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Paulo Markun: Boa noite. Para dar início à chamada fase dois do seu governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou na semana passada o PPA, Plano Plurianual. É o ponto de partida para a mudança na política de transição, para uma política de crescimento econômico. O Plano Plurianual, que define as prioridades do governo no período que vai de 2004 a 2007, será agora submetido à discussão nacional. E o Roda Viva dá início a esse debate aberto hoje, entrevistando o cientista social e economista Guido Mantega, ministro de Planejamento, Orçamento e Gestão.
[Vídeo] [Imagens de Guido Mantega, Luiza Erundina, Lula, de reuniões políticas, da página do Ministério do Planejamento na internet] [Narração de Valéria Grillo]
Guido Mantega, italiano de Gênova que veio para o Brasil com pouco mais de dois anos de idade é formado em Ciências Sociais e Economia na Universidade de São Paulo, onde também especializou-se em orçamento. Ex-integrante da equipe de Fernando Henrique Cardoso no Cebrap [Centro Brasileiro de Análise e Planejamento] nos anos 1970, teve a sua primeira experiência em administração pública em 1988, dirigindo o setor de orçamento da Secretaria de Planejamento da prefeita Luiza Erundina, em São Paulo. Aproximou-se depois de Luís Inácio Lula da Silva, tendo papel de destaque nas campanhas como assessor econômico e um dos coordenadores do programa de governo do presidente eleito. Desde que assumiu o Ministério do Planejamento, Guido Mantega vem trabalhando na definição das ações de longo prazo do governo, estabelecidas agora no Plano Plurianual anunciado na reunião ministerial da semana passada. O documento é tido como peça chave do planejamento social e econômico do governo Lula, é a estratégia para o desenvolvimento do Brasil nos próximos quatro anos, mas é também um plano de longo prazo destinado a promover o crescimento através da expansão do mercado de consumo. O Plano Plurianual já pode ser conhecido pela internet através do site do Ministério do Planejamento www.planejamento.gov.br . São quatro prioridades, do curto ao longo prazo: reduzir a vulnerabilidade externa, fazer grandes investimentos em infra-estrutura, reduzir as desigualdades regionais e constituir um mercado de consumo. O Plano Plurianual vai ser apresentado ao Congresso no segundo semestre, mas também será submetido ao debate da sociedade através de 27 audiências públicas em cada um dos estados brasileiros.
[Fim do vídeo]
Paulo Markun: Para entrevistar o ministro Guido Mantega, nós convidamos Marco Antônio Rocha, editorialista do jornal O Estado de S.Paulo; Leonardo Atuk, editor de economia da revista Isto é dinheiro; Neli Caixeta, editora executiva da revista Exame; Maria Clara R. M. do Prado, colunista do jornal Gazeta Mercantil; João Carlos de Oliveira, editor de economia da revista e do site Primeira Leitura; e Marcos Augusto Gonçalves, editor de opinião do jornal Folha de S.Paulo. O Roda Viva, você sabe, é transmitido em rede nacional para todos os estados brasileiros e para Brasília também. E você pode participar do programa fazendo a sua crítica, mandando a sua sugestão, fazendo a sua reclamação, pelo telefone (0XX11) 252-6525; o nosso fax está aí na tela, (XX11) 3874-3454, e o endereço do programa na internet é rodaviva@tvcultura.com.br. Boa noite, ministro.
Guido Mantega: Boa noite, Markun.
Paulo Markun: Eu li, aqui, atentamente esse plano, "Brasil de todos", quer dizer, a síntese do PPA, que está disponível na internet, e queria já colocar em discussão uma questão que me parece a questão-chave, pelo menos do meu ponto de vista, que é: o que muda do governo anterior, do governo Fernando Henrique, para o governo Lula? Trata-se da questão de como financiar investimentos em infra-estrutura, como financiar o crescimento do país. O plano diz aqui, com todas as letras, que vai se procurar aumentar o investimento interno, quer dizer, se conseguir o dinheiro aqui dentro. E também, evidentemente, está claro, que não há menção, em nenhum aspecto desse plano, que não se farão privatizações. Agora, o Plano também admite que o cobertor é curto e diz que a questão central - se não me falha a memória - é definir as prioridades. Não é só, digamos assim, uma declaração de intenções? Não fica muito difícil colocar isso na prática e fazer passar esse nó? Quer dizer, o nó do Brasil não é justamente a falta de capital para investir em infra-estrutura, para dar o arranque aí, digamos, para que a gente tenha mais emprego, mais crescimento?
Guido Mantega: Bom Markun, em primeiro lugar, o que muda é que nós temos um plano e o governo anterior não tinha plano nenhum. Então, nós temos um projeto de desenvolvimento. Nós estamos reintroduzindo o planejamento econômico, que é algo que foi esquecido. O Estado, nesse planejamento, passa a ter um papel diferente: ele é indutor de investimento...
Paulo Markun: [Interrompendo] Ele assume responsabilidades.
Guido Mantega: Ele coordena, ele assume responsabilidades, ele estimula determinados setores que são prioritários, ou seja, o mercado não resolve uma série de coisas, resolve umas, não resolve outras. Então, o Estado tem um papel mais ativo: faz política industrial, política agrícola, política de desenvolvimento regional, também esquecida no país, e política social também, que não se revolve automaticamente. É um plano que prevê utilização de mais poupança interna do que a externa, porque a poupança externa é perigosa. Nós vimos, ao longo desses oito anos, o que aconteceu quando há turbulência externa e tudo mais. Então, nós temos que mobilizar a poupança doméstica. Não vamos fazer privatização, porque também não tem mais o que privatizar, porque já privatizaram tudo, acabaram com o capital. Não tem mais o que privatizar. Então, nós queremos atrair capital privado de outras maneiras: fazendo parcerias público-privadas. [Essa] É uma forma moderna de atrair o capital privado para obras de infra-estrutura, grandes rodovias, hidrovias, mesmo obras de energia elétrica, onde o capital privado se responsabiliza pelo investimento, e nós garantimos a rentabilidade. É um modelo novo, já foi usado em alguns países, por exemplo, a Inglaterra, a Itália utilizam essa modalidade. É bom, porque não endivida o Estado, não aparece na dívida pública, que é nosso constrangimento de hoje. Você sabe que hoje nós estamos lá, estamos no limite da dívida. O governo anterior gastou tudo o que podia, nos deixou a dívida e aí então é uma saída para você atrair o capital privado. É claro que, ao longo do tempo, outras saídas também serão postas em prática. A mobilização de um mercado de capitais, que não existe no Brasil, mercado acionário, acostumar as pessoas a fazerem aplicação no mercado acionário, e não só no mercado financeiro, as empresas conseguirem empréstimos através de debêntures [títulos de crédito de médio e longo prazos emitidos por empresas e vendidos a terceiros] e mobilizar os empréstimos do setor privado, que existem, mas que estão guardados nos cofres dos bancos. Os bancos, ao invés de colocar dinheiro para crédito, para investimento, para consumo, preferem só ficar nas operações de tesouraria, nas operações da dívida pública, e o crédito está muito pouco alavancado no Brasil, em linguagem técnica, que significa que o dinheiro fica parado.
[...]: Tem muito dinheiro no cofre.
Guido Mantega: Não se mobiliza.
Nely Caixeta: Ministro, como é que o governo pretende atrair esses investimentos? [Como o governo pretende] fazer com que o empresário tire seu dinheiro do banco? Como é que você vai competir, como governo, com os bancos que dão a melhor remuneração? Que garantia de retorno o governo pode dar para esse empresário que vai investir em uma ferrovia ou rodovia?
Guido Mantega: São dois movimentos: primeiro, baixando a taxa de juros, a taxa Selic [taxa overnight do Sistema Especial de Liquidação e Custódia; a Selic é a taxa básica de juros da economia anunciada pelo Comitê de Política Monetária, referência para todas as demais taxas de juros]. Hoje você faz um ótimo, excelente investimento, uma aplicação sem nenhum esforço, compra papéis do governo e ganha uma fortuna, mas se essa taxa cair, esse investimento será menos atraente; aí você tem que estimular o lucro através da produção, através do investimento produtivo, que é o que se faz na maioria dos países, é normal na maioria dos países. Então, essa é a primeira providência. A segunda providência para estimular o investimento privado é uma normatização. Eu acho que aqui no Brasil faltam regras claras para os investidores, para os aplicadores. Nós tivemos uma experiência ruim principalmente com o setor elétrico, onde o governo anterior tinha criado um modelo. O modelo não deu certo, no meio do caminho ele [o governo] mudou as regras, ficou uma salada e nos deixou de herança um pepino para administrar. Então, o que nós estamos fazendo agora é estabelecer as regras para o setor elétrico, porque, mesmo nesse setor, nós temos que atrair capital novo, porque o setor elétrico precisa ampliar a sua oferta de energia; a energia é um bem que se demanda cada vez mais, 4%, 5% a mais por ano. Então você tem que pensar a longo prazo. A curto prazo está sobrando energia, as empresas distribuidoras estão até reclamando que estão com prejuízo, mas daqui a pouco o país [estará] crescendo [e] você passa a absorver esse excedente, e aí você precisa de novos investimentos. Tem que olhar lá adiante, e nós já estamos tomado precauções para isso.
Marco Antônio Rocha: Ministro, o senhor tem, nas suas entrevistas... o senhor tem concordado, digamos assim, com essa atual política de juros. O senhor concorda que os juros, neste momento, nesta fase de transição, têm que estar neste patamar, embora o senhor defenda, como acabou de fazer agora, uma queda paulatina das taxas de juros, para que as pessoas deixem de investir em papéis do governo e passem a investir em outras coisas. Mas o nível da taxa de juros não é, digamos assim, determinado pelo governo brasileiro. Na verdade, nós estamos com essa taxa de juros altíssima por causa da crise cambial que tivemos no ano passado. Quer dizer, são as circunstâncias internacionais que determinam a taxa de juros no Brasil. Como é que o governo vai fazer para ela [a taxa de juros] cair?
Maria Clara R. M. do Prado: É, eu só queria pegar a carona na pergunta do Marco Antônio Rocha, e queria que o senhor explicitasse quais são as condições que o senhor visualiza, que permitiriam a queda da taxa Selic. Porque quando o senhor fala “Os projetos vão vir, porque a taxa Selic vai baixar.”, eu não consigo entender. Quer dizer, a taxa Selic vai baixar, mas em que situação? Qual é o cenário com o qual o senhor trabalha que viabilizaria a taxa a queda da taxa Selic?
Guido Mantega: Marco Antônio, eu vou ficar de costas para você, porque a Maria Clara merece... [risos]
Marco Antônio Rocha: Claro, claro...
Guido Mantega: Nada contra... Mas, bom, em primeiro lugar, juro alto e remédio amargo, acho que ninguém gosta, exceto os banqueiros, talvez, e mesmo eles dizem que não gostam, que eles preferiam ter uma taxa Selic menor, porque a Selic é a taxa de captação dos banqueiros. O governo está tomando uma série de providências, justamente para criar um cenário adequado para queda da taxa de juros. Toda essa política econômica, política fiscal, que nós estamos fazendo, a recuperação da confiança e da credibilidade para a qual nós estamos nos empenhando, vai justamente no sentido de criar condições para que a taxa de juros caia. Primeiro, a política fiscal que nós fizemos... fizemos um aumento do superávit primário de modo a estancar a escalada da relação dívida/PIB [Produto Interno Bruto]. Você sabe, quanto maior...
Maria Clara R. M. do Prado: Que ainda é muito alta [a relação dívida/PIB].
