próprias. Por isso que é que fez [elegeu] 1057 prefeitos, o maior número de vereadores, aquelas coisas que nós todos já sabemos. Portanto, revelando concretamente a chamada capilaridade do PMDB, quer dizer, o PMDB tem uma presença muito intensa em todos os municípios brasileiros. E daí, a pergunta que começou surgir foi à seguinte: “Se nós somos tantos, por que afinal não podemos ter um projeto próprio”?  E eu recebi, ao longo do tempo [juntando as mãos], inúmeros e-mails, correspondências... não vou falar em milhares, mas vou falar em centenas, perguntando exatamente: “Escute, você que é presidente nacional do PMDB, por que é que nós não damos uma identidade própria ao partido”?  E eu devo registrar, tenho registrado em várias entrevistas, o que PMDB viveu muito ao longo do tempo, digamos assim, às custas da ambigüidade, eu até diria que o PMDB desfrutou dessa ambigüidade. Muitas vezes se dizia, só para concluir [sendo interrompido], Tereza, muitas vezes se dizia o seguinte: o PMDB, com várias correntes, ele se mantém forte, grande, se mantém unido, mas eu hoje começo a perceber, e esta percepção é de muita gente do PMDB, que essa ambigüidade passa a ser uma coisa autofágica. Ou PMDB tem um caminho próprio ou se destina a uma espécie de...

Paulo Markun: [interrompendo] Só para entender, isso significa que o senhor acredita que, no dia 12 de dezembro, o PMDB vai afirmar essa decisão de afastar-se do governo e buscar um caminho próprio? 

Michel Temer: Eu trabalho por essa tese. Primeiro, estou refletindo uma boa parte do partido PMDB. Em segundo lugar, já vivi essa experiência. Se você quer ter um projeto próprio, não é ético, digamos assim, que você fique até seis meses antes das eleições no governo e depois saia para disputar eleições com candidato próprio. Se você fica no governo, então a tese tem que ser assim: “Nós já vamos fazer uma aliança desde já porque a opinião pública não vai entender como seis meses antes você pode abandonar o governo”.

Fernando Rodrigues: Isso significa que, se no dia 12 for realizada essa convenção nacional do PMDB e se nessa convenção ficar decidido que o PMDB permanece no governo, significa que ele vai até o fim então do governo Lula? 

Michel Temer: Acho inevitável, Fernando, pelo seguinte... Só se você me der uma explicação, como é que você...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Não pode ter outra convenção seis meses depois, pensar mais adiante? 

Michel Temer: Pode, mas você sabe que este momento é um momento forte do PMDB. Nós todos temos acompanhado e temos verificado como o PMDB tem se mobilizado em torno de ter um projeto próprio partir de agora. Nós temos que preparar candidaturas. A idéia até é que nós tenhamos primárias nos estados, até para vitalizar e revitalizar o PMDB. A idéia é de que, daqui a algum tempo, quem quiser ser candidato à presidência da República pelo PMDB, e nós temos governadores, lideranças regionais que podem se candidatar, eles se escrevem e vão fazer um périplo pelos estados brasileiros. E quem tiver o maior número de votos pelos estados, nós vamos tentar provar esta coisa das primárias no PMDB exatamente na convenção. Então, cada estado de acordo com seu consciente eleitoral terá um determinado número de votos mais ou menos semelhante à eleição americana...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Mas isso agora, tem que ser agora? 

Michel Temer: Tem que ser agora. Você precisa ter os candidatos logo adiante. Você precisa ter os candidatos percorrendo o país para vitalizar o PMDB. Depois, em 2006, a partir de março, abril, maio, fazer uma campanha para a presidência da República.

Luciano Suassuna: Se a tese do apoio ao governo vencer, o senhor não deveria renunciar à presidência já que o senhor está defendendo a tese contrária? 

Michel Temer: Você sabe, Luciano, eu vou exprimir a vontade majoritária do partido. Veja que eu tenho uma opinião. Essa opinião esta muito alicerçada, digamos assim, no desejo que eu encontro hoje no partido e vou exprimir a posição da maioria. Eu jamais ficarei lá no meu gabinete me transformando numa espécie de bunker para atirar [faz o gesto de atirar] torpedo para todo lado.  Isso não vou fazer. Eu vou exprimir a vontade da maioria.  Agora, história de ficar no partido, ficar na presidência, não ficar na presidência, à esta altura, em fase do um projeto maior, eu diria que é quase irrelevante. O importante é a pregação para que o PMDB tenha este projeto próprio.

Teresa Cruvinel: Deputado, o senhor apresentou aí um argumento que é o de ter projeto próprio de poder, mas não é o único que está sendo usado pelos peemedebistas. Se você conversa com outros que também defendem o rompimento, apresentam novas e diferentes razões. O governador Requião [Roberto Requião, governador do Paraná eleito em 2003 e reeleito em 2006. Ex-prefeito de Curitiba], por exemplo, acha que é preciso romper para forçar uma mudança da política econômica, mas pegando no seu argumento que é: “O PMDB precisa ter um projeto próprio de poder e um candidato para 2006”... Ora, tem só um ano o que PMDB aderiu ao governo Lula e há um ano atrás já não se pôde pensar nisso, que tinha decisão presidencial em 2006? Este tipo de coisa que faz o PMDB ser percebido como partido oportunista, uma expressão que o senhor mesmo utilizou há pouco. Porque há um ano já se sabia que tinha eleição presidencial.  Isso reforça a suspeita também que, atrás desse movimento, exista uma aliança em aliança com o PSDB [Partido da Social Democracia Brasileira, criado a partir de uma dissidência do PMDB]. Eu lhe pergunto objetivamente é isso: o afastamento do presidente Lula? O objetivo não é o realinhamento com o parceiro antigo, PSDB? 

Michel Temer: Não. Você sabe, Teresa, que... Até dando razão a você. Você sabe que, logo no início do governo Lula, nós firmamos um documento. Os governadores e o presidente do partido, pela tese de uma oposição que não fosse uma oposição radical, portanto, apoiando teses úteis da sociedade brasileira, mas ficaríamos de fora do governo. Vocês se recordam que demorou um tempo para que o PMDB fosse chamado ao governo.  Até antes mesmo da posse do presidente Lula, o então presidente do partido, hoje chefe da Casa Civil, José Dirceu, esteve conosco e fez um acordo, uma composição. Na verdade estava assim, uma coalizão, a idéia...

Teresa Cruvinel: [interrompendo] Até não deu certo.

Michel Temer: Não deu certo, mas eu registro o episódio porque, naquele momento, o PMDB poderia ter entrado por inteiro. O PMDB estava unido em torno dessa tese de que nós faríamos uma coalizão governamental. Depois se optou pela chamada, não mais coalizão, mas adesão. Mais tarde, na verdade, o governo sensibilizou alguns membros do PMDB que optaram pela espécie de adesão que, convenhamos, diminuiu o PMDB aos olhos do povo.

Teresa Cruvinel: [interrompendo] Mas foi aprovada esta decisão de entrar também, né?

Michel Temer: Pela executiva do partido foi.

Luciano Suassuma: O PMDB passou oito anos sob o governo Fernando Henrique Cardoso, vivendo essa ambigüidade, e sempre tirano proveito.  Na verdade, o fato novo que tem é o governo Lula. Na verdade, o PMDB tentou manter essa ambigüidade durante certo tempo. No que o governo Lula errou em não conseguir aliciar, seduzir, convencer o PMDB a manter essa aliança mais para frente?

Michel Temer: Ou então, convertendo um pouco esta pergunta: No que é que nós, do PMDB, erramos no passado? No passado, você sabe que sempre houve aqueles que sustentavam a tese da candidatura própria. Eu próprio, ao longo do tempo, verifiquei que não era ético, politicamente ético, e a opinião pública não entenderia, que você ficasse, como nós estávamos, até seis meses antes de eleições no governo e depois saíssemos para candidatura própria. E então, naquele momento, tornou-se impossível a tese da candidatura própria. Por isso que, hoje, eu e muitos sustentamos: “Se nós queremos ter um projeto próprio, temos no que nos definir agora porque senão a opinião pública não vai compreender”.  Claro que eu poderia aqui tratar de outros tantos pontos. O PMDB também quer um projeto próprio porque, quando você quer chegar ao poder, você precisa ter um nome, você precisa ter nomes para presidente da República, para governadores, mas você precisa ter também um programa. Por exemplo, veja você, nós vamos cuidar de elaborar um projeto para o Brasil. Um projeto que comece com um tema que parece banal, mas é fundamental, que é a tese do reforço federativo. Você sabe que nós vivemos numa federação de fachada, federação do texto constitucional, mas na prática não vivemos esta federação.  Se você verificar a carga tributária do país, você verifica que cerca de 79% são arrecadados pela União, 38 % vão para os estados e 17 %, ou menos, perdão, 6% vão para os municípios. Cerca de 17 ou 18 % vão para os estados. Nós temos que inverter essa equação. Estou dando aqui apenas um exemplo de como o PMDB pode ter projeto para o país. O tema da segurança pública, por exemplo, é tema fundamental para todos. É tema que pode ser uma das bandeiras do PMDB porque, no passado... E estou falando aqui de questão administrativas já que a democracia foi reinstalada definitivamente no país... No passado, o PMDB tinha conexão com a sociedade porque falava com a sociedade. Eu reconheço que o PMDB desconectou-se da sociedade, não fala mais com a sociedade, não tem mensagem para a sociedade nem projeto. Olha que eu estou falando como presidente nacional do partido, reconhecendo os equívocos, né?  E nós, ou refazemos esses equívocos agora, ou nos concordamos, digamos assim, com a condição de satélites de qualquer outro partido que esteja no poder.

