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Memória Roda Viva

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Lincoln Gordon

19/12/2002

O embaixador americano, que viveu o golpe militar de 1964, fala sobre sua atuação no Brasil e sobre o envolvimento dos EUA com a política da América Latina

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Paulo Markun: Boa noite! Ele representava o governo dos Estados Unidos no Brasil, na época do golpe militar de 1964. Viveu de perto a crise política brasileira daquele momento, bem como as turbulências que também ocorreram em outros países latino-americanos nos anos 1960. Quase quarenta anos depois está de volta com um livro onde reúne os seus estudos sobre a trajetória política, econômica e social do Brasil e as suas idéias sobre o nosso futuro. No centro do Roda Viva esta noite, o economista e escritor Lincoln Gordon, embaixador dos Estados Unidos no Brasil entre 1961 e 1966.

[Comentarista]: A segunda chance do Brasil, a caminho do Primeiro Mundo, o autor deste livro conhece o Brasil como poucos estrangeiros. Estudioso da industrialização brasileira dos anos 1950, Lincoln Gordon foi escolhido pelo presidente Kennedy [J. F. Kennedy, 1917-1963, presidente dos Estados Unidos entre 1957 e 1963. Foi assassinado em 1963 no estado do Texas] para servir como embaixador no Rio de Janeiro de 1961 a 1966. Durante esse período ele acabou acompanhando muito de perto a crise política vivida pelo Brasil depois da renuncia de Jânio Quadros [1917-1992, eleito presidente do Brasil em 1961, renunciou ao cargo depois de sete meses] e da queda de João Goulart [1918-1976, político. Foi ministro do Trabalho no governo Getúlio Vargas e eleito para vice-presidente pelo partido do PTB nas eleições de 1960. Assumiu a presidência depois que Jânio Quadros renunciou]. No livro, Gordon revela o telegrama que enviou a Washington cinco dias antes do golpe militar de 1964. Entre outras coisas, sugeria apoio militar ao general Castelo Branco [1900-1967, foi o primeiro presidente do regime militar instaurado em março de 1964] e o envio de uma frota de guerra dos Estados Unidos ao litoral brasileiro. Embora apresente um material inédito ou pouco conhecido sobre o caso, o livro de Lincoln Gordon não é exatamente um relato sobre o envolvimento americano ou sobre as circunstâncias que provocaram o golpe de 1964 no Brasil. O ex-embaixador, que passou a estudar mais a vida brasileira após o fim do regime militar, dedica a maior parte da obra a uma análise do papel do governo e do setor privado no desenvolvimento econômico e social do Brasil. Para ele, o período do desenvolvimento industrial dos anos 1950, especialmente na era Juscelino [Kubitschek: 1902-1976, presidente do Brasil entre 1956 e 1961], representou a primeira chance do país atingir o status de Primeiro Mundo. Perdida essa oportunidade, surgiria uma segunda chance em 1994, com o plano real e a afirmação do governo de Fernando Henrique Cardoso. Uma segunda chance que, na visão do autor, ainda depende de uma economia melhor, de menos desigualdade social, de uma reforma política e mais esforço de incluir o Brasil num cenário político e econômico internacional.

Paulo Markun: Para entrevistar o ex-embaixador Lincoln Gordon, pesquisador da Brookings Institution, em Washington, e integrante da Academia Americana de Artes e Ciências, nós convidamos, Lourival Sant’Anna, repórter especial do jornal O Estado de S. Paulo, Andréas Adriano, editor do site da revista Primeira Leitura; João Batista Natali, repórter especial do jornal Folha de S. Paulo; Vicente Adorno, chefe de redação do Jornal da Cultura da Rede Cultura;  Luis Gonzaga de Melo Belluzzo, professor de economia da Unicamp e diretor da revista Carta Capital e Sebastião Carlos Velasco e Cruz, professor titular de ciência política da Unicamp, autor de vários livros e artigos sobre economia e política no Brasil contemporâneo e estudioso da área de relações internacionais. O Roda Viva é transmitido em rede nacional para todos os estados brasileiros e também para Brasília. Infelizmente o programa de hoje não permite a participação do telespectador porque está sendo gravado. Boa noite professor.

Lincoln Gordon: Boa noite.