Guido Mantega: A relação... Quanto maior a relação dívida/PIB, maior é o risco de você não pagá-la. No governo anterior, ela tina chegado a 65% do PIB. É um patamar muito alto. Uma parte por causa do câmbio, é verdade. Nós já voltamos para 55% do PIB, e se o dólar ficar em torno de três [reais], vai para menos do que isso, vai para 52, 53% do PIB. Então, uma das primeiras conduções é essa: manter sob controle a trajetória da dívida pública. [Em] Segundo lugar, diminuir o risco-país, o risco-país que chegou a 2400 pontos no ano passado, entre os três países com o maior risco do mundo - que era um absurdo, era um exagero, evidentemente, mas, enfim, estávamos lá - e hoje voltou para um patamar razoável, ainda muito alto para o meu gosto: setecentos, oitocentos pontos. Acho que dá para reduzir mais. Também isso ajuda a reduzir a taxa de juros, porque isso reflete no C-bond externo [principal título da dívida externa brasileira desde a renegociação de 1994 (Plano Brady), com vencimento em 2014; os capitalization bonds (bônus de capitalização) pagam amortizações semestrais desde 2004, quando venceu seu prazo de carência], mas também acaba refletindo de alguma forma aqui dentro, as reformas que nós estamos fazendo, de modo a dar mais estabilidade fiscal para a economia. Por exemplo, a reforma da previdência, que é um dos maiores déficits que nós temos - 4% de déficit por ano -... com a reforma nós vamos diminuir esse déficit, melhorar a situação...
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] Agora,...
Guido Mantega: A reforma tributária também que vai simplificar o sistema tributário, vai melhorar a arrecadação, vai aumentar a eficiência da economia brasileira. Então, além disso, mudança da lei de falências, que possibilita a recuperação do crédito de forma mais fácil...
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] Agora, este final...
Guido Mantega: Veja que é um conjunto de medidas que vão no sentido de dar uma estabilidade fiscal e uma estabilidade e... bom, com tudo isso, nós estamos conseguindo baixar o dólar.
Maria Clara R. M. do Prado: Ministro, de qualquer maneira,...
Guido Mantega: O dólar caiu e a inflação também está caindo.
Maria Clara R. M. do Prado: Sim, ministro, mas essa estabilidade fiscal está sendo conquistada, nesses últimos anos, com o aumento de arrecadação, quer dizer, cada vez mais o governo tem que ir ao setor privado aumentar impostos para poder cobrir seus gastos. O equilíbrio fiscal, o ajuste fiscal não tem sido feito com o corte de gastos e, [segundo] as contas que alguns analistas estão fazendo, ministro, com a reforma da previdência e a reforma tributária, a carga tributária no país aumentará, mais ao menos... Tem gente que está calculando que isso resulte...
Marco Antônio Rocha: [Interrompendo] Vai para 40% [do PIB].
Maria Clara R. M. do Prado: ... em um aumento, de 3 a 4%, do PIB.
Marco Antônio Rocha: Vai para 40% [do PIB].
Maria Clara R. M. do Prado: Sairia de 36% do PIB para 40% do PIB, ou seja, mais uma vez, o equilíbrio fiscal será buscado às custas de maior imposto, maior taxação sobre o setor privado, e isso obviamente deixa uma margem muito estreita para o setor privado investir. Então, eu queria que o senhor me explicasse como essa mágica vai funcionar, porque na verdade o ajuste, sendo feito por esse lado...
Guido Mantega: [Interrompendo] Bom, até agora nós falamos... Entramos em outra seara. Estou dizendo que estamos criando as condições para que a taxa de juros possa cair. A bolha inflacionária tinha sido causada justamente por uma elevação do dólar, por causa da instabilidade, por causa da insegurança, perigo da moratória [suspensão do pagamento da dívida]; tudo isso já retrocedeu. Então, a inflação já está caindo, e daqui a pouco vai permitir uma queda da taxa de juros. Ao mesmo tempo, nós estamos fazendo o ajuste fiscal, cortando sim despesas do governo, ao contrário do que se fez nos últimos oito anos, onde o governo aumentou os impostos, os tributos, ano após ano, mais de 8% do PIB ao longo desses oito anos. Nós fizemos o quê? Nós fizemos uma redução da despesa, nós fizemos um contingenciamento de 14,1 bilhões [de reais], uma coisa dura de fazer, cortamos da nossa carne para não aumentar a tributação.
Marco Antônio Rocha: Aliás, amanhã o senhor estará liberando isso.
Guido Mantega: Nós liberamos uma parte, porque a receita...
Marco Antônio Rocha: [Serão liberados] 10%.
Guido Mantega: Cerca de 10% estão sendo liberados. Agora, cortamos na carne, diminuímos a nossas despesas, pela primeira vez, porque eu acho que a carga fiscal também chegou em um patamar excessivamente alto no Brasil: 36% do PIB. Já é um padrão de Primeiro Mundo. Pelo menos em carga fiscal nós podemos dizer que já somos Primeiro Mundo.
Leonardo Attuch: Mas a reforma tributária não aumenta a carga tributária, como está se prevendo?
Guido Mantega: Não, a reforma tributária, por definição, ela tem que ser neutra. Em termos de arrecadação, ela tem que ser neutra, ela não pode nem diminuir e nem aumentar a carga fiscal. O que acontece é o seguinte: pela simplificação dos tributos, você vai poder combater mais a sonegação. Então, você vai poder arrecadar um pouco mais pela [redução da] sonegação, pelo aumento, digamos, da eficiência do investimento, porque nós vamos desonerar os investimentos e as exportações. Com isso, você vai ter um crescimento maior da economia. Então, supõe-se que, com o crescimento da economia, você vai arrecadar mais; arrecadar mais do que proporcional ao crescimento. Então diminui a inadimplência, aumenta a fiscalização, diminui a sonegação; você vai poder arrecadar mais, mas não em função de aumento de alíquotas de tributos ou coisa parecida. O nosso desejo seria poder distribuir melhor essa carga, porque essa carga está concentrada em uma parte da economia. É assim: alguma parte dos brasileiros paga muito e outros não pagam. Então, era melhor que todos pagassem mais, os que pagam mais hoje pagariam menos, os que não pagam passam a pagar. É um pouco esse o jogo a ser feito.
João Carlos de Oliveira: Ministro, eu queria retornar um pouco o fio da meada. O senhor sabe mais que todos nós aqui que investimentos exigem duas coisas: cenário e confiança. A política econômica que o senhor está desenvolvendo, até para controlar o dólar, ela é baseada em uma política de juros de aperto monetário, juntando com aperto fiscal. O resultado é que o desemprego está aumentando, a renda média do brasileiro caiu em termos de 8%, segundo os dados do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] existe menos renda disponível na sociedade. Portanto, existe uma propensão ao consumo menor e, provavelmente um potencial de crescimento menor, de um lado de cenário. Do lado da confiança,...
Guido Mantega: [Interrompendo] Como diz o ministro José Dirceu.
João Carlos de Oliveira: Como diz o ministro José Dirceu; exato. E, do lado da confiança, eu gostaria de saber se os empresários devem confiar no PT [Partido dos Trabalhadores] que prometia nas eleições retomar o crescimento, no PT que disse que fez, enfim, um cavalo de pau na economia ou no PT que promete fazer novas parcerias.
Guido Mantega: Olha, o empresário deve confiar no PT que, primeiro, fez uma arrumação da casa, porque a casa estava totalmente desarrumada. O PT está constituindo as bases sólidas para o crescimento. Você não consegue ter crescimento econômico com uma inflação de dois dígitos. Até consegue, mas é irresponsável, porque ela vai quebrar a cara logo adiante. Você começa a crescer, acelera a inflação, e depois você quebra a cara. Então, isso não podemos fazer. Então, nós procuramos arrumar a casa, recuperamos a confiança. E se você fizer uma pesquisa de opinião, você vai ver que o empresariado está confiante de que nós vamos ter uma recuperação econômica.
João Carlos de Oliveira: [Interrompendo] Está confiante, porque os senhores recuperaram a ortodoxia, que é justamente ajuste fiscal, que é a política monetária colada a uma perspectiva de inflação...
Guido Mantega: O empresário sabe que nós estamos fazendo esses juros mais alto agora para segurar essa bolha inflacionária, mas ela já está sendo debelada. Daqui a pouco poderemos baixar os juros. A política monetária será mudada - isso é muito importante - justamente graças a essa política fiscal que...
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] Não por decreto.
Guido Mantega: Não por decreto, [mas sim] criando-se as condições. Se fosse por decreto, já teríamos feito e seria muito fácil.
Maria Clara R. M. do Prado: Não, eu digo, eu pergunto isso... parece uma pergunta boba mas, quando o senhor disse assim “Os investimentos vão aumentar, porque a taxa Selic vai cair”, é uma coisa para mim que soa estranho, porque taxa de juros básica é um instrumento de política monetária, ela não é uma meta em si, ninguém pode dizer a taxa de juros Selic vai cair, quer dizer, espera-se que ela caia...
João Carlos de Oliveira: O senhor esperava que ela caísse, não é?
Maria Clara R. M. do Prado: As circunstâncias não favoreçam essa queda, quer dizer...
Guido Mantega: Eu estou aqui me comprometendo com você, Maria Clara, que a taxa Selic vai cair, porque nós estamos criando as condições para isso: controlando a inflação, diminuindo a dívida pública, fazendo reformas e, portanto, teremos todas as condições para que essa taxa caia. Mais do que isso, eu apresentei uma lei de diretrizes orçamentárias ao Congresso, com uma projeção de juros, de crescimento para o próximo ano, que diz, ali, [que] a taxa real de juros vai cair para pelo menos 8,5% no próximo ano. Ela está mais do que isso. A taxa de crescimento do PIB será de pelo menos 3,5%, no ano de 2005. Os juros cairão mais ainda em 2006. Então há um compromisso por escrito do governo [de] que isso vai acontecer. A confiança, eu diria que os empresários têm. Acho que nós conseguimos ganhar a confiança rapidamente pela seriedade, pela eficácia das medidas que estamos tomando, e agora trata-se de ter um pouquinho mais de paciência, e daqui a pouco a taxa de juros vai cair, e no Brasil, Maria Clara, há uma reação mais rápida do mercado à queda da taxa de juros. Que ela [a taxa de juros] vai cair eu não tenho dúvida. Você vê que eu sou otimista, mas, se você quiser, faço uma aposta com você: volto aqui ao programa daqui um tempo e você vai ver que ela vai cair. E, ao cair a taxa de juros, se nós conseguirmos também reduzir também o spread [taxa cobrada pelas instituições financeiras em empréstimos ou financiamentos internacionais, tanto maior quanto mais alto for o risco da operação] e aumentar a confiança dos bancos - e os bancos estão se comprometendo a aumentar os empréstimos -, essa economia se recupera muito rapidamente, ao contrário da economia americana, que está lá com juros bem baixinho, não é?
Marco Antônio Rocha: Negativos.
Guido Mantega: São quase negativos. [Só] Não [são] negativos porque agora eles estão com deflação. Infelizmente, o mundo está entrando em deflação, mas está lá com os juros pequenininhos. E baixa mais, e não acontece nada [em favor do crescimento econômico]. Aqui no Brasil se você baixar os juros consideravelmente, reduzir o custo financeiro, a reação é muito rápida da economia, nós temos condições que outros países não têm, por isso que nós acreditamos que o crescimento é algo que se realizará em breve no país.
Nely Caixeta: Mas quanto tempo mais o eleitor que votou no PT esperando uma mudança, esperando que o governo mais uma vez não se perdesse em uma busca do ajuste fiscal... ? O senhor mesmo criticou durante algumas vezes na campanha...