Fernando Rodrigues: O que está diferente hoje, presidente Michel Temer, da situação dois anos antes de terminar o governo Fernando Henrique Cardoso?  Por que essa decisão, quando o senhor e o grupo que o senhor também representa no PMDB, estavam lá, por que essa decisão? Não estava claro dois anos antes de terminar o governo Fernando Henrique Cardoso, que é caso agora do Lula e o PMDB não tomou essa atitude lá? Porque havia lá na época um grupo que falava exatamente isso que o senhor fala hoje.

Michel Temer: Você sabe o que PMDB por inteiro, hoje, e aqui eu começo a perceber uma unidade, tomou a concepção absoluta que ou ele levanta cabeça agora ou não terá mais como levantar cabeça.

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Porque a impressão que a gente tem, sendo bem sincero, a gente que observa o partido lá em Brasília, a impressão que a gente tem é que agora os grupos mudaram de lado e que, de novo, o grupo governista ao fim, ao cabo, vai ter força, continuar no governo, PMDB vai continuar a reboque do governo e daqui a algum tempo os papéis vão se inverter de novo e alguém vai estar falando a mesma coisa que o senhor está falando. O PMDB vai, como continua acontecendo a cada eleição, tendo menos votos do que está tendo.

Michel Temer: Não acredito, Fernando, você sabe que tenho absoluta convicção de que a grande maioria quer esse novo papel para o PMDB. Eu até entendo esses que estão no governo, eu não os critico. Acho... Estão no governo, acham que a melhor tese é continuar no governo. Devo registrar dois fatos em benefício dos que estão no governo: Um primeiro é que os ministros me dizem que, se o partido decidir realmente pelo projeto próprio, eles saem do governo, primeiro ponto; Segundo ponto: Os que estão hoje no governo, eles entendem desde já que devem fazer uma aliança com o PT. Não estão no governo por estarem no governo, eles têm a convicção de que o melhor é fazer aliança com o PT.  É tese.

Ilton Caldeira: Deputado, esta questão do PMDB trilhar caminho próprio, ela passa necessariamente também pela presença do PMDB nas grandes cidades e grandes colégios eleitorais. Na última eleição municipal, o que a gente pôde perceber é que o PMDB se fortalece nas pequenas cidades com menor número de eleitores, ou seja, o partido começa a criar uma característica, enfim, firmar característica de um partido talvez até de grotões. Como resolver isso? Por onde passa o projeto próprio do PMDB, sem estar com uma presença tão forte nos grandes centros e grandes colégios eleitorais?

Michel Temer: Você sabe que quem ganha eleições são votos né? E quando você verifica o número de votos o que PMDB teve, e estou de acordo com vocês, nas grandes cidades diminuiu a presença do PMDB,  mas ainda assim ele fez 16 milhões e 889 mil votos sem ter candidatos em São Paulo, em Belo Horizonte e em Curitiba. Tivesse um candidato, aumentaria substancialmente o número de votos em qualquer dessas capitais. Segundo ponto: O PT [Partido dos Trabalhadores] teve 17 milhões e 55 mil votos, ou seja, menos de 200 mil votos a mais. O PSDB é que teve número elevado, precisamente em função da cidade de São Paulo. Então, em número de votos, o PMDB ainda é um grande partido. Quando eu falava da chamada capilaridade e dizia: “Olha, se nós queremos ter um projeto, nós precisamos começar já” é exatamente para multiplicar esses votos e ter, digamos, uma conexão com a sociedade, principalmente com a classe média. Eu sinto que a classe média está um pouco, digamos, desalinhada tanto do PT como PSDB.  É a impressão que eu tenho.

Fernando Rodrigues: Qual a maior cidade governada pelo PMDB hoje no Brasil inteiro? 

Michel Temer: Goiânia. E tivemos uma vitória expressiva em Santos.

Luiz Carlos Azedo: Vou fazer uma pergunta aqui, estou tentando. Está difícil.  É o seguinte: O PMDB é um grande partido. A estratégia do governo foi montada considerando isso e apostando nas vantagens para o país de uma aliança com o PMDB.  Agora, o PMDB está se descolando do governo. De certa maneira paralisou o Congresso, quer dizer, o movimento de obstrução que está sendo feito pela bancada do PMDB, parou o Congresso, eleições acabaram, o Congresso continua sem votar... Quer dizer, é um cenário de desarticulação política do governo, de desestabilização do governo do ponto de vista da sua capacidade de aprovar os projetos, de governar com apoio político.  Essa decisão de o PMDB de passar para a oposição, ela vai ter conseqüências institucionais para o país, porque o quadro tende a se agravar. Isso está sendo pesado pelo PMDB? O PMDB está apostando, torce pelo governo dar certo ou para dar errado?  Está apostando num impasse político, está... Enfim, porque a pressão que o PMDB está fazendo contra o governo é muito forte. O senhor vai ter uma conversa com o presidente do PT [referindo-se a José Genuíno, deputado federal por São Paulo entre 1982 e 2002. Renunciou ao cargo em 2005 envolvido em denúncias de corrupção], pelo menos os jornais estão anunciando isso. Com o ministro Aldo [Aldo Rebelo, deputado federal eleito por São Paulo, presidente da Câmara dos Deputados entre 2005 e 2007. Ex-ministro da Coordenação Política] , e parece que o senhor ia ter um encontro com o Genuíno também.

Michel Temer:  [interrompendo] Com o Genuíno eu já tive.

Luiz Carlos Azedo: Com o ministro Aldo. Como é essa coisa vai se administrada? Porque não é só... Eleição de 2006 é em 2006, temos que chegar a 2006. Como é que, responsavelmente, a cúpula do PMDB está administrando essa pressão? 

Michel Temer: Olha, Azedo, em primeiro lugar, a chamada governabilidade, quer dizer, o governo não fez  aliança com PMDB para assegurar governabilidade. Eu até confesso, se nós tivéssemos feito isso em dezembro, antes de posse do presidente Lula, quando eu falei em coalizão, é muito possível que a intenção do PT e do governo tivesse sido esta.  Na verdade...

Teresa Cruvinel: [interrompendo] Mas foi só para ter os cargos, então? Não entrou para o governo para assegurar a governabilidade, então, entrou para quê?

Michel Temer: A intenção, exatamente... O pacto com o governo foi alinhar o PMDB no plano parlamentar, quer dizer, trazer os votos do PMDB no plano parlamentar. O PMDB não participa das políticas públicas do governo, tem pasta da Previdência Social e pasta da Comunicação Social...

Teresa Cruvinel: Não foi em busca da governabilidade? 

Michel Temer: Não. Foi no plano parlamentar.  E estou dizendo isso, Teresa, porque na verdade, ainda que nós saiamos do governo, nós vamos assegurar a governabilidade.  É que se tem uma idéia no país equivocada de oposição.  A idéia que a  oposição mesma tem de oposição é que se ela perder eleições tem que opor se radicalmente em relação a todas as teses do governo. Quando a idéia de oposição depois das eleições é exatamente uma idéia de quem vai ajudar a governar.

Luiz Carlos Azedo: O que o PMDB está fazendo no Congresso é isso, obstrução. Está se opondo a todos...

Michel Temer: [interrompendo] Não. Eu vou responder a você. Não é o PMDB que está fazendo isso, não. O PMDB e todos partidos da base. Por razões, vou logo botar o dedo na ferida. Razões das chamadas emendas orçamentárias.

Luis Carlos Azedo: O senhor acha certo isso, faria isso? 

Michel Temer: O que eu quero registrar é o seguinte: a lei orçamentária é uma lei, e você sabe que, pela Constituição, todas as leis têm que ser cumpridas. É interessante, de vez em quando, se fala na história do orçamento impositivo ou orçamento autorizativo e não há nenhum trecho da Constituição que diga que lei orçamentária não precisa ser cumprida. E quando eu falo na lei orçamentária, e quando os parlamentares falam na lei orçamentária, estão falando de algo que é por si próprio, por definição constitucional, impositiva. Está numa lei. O que o governo faz? O governo contingencia determinadas verbas e não libera emendas. O que o parlamentar faz. O parlamentar promete para a sua base, promete para os prefeitos da sua região: “Olha, eu consegui a verba lá etc...".

Paulo Markun: [interrompendo] Ele age como se fosse um despachante? 

Michel Temer: Lamentavelmente.

Paulo Markun: O que eu queria ouvir do senhor... Qual é a opinião do senhor? Se o senhor concorda com isso? Desculpa, não é função do mediador. Eu acho isso de um absurdo, a atitude dos parlamentares e do governo. E nós assistimos isso. 

Michel Temer: Me permita, complementando aqui a respostado do Azedo, esta não é a única razão que paralisa os trabalhos do Congresso. É que há pelo meio a questão política que é a reeleição. Eu boto o dedo na ferida também, que...

Luciano Suassuna: [interrompendo] Na reeleição do presidente da Câmara e do Senado.

Michel Temer: Sim, sim. É que se diz, muitas vezes, que o governo entrou nessa história. Eu acho que é mais um equívoco porque... Eu vou ser pretensioso aqui, mas se eu pudesse dar um conselho pro governo. Eu diria: “Olha, não se meta na coisa interna do poder legislativo. Primeiro porque a Constituição diz que os poderes são independentes entre si. Então, certas matérias são internas de interesse do poder legislativo”. O governo não deve entrar nisso. Deu uma confusão, especialmente no Senado, não é?  E essa confusão, que é política, ajudou também a paralisar os trabalhos da Câmara e do Senado.

Paulo Markun: Por falar em paralisar os trabalhos, vamos fazer rápido intervalo e já voltamos. 