Paulo Markun: Eu queria começar pelo seguinte, o título do livro, é uma pergunta obrigatória. O título do livro que o senhor lança aqui A segunda chance do Brasil: a caminho do Primeiro Mundo, me remete a seguinte dúvida: o livro foi escrito antes das eleições que acabam de acontecer. O senhor acha que o Brasil perdeu a segunda chance ao eleger Lula?

Lincoln Gordon: Não, de forma alguma. A segunda chance é muito mais ampla que uma eleição. Pelo menos, por enquanto, estou no Brasil há cerca de oito dias, falei com pessoas de várias tendências políticas a respeito da visão delas, a maioria apoiou [José] Serra [1942-, candidato do PSDB nas eleições presidenciais de 2002, cujo vencedor foi Luiz Inácio Lula da Silva do PT] nas eleições. Mas, mesmo assim, o consenso entre meus interlocutores foi que Lula começou bem como presidente eleito e que o grupo que ele reuniu para formar sua administração é de gente muito responsável. A perspectiva, embora seja muito cedo, parece ser a continuação de alguns fundamentos do governo Fernando Henrique em seus esforços de oito anos, sobretudo a estabilização da moeda, manutenção de boas relações com o exterior, inclusive o FMI [Fundo Monetário Internacional] e, espero, com governo dos Estados Unidos, evidentemente fazendo mudanças, porque as circunstâncias são outras. O candidato do PT eleito na quarta tentativa, vai ter de fazer coisas que não seriam feitas se o eleito fosse Serra, mas não vejo indícios de que essas coisas, por exemplo, alimentar pessoas que não se alimentam bem. Se isso for bem feito, não vejo uma contradição com a idéia da estabilização da moeda, por um lado, de um orçamento de acordo com realidades difíceis e também de um compromisso com o exterior. Acho justo dizer que o que o Lula propôs em campanhas anteriores ia contra esse tipo de compromisso. Isso mudou, o mundo mudou. Desde a primeira candidatura de Lula, a URSS se desfez, os países comunistas sumiram do mapa, tendo restado apenas a China, que hoje tem um comunismo com livre mercado. Ela também está perdendo suas características tradicionalmente marxistas. Acho que o quadro é promissor. Estou ansioso pela visita de Lula ao presidente Bush no dia 12 de dezembro. Mas parece que a reação do governo do meu país foi exatamente a que deveria ter sido. O presidente Bush ligou no dia seguinte, o secretário do Tesouro deu os parabéns, ele que tinha enfrentado numa certa altura um quadro bem difícil até vir para cá e conhecer melhor a realidade do Brasil e as diferenças entre o Brasil e a Argentina. Estou otimista. Conheço as dificuldades que o país enfrenta...

Paulo Markun: Mas, talvez, a impressão que eu tenho, eu estive lendo o livro do senhor, é que na visão do senhor a segunda chance estaria mais próxima se o candidato do presidente Fernando Henrique Cardoso tivesse sido eleito. Além disso, o senhor menciona muito explicitamente a importância da questão política, digamos, da estabilidade política, das instituições políticas como substrato, como apoio para que a gente tenha essa janela aberta para este salto para o Primeiro Mundo, estou errado?

Lincoln Gordon: O corpo do livro, com exceção do capítulo complementar, é sobre os anos 1960, o governo Goulart, mas ele foi concluído em 2001. A edição americana saiu há pouco mais de um ano, em junho ou julho de 2001. É evidente que o livro não considera o que houve em 2002. Em termos macroeconômicos, o que houve em 2002 é, em geral, negativo. Todos sabemos disso. Nesse sentido, talvez o capítulo 9, a conclusão, seja mais otimista do que seria se eu escrevesse hoje. Acho que, infelizmente, com a recessão mundial, inclusive na economia americana, que sofre uma leve recessão sem indícios claros de que haverá recuperação, o ambiente que o Brasil vai enfrentar é menos favorável do que em 2001. Mesmo assim, o governo atual soube lidar com esse ambiente. Ele ficou mais desfavorável do que deveria, devido a alguns mal-entendidos em Wall Street, entre os responsáveis pelo índice de risco dos países. Eles não entenderam o processo eleitoral brasileiro e não entenderam as transformações no PT nos últimos anos. Hoje, o câmbio está se recuperando e acho que, depois da posse do novo presidente, dependendo das pessoas que estarão em posições-chave; como o ministro da Fazenda, o presidente do BC [Banco Central], o chefe do Itamaraty, que será o negociador-chefe na área comercial, esses três, particularmente na política macroeconômica, o dólar vai voltar a baixar e o ano vai começar com um ótimo índice de exportação, pela primeira vez em muitos anos. Não vejo porque isso não continuaria. Acho que é um panorama difícil, mas não desfavorável, não é crítico.