Paulo Markum: [Ínterrompendo] Eu só queria citar [que] dia cinco de maio de 2002, a Folha de S.Paulo publicou uma entrevista dada pelo senhor, em Washington, para o Márcio White, que diz assim: "Um dos nossos objetivos é baixar essas taxas de juros e viabilizar um crescimento maior da economia. Ao cair a despesa, você não precisará ter o mesmo superávit primário, porque o que interessa é o conceito do conjunto das contas, o conceito nominal. Não precisa necessariamente haver superávit primário de 3,5% se você baixou a despesa de juros para 4% ou 4,5% do PIB.
João Carlos de Oliveira: Pois é, esse superávit pulou para 6,2[% do PIB]. Vocês se comprometiam com 4,5% ou 4,25% [do PIB].
Guido Mantega: Superávit para 6,2% [do PIB] não.
João Carlos de Oliveira: No primeiro trimestre foi de 6,2% [do PIB].
Guido Mantega: Não, [um superávit de] 6,2% [do PIB] você sabe que... Você começa com uma despesa baixa, ela acelera no final do ano. Quando eu disse isso, nós estávamos em maio do ano passado. Você lembra quanto estava o dólar? Quanto estava a dívida? Estava em um patamar razoável, e depois tudo virou uma confusão. No segundo semestre, o dólar foi bater quase em quatro [reais]. Em setembro, nenhum banco dava qualquer tostão de crédito para o Brasil. O Brasil esteve à porta da moratória. Isso é uma coisa muito séria...
[...]: Verdade.
Guido Mantega: Nós poderíamos ter quebrado. Então, diante desse quadro, você tem que fazer um superávit primário. Eu dizia isso e me referia ao período Fernando Henrique Cardoso, de modo geral, que praticou a política monetária ortodoxa por opção - e desnecessária, a meu ver - e aí pagava juros altíssimos, e foi criando uma dívida monumental. Agora, nós pegamos o abacaxi, nós tínhamos que desapertar a situação. A situação estava muito difícil, muito apertada; aí você usa todos os instrumentos que você tem à mão.
João Carlos de Oliveira: Mas foi a opção do PT fazer essa política que está aí, [de] continuidade, até para... como o senhor disse mesmo, a preocupação dos senhores era resgatar a credibilidade que o país havia perdido, certo?
Guido Mantega: Claro!
João Carlos de Oliveira: E os senhores fizeram isso com uma política monetária que é basicamente a mesma que a anterior e com uma política fiscal ainda mais apertada do que foi a anterior, não foi?
Guido Mantega: Foi uma opção nossa, e nós avisamos a população antes da eleição, ainda antes de o presidente Lula ser eleito, fizemos uma carta de compromisso dizendo: "nós vamos ter uma transição.". O presidente Lula disse: “Nós não vamos fazer um milagre, nós não vamos poder consertar isso do dia para a noite, nós vamos fazer uma política fiscal austera.". Nós aceitamos o acordo com o Fundo Monetário [Fundo Monetário Internacional - FMI] antes da eleição. Então, deixamos muito claro os passos que seriam dados nessa transição. Dissemos: “teremos a transição e, depois da transição, teremos o crescimento sustentado”. Agora vamos passar para essa segunda fase.
Marcos Augusto Gonçalves: Ministro, essa divisão entre fase um, fase dois, até que ponto ela não traduz uma divergência de linha econômica dentro do governo? Quer dizer, a mesma [linha] que poderia ser percebida entre o documento [do Ministério] da Fazenda e o documento agora lançado pelo Ministério do Planejamento que, aparentemente, é um documento negociado, e que ali, ao menos no texto, tenta conciliar posições que talvez não sejam tão conciliáveis assim... vendo-se no documento da Fazenda, que de certa maneira corresponde a essa fase um, uma linha econômica mais ortodoxa, mais liberal, em certo sentido, e na fase dois uma linha mais desenvolvimentista - aí para usar um pouco os clichês que se tem usado para definir a política econômica... Ou seja, até que ponto há essa contradição? Porque os sinais são, em alguns momentos, enfáticos [de] que há contradições, há linhas de tensão... e que não há muita clareza de qual linha efetivamente vai predominar e que vai levar a política econômica no futuro próximo.
Guido Mantega: Olha, não há contradição. O que há é complementaridade. Tanto... ambas as equipes... nós temos uma equipe na Fazenda, uma equipe no Planejamento, vários economistas, e ambas... e nós discutimos essas questões, nós tomamos as decisões juntos, e depois submetemos ao presidente da República, que tem a palavra final, evidentemente. Nós decidimos, de comum acordo, fazer esse ajuste fiscal. Esse número de 4,25% [do PIB] de superávit primário de maio foi feito de comum acordo. Eu acho que ele era necessário. Não há nenhuma discordância em relação a isso. A Fazenda faz a política macroeconômica. O documento da Fazenda é um documento de política macroeconômica, que coloca as bases para o crescimento, e agora nós temos que construir o edifício. Então, estamos de perfeito acordo, cada um está cumprindo uma parte da coisa. Sem as bases você não cresce. Você vai ver isso no documento do PPA, [em] que está escrito exatamente isso: "Se você não estabilizar o país, se você não tiver uma redução da relação dívida/PIB, se você não tiver a inflação sob controle, você não tem condições de crescer.".
Marcos Augusto Gonçalves: Eu li o documento do PPA.
Guido Mantega: Então, são complementares. Agora, uma vez conseguido isso, aí vamos fazer planejamento estratégico de longo prazo, vamos colocar em prática política industrial, política comercial, política de comércio exterior que, diga-se de passagem, o outro governo não fazia, era contra os princípios do outro governo. Esse documento foi feito com a cooperação da Fazenda, esse documento PPA. Esse do Plano de Desenvolvimento foi feito em conjunto; é documento do governo com concordância de ambas as equipes.
Marcos Augusto Gonçalves: Mas qual o momento que essa fase um passa a se transformar em fase dois? Porque a gente tem tido uma história em que o mercado, a cada etapa que se cumpre... quer dizer, faz-se a reforma, faz-se aquilo outro e surge uma nova exigência do mercado. O mercado, nesse sentido, é incansável em colocar obstáculos. Então, aprovada a reforma da previdência, pode-se imaginar uma situação... ou uma situação de crise externa e que se venha novamente colocar necessidade de mais um aperto na política monetária, de mais aperto fiscal, e assim estamos vivendo, com esse constante adiamento do momento em que o país efetivamente poderá crescer. Porque desde o governo anterior falava-se em crescimento. Diversas vezes se anunciou a possibilidade de uma redução da taxa de juros, do início do crescimento. Quer dizer, até que ponto a gente vai conseguir fazer isso dentro dos mesmos marcos de política econômica que têm sido praticados já há dez anos - não sei - no Brasil?
Guido Mantega: É, nós estamos mudando justamente os marcos. Estou insistindo aqui [que] não se fazia planejamento, o Estado não fazia política industrial, comercial, era tímido na política do comercio exterior. Nós estamos mudando tudo isso. Vocês não estão reparando, mas nós estamos mudando. Nós somos mais agressivos na política social. Vai ter política de desenvolvimento regional que também não tinha no governo anterior. Vamos usar os bancos públicos para alavancar financiamento, [os bancos públicos] vão ser mais agressivos. Nós estamos montando uma arquitetura financeira para financiar a América do Sul através das agências BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento], CAF [Corporação Andina de Fomento] e Fonplata [Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata]. São agências que pertencem aos países da América do Sul, juntando com o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social]. Então, nós estamos dando passos importantes para mudarmos esses marcos econômicos. Então, a taxa de juros depende apenas da inflação. Se a inflação cair para um patamar razoável - e ela está caindo, ela está dizendo que vai para esse patamar -, o Banco Central baixa a taxa de juros. O único parâmetro que move a taxa de juros é a inflação: caiu inflação, está liberado para você baixar a taxa de juros; caiu a inflação e ela está sob controle, evidentemente, e cairá a taxa de juros, e a política monetária será diferente. Ao lado de uma nova política monetária, você vai ter todas as demais políticas que estão sendo realizadas pelo governo, estão sendo agora gestadas e serão postas em prática já este ano, e a partir do próximo ano. Então, haverá uma mudança sim. Na questão que você mencionou, o outro governo, ele ficava muito vulnerável às crises externas - você tem razão - porque ele descuidou completamente das contas externas brasileiras. Pelo contrário, uns e outros diziam até que quanto maior o déficit de transações correntes, melhor para o Brasil. Tinha um presidente do Banco Central que dizia isso. Isso é um disparate, evidentemente, porque cada crise internacional, cada turbulência que tem... você tinha começado a crescer, derruba o castelo de cartas e volta tudo para trás. Então, a nossa prioridade no Plano Plurianual que aí está é justamente diminuir a vulnerabilidade externa. Essa é uma das diretrizes de nosso projeto econômico: trabalhar para que nós não dependamos de tanto capital externo como dependíamos antigamente, de modo que, se tiver um espirro lá no mercado asiático, a gente não sofra aqui uma [...] ou sei lá o quê. Então, nós vamos aumentar o saldo comercial, vamos mobilizar mais capital interno, vamos aumentar o volume comercializado no mercado internacional, e com isso vai diminuir a nossa vulnerabilidade.
Paulo Markun: Eu queria corrigir [uma informação]: o João Carlos de Oliveira é o redator-chefe da revista e do site Primeira Leitura e não editor de economia, como eu erradamente mencionei. Ministro, em certos programas, às vezes, as perguntas não são só perguntas, são uma espécie de termômetro da opinião do telespectador - evidentemente, daquele telespectador que consegue entrar em contato com a gente pelo telefone, pelo fax, pelo e-mail - e eu queria citar algumas aqui nessa linha do termômetro. Maria Clara, de Brasília, que é professora, pergunta o seguinte: "Se o PT está fazendo a lição correta na economia e no campo social, por que as críticas de toda a sociedade, inclusive dentro do próprio partido?". Osmar de David, de Toledo, no Paraná, pergunta o seguinte: "Ministro, é para confiar no PT ou na frente liberal do PT?". Rafael Rogério de Oliveira, de Guarulhos, professor, pergunta o seguinte: "Ministro, o senhor começou a entrevista criticando o governo anterior. Como se sente com a incoerência de a gestão Lula estar seguindo a mesma cartilha de Fernando Henrique?". Milton Lopes da Silva, de Francisco Morato, auxiliar de enfermagem pergunta: "Como é que o presidente Lula diz que quer acabar com a fome, se está lotando o Palácio [do Planalto] de ministros e aumentando os gastos do governo?". Finalmente, Fábio de Jesus, de São Paulo, advogado, diz o seguinte: "O PPA prevê Estado mais eficiente a ponto de gerir a economia, dentro da lógica do sistema neoliberal capitalista. Como de fato o Estado pode implementar políticas públicas voltadas para o cidadão?". Eu não achei uma pergunta... é... elogiando...
Guido Mantega: Esse é um jogo de memória. Você me fez dez perguntas e...
Paulo Markun: [Interrompendo] Não, mas a idéia é o sentido da coisa. Evidentemente, não é para o senhor responder [a] todas as perguntas, mas há uma queixa que diz o seguinte: "Olha, uma parte do PT está reclamando, o PT está copiando o que o governo Fernando Henrique fazia", quer dizer, isso que a mídia volta e meia vem martelando. Então, eu acho que é mais como é que se justifica isso diante das circunstâncias em que o governo está vivendo hoje?