[intervalo]

Paulo Markun: Estamos de volta com Roda Viva, esta noite entrevistando o deputado Michel Temer, presidente nacional do PMDB.  Eu recoloco as perguntas de telespectadores, Adriano Reis, de Porto Alegre, economista, pergunta se o PMDB vai ter um projeto de governo já que hoje parece um partido de aluguel? Sandra da Silva Santos, da cidade Dutra, de São Paulo, professora, diz o seguinte: só existe projeto próprio se este projeto atender necessidades de população”. E, finalmente, Luís Carlos Legal, presidente do diretório municipal do PMDB de Bebedouro, disse que gostaria de perguntar se partido consultará os diretórios municipais a respeito do rumo que o partido vai tomar em 2005? Se isso não seria mais democrático?

Michel Temer: Me permita completar duas respostas: uma para o Azedo e uma para Teresa Cruvinel e também para o telespectador. Primeiro, dizer ao Azedo, também, que outra razão que paralisa os trabalhos é o grande número de medidas provisórias. Esta história das medidas paralisarem os trabalhos, hoje são 25 na pauta, estão paralisando os trabalhos da Câmara, portanto é uma conjunção de fatores. E a Tereza, ela tem razão. No intervalo, nós comentávamos que não respondi a história de fazer aliança com PSDB, não fazer com o PT, mas com o PSDB na frente. Eu acho o seguinte: a tese central, Tereza, é que o PMDB vai ter o seu projeto. Essa é a tese central. Quando eu falo em organizar primárias nos estados, você vê que é para ter candidatura própria. Mas se você me disser: “Você tem absoluta convicção do que vai acontecer adiante na convenção”?  É difícil, tanto nesta convenção como daqui a um ano, um ano e meio... então, de qualquer maneira, eu acharia útil, digamos assim, que nós zerássemos esse jogo neste momento para que o PMDB tivesse liberdade absoluta.  Pode ser que até lá para frente que haja uma coalizão com o PT.

Teresa Cruvinel: Mas hoje o senhor não negociou uma aproximação com PSDB? O senhor pessoalmente, inclusive?

Michel Temer: De jeito e maneira, aqui em São Paulo...

Teresa Cruvinel: O senhor é o mentor e o executor de uma política de reaproximação com PSDB, por isso, levantou, o senhor foi o primeiro a levantar, essa proposta e a liderar esse movimento de afastamento do governo Lula, né? Então, quer dizer, hoje o senhor assegura que não está fazendo isso porque tem um negócio paralelo com o PSDB?

Michel Temer: Não. Sem embargo de uma ou outra notícia, que diz que eu acertei com o Serra [José Serra, político do PSDB, candidato à presidência da República em 2002, eleito governador de São Paulo em 2006], aqui em São Paulo, né? Uma participação no governo municipal e com isso abandonaria o governo federal.

Teresa Cruvinel: Isso mais no futuro também.

Michel Temer: Não, há [fazendo o gesto de negativo com a cabeça]. Não há negociação nenhuma. Agora, o que eu devo dizer a você é que não sei o que vai acontecer daqui a um ano, um ano e meio.

Teresa Cruvinel: Pode ser que vocês venham a se aliar, como pode apoiar o PT também?

Michel Temer: Claro, mas aí é uma coalizão. São dois partidos. Esta é coisa civilizada que se faz politicamente. Você faz uma coalizão de dois partidos que trabalham juntos para chegar ao poder e depois juntos vão governar. O que PMDB se cansou foi de ser adesista e ser um satélite dos partidos.

Fernando Rodrigues:  [interrompendo] O PMDB não teria a vaga de vice-presidente, nesse caso?

Michel Temer: Nem quero tratar desse assunto. A coalizão pode ser até com o PMDB na cabeça de chapa. Num sistema partidário que tem 30 partidos, você recusar hipótese de aliança é um pouco irreal, mas eu queria responder em atenção aos telespectadores, né?

Paulo Markum: Sim, exatamente.

Michel Temer: Você veja, eu acho que são todos peemedebistas. Alias, o Leal eu conheço, é o presidente de Bebedouro. Todos eles têm esta preocupação: nós vamos ter mesmo um projeto próprio? E tem razão, projeto próprio não significa apenas ter candidatura, por isso que ao longo da nossa conversa, o PMDB diz: o PMDB quer formular propostas para o país.

Paulo Markum: [interrompendo] Aliás, se a gente verificar, desculpe interrompê-lo, se a gente verificar a história do MDB, que é antecessor do PMDB, ele justamente começou a ganhar consistência quando ele estabeleceu um programa que tinha a ver com a redemocratização, com a abertura e a partir daí. Não foi quando teve... Naquela época nem tinha candidato à presidência porque não se poderia votar. Eu fico pensando que pedaço da sociedade brasileira o PMDB vai representar?

Michel Temer: Acho que a classe média, talvez esteja equivocado, mas eu tenho a impressão de que  a classe média hoje estaria órfã. Você sabe que dados revelam que quase 2 milhões de pessoas deixaram a classe média e foram empobrecidas. Esta gente quer uma mensagem. Eu creio que o PMDB pode ser autor dessa mensagem, nós começamos estudos nessa direção. Não sou eu apenas, até nesse particular do nome viu, Markun, você sabe que uma das teses que surgiu foi voltar à denominação MDB? Quer dizer, o novo MDB seria o velho MDB. Quércia [Orestes Quércia, uma das maiores lideranças do PMDB, ex-governador de São Paulo] tem falado isso, o Pedro Simon [político do PMDB, ex-governador do Rio Grande do Sul, senador da República], tantos líderes têm falado nesse tema, né, que é a recuperação daquela mensagem do MDB.  Eu reconheço, o PMDB feza  redemocratização do país. Isso ninguém nega. Depois se perdeu, chegou a ocupar muitos cargos no executivo, maior bancada no legislativo. E descuidou-se, digamos assim, dessa mensagem para a sociedade. Isto é que criou esse problema, embaraço que os peemedebistas do Brasil inteiro hoje perceberam. Aliás, eu vou consultar... Há uma pergunta aí, os diretórios estaduais vão ser consultados [referindo-se a uma pergunta anterior], portanto, os estaduais vão consultar os militantes de todos os estados.

Luciano Suassuna: Agora, presidente, muito da imagem de um partido e a imagem das suas figuras centrais... E esse é um problema no PMDB, são figuras centrais muito diferentes entre si. Quer dizer, imaginar que é partido que tem o presidente do Senado, José Sarney, o ex-governador Requião [Roberto Requião, prefeito de Curitiba de 1986 a 1988, secretário do Desenvolvimento Urbano do Paraná de 1989 a 1990, governador do Paraná de 1990 a 1994, senador de 1995 a 2002, governador do Paraná, de 2003 a 2006, quando foi reeleito], o ex-presidente Itamar Franco [governou o Brasil entre outubro de 1992 e janeiro de 1995], agora, o ex-governador Anthony Garotinho [governou o estado do Rio de Janeiro e foi candidato derrotado à presidência da República em 2002, pelo PMDB], quer dizer, quem são essas lideranças e o que vai aparecer? 

Michel Temer: Eu acho que a cara, Luciano, tem que vir por meio de um projeto para o país, esta há de ser a cara do PMDB...

Luciano Suassuna: [interrompendo] São projetos diferentes. O projeto do governador Garotinho é muito diferente do governador Requião.

Michel Temer: Sim, mas pode ocorrer que, quando nós aprovarmos um programa, um projeto para o PMDB, todos estejam aderindo a este programa, porque senão voltaríamos ao tema do “caciquismo” e eu confesso a você que tenho horror ao “caciquismo”. Porque é uma coisa que destrói os costumes nacionais. As pessoas têm que se reunir em torno de umas pessoas que proponham algo para o país. E quem tem que propor esse algo há de ser o partido. O candidato há de levar a mensagem do partido. Quando se fala em reforma política [coloca a mão no queixo], eu costumo dizer: “Uma das principais teses da reforma política seria caracterizarmos a idéia de partido político”. Porque nós temos, e falo com muita tranqüilidade, o que nós temos são muitas siglas partidárias no país e não temos partido. Partido é idéia de parte, de parcela da opinião pública que se reúne em torno de uma idéia para se chegar ao poder e implantar esta idéia. Então, nós temos que caminhar para isso. Quando você diz: “tem muita gente”, é verdade, tem muitas lideranças regionais. O que nos estamos querendo é no, plano nacional, reunificar essas lideranças nacionais. Veja que eu fiz a reunião dos governadores e houve consenso, não houve divergências entre os governadores, né?  Faço a reunião dos diretórios estaduais, há um número imenso de diretórios que, de uma forma avassaladora, querem caminho próprio para o PMDB. Agora, você pode me perguntar: “Bom, mas o PMDB vai para um caminho próprio”?  Eu torço por isso. Pode ser que a tese não seja majoritária no dia 12, quer dizer, eu não quero antecipar concepções.

Paulo Markun: O presidente do PT, José Genuíno, está correndo atrás da bola para evitar que isso aconteça.

Michel Temer: Claro, aliás, muito delicadamente, ele foi a mim e me disse que, como presidente do PT, ele iria sustentar a necessidade do PMDB integrar a base governista. Eu recebi um telefone também muito cordial do ministro Aldo Rebelo que quer conversar sobre essa permanência. Nós vamos conversar. Eu terei pouco a dizer, mas vamos conversar.

Luciano Suassuna: Presidente, vocês fizeram um grande acerto com o PT no começo do ano, depois veio a prefeita Marta Suplicy, aqui no Roda Viva, e disse que o PMDB não era confiável. Agora o senhor está, em outros termos, não sendo assim tão duro, dizendo as mesmas coisas, dizendo que o governo não foi confiável.