Lourival Sant’Anna: Embaixador, o secretário adjunto de Estado para a América Latina, Otto [Juan] Reich, nascido em Cuba, tem uma posição ideológica muito marcada, tem uma visão anti-esquerdista por excelência. Ele vem vindo aí para se encontrar com o presidente eleito. O senhor acha que, algumas questões ideológicas, como Cuba e Venezuela e outras assim, podem azedar o relacionamento entre o Brasil e o Estados Unidos?

Lincoln Gordon: Ele faz parte da comunidade de exilados cubanos, então, obviamente, é anticastrista [se posiciona contra Fidel Castro, dirigente de Cuba]. Acho que o período em que avaliávamos a posição dos países latino-americanos com base em sua hostilidade a Cuba é uma época que já passou há muito tempo. Cuba já não é uma ameaça aos EUA. Todos estão esperando Fidel Castro sair de cena, acreditando que, então, alguma forma de democratização vai acontecer no país. Eles não têm mais o apoio generoso da Rússia e fazem parte do Ocidente. Acho que isso seria retomado. Espero que o secretário-adjunto, com quem falei uma só vez, aproveite a oportunidade para conhecer melhor a região que lhe cabe na América do Sul, sobretudo o país mais importante, o Brasil. Ele não é burro. Se souber encarar isso como um aprendizado, dentro da pequena parcela de influência que posso ter, certamente vou tentar exercê-la. Falei com ele há alguns meses, disse que viria para cá e pedi ajuda da embaixada e dos consulados para isso. Ele não me pareceu uma pessoa fechada a conselhos e opiniões diferentes. Ele pode ficar pouco tempo, o Senado não o confirmou. Está trabalhando temporariamente. Seu mandato termina não sei exatamente quando, mas é cerca de um ano depois da posse. A menos que Bush consiga a confirmação do Senado, ele será substituído. O Senado agora tem maioria republicana, e o mais provável é que o nome dele seja confirmado.

João Batista Natali: Embaixador, o senhor me daria licença de recuar um pouco no tempo para que nós abordássemos algumas das revelações que o senhor faz no seu livro? Obviamente que depois nós podemos voltar para a questão atual do Brasil. Então, a gente vai sair da esquerda que pode se tornar confiável aos olhos americanos, e retornar para aquela esquerda que não era de maneira nenhuma confiável aos olhos americanos, no início dos anos 1960. O senhor teve a sabedoria de colocar no seu livro um anexo, que é a transcrição do encontro que houve entre Bob Kennedy, o irmão do presidente John Kennedy, e o presidente João Goulart no final de 1962. Naquela época, um dos tópicos que mais incomodava o governo norte-americano era a extensão da presença do partido comunista brasileiro nas instituições do então governo. E, obviamente, durante aquela conversa, segundo o senhor próprio transcreve, o presidente João Goulart disse que nas eleições legislativas que tinham ocorrido recentemente, o partido comunista havia elegido apenas três deputados, num conjunto de mais de quatrocentos. Ou seja, era uma coisa muito pouco representativa. O senhor acha que havia alguma espécie de exagero, talvez provocada pelas lentes distorcidas da Guerra Fria, sobre a importância que o partido comunista teve naquele período? Que, afinal de contas, se não fosse pelo temor da força, ou da suposta força do partido comunista, teria sido muito mais difícil arregimentar a classe média conservadora brasileira e mobilizar as forças armadas para que se desse o golpe militar de abril de 1964? Então, digamos não mais como ex-diplomata, mas como brasilianista, o senhor acha que não houve um exagero sobre a importância do partido comunista? 