Guido Mantega: Bom, eu acho que a população brasileira está impaciente, e com toda razão, porque viveu aí, nos últimos dez, 15 anos com uma taxa de crescimento baixa, o nível de desemprego elevado, situação desconfortável. Talvez alguns esperassem que rapidamente essa situação se solucionaria; não avaliaram a magnitude dos problemas que nós encontramos, que foram deixados pelos governos anteriores. Estou usando o plural propositalmente. Então, eu acho que a população tem que ter compreensão e ver o que está sendo feito. Se nós compararmos a situação de hoje para o ano passado, e mesmo o ano retrasado, vamos perceber que houve uma melhora. No ano retrasado tínhamos a crise de energia, apagão e não sei o quê. No ano passado tivemos uma crise quase que o ano todo, e nós já conseguimos alguma melhoria em relação àquela situação; é uma estabilidade. Agora, o desemprego não melhorou ainda, infelizmente. Ele só vai melhorar quando retornar o investimento e a economia começar a crescer. A renda da população também vem diminuindo há vários anos seguidos, quer dizer, é o efeito do FHC [Fernando Henrique Cardoso]. Nós estamos colhendo o resultado daquilo que foi feito, estamos fazendo todo um trabalho para reverter este processo. Então, ainda, em termos de efeitos palpáveis, digamos, a população quer ver mais dinheiro no bolso, um consumo maior, alternativas de empregos; isso ainda não aconteceu realmente, mas eu digo: acontecerá. Nós fizemos uma pesquisa recentemente que mostrava que a população entendia a dificuldade de você melhorar a situação do país, que você precisaria de algum tempo para que isso pudesse ser concretizado, dava um voto de confiança, tanto que quando se faz uma avaliação em relação ao nosso presidente e à sua gestão, ele é bem avaliado até hoje, está certo? Então, uma parte da população compreende o enrosco [em] que nós estávamos e os esforços que estamos fazendo.
Nely Caixeta: Ministro, eu gostaria de perguntar o seguinte: há essa armadilha do curto prazo, e parece que também o PT está preso nessa armadilha. O lançamento do PPA, seguramente, vem para mostrar que este governo tem uma segunda fase, tem um lado que é justamente cumprir aquela promessa, que é fazer o país [se] desenvolver. O que eu gostaria de saber do senhor é o seguinte: quais são os setores? O governo vai eleger alguns setores através dos quais o governo pretende induzir o crescimento?
Guido Mantega: Olha... bom, em primeiro lugar, a novidade que nós trazemos [é] que esse é um projeto de desenvolvimento, esse que nós estamos apresentando, que coloca como prioridade a questão social. Então, o econômico passa a ser um meio para atingir o fim, que é o social. O grande objetivo, o grande compromisso do presidente Lula com a nação é diminuir o nível de pobreza da população, tentar acabar com a miséria, analfabetismo, enfim, colocar a questão social como prioritária. Como fazer isso? Em parte, com programas sociais, e alguns a gente começou a pôr em prática, mas o Estado tem pouco dinheiro, crise fiscal, não dá para fazer todos os programas que nós gostaríamos. Então, a saída para isso é promover o crescimento sustentado. Só com o crescimento sustentado a 4%, 4,5%, 5% e 5,5% gera os empregos, aumenta o nível de renda da população e vai aumentar a arrecadação fiscal, com a qual arrecadação o governo terá dinheiro para pôr em prática os projetos sociais. O governo vai privilegiar alguns setores sim, por isso que a política é diferente do governo anterior, que deixava o mercado resolver tudo e não levava a nada. Então, o setor prioritário é o setor exportador. Por quê? Para diminuir essa vulnerabilidade externa. Nós achamos que um dos principais males que nós temos é a vulnerabilidade externa.
[Sobreposição das vozes de Guido Mantega e Marco Antônio Rocha]
Marco Antônio Rocha: [Interrompendo] Eu quero aproveitar isso aí que o senhor está dizendo... que o senhor mencionou na primeira parte do programa duas coisas: política industrial e política de comércio exterior. Eu gostaria de saber se no seu projeto a política industrial a ser desenvolvida será especificamente voltada para o comércio exterior, como me parece ser o primeiro passo que o senhor vai dar amanhã com esse empréstimo, com esse dinheiro do BID para financiar exportações brasileiras para países da América do Sul, é isso? Então, eu gostaria de saber se haverá uma política industrial voltada especificamente para as exportações.
Leonardo Attuch: Ministro, só para complementar essa questão, quer dizer, do comércio exterior. Uma crítica que se faz ou que se fez ao governo agora, nesse início de mandato, foi ter permitido uma valorização do real. Quer dizer, de não ter uma taxa de câmbio ali mais ou menos determinada, favorável às exportações. Esse ponto vai ser deixado ao sabor do mercado? Quer dizer, o Brasil vai poder, eventualmente, quando houver capitais de curto prazo entrando, o câmbio se valoriza [e] prejudica o saldo comercial? Ou vai existir alguma política para defender uma taxa de câmbio?
Nely Caixeta: O câmbio vai continuar flutuante, ministro?
Marcos Augusto Gonçalves: Posso pegar uma terceira carona aqui?
Guido Mantega: Aí nós já estamos fugindo do assunto. Nós já estamos em câmbio.
Marcos Augusto Gonçalves: Porque hoje houve uma mudança política do Banco Central em relação ao câmbio, como, ao mudar a regra de rolagem da dívida indexada ao dólar, claramente, hoje o Banco Central fez o que dizia que não ia fazer, que é uma intervenção na taxa de câmbio: o dólar já subiu três e tanto por cento. Também é uma certa desorientação, porque o que se dizia [era]: “não, o BC [Banco Central] não defende uma taxa de câmbio, o BC defende uma taxa de inflação”.
Guido Mantega: Se não faz, é omissão; se faz, é desorientação.
Marcos Augusto Gonçalves: Não, eu só estou...
Guido Mantega: Bom, então eu não sei. Se ficar o bicho pega, se correr o bicho come.
Marcos Augusto Gonçalves: Não estou fazendo uma crítica, ao contrário, só estou lembrando que houve hoje essa mudança.
Guido Mantega: Eu vou começar no câmbio, depois eu volto para política industrial. O real tinha que se valorizar, porque ele estava totalmente desvalorizado, estava criando uma pressão inflacionária. Então, era desejável que ele se valorizasse, e isso foi muito bem recebido, inclusive porque diminuiu as dívidas que várias empresas brasileiras tinham em dólar, [empresas que] estavam com a água acima do pescoço [coloca a mão na linha da boca], e isso deu uma desafogada melhor na situação da indústria. Eu acho que ele [o câmbio] flutuou muito bem. Eu acho que a flutuação cambial se deu muito bem no Brasil, porque ela fica flutuando ali no patamar que me parece muito satisfatório: em torno de três, um pouco mais, um pouco menos. É um câmbio que satisfaz um patamar inflacionário bom, ou seja, uma descompressão inflacionária, e ao mesmo tempo continua estimulando o saldo comercial. Eu estou satisfeito com essa flutuação. O câmbio tem que ser flutuante. Quem deixou de ter câmbio flutuante quebrou a cara, não é, Maria Clara? Você viu, num mundo de câmbios flutuantes, você ter um câmbio rígido ou semi-rígido não dá certo.
Maria Clara R. M. do Prado. É porque quando o senhor diz, ministro, que está satisfeito com essa flutuação, a impressão que dá é [de] que o senhor trabalha com um piso e um teto, quer dizer, o senhor faz assim... até assim com a mão o senhor faz [gesto de balançar a mão para cima e para baixo], essa flutuação.
Guido Mantega: Eu estou fazendo uma constatação [de] que há uma flutuação satisfatória, sadia, satisfatória. Então, por que eu vou me preocupar com isso? É artificial se preocupar com isso. O Banco Central está sempre operando no mercado; todos os bancos centrais do mundo operam no mercado, porque eles compram títulos, vendem títulos, compram títulos para lá, fazem operações swap [mecanismo de troca de posições entre investidores, visando a proteção contra riscos], desfazem operação, sobe, o juro dos swap, diminuem. Então, eles estão operando o tempo todo. Não há por que se preocupar...
[...]: A idéia de que não há integração é falsa?
Guido Mantega: Nós criamos uma falsa questão aqui, ficamos discutindo a questão cambial. A questão cambial está muito bem: o câmbio é flutuante, está flutuando em um patamar adequado. Então, nós temos que reclamar se tiver uma anomalia, digamos, se o dólar voltar a [custar] quatro [reais] - bom, aí tem um problema - ou então se ele baixar para 2,30 [reais]. Mas não está acontecendo isso. Então não se preocupe com o câmbio.
Maria Clara R. M. do Prado. [Interrompendo] Agora, ministro, a partir disso... A pergunta que se coloca é a seguinte: como resolver a questão da vulnerabilidade externa que o senhor disse, que mesmo o próprio texto do documento do PPA coloca como prioridade reduzir a vulnerabilidade externa. Como fazer isso?
Guido Mantega: A vulnerabilidade externa se resolve como? Primeiro, [com] uma política de comércio exterior mais eficaz, mais agressiva - e o Brasil passou os últimos dez anos com uma política de comércio exterior tímida, não se preocupava em fazer...
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] Isso implica em instrumentos como taxa de juros subsidiadas, algum tipo de...
[...]: Alíquotas.
Guido Mantega: Já existe o Proex [Programa de Financiamento às Exportações], com taxa de juros... É claro que existe, digamos, um suporte do governo, existe um crédito direcionado do BNDES. Então, o BNDES pode emprestar para o setor a, b e c. Se a prioridade é exportação, ele está lá dando mais crédito à exportação, e isso está sendo feito. Nós estamos pegando dinheiro do BID para financiar trade, para financiar comércio exterior a taxas muito baixas, porque há sobra de mercado, principalmente nas mãos do BID. Amanhã nós vamos assinar um contrato, já conseguimos novecentos milhões de dólares para o BNDES. Então, isso é uma operação que facilita.
[...]: [Interrompendo] E substituição de importação, ministro?
Guido Mantega: Isso também é muito importante. Aí a gente entra na política industrial. Então, a política industrial...
[...]: É nisso que eu queria voltar...
[...]: É só para retomar a pergunta.
[Sobreposição de vozes]
Guido Mantega: A política industrial tem vários objetivos, um deles é favorecer um saldo comercial mais favorável. Significa...
Paulo Markun: [Interrompendo] Mas também mexer no consumo de massa?
Guido Mantega: Como?
Paulo Markun: Mexer também no consumo de massa?
Guido Mantega: Aí depois a gente chega ao consumo de massa. Mas saldo comercial favorável se obtém como? Dando mais competitividade para as empresas brasileiras oferecerem um produto melhor lá fora. E aí política industrial ajuda isso fazendo também substituição de importações. Então se escolhem alguns elos da cadeia produtiva, aqueles que produzem maior déficit comercial. Vou citar dois casos aqui: eletroeletrônico e petroquímica. Os dois produziram grandes déficits comerciais e, além disso, são geradores de tecnologia importante para a produtividade de toda indústria. Então, outro alvo importante da política industrial é permitir o desenvolvimento tecnológico, é o domínio tecnológico que o Brasil não tem, é fazer o que a Coréia fez e não o que o México fez, que é só uma maquiladora de produtos que vêm dos Estados Unidos com pouco valor agregado. O Brasil tem que desenvolver, tem que dominar, absorver tecnologia, para ele ter a estrutura produtiva completa, pelo menos a tecnologia básica.
Nely Caixeta: Mas em que área?
Guido Mantega: Eu vou lhe dar um exemplo: semicondutor...
Nely Caixeta: Tecnologia da informação, biotecnologia?