Michel Temer: Não. Você sabe que essa indelicadeza eu não cometeria. Eu torço pelo governo e eu acho que torcer pelo governo é um dever de todo brasileiro, especialmente de um dirigente de um partido como eu sou. Eu ia dizendo, há pouco, que idéia de oposição não é a idéia de quem vai se opor radicalmente. Quando as teses forem boas, nós vamos aprovar, quando forem ruins vamos criticar. Este é o papel da oposição, é para ajudar a governar. A oposição eleitoral é diferente da oposição durante o governo, é oposição administrativa. Oposição eleitoral é quando dois ou três setores fazem uma pregação para chegar ao poder, aí é embate eleitoral, depois disso, tanto situação como oposição, só existem para fazer o país prosperar.

Teresa Cruvinel: O senhor disse que, em dezembro, na convenção, o PMDB vai aprovar projeto para o país..

Michel Temer: [interrompendo] Vai começar estudar um projeto para o país.

Teresa Cruvinel: Vai aprovar. Outros estão dizendo que vai aprovar, que está em elaboração?

Michel Temer: Há um engano.

Teresa: Mas passa por uma concepção diferente, um modelo diferente, modelo econômico ou política econômica diferente da que está sendo aplicada pelo governo atual?

Michel Temer: Basta falar da repactuação federativa para você verificar que é radicalmente diferente, ou seja...

Teresa Cruvinel: [interrompendo] Mas esse é um problema que não vem só deste governo. É um problema da carga tributária, da distorção federativa... é um problema mais histórico? Eu estou perguntando política econômica mesmo, que essa aí, também é continuação da outra [sendo interrompida]. O PMDB vai propor o quê de diferente do governo que está aí e da proposta tucana [do PSDB]?  Quer dizer, vocês querem ser alguma coisa diferente dos dois. Para ser um projeto de poder tem que se diferenciar do PT e PSDB, que são as forças mais predominantes. Hoje a eleição municipal apontou isso claramente. Como se diferencia o PMDB

Michel Temer: Nestes tópicos, Teresa nós vamos propor firmemente a idéia do desenvolvimento. Você poderá dizer: “Bom, mas o PT também quer desenvolvimento, PSDB quis desenvolvimento”, mas nós devemos registrar que hoje, mesmo internamente... Olha o Jornal O Estado de S. Paulo hoje [ele] traz uma longa matéria sobre economistas do PT que criticam a política econômica. Há um membro que até é filiado ao PMDB no governo, que é o presidente do BNDES [Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social]. Não foi indicado pelo PMDB, mas é um nome ilustre do PMDB e faz críticas à condução da política econômica, né? Então, eu acho que nós vamos ter a tese do desenvolvimento, vamos dar os parâmetros para esta tese do desenvolvimento que envolve necessariamente uma redução da carga tributária. Eu estou falando aqui do óbvio, as pessoas vivem falando disso, mas nós queremos apresentar dados concretos para tanto. A renda do brasileiro vem caíndo acentuadamente ao longo do tempo. Estou dizendo também uma obviedade, mas sem embargo de cair a renda... Por exemplo, eu vejo que nos acordos com o FMI [Fundo Monetário Internacional], o superávit primário acordado com o FMI, por exemplo, é de 4.5 o superávit secundário 5.5, este um ponto a mais significa uns bilhões de reais. Estes bilhões de reais, ao invés de serem aplicados em infra-estrutura, desenvolvimento etc, são mantidos como superávit em função desse acordo. Então, eu tenho a impressão que nós podemos propor uma tese de desenvolvimento com dados concretos e aí eu acho que nós vamos nos diferenciar. Quando nós propomos repactuação do pacto federativo parece que não é importante, mas é importantíssimo, porque os estados e municípios recebendo por si próprio os recursos tributários, eles têm melhores condições para promover também este desenvolvimento local.

Paulo Markum: Deputado, o PT se vangloria de ter o chamado modo petista de governar, que é um sistema que aparentemente pode ser aplicado em Porto Alegre, Recife em Belo Horizonte ou no interior da Bahia, alguns princípios que envolvem orçamento participativo, entre outras coisas, enfim, várias propostas. O PMDB governa vários estados, seis estados, existe um modo peemedebista de governar?

Michel Temer: Não, exatamente peemedebista, não.

Paulo Markun: E tem um traço de união?

Michel Temer: É exatamente isso que estávamos discutindo aqui, o Suassuna levantou esse tema. Quer dizer, como o PMDB hoje não tem um programa próprio, uma mensagem identificadora do partido, cada governador, digamos assim, governa a seu modo. A idéia é que nós possamos exatamente dar esta unidade de pensamento.

Paulo Markun: Mas se a gente usar, vamos dizer assim, a metáfora do organismo, que é aonde a capilaridade faz sentido... Capilaridade seria um sistema de conexão que faz com que determinada coisa que acontece na cabeça chegue no dedão do pé e funcione. Fico pensando como se constrói isso ao contrário, quer dizer, depois de ter um partido, que é uma federação de interesses, que é... E é por isso que, na minha avaliação, é a pujança do PMDB, quer dizer, permitir que em Santa Catarina tenha um jeito, no Paraná tenha outro, no Rio Grande do Sul tenha outro e assim por adiante, e estas liderança regionais estruturem os seus partidos locais, como é que se inverte o processo e coloca: “Não, a partir de agora nos vamos seguir todos para esse rumo”. Quer dizer, não é mais difícil colocar o carro na frente dos bois?

Teresa Crevinel: Como convencer... ter um governador estatizante como Requião e tem um partido com uma pendência? Não sou especialista no seu partido, mas acho que ele tem uma tendência liberal predominante... você tem tendências estatizantes como isso que o Markun está falando. Como é que vai enquadrar isso, agora? Como vai homogeneizar o que já é diferente por natureza?

Michel Temer: Você sabe que Markun tem razão, não é fácil fazer esse movimento, Teresa. Agora, o PMDB, convenhamos, nasceu como um movimento. Ele era...

Paulo Markun: [interropendo] Ele era uma federação, desde o ínicio.

Michel Temer: Nasceu como federação e subsistiu como federação ao longo ao tempo.

Teresa Crevinel: [interrompendo] Foi no tempo da ditadura.

Michel Temer: Agora, hoje o que está se vendo é que a realidade política mudou. E você tem que mudar realidade interna do partido para poder até sobreviver...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] O senhor não acha que um partido como o PMDB não ficou obsoleto com o fim da ditadura. O senhor não acha que foi difícil para ele existir dessa forma? Porque também da forma como o Markun está dizendo, a gente assiste isso há anos, enfim, um grupo dizer que quer sair do governo e outro grupo dizendo que quer ficar.  Agora, ocasionalmente o senhor está no grupo que acha que é melhor sair e outros estão querendo ficar e depois volta e fica. Dificilmente haverá conjunção de opiniões.

Michel Temer: É, Fernando, corre o risco de ficar obsoleto. Quando nós fazemos esse alerta hoje é em função dessa circunstância. Se ele não se modernizar, se ele não atualizar, ele corre o risco de tornar-se superado. O simples fato de não termos tido votos em grandes cidades do país revela um pouco isso...

Fernando Rodrigues: Não é melhor, então, o grupo do senhor formar uma agremiação separada, independente? 

Michel Temer: Não. Nós nascemos no PMDB, crescemos no PMDB, toda a minha vida está ligada ao PMDB, não é?

Paulo Markun: É a única filiação do senhor?

Michel Temer: É a única filiação minha. Eu não teria condições. Eu prefiro lutar dentro do PMDB.

Luiz Carlos Azedo: Deputado, três candidatos que o PMDB poderia ter, lideranças que pudessem promover essa mudança de posição, e com respaldo eleitoral, nacional... Porque o PMDB é um partido que tem caciques regionais e que, de certa maneira, tem influência e que a ainda controla um partido, e lideranças populares, que também são regionais. Quer dizer, no que tem governadores, mas quem poderia liderar o partido para essa postura nova aí?

Michel Temer: Olha, Azedo, eu acho que nós temos... Todos os governadores têm condições para isso. Todos os governadores. Nós temos...

Luiz Carlos Azedo: [interrompendo] Candidato, Garotinho era um nome que estava aí, era bola a vez. Com esse resultado lá no Rio já não tem o mesmo fôlego que tinha.

Michel Temer: Garotinho é um nome e veja...

Luiz Carlos Azedo: [interrompendo] Mas ele une o PMDB? Porque o PMDB tem tradição de cristianizar os candidatos. Lança um candidato depois todo mundo faz seu acordo, apóia outro por baixo dos panos, fez isso com Ulysses, fez com Quércia.

Michel Temer: É verdade. É verdade... e olha que são expressões maiúsculas do partido que, entretanto, tiveram uma votação muito pequena exatamente em função dessa circunstância. O que nós queremos acabar é com isso. Nós queremos ver se nós despertamos um certo, digamos, patriotismo no PMDB. Você fala do Garotinho, por exemplo... o Garotinho foi um candidato que teve 15 milhões de votos no país, o governador Requião, o Rigoto [Germano, foi governador do Rio Grande do Sul] ... todos eles têm presença nacional. O que um deles diz lá, ganha logo espaço na imprensa nacional. O presidente Sarney foi presidente da República, um presidente que ajudou a redemocratizar o país, tem presença hoje.

Luiz Carlos Azedo: O vice-presidente, Itamar.

Michel Temer: Presidente Itamar, sem dúvida alguma.

Luiz Carlos Azedo: Mas nenhum deles une o PMDB.