Lincoln Gordon: A transcrição que o intérprete e eu fizemos, e é um registro fiel do que aconteceu, foi publicada na integra, como anexo ao capítulo complementar. Que eu me lembre, não era apenas o Partido Comunista ou, sobretudo o PC, mas também pessoas com idéias semelhantes, o que incluíam social-democratas de esquerda, muito favoráveis a Cuba e contrários aos investimentos americanos no Brasil. O que San Tiago Dantas chamou de “nacionalistas negativos”, que não eram membros do PC. Mas, na verdade, uniam-se aos membros do partido. Por exemplo, na legislação a respeito da remessa de lucros, que era uma questão muito discutida na época, a ação não se concentrava entre os membros do PC. Eu me lembro que Bob Kennedy mencionava um grupo forte de esquerda, antiamericano, embora uma coisa não inclua a outra. Falava-se muito na época, por exemplo, sobre o próprio João Goulart. Conheci muitos brasileiros, alguns das Forças Armadas, inclusive um da Marinha que eu descrevo no livro, o almirante [Silvio Heck] que era ministro da Marinha quando Jânio Quadros renunciou, além de alguns executivos, americanos e brasileiros, e eles diziam que João Goulart era comunista, mas eu nuca vi provas convincentes disso. Entendi a ambição de Jango meses antes do golpe. Ele me disse uma vez, no Rio, que seus heróis eram Getúlio Vargas [1882-1954 governou o Brasil de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954. Seu governo foi marcado pelo nacionalismo na política e na economia. Entre os anos de 1937 e 1945 governou sob um regime ditatorial, organizou uma ampla censura nos meios de comunicação e colocou na ilegalidade partidos políticos e movimentos sociais de esquerda] e Juan Perón [1895-1974. Foi presidente da Argentina de 1946 a 1955 e de 1973 a 1974. Seu governo populista era apoiado pela Igreja, pelo Exército e pelo movimento sindical, e baseava-se num forte nacionalismo, centralizado no poder do Estado] Achei significativo. Posso contar quando foi isso?

[?]: claro...

Lincoln Gordon: Estávamos na rua, um político argentino passou, um peronista que Jango conhecia. Ele disse: “Ele será candidato dos peronistas nas eleições. Gosto dele. É o melhor político da Argentina neste momento. Na verdade meus dois heróis são: Getúlio Vargas e Juan Perón”.

João Batista Natali: Ou seja, ele não incluiu Fidel Castro entre os seus heróis, isso poderia dar uma espécie de uma, de uma...

Lincoln Gordon: Não mesmo. Nem mesmo Juan Perón, nem muito menos Getúlio Vargas eram comunistas. Eles eram mais à esquerda, mas eu não achava, e gostaria de enfatizar isso, que, se ele conseguisse o que queria, que era fazer um outro golpe, ele tentaria imitar Vargas no governo de 1937 [ditadura militar instaurada em 1937 por Getúlio Vargas que durou até 1945]. Destituiria os governadores eleitos, colocaria interventores. Seria uma política mais inclinada para a esquerda, fazendo uso do comunismo. É claro que achávamos que haveria interferências dos sindicatos, cujas lideranças eram próximas a ele, tanto que ele foi deposto do Ministério do Trabalho quando Getúlio ainda era vivo. Ele usava este contato e havia muitos comunistas nos sindicatos. Mas isso não quer dizer que ele era comunista ou que, caso se tornasse ditador, ele colocaria o Brasil num relacionamento próximo com a URSS a curto prazo, como aconteceu com Cuba. Minha preocupação era o problema a longo prazo. A possível tomada do poder por esquerdistas mais ambiciosos, numa analogia com o Egito. Alguém chamado Nagib [Muhammad Naguib, presidente do Egito em 1953], cujo nome ninguém lembra hoje, derrubou o rei e, meses depois, Nasser [Gamal Abdel Nasser, 1918-1970, presidente do Egito de 1954 até sua morte], cujo nome todo mundo lembra, assumiu o poder e criou no país um regime muito mais ditatorial. Essa analogia me preocupava.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Embaixador, o seu livro tem uma peculiaridade, pelo menos eu vi assim. A parte final sobre a participação americana no golpe de 1964, para mim, é muito mais interessante do que a parte que trata da economia brasileira, que é até bem escrita e tal, mas, eu diria que é relativamente banal. Mas, eu gostaria de fazer uma pergunta sobre o episódio do golpe militar, o senhor descreve até com detalhes, nos brinda com alguns documentos, os quais nós não tínhamos acesso, mas todos nós brasileiros que vivíamos naquela época tínhamos clareza a respeito da participação decisiva americana no golpe. O que me parece que falta no livro, já que o senhor agora está vestindo o uniforme, a máscara do historiador e não mais do diplomata, né? É que falta uma referência sobre a política externa americana para o conjunto da América Latina, quer dizer, é um pouco centrado demais no Brasil. Se nós formos olhar o desempenho americano a partir, digamos, da queda de Arbenz [Jacobo Árbenz Guzmán foi presidente da Guatemala entre 1951 e 1954. Caiu após golpe de Estado organizado pela CIA, a central de inteligência estadunidense] em 1954, nós vamos ver que é uma seqüência de episódios em que há a substituição de regimes eleitos pelo voto, por regimes ditatoriais que tiveram diferentes destinos, incluindo o Brasil, por conta até da qualidade das suas Forças Armadas, e a gente precisa reconhecer isso, e a despeito de ter havido uma tremenda transferência de tecnologia dos americanos para os brasileiros em matéria de tortura, na qualidade das nossas Forças Armadas, o Brasil conseguiu ter um desempenho, digamos, mais favorável, se comparado a outros países como Argentina, Uruguai etc. Então, eu gostaria que o senhor me fizesse, traçasse rapidamente um quadro; quais foram as diretrizes da política americana na América Latina que redundaram nesses episódios de substituição de regimes legítimos por ditaduras militares ou civis?