Guido Mantega: Vou pegar uma tecnologia que é básica hoje para toda a estrutura industrial: semicondutor. Você sabe qual é o nosso consumo de semicondutor? Aproximadamente 6,1 bilhões de dólares por ano. Sabe quanto nós produzimos? [Produzimos por ano] setenta milhões [de dólares], eu estou falando de bilhões para milhões. Até algum tempo atrás nós tínhamos 23 empresas que produziam semicondutores no Brasil. Sabe quantas nós temos? Três empresas de semicondutores. Então, perdemos a corrida de semicondutores. Então, nós precisamos estimular esses setores. Desses seis bilhões, quatro são contrabando. Então, nós precisamos coibir o contrabando e produzir mais aqui semicondutores. Semicondutores podem ser desenvolvidos em associação com universidades. Por exemplo, a Motorola [empresa norte-americana do setor de telecomunicações] junta com a universidade de Santa Maria, lá no Rio Grande do Sul, e desenvolve um chip para o setor agrícola; a outra universidade se associa a uma outra empresa de médio porte e desenvolve... Então, nós precisamos fazer uma política industrial, por exemplo, que estimule esse tipo de substituição de exportação.
[...]: Ministro, quanto tempo demora para uma... ?
Guido Mantega: Além disso, a política industrial também tem que pensar nos setores que empregam muita mão-de-obra, porque um dos grandes objetivos na nossa política econômica é gerar emprego. Nós temos que gerar milhões de empregos no Brasil. Então, a política industrial vai estimular também setores que têm grande capacidade de gerar empregos. Quais são? Pequenas e médias empresas, clusters [aglomeração de empresas com características semelhantes, que colaboram entre si para ganharem eficiência] regionais. Nós temos tudo isso maquiado...
Nely Caixeta: Mas de que áreas, ministro?
Guido Mantega: De todas as áreas. Clusters regionais nós temos espalhados pelo Brasil todo. Temos os mais produtivos, os que têm mais capacidades competitivas, os que têm menos capacidades competitivas...
[...]: [Interrompendo] Agora, com que instrumentos isso será...?
Guido Mantega: Crédito fundamentalmente é assim. Do que a pequena e média empresa precisa? Primeiro, desesperadamente, de crédito e taxas de juros mais baixas; então nós usamos os bancos públicos para dar esses créditos. Cooperativas, bancos cooperativos... nós estamos desenvolvendo...
Maria Clara R. M. do Prado: Banco do Brasil, a Caixa Econômica, BDNES vão ser usados para...
Guido Mantega: Exatamente.
Maria Clara R. M. do Prado: ... financiar esses setores a custo mais baixo.
Guido Mantega: Exatamente. Já fazem isso. A TJLP [taxa de juros de longo prazo] que o BNDES utiliza já é uma taxa subsidiada. Nós temos lá conta do subsídio lá no Tesouro.
Leonardo Attuch: Mas, Banco do Brasil e Caixa Econômica vêm sendo administrados ultimamente, quer dizer, como instituições...
Guido Mantega: [Interrompendo] De fomento.
Leonardo Attuch: ... privadas. Isso vai mudar?
Guido Mantega: Elas vinham sendo privatizadas e nós estamos mudando. São bancos de fomento.
Leonardo Attuch: Quer dizer, o investidor dessas empresas deve entender assim, quer dizer, vai haver...
Guido Mantega: Olha, veja, a margem de lucro que eles tiveram... acho que o investidor está muito satisfeito e...
Leonardo Attuch: Vai ser um pouquinho menor então?
Guido Mantega: Não, olha, posso dizer de cabeça... quer dizer, a Caixa Econômica teve um lucro sobre o patrimônio de 22% no ano passado. Está bom para um banco público. A Petrobras [empresa mista do setor de petróleo e gás natural]... você viu o lucro que a Petrobras teve no primeiro trimestre: cinco bilhões [de reais]; quer dizer, é uma beleza.
Leonardo Attuch: Dava para baixar um pouquinho o preço do combustível?
Marco Antônio Rocha: [Interrompendo] Não dava para investir mais?
Guido Mantega: Está baixando, está baixando...
[Sobreposição de vozes]
João Carlos de Oliveira: Mas ainda é mais caro no Brasil que no exterior, principalmente diesel, que é uma coisa não tão importante.
Guido Mantega: Mas está baixando, baixando...
João Carlos de Oliveira: Ministro, me deixa só retomar o seguinte: o senhor falou em fábrica; as novas fábricas, clusters, coisa e tal... demora mais ou menos uns três anos para montar uma fábrica de processadores, montar e ter mercado, distribuir, vender... quer dizer, nós estamos em 2003 e ela [a fábrica] entra em operação mais ou menos próximo da nova eleição. Quer dizer, esse projeto aqui que o senhor está fazendo na verdade é um projeto para o segundo governo do Lula?
Guido Mantega: Olha, é um programa para os quatro anos do Plano Plurianual: 2004-2007. Existem medidas que exercem um efeito a curto prazo e outras a médio [prazo], e depois, a longo prazo. Nós temos que pensar o Brasil a longo prazo. Nós temos pensado muito o Brasil no curto, curtíssimo prazo. Aliás, o PPA, o horizonte dele é mais até do que quatro anos: é oito, dez, vinte anos. Não se conta se é governo "x", "y" ou "z", mas é para dar uma perspectiva de longo prazo, principalmente investimentos de infra-estrutura, [que] demoram mais tempo do que você falou. Para se fazer uma hidroelétrica de grande porte demora quatro, cinco anos, às vezes até seis anos. Mas nós temos que planejar isso e começar a fazer desde já. Se você começar a construir uma hidroelétrica, o que você faz? Você contrata as turbinas [e assim] você está estimulando a indústria metalúrgica, você está pagando salários, você está fazendo lá uma parte do alagamento, desmatamento da região, cimento, concreto, estimula a indústria de construção, começa a empregar trabalhador, e isso tem um efeito imediato, e aí depois vou responder à questão do mercado de massa.
Paulo Markun: [Interrompendo] Sim, o senhor mencionou... até não perdendo aqui o gancho, o senhor mencionou esse fato do setor elétrico e, digamos, uma nova regra do jogo, que é justamente a parceria público-privada, que é utilizada na Europa, em vários países, basicamente na área de rodovias, com muito bons resultados, e que no Brasil não é praticada até agora. Ao mesmo tempo, o governo Fernando Henrique deixou uma estrutura de agências reguladoras que o atual governo sinaliza que não serão mantidas ou que, se serão mantidas, não vão funcionar da mesma maneira. Não fica confuso para um empresário externo que veio aqui investir, por exemplo, na área da energia... ?
Leonardo Attuch: [Interrompendo] Só para completar,...
Paulo Markun: .... na área de energia; quer dizer [o empresário não poderia questionar]: "Poxa, para onde vai isso?"?
Leonardo Attuch: Um ponto interessante [é que] nessa semana o Ministério das Comunicações está revendo os contratos das empresas de telefonia, quer dizer, ele está tentando desindexar os contratos para que eles não sejam mais corrigidos por IGPM [Índice Geral de Preços de Mercado], IGP-DI [Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna]. Isso não é uma quebra de contrato? O senhor falou em regras claras aí para os investimentos a longo prazo. O investidor não fica meio confuso? Quer dizer, quando vai, enfim, em um setor que também é crucial... ?
Guido Mantega: Olha, não está sendo rompido nenhum contrato, absolutamente. Isto tem que ser muito claro dito aqui: nós nos comprometemos na campanha a não romper nenhum contrato, não rompemos e não romperemos nenhum contrato. Tudo isso que está sendo feito está sendo feito ao abrigo da lei e dos contratos que foram celebrados. No setor elétrico especificamente, agora, infelizmente, houve uma catástrofe, um fracasso enorme no governo anterior, que pendurou várias empresas, fez uma privatização mal feita, financiada pelo BNDES, sem garantias; as empresas em parte quebraram, eu não preciso mencionar o nome delas aqui, mas estão todas penduradas no BNDES, e [o governo anterior] fez uma série de regras que não satisfaziam, então nós estamos tendo que refazer as regras do setor elétrico e isso passa também por rever as agências reguladoras, as agências reguladoras não eram satisfatórias; até o Fernando Henrique brigava com a Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações], com a Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica], um empurrava a culpa para o outro para ver quem é que tinha errado na previsão do consumo de energia elétrica. Então, essas agências reguladoras...
Paulo Markun: [Interrompendo] O senhor acha que existirão agências?
Guido Mantega: Elas não serão extintas, elas estão sendo repensadas, elas têm papel...
Paulo Markun: Elas perdem o poder?
Guido Mantega: Elas perdem o poder, porque antes elas faziam contrato e o fiscalizavam; elas celebravam o contrato e fiscalizavam. Isso é um princípio elementar que não se deve praticar: o agente que faz é o agente que fiscaliza. [É] A mesma coisa que o Ministério do Planejamento se se fiscalizar a si próprio... não, precisamos ter um tribunal de contas para nos fiscalizar. Então, elas deixarão de celebrar os contratos, serão feitos pelo ministério da área. O Ministério das Minas e Energia faz o contrato e aí elas vão fiscalizar o cumprimento não só do contrato [mas de] todas as regras que eles contêm. O que nós queremos é definir regras claras.
Leonardo Attuch: Mas e na telefonia... ?
Guido Mantega: Nós sabemos que isso é muito importante para reequilibrar o setor: regras claras, mantidos os princípios do mercado. O setor privado tem que ter lucro, senão ele não vem, ele não vai investir e nós precisamos do investimento privado.
Leonardo Attuch: Na telefonia, o governo não estaria mexendo no que deu certo, enfim, nas regras do que deu certo? Quer dizer, quando chega e fala em rever o contrato, em rever a indexação? Ou não?
Guido Mantega: Aí nós vamos mexer no seguinte: não sei se você está satisfeito com o comportamento dos preços administrados, [mas] eu não estou satisfeito. Eles têm sido...
Leonardo Attuch Mas a gente falou na questão do investidor...
Guido Mantega: Tudo bem, mas nós temos que ver qual é o arranjo que se pode fazer com o investidor [para] que ele não perca, mas também [para] que ele não mantenha a economia brasileira indexada, porque uma parte dessa inflação que nós tivemos aí nesse último ano foi por causa desses contratos, talvez mal feitos pelo governo anterior, na área de serviços públicos. Então, telefonia, energia elétrica... Então, dentro do que permite a lei e os contratos, nós podemos negociar, e não é para impor perda ao setor privado, mas para deixar de você, por exemplo, este ano ter que pagar 30%, 35% de reajuste, quando a inflação média não foi essa e ninguém ganhou 35% de reajuste de renda ou de salário ou de coisa parecida. Então, essa é uma anomalia que tem que ser corrigida com a devida cautela, porque nós queremos que o setor privado continue investindo. Olha, é uma coisa clara que o governo não tem recursos para fazer todos os investimentos que são necessários. Nós queremos ter uma grande oferta de telefone para todo mundo, baratear o telefone, fazer com que o telefone chegue nas áreas mais distantes do país, queremos que a energia chegue em todas as partes do país. Ainda tem regiões no Brasil que usam o óleo diesel para produzir energia. A região amazônica, eu fui lá semana passada, em Rio Branco [AC], e os governadores falaram: ”Aqui é queima de óleo diesel.”. A região que tem mais águas disponíveis a utilizar... então, tem que fazer hidroelétricas lá. E como vamos fazer? Nós não temos dinheiro, vamos ter que atrair o setor privado, e o setor privado só vem com regras muito claras. Então, isso é uma questão que nos preocupa e vamos definir.
João Carlos de Oliveira: Ministro, do plano, quanto o senhor imagina que vai ser investido nesses anos todos? E quanto seria a participação do setor privado que vocês estão estimando?