Michel Temer: Perdão?

Luiz Carlos Azedo: Nenhum deles une PMDB. Esse é o problema.

Michel Temer: Se o partido tem essa convicção, eu me sento na cadeira e digo assim: “Não vou fazer nada aqui, por que o PMDB não é reunível” [ri], não dá...

Luiz Carlos Azedo: [interrompendo] Quem vai unir PMDB?

Michel Temer: Você sabe que é um movimento paulatino, por isso que não fiz uma ligação, uma reunião de todos dos PMDB. Primeiro eu fiz uma conversa com governadores, conversei com governadores, depois conversei com os diretórios estaduais, agora serão unidos. Você viu o presidente do diretório municipal querendo ser consultado. E quando nós fizermos toda essa mobilização, e veja que nós temos dois anos e pouco para a próxima eleição, então nós teremos tempo para isso. Eu acho que o momento é do PMDB e se nós tivéssemos coragem para enfrentar essas realidades…

Luiz Carlos Azedo: [interrompendo] A sensação que passa é a seguinte, percepção: se o partido quer romper com o governo, quer ter candidato próprio e não tem um nome, essa coisa não tem... não é pra valer. Não é palpável. Parece que o partido está fazendo um jogo.

Michel Temer: Mas não está, não está. Olha, eu até vou dizer a vocês...

Luiz Carlos Azedo: [interrompendo] Para colocar o presidente Lula numa posição mais...

Michel Temer: [interrompendo] Eu conheço a opinião da imprensa e até dou razão porque a imprensa pensa dessa maneira que são antecedentes do PMDB. Nós queremos exatamente eliminar isso. Não estamos propondo aqui hoje, estamos discutindo não ampliar espaço do PMDB, é perda do espaço do PMDB, em tese é isso: eliminar a curto prazo pra ganhar em médio prazo. Esta é a idéia que pauta hoje o PMDB. Se você me disser: “Bom, mas você vai conseguir isso? Vocês vão conseguir”?  Eu acho que sim. Se eu não achasse, não iria fazer esse movimento. A idéia é que sim, a sensação.

Luiz Carlos Azedo: Eu me lembro de ter conversando com colegas e a impressão predominante é o seguinte: que PMDB está insatisfeito em participar da base do governo porque ele quer participar do centro do governo, quer participar do poder, ter uma participação efetiva, porque o governo do presidente Lula é um governo do PT e o PMDB quer que seja um governo de coalizão e que ele também tenha participação nas decisões principais. Essa é a sensação que passa e não é ilegítimo isso, numa ordem democrática, isso é legítimo?

Michel Temer:  Eu acho que legítimo é. Ilegítimo é a tentativa de buscar mais espaço pelo espaço.  Então, quando eu disse aqui: “Olha, no começo do governo, poderiam ter feito uma grande coalizão, coalizão governamental que iria redundar até numa coalizão eleitoral”, não há dúvida disso.

Paulo Markun: Mas o PT não quis, né?

Michel Temer: O PT não quis. A verdade é que isso ficou acordado lá na sala do partido. O ministro José Dirceu esteve comigo, fez todos os esforços. Devo registrar isso em relação ao ministro José Dirceu, e acho que ele tinha convicção absoluta que era fundamental a presença do PMDB, mas depois, quando levou aos demais companheiros do partido, ao governo, enfim, ele não pôde fazer prevalecer a sua opinião. É por isso que a coalizão não se deu naquele momento. 

Paulo Markun: Deputado, então vamos fazer mais um rápido intervalo a gente volta daqui instantes. 

[intervalo]

Paulo Markum: Estamos de volta com Roda Viva, esta noite entrevistando o presidente nacional do PMDB, deputado Michel Temer. Vaílton Ferreira de Souza, de São Paulo pergunta o que impediu coligação do PMDB com Marta Suplicy? E Roberta Maria Silva, de Aricanduva, São Paulo  pergunta por o que senhor desistiu de concorrer à prefeitura de São Paulo e aliou-se à Luiza Erundina? 

Michel Temer: Olha, você sabe que a coligação com o PT aqui em São Paulo não se deu porque o PT não quis. A candidata à prefeita [referindo-se a Marta Suplicy], aqui, neste programa, acho que talvez por um equívoco de linguagem, disse uma coisa muito grave, nessa questão partidária. Disse que não confiava no PMDB. É claro que o PMDB daqui, Orestes Quércia, que é presidente do partido regional, creio que até estava disposto a fazer uma composição desde o que PMDB fizesse uma coalizão. A velha história da coalizão. Desde que, por exemplo, tivesse um vice, não é?  E o que os partidos querem, na verdade, é que PMDB adira, coisa que PMDB não quer mais fazer. Essa foi a primeira razão. A segunda razão é a referente à minha candidatura a prefeito. Eu fui pré-lançado à prefeito, até disputaria com muito gosto, mas é claro que há razões políticas em torno disso. Eu imaginava que entre os dois candidatos que estavam disputando naquele momento, eu poderia vir a ser alternativa em nome do PMDB, mas depois lançou-se candidato o José Serra, que seguramente passou a ser alternativa mais poderosa, tinha acabado de ser candidato à presidência de República e seria uma alternativa muito mais poderosa que realmente se consolidou, não é?  Foi exatamente o que aconteceu.  E eu, embora pré-candidato, acabei desistindo. Fizemos uma aliança com a Luiza Erundina, que era uma candidata, ao nosso modo de ver, eticamente correta. Ela impediria qualquer espécie de acusação ao PMDB do tipo: “Fez acordo com o PT porque vendeu tempo de televisão ou fez acordo com O PSDB porque igualmente vendeu o tempo de televisão”. Não, a Luiza Erundina não tinha sequer condições e qualquer...

Paulo Markun: [interrompendo] Por que o senhor acha que a candidatura dela e de vocês não decolou?

Michel Temer: Por uma razão seguinte... Aliás aqui eu até coloco em pauta a discussão sobre o segundo turno. Sabe que eu começo a achar que segundo turno passou a ser coisa inútil. Porque as pessoas começam a decidir o chamado voto útil no primeiro turno. Nesta eleição de São Paulo, e em tem muitas outras, as pessoas já optaram pelos dois candidatos, quem vai disputar?  São esses dois?  Então a opção é entre eles.

Luciano Suassuna: Ao contrário, também. Teve muita eleição municipal na qual o segundo turno foi decisivo para a prefeitura.

Fernando Rodrigues: Por exemplo, Fortaleza.   

Luciano Suassuna: Porto Alegre

Michel Temer: Mas a candidata já foi lá, lá já houve uma opção. Por exemplo, tanto em Porto Alegre ou em Fortaleza...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Mas no segundo turno não são mais raros os casos em que o segundo colocado passe o primeiro?

Michel Temer: Mas aqui em São Paulo, fundamentalmente e de uma forma avassaladora, a opção pelo voto útil se deu logo no primeiro turno. Aliás, aconteceu em relação à Erundina a Paulo Maluf, em relação a outros candidatos.

Fernando Rodrigues: Já que o senhor está falando da inutilidade do segundo turno e  sobre reforma política, o senhor estava falando alguma coisa... O senhor acha que os itens que, eventualmente, possam conjugar esforços ali dentro do Congresso para ser em aprovados, seriam quais? 

Michel Temer: Por exemplo, verticalização. Eu acho que é uma coisa que precisa acabar. Ela, por enquanto, é incompatível com a realidade política brasileira.  Até porque isso que nós estamos...

Teresa Cruvinel: [interrompendo] Se ela acabar fica mais difícil de unir o PMDB, porque aí...

Luiz Carlos Azedo: [interrompendo] Esse projeto aí vai, vai embora. Não sobrevive [o projeto] de unificar PMDB de ter uma candidatura própria.

Michel Temer: Não, não.

Fernando Rodrigues: Eu acho que o fim da verticalização favorece os partidos como o PMDB de existirem, que são divididos regionalmente, o senhor não acha?

Teresa Cruvinel: Favorece continuar como é.

Michel Temer: Sim, mas todos os partidos... Aqui é coisa maior, aqui não quero pensar apenas no tema do PMDB. É uma coisa de país. Não dá para você ter uma aliança nacional que obrigue [coloca a mão no queixo] as alianças estaduais.

Fernando Rodrigues: Por que não presidente Michel Temer? Veja bem, tem países que... Estados Unidos. A gente pode criticar tudo que tenha saído daquelas eleições lá, quem é democrata é democrata no meio, em Nevada, na Califórnia. Quem é republicano é republicano no país inteiro. Por que no Brasil não pode ser assim?

Michel Temer: Eu acho que haverá um dado momento que isso será possível...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Você acha que verticalização ajuda isso?

Teresa Curvinel: [interrompendo] Até funcionou em 2002, não funcionou em 2002? É, foi meio extemporâneo. Na época, eu achei extemporâneo porque o jogo já estava em curso, mas funcionou. 

Michel Temer: Não funcionou. Não funcionou porque os membros do PMDB, eu digo, PSDB, PFL [Partido pela Frente Liberal. Tornou-se Democratas em 2007] não obedeceram às determinações nacionais.

Teresa Cruvinel: [interrompendo] O PMDB sim, não funcionou, mas os partidos sobreviveram àquilo, e alguma coerência pode ter sido agregada ao sistema político. Agora, uma regra eleitoral para todos os efeitos, ela tem que ser adotada durante várias eleições seguidas para que ela vá se incorporando pela cultura política. Agora, se toda hora muda, não vai ter efeito nunca.

Michel Temer: Agora, Teresa, quando nós fizermos uma efetiva mudança política, sistema como o americano, dois ou três, quatro partidos, daí sim a verticalização vai funcionar. Enquanto nós tivermos 30 partidos como nós temos no país, a verticalização não impera.