Lincoln Gordon: Você se refere aos anos posteriores à minha saída. Voltei aos EUA em 1966, fui chamado pelo presidente Johnson [Lyndon Johnson, 1908-1973, sucedeu John Kennedy após sua morte em 1963. Instaurou o projeto social Great Society (grande sociedade). Depois de eleito, em 1964, intensificou a atuação do exército americano no Vietnã.], que me pediu para ser secretário-adjunto de Estado para a América Latina. Fiquei no cargo até junho de 1967, quando fui para Baltimore ser reitor da Universidade Johns Hopkins, na qual tinha ocupações que não tinham a ver com o Brasil, nem com a política externa. A meu ver, o predomínio dos abusos, por assim dizer, da política americana, nesse sentido, principalmente em relação ao Brasil, era manter boas relações com governos que se envolviam com torturas e desaparecimentos, atividades muito desagradáveis. Isso em 1968, 69, até os anos 1970. Eu ouvia dizer e ficava muito incomodado. Num certo momento, com a imposição do AI-4 [Atos Institucionais], junto com outros reitores assinei uma carta de protesto. Fiquei muito feliz quando vim aqui, em 1976, Geisel era o presidente, e vi o começo da abertura [refere-se ao período de redemocratização “lenta, segura e gradual” proposta pelo General Ernesto Geisel a partir de 1974], achei que as coisas estavam melhorando. Eu fui embaixador durante o governo Goulart. Escrevi esse capítulo para esclarecer isso. A história foi distorcida, muitos livros são totalmente absurdos, não demonstram conhecimento dos fatos. O fato é que, até o Comício da Central [comício onde João Goulart lançou as propostas de reforma de base], na sexta-feira, 13 de abril de 1964, as minhas recomendações eram fazer o possível para manter o regime constitucional até as eleições de 1965. Eu acreditava que Juscelino venceria. Entre Juscelino e Carlos Lacerda [1914-1977, político da UDN (União Democrática Nacional) e dono do jornal A tribuna da imprensa. Foi o maior opositor do governo Getúlio Vargas], parecia-me que Juscelino seria o vitorioso. E isso seria bom para o Brasil e para as relações bilaterais, que de fato foram muito boas no governo dele. A questão de pressionar, até mesmo Thomas Skidmore, que é um bom historiador, no primeiro livro sobre o final desse período [Brasil: de Getúlio Vargas a Castelo Branco. Editora Saga, 1969], coloca a seguinte pergunta: “Os EUA participaram do golpe de Goulart?”. Ele diz que não, mas que fizemos pressão econômica para enfraquecer Goulart. A verdade é o oposto disso. Posso dar uma prova disso. Quando o balanço de pagamentos ficou apertado e o pagamento das dívidas ficou mais difícil, quando Carvalho Pinto era ministro da Fazenda [1910-1987. Em documentos oficiais brasileiros, consta que Carvalho Pinto pediu demissão do cargo de ministro em dezembro de 1963. Além disso, assinou um documento que apoiava o Golpe Militar em 1964], achei que seria ruim negligenciar os pagamentos. Isso causaria tumulto e o balanço de pagamentos ficaria ainda pior, porque os investidores recuariam, e a recuperação poderia levar anos. Não sei se Carvalho Pinto sabia que havia um modo sistemático de reduzir as dívidas.