Guido Mantega: Não temos ainda esses dados, porque, assim... o PPA, Plano Plurianual, ele tem mais ou menos três meses para ser elaborado. Isso que nós estamos apresentando é apenas a primeira fase, que são as diretrizes estratégicas. Depois de discutir as diretrizes e a sociedade aceitar que são essas mesmas, os governos estaduais, a sociedade civil e tudo o mais, vamos partir para a segunda fase: a definição de políticas que começa o detalhamento dos projetos. Ao mesmo tempo, tem uma equipe econômica que está montando o cenário macroeconômico para este período, ou seja, quanto vai crescer a economia, quanto nós vamos arrecadar, qual vai ser a disponibilidade de recurso para investimento... e aí nós temos uma grande matriz que tem assim: recursos orçamentários que estarão disponíveis para investimentos, recursos não orçamentários, recursos dos bancos públicos e depois vêm recursos do setor privado, parcerias público-privadas, atração de investimentos externos, que pretendemos também atrair investimentos externos, não o hot money, não esse capital de curto prazo, mas o capital de investimento. Então, com tudo isso nós temos uma matriz de financiamento que vai viabilizar aí esse crescimento.
Paulo Markun: Eu sei que a comparação é grosseira, mas às vezes a gente tem que comparar grosseiramente. Essa maneira de apresentar o PPA me lembra o orçamento participativo, no sentido de que se apresentam diretrizes, vai lá se discutir com a sociedade etc e tal. Agora, o orçamento participativo, me faz sentido que ele funcione em uma prefeitura, nos bairros de uma cidade, em um governo do Estado já começa a ficar complicado. Agora, no plano federal não é mais enrolado, na medida em que os lobbies são de poderes diferentes, de tamanhos diferentes? Os setores enormes da sociedade que não têm condições de opinar sobre essa questão e que serão atingidos de alguma forma deveriam ser representados ou pelo governo ou pelo legislativo?
Guido Mantega: Markun, você tem razão: não dá para você fazer planejamento participativo ao nível federal em um país tão grande como o Brasil e com 170 e tantos milhões de habitantes. Então, nós temos estabelecido canais de comunicação com a sociedade. Por exemplo, o presidente Lula criou o Conselho de Desenvolvimento Econômico Social. São noventa entidades que estão lá representadas, representam alguma coisa da sociedade civil. Eu já fiz reuniões com todos os secretários de Planejamento do Brasil. Então eles também representam alguma esfera de poder local que tem representatividade, foram designados pelos governadores eleitos e tal. Estamos conversando com as confederações nacionais de indústria, de trabalhadores, de agricultura, não sei o quê, de todo... ONG, Igreja, todo mundo metido nisso aí. Então, dentro das limitações que de fato existem, nós estamos fazendo consultas e que nós vamos fazer 27 fóruns regionais. Em cada estado do país vai ter um fórum onde nós vamos apresentar as diretrizes e vai haver a manifestação do público local. Inclusive, eu vou, na semana que vem, ao Congresso, à Comissão Mista de Orçamento, e vou apresentar o Plano Plurianual. Nós vamos trazer os parlamentares para discutir isso antes de apresentarmos o projeto ao legislativo. É uma inovação. Eles vão discutir antes, eles vão dar palpites nos projetos especificamente. Então, nós estamos tentando criar canais de comunicação dentro das limitações que vão discutir diretrizes e tal. Projetos específicos, nós vamos discuti-los nos grupos regionais. Então, quando nós fomos para o Acre, uma semana e meia atrás, reuniram-se seis governadores e eu levei lá um pacote de alternativas de rodovias, ferrovias, hidroelétricas e tal, que nós discutimos e eles se manifestaram.
Paulo Markun: Mas esse processo não exime a responsabilidade do governo federal de dizer: "É por aqui que nós vamos."?
Guido Mantega: Não, não exime. O governo federal vai apresentar um conjunto de alternativas. A decisão final é do governo federal e a responsabilidade também. Então, nós estamos consultando a sociedade, ouvindo as necessidades, e depois nós vamos ter, evidentemente, a palavra final. Na verdade é o legislativo que vai ter a palavra final, mas ele já vai estar discutindo junto conosco. Então, é um processo participativo, é um processo que tem resultados, porque os governadores são ouvidos, os parlamentares são ouvidos, as associações são ouvidas. Então, não é um, [não é] cada elemento da população, não é o cidadão, mas os seus representantes que, de alguma forma, vão definir os projetos escolhidos.
João Carlos de Oliveira: E essa palavra final vai ser dada ainda sem a definição de quanto será investido?
Guido Mantega: Não, aí já teremos a definição, dentro de mais ou menos...
João Carlos de Oliveira: [Interrompendo] Quanto tempo demora esse processo?
Guido Mantega: [Em] Mais ou menos um mês e meio já teremos o volume de recursos que podemos contar, os volumes... volume de recursos próprio do Estado, orçamento federal, do orçamento indireto das empresas públicas e aquilo que queremos atrair de investimento privado. Isso já vai estar delineado, delimitado, porque aí nós vamos dar os limites para as obras que vão ser feitas. Sem isso você não consegue definir quais são as obras.
João Carlos de Oliveira: E a definição é feita basicamente junto com o orçamento. Então, no final do ano ou início do ano que vem.
Guido Mantega: Junto com o orçamento... o orçamento vai ser elaborado concomitante ao Plano Plurianual e ele vai ser uma parte do [Plano] Plurianual, porque o que se fez muito tempo aqui no Brasil são planos plurianuais de ficção, que não são postos em prática. Então, se você faz um plano anual que é um quarto do Plurianual, você já está pondo em prática o Plurianual. Então nós vamos fazer o orçamento de 2004 colado no Plurianual e, portanto, realizando o primeiro ano do Plurianual.
Paulo Markun: Queria que o senhor abordasse duas questões que estão também nesse resumo do PPA, que são, de um lado, as políticas regionais e, de outro, essa questão do estímulo, do incentivo, a dinâmica do crescimento por consumo de massa. Como é que se faz isso?
Guido Mantega: Bom, o desenvolvimento regional é uma das prioridades do nosso plano nacional, é um plano nacional voltado para o desenvolvimento regional. Nos últimos anos não se praticaram planos de desenvolvimentos regionais no país e as regiões mais pobres continuam pobres, lutando com dificuldades, principalmente a região Nordeste. Existem vários focos de pobreza no país. Então, esta é uma prioridade: dotar essas regiões, dar condições para que haja uma recuperação econômica e social. Então, o governo vai praticar programas sociais com mais intensidade nessas regiões e vai dotar essas regiões, dar infra-estrutura para que elas possam desenvolver, por exemplo, turismo. Nós temos regiões que são pobres, mas que são muito bonitas, que têm condições naturais muito favoráveis. Então, o turismo é o forte estimulador da atividade econômica, é gerador de emprego. Vamos estimular as vocações regionais; também não é para se fazer uma coisa artificial...
Paulo Markun: [Interrompendo] Mas o Ministério... desculpe interromper...
Guido Mantega: ... colocar uma zona franca de que não sei o quê em Sergipe ou coisa parecida, nós vamos estimular...
Paulo Markun: Mas o Ministério da Integração Regional não foi justamente um dos mais atingidos pelos cortes de verbas logo no início deste governo? Quer dizer, criou-se o ministério e logo em seguida cortaram os recursos. Se não me falha a memória, foi um dos mais atingidos.
Guido Mantega: É, o que foi cortado ali na verdade foram emendas parlamentares, das quais o ministro Ciro Gomes [(1957-), foi ministro da Integração Nacional entre 2003 e 2006] não gostava... dizia que não eram bons projetos. Então, ele não reclamou quando foi feito o contingenciamento desses projetos e ele apresentou projetos alternativos para justamente a integração nacional, visando as regiões mais pobres. O ministro Ciro Gomes administra um fundo que tem cerca de seis bilhões de reais. São fundos constitucionais, parte da receita que é destinada a esses fundos ele pode utilizar para financiamentos da região. Então, ele tem bastante dinheiro para poder realizar essa integração regional.
Paulo Markun: E o consumo de massa?
Guido Mantega: O consumo de massa, na verdade, eu diria que é a marca desse projeto de desenvolvimento, porque nós estamos pensando em um desenvolvimento, num crescimento diferente daquele que já houve no Brasil. O Brasil já foi um dos países que mais cresceram no mundo, teve já uma vitalidade muito grande no passado. Ao longo do último século, o século XX, o Brasil crescia a taxas magníficas, mas a população...
Paulo Markun: À exceção do tempo da democracia, o resto foi bem.
[Risos discretos]
Guido Mantega: ... a população ficou pobre. Então, o Brasil é um dos países que têm a maior concentração de renda; a riqueza ficou muito concentrada. Então, nós queremos agora promover um desenvolvimento com desconcentração de renda, distribuindo a riqueza para a população brasileira. E vamos usar vários instrumentos para que isso aconteça, desde estimulado essas atividades de pequena e média empresa que gera muito emprego, dando crédito para a pequena agricultura familiar etc e usando todos os instrumentos que o Estado tem para transferência de renda, políticas sociais, onde você, ao invés de dar dinheiro para quem não precisa você dá dinheiro para quem precisa, programas sociais, aumento de salários mínimos. O próprio estímulo ao crescimento econômico ajuda a distribuição de renda. Por que o salário real está caindo no país e está caindo há vários anos? Você tem um grande exército de trabalhadores que não têm emprego e não encontram emprego, e aí o poder de barganha do trabalhador cai. Vocês sabem isso, na área de comunicações também é uma realidade: os salários estão caindo. Se você consegue reverter e produzir um crescimento de 3%, 4%, você começa a ter uma demanda de mais trabalhadores, o mercado vai absorver mais trabalhadores e o salário tende a crescer. Então, aí começa a subir o salário do trabalhador, mais as transferências que o governo pretende fazer através de seus projetos, mais uma política tributária com progressividade, mais o barateamento dos gêneros de primeira necessidade. Por exemplo, na reforma tributária, desonerando a cesta básica do ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços]. É uma proposta que existe. Então, são várias medidas que vão aumentando o poder aquisitivo da população trabalhadora. A nossa idéia é fazer um pouco seguir o caminho que o Estados Unidos seguiram quando eles se constituíram enquanto país capitalista forte, estimulando o mercado de massa. Você vai aumentando o poder aquisitivo dos trabalhadores brasileiros e vai criando um grande mercado de massa. Com isso, eles dão escala para a indústria, dão escala para a produção brasileira; os empresários vão ter uma escala maior e vão poder aumentar a sua produtividade, só que vão ter que dividir essa produtividade com os trabalhadores, e a produtividade...
[...]: [Interrompendo] Como é que faz isso?
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] O problema é que existe um descompasso no tempo entre oferta e a demanda, não é, ministro? Esse que é o problema maior de administrar...
Guido Mantega: Veja, isso não é um projeto para aplicação imediata. Esse não é o ponto de partida, é o ponto de chegada. Nós estamos nos direcionando para isso: para que amanhã o trabalhador brasileiro constitua um grande mercado consumidor. E é uma coisa... o Brasil é um dos países que têm um dos maiores mercados potenciais do mundo. Nós temos hoje oitenta, cem milhões de cidadãos brasileiros que estão fora do mercado ou que têm um baixíssimo poder de consumo. Se você conseguisse colocar - sei lá - mais cinqüenta milhões no mercado consumidor, isto aqui dá um salto, aumenta a escala de produção. Mas no mercado externo, você tem uma grande escala, aumenta a produtividade das empresas e você cria um ciclo virtuoso...
Marcos Augusto Gonçalves: O que aconteceu não [...] no [Plano] Real. O que vai acontecer artificialmente. Isso, isso, mas...
Guido Mantega: Aconteceu de modo artificial, porque eles pensaram na demanda e não na oferta, e nós estamos fazendo um modelo... O que fizeram no [Plano] Real? Baixaram drasticamente a taxa de juros, injetaram créditos na economia e subiu o consumo desmesuradamente de uma hora para outra, e não havia como atender...
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] Ministro, mas o consumo subiu no Plano Real porque definitivamente a inflação caiu. Esse foi o principal... esse foi o principal motor para aquele aumento do consumo que houve imediatamente.