Fernando Rodrigues: 27.

Michel Temer: É, são 27 partidos, né?

Fernando Rodrigues: Mas já fez algum efeito.

Michel Temer: Mas não vai resolver. Quando nós tivermos dois, três partidos.

Ilton Caldeira: Isso não poderia começar a mudar com a cláusula de barreira?

Michel Temer: Não. Você sabe, naquela reforma política tem um dispositivo, este muito sábio, que estabelece a chamada federação de partidos. Então, quando você faz uma aliança em determinado momento entre três ou quatro partidos, isso forma uma chamada federação de partidos. Aliás, quando vai para a cláusula do financiamento público etc, com o financiamento, tanto se daria para partidos políticos como para federações de partidos. Hoje, tanto na Câmara como Senado, você pode formar blocos partidários que subsistem enquanto houver interesse dos partidos. Nas federações não. Se você faz uma aliança federativa agora, durante as eleições, você tem que manter essa aliança durante todo o período parlamentar até a próxima eleição

Paulo Markun: Isso é uma proposta que não está ainda em vigor, né?

Michel Temer: Não, não está em vigor. Mas é o que está na reforma política e, por incrível que pareça, a reforma política foi ressuscitada lá no Congresso Nacional. Ela está em pleno debate.

Fernando Rodrigues: Na verdade, o que a gente houve falar é que verticalização vai cair mesmo.  Queria que o senhor falasse mais sobre isso, porque veja só: se cair a verticalização vai ser uma maravilha para o PMDB porque, realmente, vai deixar o Requião fazer as alianças dele, apoiar o candidato dele do PT de Curitiba, vai permitir que prefeito Íris Rezende [ex-vereador e ex-prefeito de Goiânia. Ex-ministro da Agricultura do governo Sarney e da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso], em Goiânia, possa fazer campanha contra o PT em Goiás, enfim... o fim da verticalização, na verdade, vai, pelo menos eu acho assim, queria o que senhor me contestasse, vai fazer com que o PMDB ficasse exatamente como os outros partidos já estão hoje, totalmente divididos. Não estou entendendo porque o senhor acha que fim da verticalização ajuda a melhorar o sistema partidário?

Michel Temer: Porque ele permite realidades locais. Estamos falando tanto em federações regionais, que nós estamos querendo desde já eliminar radicalmente essas possibilidades.

Fernando Rodrigues: Por que o país precisa de partidos regionais?

Michel Temer: Não são partidos regionais, mas posições regionais dos partidos.

Fernando Rodrigues: Não são partidos, são sublegendas, na verdade.

Michel Temer: Não, não são sublegendas. A realidade política nacional [juntando as mãos] tem revelado a necessidade, muitas vezes, de alianças nos próprios estados. Agora, se você tiver... Por que isso no PMDB tornou-se grave? Porque o PMDB deixou de ter candidatos à presidência da República. Se tiver um candidato à presidência da República, a influência nas localidades estaduais será muito maior. Agora, se lá precisar fazer acordo com PSL [Partido Social Liberal] e este PSL não está coligado com ele lá na área nacional, permitirá ao governador do PMDB ou de qualquer partido...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Por que PSL pode se aliar em Piracicaba [cidade do estado de São Paulo] ao PMDB e não se pode se aliar no governo federal? Se é o mesmo partido?

Michel Temer: Mas ele pode se aliar.

Fernando Rodrigues: Mas daí teria que seguir tudo pela verticalização. Por que um partido pode pensar uma coisa no município e não pode pensar nacionalmente a mesma coisa?

Michel Temer: Porque ações eleitorais são casadas, no município, não, mas nas eleições de governador, presidente, são casadas.

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Mais grave ainda. Por que um candidato ao governo não pode pensar a mesma coisa que o partido pensa a respeito do candidato à presidência? 

Michel Temer: Porque, na minha concepção, isso só terá possível quando tivermos um número menor de partidos. Enquanto tivermos essa gama imensa de partidos políticos, não há condições de pensar na verticalização.

Teresa Cruvinel: [todos falam ao mesmo tempo] Deixa só eu acrescentar um argumento aqui. Quem quer ter um projeto de poder, quer ter um candidato a presidente, quer o fim da verticalização, porque você quer amarrar aliados

Michel Temer: Mas você não amarra.

Teresa Cruvinel: Quando o senhor defende o fim da verticalização, além de ser contraditório com o seu trabalho, como o Fernando apontou, então o senhor está trabalhando inutilmente que é unir o partido para a eleição presidencial e rachar tudo nos estados depois. Mas, além de tudo, quem tem candidato à presidente, tem interesse em ter alianças também nos estados. Não vejo coerência nesse seu projeto de PMDB. Quer dizer: "eu quero ter candidato em 2006, mas eu quero o fim da verticalização. Vou deixar as regionais soltas por aí". Estou achando incoerente.

Michel Temer: Eu vou tentar explicar, pelo menos. Se você tiver candidato à presidência, o seu candidato à governador do estado... Porque a idéia é termos candidatos à presidência e a governadores de estados.

Teresa Cruvinel: Está livre até para não apoiar seu candidato à presidente. Quer dizer, candidato do PMDB do Rio Grande do Sul...

Michel Temer: [interrompendo] Você está tirando uma conclusão bem equivocada.

Teresa Cruvinel: Não.

Michel Temer: Se você tem candidato à governador do PMDB, ele vai apoiar o candidato à presidência do PMDB. Nós teremos até instrumentos disciplinares, para tanto. É claro que nós não chegamos a esse ponto, a partir de agora, nós vamos ter instrumentos disciplinares do PMDB que, se for o caso, é melhor que o sujeito saia do partido do que não obedeça as diretrizes do partido. O que ele pode fazer são alianças locais, mas como candidato próprio do PMDB, o fim da verticalização não atrapalha o PMDB, é incompatível

Paulo Markun: O Noé Ângelo de Mello, que é vereador do PMDB no Rio Grande do Sul, pergunta: se a decisão do partido for sair do governo e não for atendida pelos ministros do PMDB ou outros partidários com altos cargos, o partido pode tomar a decisão de expulsá-los do PMDB

Michel Temer: Em primeiro lugar, respondendo ao vereador, as conversas que eu tenho com os membros do PMDB que estão no governo é que eles cumprirão a determinação partidária. Mas vamos supor que não cumpram. Haverá métodos disciplinares [sendo interrompido] eu estava acabando de dizer isso, que haverá formas disciplinares que serão aplicadas pelo PMDB. Eu creio, Markun, que pessoas desse nível, ministros, presidente de uma autarquia, eles tenham atual tamanho político que se perceberam que se o PMDB não apóia o governo, que quer sair do governo, eles tomarão a providência por conta própria. Eu não creio que, na estatura de ministro, presidente de uma autarquia, vai esperar um processo disciplinar dentro de partido. 

Paulo Markun: Deputado, eu sou freqüentador da página do PMDB na internet e me incomoda muito uma coisa, tem um setor lá chamados "idéias". Você abre lá, tem três discursos, dois ou três artigos do senhor [risos]...

Michel Temer: [interrompendo] É coisa curiosa, me permita interromper, você veja a posição em que está o PMDB. Você viu o sorriso dos nossos colegas entrevistadores porque falou em idéias e quando eu venho aqui defender idéias...

Paulo Markun: [interrompendo] Mas eu só queria...

Michel Temer: Você tem toda razão, o sorriso é pertinente

Paulo Markum: É porque tem artigos do senhor e do Moreira Franco [governador do Rio de Janeiro entre 1987 a 1990] e ponto acabou. Não tem mais nada.

Fernando Rodrigues: Moreira Franco que renunciou à candidatura dele no segundo turno, você vê...

Paulo Markun: Segundo turno.  Então, eu fico pensando como é difícil essa proposta...

Michel Temer: [interrompendo] É, claro, claro, é difícil mesmo, Markun. É difícil. E eu mesmo estou falando dos sorrisos dos colegas da bancada. Isso é revelador. Eles estão trazendo aqui, verbalizando por meio do sorriso, a concepção que a opinião pública está tendo do PMDB. Isso reforça meu ânimo para dizer: “Nós precisamos dar caminho, identidade para o PMDB”. E identidade vem de idéia, né? E exatamente vem de "idéias". A idéia é essa, é dar identidade ao PMDB. Agora, o fato de ter... Aliás, uma crítica muito procedente que eu vou levar em consideração. O Marcos está aí, eu vou pedir para rever essa coisa dos artigos.

Paulo Markun: Então faz tempo, porque eu vou lá e vejo os mesmo artigos lá, semanalmente.

Michel Temer: A crítica é adequada.

Paulo Markun: Porque o PT, por exemplo, tem em sua página uma porção de idéias. Talvez não estejam sendo executadas tal como o próprio PT gostaria no governo dele, mas que tem, tem. O próprio PSDB tem, mas o PMDB não.

Michel Temer: O PMDB tem que ser uma alternativa. Isso que nós queremos, uma alternativa com identidade própria, com idéias.

Fernando Rodrigues: Deputado, voltando ao tema que é super enfadonho, até para o próprio telespectador: verticalização. Eu acho até que muitos não sabem o que é. Significa que o candidato a presidente da República, se ele tem apoio do PMDB, todos os candidatos a governador, só podem fazer aliança semelhantes àquela que ele fez para presidente da República. O senhor acha que essa tese, em vigor atualmente por decisão do TSE [Tribunal Superior Eleitoral], deve sair por decisão do Congresso. O senhor acha que, com este número de partidos, não é bom? Deveria ter menos partidos. Mas daí lhe pergunto: Qual é o caminho? O senhor acha que tem que ter menos partidos ou não é bom que todos existam? O que é que tem que ser feito pra haver menos partidos e partidos mais consistentes que possam, enfim, ter idéias claras com as quais os eleitores se identifiquem e que, eventualmente possam criar movimentos de liderança verdadeira para eles?

Michel Temer: Sem dúvidas alguma. Em primeiro lugar, não vamos derrubar a decisão do TSE, que só fez interpretar a lei e a Constituição que no artigo 17 diz que os partidos têm caráter nacional. Então, nós queremos é modificar a lei, não a ingerência contra a decisão do TSE. Primeiro ponto você e segundo ponto, eu tenho convicção absoluta que não podemos ter muitos partidos no país, por uma concepção...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Qual o caminho para isso?

Michel Temer: Reforma política.

Fernando Rodrigues: Como enxugar isso? Qual o primeiro item? A gente sabe que reforma política, vamos ser sinceros, é baboseira que a gente ouve anos a fio e não será aprovada nesses termos todos. Vai ser um item ou dois, no máximo, em cada dois ou três anos. O que o senhor acha que um ou dois itens que poderiam ser aprovados?

Michel Temer: A cláusula de barreira, por exemplo, cláusula de barreira, bem aplicada pode ser uma fórmula de invalidar os partidos políticos.

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Mas vai ser aplicada se nada for feito? 

Michel Temer: Ela precisa ser, digamos, talvez endurecida porque você, você não tem...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] A gente ouve justamente o oposto no Congresso, que ela vai ser amolecida.

Michel Temer: Precisamos aumentar a questão do impedimento do surgimento de partidos. Eu dizia há pouco ao Hilton que, na verdade, eu sou favorável aos partidos, que possam nascer no município, em alguns municípios, depois possam ganhar dimensão estadual e depois dimensão nacional.

Fernando Rodrigues: O senhor pode explicar para telespectador o que é cláusula de barreira e como o senhor entende que deve ser aplicada?

Michel Temer: Acho que a cláusula de barreira hoje, realmente está muito facilitada. Nós precisaríamos hoje...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Hoje são cinco por cento.

Teresa Cruvinel: Explica a regra.

Michel Temer: A reforma política reduz para 2%.

Paulo Markun: Só para explicar, o partido que não alcançar 5% dos votos nacionais...

Fernando Rodrigues: [interrompendo] Para deputado federal.

Paulo Markun: Não tem condições de existir.

Michel Temer: Não tem funcionamento parlamentar, né? E eu entenderia que esses partidos deveriam eleger um número maior de deputados para poder ter, em primeiro lugar, funcionamento parlamentar.  É preciso endurecer esta cláusula de barreira.

Teresa Cruvinel: Não é era melhor endurecer primeiro a regra que permite a criação, que é tão fácil? Depois do fim da ditadura, nós idealizamos de tal forma a lei orgânica do partido que hoje é muito fácil criar. A primeira providência não seria impedir o surgimento de novos? 

Michel Temer: Claro, aumentar o número...

Teresa Crunevil: [interrompendo] Isso exige reforma da lei partidária que nem está no projeto da reforma política.

Michel Temer: É uma grande reforma política, Teresa. É a partir daí que nós...

Teresa Crunevil: [interrompendo] Essa mudança aí, vedar o nascimento de novos partidos, agora está dando uma enxugadinha, era a primeira providência. E não está na reforma política endurecer as regras para a criação de partidos.

Michel Temer: O PMDB vai lutar por isso, trabalhar por isso. Eu acho que nós temos que trabalhar por isso. No dia em que nós tivermos três, quatro, cinco partidos no país... Eu não acredito que nós tenhamos mais do que cinco correntes de pensamentos no país. E essa idéia de partido...

Teresa Cruvinel: [interrompendo] Mas vamos naquilo o que Fernando falou e o senhor começou a responder. O que fazer para chegarmos a essa situação ideal?

Michel Temer: Você acabou de dar uma posição, que é dificultar. Outra é o funcionamento parlamentar para partidos que tenham um número muito mais elevado de deputados. A outra, financiamento público de campanha, se for aprovado, apenas para partidos regularmente constituídos e com um número significativo de presença, não só no parlamento, na Câmara e Senado, mas em todo o país, em todas as assembléias estaduais, em todos os municípios. E com isso, você valoriza... A idéia de federação. Idéia de federação de partidos. A federação de partido, eu ia dizendo, ela agrega muitas vezes quatro ou cinco partidos que vão ter que ficar juntos durante três anos e meio, quatro anos. Isso vai ensejar a possibilidade de um partido único. Então, três, quatro, cinco partidos unidos vão formar um único partido, não é?  Ou então se desfaz depois para formar uma nova federação, a federação de partidos. Este é o ponto muito importante da reforma política, porque se você... E, olha, eu vou fazer um parêntese [faz o gesto de parênteses] aqui. Eu tenho dito com freqüência: Um estrangeiro que chegue ao parlamento, ele olha uma votação e diz assim: “Interessante, aqui há três partidos no país, um que votou no governo, outro que vota contra e outro que vota alternativamente”. Quando vai examinar o quadro político partidário do parlamento, ele verifica que tem 18, 19 legendas que têm assento lá no parlamento. Então, a federação vai fazer com que partidos iguais permaneçam juntos durante três anos e meio, quatro anos e isso vai ensejar formação de partidos políticos. 

Paulo Markun: [interrompendo] Deputado.

Michel Temer: [interrompendo] Por aí se pode melhorar o quadro político partidário.

Paulo Markun: Vamos para mais um intervalo e a gente volta já.

[intervalo]

Paulo Markun: Estamos de volta com Roda Viva entrevistando Michel Temer, presidente nacional do PMDB. Fabiane Baldesser, de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, administradora de empresa, pergunta qual a opinião do senhor sobre a atual política externa do governo Lula, já que o país pode, hoje, enriquecer urânio e faz campanha para ter uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU e ainda pergunta se a população poderia ser consultada através de plebiscito?

Michel Temer: Eu não discordo da política externa do presidente Lula. De qualquer maneira, ele tem, primeiro o fato de ter sido eleito no país, primeiro operário que chega ao poder. Criou, digamos assim, uma aura de simpatia internacional. Acho que foi útil para o Brasil. Em segundo lugar, acho que ele faz muito esforço para propagar a imagem do Brasil e até trazer investimentos para cá. E, nessa busca de prestígio do país, cresce também a possibilidade do país ocupar uma vaga no Conselho de Segurança. Acho que o governo não está se descuidando desse fato. Acho o que governo está fazendo esforço para isso, está buscando apoios e não é improvável que venha a conseguir.

Paulo Markun: E a reeleição do presidente da Câmara e do Senado, o que o senhor acha? 

Michel Temer: Olha, o PMDB tomou posição sobre isso, reuniu a executiva, discutiu o assunto e resolveu optar pelo não apoio à tese da reeleição.

Paulo Markun: Apesar do presidente Sarney.

Michel Temer: Apesar do presidente Sarney. Eu, pessoalmente, tenho só palavras de elogios à figura e à gestão do presidente João Paulo [João Paulo Cunha, deputado eleito pelo PT, foi presidente da Câmara dos Deputados], e igualmente do presidente Sarney. No campo teórico, é claro que há alguma dúvida, porque se você autoriza a reeleição no mesmo mandato, e, olha, eu fui reeleito presidente da Câmara, mas fui reeleito em outro mandato. Em outro mandato, os eleitores são outros, são aqueles que chegaram para o próximo mandato. No mesmo mandato é sempre o mesmo eleitorado. A tendência sempre é a reeleição. Se você optar pela reeleição, talvez fosse o caso de optar por uma tese que estabelecesse que mandato é de quatro anos. O sujeito é eleito deputado e dirigia a Câmara por quatro anos.  Eu acho que seria mais isso.

Fernando Rodrigues: O que difere a tese da reeleição atual para presidente da Câmara e do Senado, com mandatos de dois anos, da tese da reeleição que foi esposada pelo PMDB em 1997, para reeleição de presidente da República? 

Michel Temer: Não entendi bem sua pergunta.

Fernando Rodrigues: Veja só, em 1997, o PMDB, maciçamente, apoiou a emenda constitucional que permitiu a reeleição do presidente da República, no caso beneficiando um presidente da República que estava em mandato e governador. E agora, o PMDB decide que é contra a reeleição dos presidentes da Câmara do Senado. Por que agora é contra e antes foi a favor?

Michel Temer: Porque são situações diferentes. Você está dentro do partido num corpo eleitoral de 500 e poucos membros e 80 e poucos no Senado. É diferente, a reeleição no país. Eu até confesso a você que eu patrocinei a tese da reeleição, não só agora. Eu já havia patrocinado durante a Constituinte de 1986 e 1988, mas hoje eu estou me convencendo que a reeleição não é útil.

Fernando Rodrigues: Para presidente?

Teresa Cruvinel: De quê?

Michel Temer: Para qualquer presidente.

Fernando Rodrigues: Presidente da República? 

Michel Temer: Eu acho que deve aumentar prazo de mandato para cinco ou seis anos e não permitir mais a reeleição. Eu não acho que reeleição tem que ser útil.

Fernando Rodrigues: Por que o senhor não acha útil? 

Michel Temer: Porque primeiro, você sabe que há, necessariamente, uma utilização do prestígio do cargo de prefeito, de governador ou presidente. Por sua vez, permanecer o prazo de quatro anos é pouco para o mandato. Um prazo de cinco ou seis anos seria um prazo em que o presidente, governador ou prefeito poderiam realizar suas tarefas sem utilizar, depois, direta ou indiretamente digamos assim, a máquina administrativa. Hoje eu sou favorável a essa espécie de projeto.