Guido Mantega: O Plano Real é um conjunto de medidas. A queda na inflação sem dúvida aumenta o poder aquisitivo, mas também...
Maria Clara R. M. do Prado: Claro! São instantâneos inclusive.
Guido Mantega: Eles baixaram a taxa de juros e aumentaram o crédito de uma forma arbitrária, de uma forma absurda. Então eles desequilibraram a relação entre oferta e demanda, e nós estamos cuidando... o nosso estímulo neste momento é para o investimento: o investimento tem que subir. Quando você estimula a exportação, você está impedindo o aumento do consumo. Por exemplo, você está estimulando mais a oferta do que a demanda.
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] Sim, ministro, mas eu volto à questão, como compatibilizar essa coisa da oferta com a demanda? Porque a hora que vocês começam a fazer, que o governo começa a fazer política de distribuição de renda, imagina-se que, se funcionar - e eu imagino que vá funcionar -, você tira de quem tem e coloca, através de políticas sociais, e redistribui para quem não tem ou para quem está precisando entrar nesse mercado de consumo. Se você não tiver um setor industrial respondendo para suprir aquilo...
Paulo Markun: [Interrompendo] Se não tiver feijão, o preço do feijão vai subir.
Maria Clara R. M. do Prado: É o problema do Fome Zero também, porque não adianta você botar dinheiro na mão do pessoal de renda mais baixa se você não tiver feijão e arroz suficiente, porque é uma demanda a mais que você está criando dentro da economia, não é isso? Então, a minha pergunta é: como compatibilizar a demanda e qual é o timing para isso?
Nely Caixeta: [Interrompendo] E pelo o que eu entendi, ministro,...
Maria Clara R. M. do Prado: Porque acaba estourando na inflação, quer dizer, não tem como você evitar, se você tem uma demanda maior que a oferta.
Nely Caixeta: Pelo que eu entendi, ministro, então, complementando, não vai ser uma mera redistribuição de renda ou você vai fazer com que essas pessoas que estão à margem do consumo passem a trabalhar, seguramente incentivando pequenas e médias empresas mas, para que os empregos continuem a existir, a atividade tem que ser rentável. Então, minha pergunta: em que áreas essas pessoas podem trabalhar? Em que áreas poderá haver condições de elas continuarem a ter seus empregos e ter seus salários todo mês?
Guido Mantega: Então, veja bem, nós temos que compatibilizar oferta com demanda e nos preocuparmos mais com a oferta no primeiro momento do que a própria demanda. Porque a demanda é fácil: você baixa lá a taxa de juros, dá um consumo mais barato para a população, a população sai consumindo. Então, nós temos que nos preocupar com o investimento. Você tem que aumentar no primeiro momento o nível de poupança e o nível de investimento, para se preocupar com a oferta, está certo?
Maria Clara R. M. do Prado: Mas poupança precisa de renda. A poupança só cresce com o aumento da renda, quer dizer, não dá para você...
Guido Mantega: É concomitante. Você...
João Carlos Oliveira: [Interrompendo] Mas o senhor está dizendo o seguinte: "Olha, então vamos lá para os juros, aperto fiscal, diabo a quatro. Nós vamos continuar controlando o consumo, aí nós vamos, por mágica, gerar o aumento da oferta, e aí a gente pode cair o juro, porque aí o consumo vai ter, para realizar aquela fábrica e vai ficar muito rentável e tal.". Quer dizer, essa junção das duas coisas, fase um, fase dois, fase três...
Guido Mantega: [Interrompendo] Como é que a coisa está funcionando hoje no Brasil? O setor que está puxando é o setor exportador.
João Carlos Oliveira: Que a demanda é de fora, que está caindo também.
Guido Mantega: O setor exportador. Então, você estimula o investimento e o crescimento da oferta, que é o que está sendo feito.
Maria Clara R. M. do Prado: Mas para fora, não é ministro? Está estimulando o consumo...
Guido Mantega: Para fora e também aqui para dentro, porque a nossa capacidade produtiva dá para produzir para fora, nós já estamos produzindo cinqüenta milhões de toneladas de soja. Estamos aumentando a produção, daqui a pouco o mercado externo já está saturando e aí você vai ter que direcionar para o mercado interno. Então, é estimular o investimento, criar mecanismos para que aumente o investimento, por exemplo, Moderfrota [Modernização da Frota de Máquinas e Equipamentos Agrícolas], que é um programa de compras de máquinas e implementos para aumentar a produtividade. A chave disso tudo é produtividade. Aquilo que você vai transferir para os trabalhadores é uma parte dos acréscimos de produtividade. Não é que você vai tirar o lucro dos ricos, todo capital dos ricos, e dar para os pobres, não é isso não.
Marcos Augusto Gonçalves: [Interrompendo] Ministro, deixa eu lhe fazer uma pergunta concreta.
[Sobreposição de vozes]
Guido Mantega: É o aumento de produtividade, que vai ser...
Marcos Augusto Gonçalves: Mas como [é] que transfere a produtividade para o aumento de poder de compra do trabalhador?
Guido Mantega: São duas coisas: primeiro, o próprio mecanismo de mercado, na medida em que você aquece a economia e estão empregando mais mão-de-obra, está certo? Então, emprega-se mais mão-de-obra, a tendência do salário é subir; segundo lugar, esse mecanismo que eu mencionei, desde aumento do salário mínimo, políticas sociais onde o Estado arrecada recursos e faz programas sociais, isso é uma transferência de renda para os trabalhadores, não é?
Marcos Augusto Gonçalves: Se o gasto for bem feito pelo Estado.
Guido Mantega: Se o gasto for bem feito - e será bem feito. Todos esses programas estão sendo racionalizados. Nós estamos revendo custos de todos os programas. É que não há tempo de explicar aqui, mas, diminuindo os custos de todos os programas com novas técnicas de gestão... várias empresas estão trabalhando conosco nesse sentido. Nesta semana, ou na semana passada, assinei um contrato com o Movimento Brasil Competitivo [organização criada em novembro de 2001 para estimular e fomentar o desenvolvimento da sociedade brasileira, viabilizando projetos para aumentar a competitividade organizações e a qualidade de vida da população; congrega as funções do Instituto Brasileiro da Qualidade e Produtividade (IBQP) e do Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade (PBQP)] para implementarmos novos métodos de gestão em vários programas do governo. Então, redução de custo, aumento da eficiência, transferência... Agora, essa transferência é gradativa, mesmo porque como nós temos que aumentar o saldo comercial num primeiro momento, não dá para você aumentar muito o consumo interno e o saldo comercial, é incompatível. Então, você tem que aumentar o saldo comercial, diminuir a vulnerabilidade, criar um crescimento sustentado aqui dentro e aí você começa a distribuir mais renda e criar um mercado interno mais sólido. Tudo isso não se faz de um dia para noite, nem num passe de mágica: são passos concatenados, é o ponto de chegada do plano. Mas isso já começa a fazer efeito no médio prazo, quer dizer, quando a economia se aquecer você já vai ter uma melhora no emprego; quando nós pudermos estimular os setores que mais empregam mão-de-obra, pequena e média empresa, com cooperativas de créditos, créditos do BNDES, nós estamos aumentando - e muito - o crédito para pequena e média empresa - que, em geral, é um segmento que não tem crédito -, porque nós estamos gerando capilaridade, porque muitas vezes o BNDES até tinha recursos para pequena e média empresa, mas não tinha como fazer o recurso chegar lá, ou por falta de garantia ou por falta de um agente financeiro que fizesse a transferência. Nós estamos fazendo isso...
Paulo Markun: [Interrompendo] Desculpe, isso envolve mudança na política dos agentes financeiros, quer dizer, do Banco do Brasil e da Caixa Federal?
Guido Mantega: Exatamente. Está havendo uma mudança, o Banco do Brasil será o agente financeiro do BNDES, porque o BNDES é um grande banco, mas ele não tem agência.
Paulo Markun: Eu só queria contar uma historinha, que a boa norma do jornalismo não recomenda, mas eu vou burlá-la aqui em nome da clareza. Eu conheço uma pessoa que teve uma experiência prática de pegar um pequeno financiamento agrícola de 11 mil reais lá em Santa Catarina, um conhecido meu, com o Banco do Brasil...
Guido Mantega: Quando foi, Markun?
[...]: No governo anterior, evidente. Neste governo aqui não deu nem tempo de se ter... E eu nem sei se as linhas de créditos estão neste momento funcionando regularmente.
Guido Mantega: Estão funcionando.
Paulo Markun: Ótimo. O que aconteceu nesse episódio? Depois de longas tratativas, o gerente da agência do Banco do Brasil disse a seguinte frase para essa pessoa, disse: “Olha, o senhor tem que entender o seguinte, que isso aqui é um banco, isso aqui... nós temos que atender aos nossos acionistas; então não vale a pena a gente fazer um financiamento que tem juros subsidiados de 11 mil reais, quando a gente pode vender um financiamento de carro de quarenta, cinqüenta mil reais com juros de mercado e com uma lucratividade muito melhor.”. Então, é essa lógica que está instaurada hoje no Banco do Brasil, na Caixa Econômica, em todos agentes financeiros, que, [em] todas as vezes que o governo anterior anunciou grandes planos de chegar o dinheiro até o pequeno produtor, na prática, na vida real lá, o pequeno produtor dava de cara com um gerente de banco que tinha esse raciocínio. Então, o que eu digo é o seguinte: se o Banco do Brasil não tinha uma mudança...
Marcos Augusto Gonçalves: [Interrompendo] Até porque ele participa da lucratividade do banco.
Paulo Markun: Claro! Se não houver uma mudança radical dentro da filosofia em que o Banco do Brasil e a Caixa Federal... e se não existirem outros agentes de créditos, toda essa filosofia vai ficar restrita aos grandes financiamentos, porque aí sim o negócio se consuma.
Guido Mantega: Eu posso lhe assegurar que essa filosofia está sendo mudada, dirigida pelo próprio presidente da república. Nós temos lá um conselho que junta os três diretores [dos bancos]: BNDES, Caixa Econômica e Banco do Brasil. Eles...
Marco Antônio Rocha : [Interrompendo] Não, e tem alguém lá que deve entender de banco, que é o Luiz Gushiken [(1950-), bancário, político filiado ao PT, foi chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência no governo Lula. Deixou o governo em 2006, pouco depois da reeleição de Lula. Segundo informações da imprensa é ligado a fundos de pensão].
Guido Mantega: O Gushiken entende de banco, ele foi presidente... Bom, o Gushiken é formado em administração de empresas na [Fundação] Getúlio Vargas. Não subestime o Gushiken.
Marco Antônio Rocha: Não, eu sei disso. E foi presidente do Sindicato dos Bancários.
Guido Mantega: E não só ele já tem uma orientação para mudar sua política em relação a isso, como eles não perdem nada, porque o Banco do Brasil vai ser o agente de crédito do BNDES. Quem paga o subsídio é o BNDES que, na verdade, repassa ao Tesouro. Aliás, é uma coisa salutar que subsídio seja explícito e não acabe aparecendo na conta do Banco do Brasil.
Paulo Markun: Sim, porque senão ele se queima.
Guido Mantega: O Banco do Brasil não o tem, simplesmente ele recebe o subsídio do BNDES, que recebeu do Tesouro e nós publicamos lá, nesse descontingenciamento que estamos fazendo agora... tem lá uma conta de duzentos milhões [de reais] de crédito, de subsídio ao crédito agrícola, tudo muito claro...
Maria Clara R. M. do Prado: [Interrompendo] Mas o contribuinte paga a conta, não é ministro?
Guido Mantega: O contribuinte paga a conta e recebe os benefícios.
Maria Clara R. M. do Prado: Aí a gente cai naquele problema: alguns setores são selecionados na economia brasileira para serem tratados com privilégios e...