Luciano Suassuna: Mas a realidade mostrou o contrário. Com a reeleição, parece que a gente teve menos uso da máquina administrativa até porque teve a lei de responsabilidade fiscal. Quer dizer, todo um conjunto de ações que moralizaram mais as contas públicas, né?

Michel Temer: Sim, mas com a lei de responsabilidade fiscal, ela se aplica também no caso do sucessor.

Luciano Suassuna: Sim, se aplicará.

Michel Temer: Eu acho que presidente, governador, prefeito, sempre tem tal prestígio durante a sua gestão, salvo uma gestão calamitosa, desastrosa que ele consegue, em igualdade de condições...

Luciano Suassuna: De novo a eleição municipal não mostrou isso que o senhor está falando, Marta Suplicy fez uma boa administração, para quem herdou a prefeitura, e no fim perdeu a eleição.

Michel Temer: Mas se ela tivesse cinco, seis anos de mandato, continuaria com o bom governo e não se submeteria, ainda que fosse, à derrota. Acho que prazo alongado daria mais possibilidade ao eleitor e renovação da administração pública.

Paulo Markun: O senhor teve uma atuação marcante e importante na área de segurança pública, como secretário de Segurança. É um assunto que o senhor domina. O que está faltando, ou melhor, o que poderia ser feito para melhorar a situação de segurança pública no Brasil? Quem é que tem esta responsabilidade? 

Michel Temer: Olha, em primeiro lugar, é preciso acabar com o mito de que segurança pública é apenas competência do estado. É competência da União, do estado e do município [gesticuando].  Aliás, a União, por meio da Polícia Federal, está tratando de atuar intensamente na área de segurança pública. Eu acho até, sem embargo do ministro Márcio Thomaz Bastos, que está fazendo belíssimo trabalho no Ministério da Justiça, acho que hoje comportaria até um Ministério da Segurança Pública que se incumbisse da questão de segurança pública, por exemplo, fornecendo verbas para construção de penitenciárias federais em todo o país. Essa questão de falta de vagas no país é uma coisa atormentante para todos os estados brasileiros. Em segundo lugar, você precisa, digamos, estabelecer com as guardas municipais, e eu volto a dizer que a Constituição estabelece que as guardas municipais cuidem dos próprios municipais. E próprio municipal é escola, hospital, rua pública. Isso é próprio do municipal. Então, uma conexão absoluta entre o policiamento militar e guardas municipais que, em município como São Paulo, municípios maiores, tem que ser mais prestigiada por meios de recursos, ampliação de efetivos, ampliação de instrumental para trabalho, numa conexão entre o estado e o município. Eu até acho, hoje eu até vi a declaração do comandante da Polícia Militar daqui de São Paulo, com novos planos de policiamento, onde eu vislumbrei essa possibilidade de conexão com a guarda municipal. Eu acho que esse trabalho poderia ser feito com bons resultados para a segurança pública. Agora, não quero ignorar as causas sociais que levam um sujeito para marginalidade social, marginalidade socialmente, para a marginalidade criminosa, que é o número de desempregados, desavenças sociais, também redundam na insegurança pública. Você vê que hoje os povos, Markun, eles acabaram com conceito de segurança nacional para um conceito de segurança social. O que as pessoas querem é segurança social. Esta é uma questão que diz respeito muito de perto com segurança pública.

Luiz Carlos Azedo: Eu tenho uma bservação a fazer: se associou muito segurança pública ao autoritarismo, e defesa dos direitos humanos a um, vamos dizer assim, uma preocupação muito grande com a forma de atuação da polícia. E a oposição fez isso anos e anos, depois a oposição chegou ao governo e ela hoje é responsável pela segurança pública. Essa coisa está mal resolvida sob todos os aspectos, desde a questão lá da repressão política durante o regime militar que está aí. Caiu ministro da Defesa, agora está caindo secretário de... Como é?  De Direitos Humanos.

Fernando Rodrigues: Subsecretário.

Luiz Carlos Azedo: Subsecretário. Está uma coisa mal resolvida e, de determinado ponto de vista, anacrônico, essa questão da Constituição impedir uma guarda municipal de ter um poder de polícia mesmo, de prender, de autuar, de combater certo tipo de criminalidade...  Então, acho que não seria o caso de se promover uma, vamos dizer assim, uma reforma institucional nessa área de segurança pública, para redesenhar esse sistema? 

Teresa Cruvinel: Com o mesmo empenho dedicado às outras reformas, talvez.

Luiz Carlos Azedo: O governo pára de prender porque não tem mais vaga na penitenciária. Pára de prender. O sujeito era para estar preso, mas como não é muito perigoso, melhor não prender, porque não tem lugar para botar. Está acontecendo isso. O PMDB é um partido que tem força no Congresso e tem responsabilidade, por causa dos governadores do PMDB, com relação a esse assunto. Não seria o caso de se partir para uma rediscussão de tudo nessa área? Limpando, vamos dizer assim, essa discussão de certas abordagens ideológicas que tanto os setores mais conservadores têm, como os setores de esquerda também têm, uma visão um pouco distorcida do problema.

Michel Temer: Você sabe, que um dos fatores de governo Clinton [Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos de 1993 a 2001] foi que ele inaugurava, não o desejado, mas  diante da realidade, digamos perigosa, não havia outra solução, ele inaugurava uma penitenciária a cada três semanas durante sua gestão nos Estados Unidos, significando, portanto, que o governo federal entrou, lá nos Estados Unidos, nessa questão da segurança. E resolveria esse problema que você apontou muito bem, o acúmulo de detidos numa penitenciária e, muitas vezes, num distrito policial.

Luiz Carlos Azedo: E a justiça também funciona mal nessa área...

Michel Temer: Eu não diria isso, porque, muitas e muitas vezes, o que o juiz faz é aplicar a lei processual. Polícia prende, justiça libera, não é bem assim.

Luiz Carlos Azedo: Depois o soldado encontra o cara de novo, mata.

Michel Temer: Não é bem assim. Aí é preciso compatibilizar a questão da segurança pública com os direitos humanos. Quando eu fui secretário de Segurança Pública eu disse: “Não admito tortura em delegacia de polícia, a lei permite tortura? Não permite. Eu sou servo da lei. Não pode ter tortura, mas também não se trata bandido e criminoso com rosas na mão”.  Era uma frase que eu usava muito no sentido de que a toda ação, deveria corresponder a uma reação igual ou contrária.  Porque não vamos imaginar também que o cidadão policial, quando sai para seu trabalho, que ele não tenha problemas no enfrentamento da criminalidade, são problemas seriíssimos. Então, é preciso... é uma área difícil, cinzenta, essa história do combate à criminalidade e preservação dos direitos humanos, né [gesticulando]?  Então, o que acontece? A polícia tem que ser reativa, tem que reagir à violência do criminoso, mas não praticar, muitas vezes, barbaridades. Como muitas vezes a imprensa noticia.

Luiz Carlos Azedo: Sobretudo modelo institucional, esse modelo institucional aparentemente se esgotou, não dá conta do recado.

Michel Temer: E poderia ser modificado.

Luiz Carlos Azedo: Não dá conta do recado, fica o jogo de empurra e não dá conta do recado.

Michel Temer: E quando eu digo aqui: Olha, os três exemplos, três entidades federativas cuidam de segurança pública é exatamente para tentar harmonia das três atividades. Quando nós falamos: o  PMDB cuidará disso, criação do Ministério da Segurança Pública, poderia ser para coordenar estss atividades dos estados e dos municípios. Há uma outra tese, eu sou simpático a ela também, que é a tese da municipalização de segurança pública em municípios que tenham por exemplo mais de 500 mil habitantes. Nos Estados Unidos é assim e dá resultado. Quer dizer, o sujeito é muito mais próximo, muito mais próximo do município do que do estado. Então, a cobrança do povo em relação ao prefeito, é muito maior do que a cobrança, por exemplo, em relação ao governador. Para isso há emenda constitucional, projeto de emenda constitucional tramitando pela casa. O PMDB vai cuidar isso.

Paulo Markun: Deputado, o senhor é deputado federal desde 1987. Os cargos que senhor exerceu quando secretário Segurança Pública e secretário do governo, o senhor se licenciou do mandato, mas estava em pleno mandato. O que o motiva a ser deputado há tanto tempo? A gente que acompanha a cobertura do parlamento, a gente sabe que a Câmara dos Deputados é um salseiro danado, é "cotovelaço" por todo lado. É difícil conseguir espaço e perseguir alguns objetivos. O que motiva o senhor a ficar ali? 

Michel Temer: Sabe que a vida pública, Markun, ela é feita de circunstância né? O doutor Ulysses Guimarães era quem dizia: “Eu não postulo, eu me posiciono”. E o que tem acontecido ao longo do tempo é que eu fui para o legislativo, e, graças a Deus, eu fui bem no legislativo. Fui líder do meu partido duas vezes, presidente da Câmara dos Deputados duas vês. Hoje eu sou presidente nacional reeleito do PMDB, então a atividade legislativa, de alguma maneira, me seduziu pelas várias funções que eu exerci ao longo do tempo. Mas se você me perguntar: “Você gostaria de trilhar outro caminho”? Se as circunstâncias políticas permitirem, claro eu vou trilhar.

Paulo Markun: Muito obrigado pela sua entrevista, aos entrevistadores, à platéia aqui e na próxima segunda-feira estaremos aqui com mais uma Roda Viva. Uma ótima semana e até segunda-feira. 

Sobre o projeto | Quem somos | Fale Conosco