[Sobreposição das vozes de Maria Clara e Guido Mantega]
Guido Mantega: [Interrompendo] Veja que beleza, Maria Clara: o setor agrícola brasileiro está indo muito bem, está gerando riqueza para o país todo. O crédito agrícola no Brasil, o Moderfrota, que é um programa que dá subsídio para compra de tratores e máquinas, aumentou a produtividade do setor agrícola e aumentou essa produção fantástica, criou emprego, gerou um monte de riquezas...
Marco Antônio Rocha: [Interrompendo] Olha, ministro,...
Guido Mantega: Isso está movimentando a economia. Nós liberamos...
Marco Antônio Rocha: ... não diga isso de público, que dá subsídio para compra de frota, porque o governo norte-americano está de olho nesta entrevista aqui e os produtores de soja americanos estão de olho nesta entrevista aqui e vão pressionar o governo para acabar com esse subsídio do Moderfrota. [risos]
Guido Mantega: Em matéria de subsídio os americanos não podem abrir a boca, porque a quantidade de subsídio que eles dão para agricultura é um negócio vergonhoso. A nossa agricultura é muito mais eficiente. Se eles toparem a brincadeira, eles eliminam todo o subsídio lá e nós eliminamos aqui. O nosso subsídio, perto do deles, é uma cifra, é uma merreca, é uma coisa insignificante. Eles colocam bilhões de recursos e a nossa produção por hectare já superou... por exemplo, soja, a nossa produção por hectare de soja já é superior à americana, nós somos mais produtivos que eles e vamos passar em tudo: suco de laranja, algodão, café... Eu diria que o Brasil é imbatível em uma série de culturas. Esse dinheiro, esse subsídio do Moderfrota é por tempo limitado, ele está acabando, nós acabamos de liberar a última cifra de oitocentos milhões no Conselho Monetário Nacional - tudo oficial, especificado - e a tendência dele é não ser renovado, mesmo porque a agricultura já tem lucros suficientes para poder se capitalizar e comprar equipamentos com seus próprios recursos. Mas deu muito certo, deve ser aplaudida [a iniciativa] e o contribuinte não vai ficar triste. Ele tem aí o resultado palpável.
Leonardo Attuch: Ministro, deixa eu lhe perguntar sobre o imposto de renda progressivo. Aliás, o sistema tributário progressivo que o senhor mencionou... quer dizer, o sujeito que está lhe assistindo agora na TV, que paga 27% de imposto de renda, pode vir a pagar 30%, 35%, como está se falando? Quer dizer, isso está em estudo no governo, na Receita, no Planejamento? O sistema que transfira mais os...
Guido Mantega: [Interrompendo] Não faz parte do projeto da reforma tributária, porque nós estamos tratando a reforma tributária só do que é lei; isso daí seria infra... seria, digamos, depois da regulamentação dessa legislação. Então,...
Leonardo Attuch: [Interrompendo] Mas faz parte do projeto do governo do PT, enfim?
Guido Mantega: Olha, faz parte, mas não tem uma proposta concreta, não há uma proposta nesse sentido. Tem várias maneiras de você aplicar progressividade...
Leonardo Attuch: Por exemplo?
Guido Mantega: Por exemplo, ICMS, desonerando a cesta básica e cobrando mais de produtos de luxo ou de cigarros, bebidas etc. Tem várias maneiras pelas quais você pode fazer isso.
Leonardo Attuch: Quer dizer, não necessariamente...
Guido Mantega: [Interrompendo] Não necessariamente pelo imposto de renda.
João Carlos de Oliveira: Ministro, durante boa parte deste programa a gente ficou discutindo, no fundo, essa distância que tem entre o que a gente vê, o que é o curto prazo da economia, dos juros altos e tal, com essa carta de intenções maravilhosa do crescimento que, evidentemente, todos nós aqui gostaríamos muito que fosse exeqüível, que fosse prática. Eu só queria colocar um exemplo...
Guido Mantega: [Interrompendo] Eu queria discordar de você, porque nós estávamos falando agora da produção da agricultura. Eu posso mencionar...
João Carlos de Oliveira: [Interrompendo] Que são coisas que já estão aí. Agricultura e exportação, basicamente, vão responder pelo crescimento do PIB no começo deste ano.
Guido Mantega: As exportações estão crescendo este ano como nunca cresceram nos últimos dez anos.
João Carlos de Oliveira: Com o câmbio a 3,50 [reais por dólar] sim, mas o câmbio não está mais a 3,50, não é?
Guido Mantega: Não, vão continuar crescendo, porque não é só o câmbio que faz elas crescerem, porque houve aumento de produtividade, está certo?
João Carlos de Oliveira : Sim.
Guido Mantega: Então, nós estamos realizando coisas já de imediato.
[Sobreposição de vozes]
Nely Caixeta: Só tem a ver... depois você continua, porque tem a ver com o que ele acabou de falar. Nós vamos crescer 10%, aumento das exportações.
Guido Mantega: [É de] 13% a previsão [do crescimento das exportações].
Nely Caixeta: 13%. O ministro fe... é verdade...
Guido Mantega: [O aumento deverá ser de] 13% este ano, de exportação...
Nely Caixeta: Agora, se as estradas continuarem esburacadas, com essas crateras enormes... você anda por Mato Grosso, por Minas Gerais, é um escândalo. Se os navios continuam não podendo atracar no porto, porque não tem calados suficientes, os portos não têm calados suficientes, então, quando é... a partir desse plano que o governo está lançando, quando [é], afinal, que a gente vai ter as nossas carretas deslizando pelas rodovias e os trens voltando a carregar soja com eficiência? Quando é que esse horizonte vai chegar?
Guido Mantega: Você tocou num ponto muito importante, porque, de fato, você não consegue ter um crescimento, aumento das exportações, sem melhorar a infra-estrutura, a logística de transporte que está em petição de miséria no país. São dez anos que não se fazem investimentos na recuperação das estradas. Há estradas que foram reduzidas a buracos, não são mais estradas, são grandes buracos que estão por aí. Então, nós estamos liberando, inclusive, uma verba extra para o Ministério dos Transportes, para um grande programa de recuperação de estradas no país. Ele tem quase que um bilhão de reais disponível, o Ministério dos Transportes, para iniciar um programa de recuperação, porque também não dá para recuperar tudo de uma vez só. Então, vamos recuperar as estradas em pior estado, emergenciais, vamos terminar algumas grandes rodovias, a Fernão Dias, a Regis Bittencourt, o corredor do Mercosul, a ligação norte-sul; isso é um tema prioritário. Se você ler esse Plano Plurianual, ele vai dizer [que] uma das prioridades é diminuir a vulnerabilidade externa e, portanto, aumentar as exportações e o saldo comercial. A segunda [prioridade] é infra-estrutura, fazer investimentos de infra-estrutura sem os quais a economia não cresce, o saldo comercial não se viabiliza, o turismo não aumenta. Então, esse realmente seria um ponto de estrangulamento, caso não fosse atacado. Também tem a questão de energia elétrica, que também faz parte da infra-estrutura.
Nely Caixeta: Mas quando?
Guido Mantega: Já de imediato, isso já está sendo atacado de imediato. Então, estou lhe dizendo que, no orçamento do Ministério dos Transportes, agora existe disponibilidade de cerca de um bilhão de reais. O ministro Anderson Adauto [(1957-), foi ministro dos Transportes em 2003 e 2004, quando candidatou-se à prefeitura de Uberaba (MG) e venceu; foi reeleito prefeito em 2009, no primeiro turno] está agora começando a licitar, a chamar as empreiteiras para fazer a reparação, a recuperação de vários milhares de quilômetros no Brasil todo. É um plano imediato, é o ministério que talvez teve a maior liberação de recursos agora nesse descontingenciamento que ainda não foi anunciado.
Paulo Markun: Ministro, nosso tempo aqui está acabando, a última pergunta é do João Carlos. Um minuto, João Carlos, por favor.
João Carlos de Oliveira: Eu só queria concretizar aquele negócio que eu estava falando da distância entre o curto prazo e o longo prazo, e eu queria citar um exemplo. O senhor mesmo disse aqui que a inflação está caindo. Aliás, todos os índices mostram isso, e, no entanto, o Banco Central manteve a taxa de juros, apesar do apelo do José Alencar [(1931-), vice presidente do Brasil do governo Lula desde 2003, foi ministro da Defesa de 2004 a 2006] e da própria declaração do senhor, [de] que vinte dias antes disse que sentia um cheirinho de queda de juros no ar, certo? Então, eu queria saber, na verdade,...
Guido Mantega: [Interrompendo] De juros não, [referi-me a queda] de inflação.
João Carlos de Oliveira: De inflação e de juros também.
Guido Mantega: De inflação.
João Carlos de Oliveira: Mas, enfim, gostaria de saber o seguinte: todas as medidas que são adotas do governo são adotadas em determinadas circunstâncias e determinadas lógicas e, até agora, tem prevalecido sempre a lógica do curto prazo, da manutenção do que está aí. Quer dizer, quando é, na verdade, que vai se poder trafegar para isso? Quando a gente imagina... por exemplo, também não há tanta distância, o Armínio Fraga [(1957-), foi presidente do Banco Central de março de 1999 a janeiro de 2003, sucedido por Henrique Meirelles] estava com juros de 18%, lá em 2000, a taxa de crescimento da economia [...] foi em torno de 3%. Quer dizer, isso também é uma volta ao passado. Não há uma mudança geral da política econômica que teve com o Fernando Henrique.
Guido Mantega: Mudança fundamental é, por exemplo, a redução da vulnerabilidade externa, que não era uma preocupação do governo anterior. O governo anterior não se preocupava com isso, achava que a coisa se equilibraria espontaneamente, e isso muda totalmente a dinâmica, porque nós não vamos mais estar sujeitos à instabilidade causada de fora, pelo menos não nessa magnitude. A queda da taxa de inflação é uma realidade. Isso está se consolidando e eu diria que em breve o Banco Central vai poder baixar a taxa de juros.
João Carlos de Oliveira: E aí começa um novo Brasil?
Guido Mantega: O Copom [Comitê de Política Monetária do Banco Central] avaliou que não era ainda o momento de fazer isso, mas ele saberá avaliar o momento preciso. Eu acho que não está distante. O que eu constato é que a inflação está caindo, mesmo que não caia de uma forma linear, ela faz alguns zig-zag, mas ela está na direção certa. Então, isso me deixa tranqüilo para que o fato de o Banco Central, em breve, não sei quando...
João Carlos de Oliveira: [Interrompendo] [..] que a paciência está chegando ao fim, né?
Guido Mantega: A paciência... veja, infelizmente esse é o timing necessário; não podemos cometer irresponsabilidades. A inflação... se você fizer uma pesquisa de opinião, eu acho que ninguém quer a volta de inflação no país. Não podemos correr esse risco. O Brasil esteve em um risco muito elevado no ano passado. Mudança de governo é um momento muito delicado. Então, você precisa tomar cuidado nas medidas que você toma, não pode arriscar e jogar fora aí essa estabilidade que você conseguiu, essa confiança. Então, você tem que ser prudente. Às vezes é melhor esperar mais um mês, 45 dias, do que tomar uma medida precipitada que você tem que voltar atrás em seguida.
Paulo Markun: Ministro Guido Mantega, muito obrigado pela sua entrevista, boa sorte na sua empreitada, e nós vamos estar aqui, com o compromisso da Rede Pública de Televisão, acompanhado o trâmite desse novo projeto que a gente mal esboçou aqui. Eu agradeço aos nossos entrevistadores e a você que está em casa. E nós voltaremos na próxima segunda-feira com mais um Roda Viva. Uma ótima semana e até segunda.