Luis Gonzaga Belluzzo: A dívida brasileira era muito pequena, very small [fala gesticulando].

Lincoln Gordon: Podia ser pequena em relação ao que é hoje, mas o Brasil tinha poucas chances de saldá-la. O dólar valia muito mais. Posso dizer que foi um grande problema para Carvalho Pinto essa dívida. Recolhi documentos sobre rolagem de dívidas, e naquela época não havia tantos quanto hoje, mostrei-os ao Carvalho Pinto, falei com ele a respeito, e ele nunca tinha ouvido falar. Para ele, foi como uma luz, um presente dos céus. Foi essa a reação. Ele estava muito preocupado com a dívida, mesmo que, em retrospecto, imagine-se que não. E conseguimos um acordo. Tivemos de reatar as relações entre Goulart e De Gaulle [Charles De Gaulle,1890-1970. Foi general e estadista da França entre 1958 a 1969. Ainda participou do movimento de resistência francesa na Segunda Guerra Mundial.], que haviam se desentendido devido à Guerra da Lagosta. Jorge Serpa, que era assistente de Goulart, discutiu comigo a carta que Goulart enviou a De Gaulle para retomar o relacionamento entre eles e eu ajudei. Ele mantinha correspondência direta com Johnson. Havia feito isso com Kennedy após o encontro de abril de 1962, ao qual Goulart sempre se referia. Ele reencontrou Kennedy em Roma, na posse do Papa. Quando voltamos, ele estava entusiasmado com essa relação pessoal com Kennedy. Carvalho Pinto ficou tão impressionado com isso, que me pediu, como eu conto no livro, para ir com ele a Washington colocar o problema. Eu me ofereci para ir, voltei com ele e naquele momento, na manhã em que ele ia negociar, recebeu um telegrama do Rio ou de Brasília, informando sobre o estado de sítio. Ele ficou surpreso, disse que precisava voltar a Brasília para ver o que estava acontecendo. Era mais um sinal da crise. Eu me esforcei bastante para conseguir os documentos, traduzi-los, falar várias vezes com Carvalho Pinto, com quem eu me entendia muito bem, para depois ver Thomas Skidmore dizer que queríamos piorar a situação econômica do Brasil por motivos políticos. Não foi isso. Um dos documentos, o telegrama mais longo de agosto de 1963, fala da situação após a saída de Dantas [San Tiago Dantas, ministro das relações exteriores no governo parlamentarista de João Goulart (entre 1962 e 1963) e da Fazenda, em 1963-64. Elaborou o plano trienal para conter a inflação] e Furtado [Celso Furtado, ministro do Planejamento em 1962, no governo de João Goulart]. Aí começou a fase de decadência no nosso entendimento. Ele demonstra preocupação com o que estava ocorrendo. Eu tinha a seguinte idéia fixa: se houvesse uma ruptura do regime, que fosse na questão interna, não nas relações com os EUA. Em outros aspectos também apoiávamos projetos federais, alguns estaduais. Dizem que só ajudei quem era contra Goulart. Não. Os documentos estão disponíveis e incluem governadores como o da Bahia, Lomanto Junior, o de Goiás, cujo nome não lembro agora, e muitos outros.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Mauro Borges.

Lincoln Gordon: Isso mesmo! Obrigado. E muitos outros que não eram contra Goulart. Financiávamos esses projetos. Trabalhamos com a Sudene [Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste]. Fizemos o possível para manter um regime constitucional até 1965. Percebemos que a situação se agravaria, mas, depois de 13 de abril comecei a perceber que seria impossível.

Paulo Markun: Embaixador, eu queria voltar ainda um pouquinho mais atrás e falar da crise de 1961 que coincide praticamente com a chegada do senhor ao Brasil. Eu tive a oportunidade de trabalhar num projeto de um livro que reconta este período da história, justamente os dias que separam a renúncia de Jânio Quadros da posse de João Goulart, e tivemos acesso a alguns documentos classificados, até então classificados nos Estados Unidos, que indicam os informes da embaixada americana para o governo norte-americano. E o que fica evidente é que naquele caso específico não houve uma participação, no caso da crise de 1961, do governo norte-americano. Embora muitas informações precisas eram encontradas nesses informes, de maneira muito mais eficiente do que nas informações dos protagonistas, mostrando claramente que a embaixada americana estava muito atenta ao que acontecia. No entanto, quando termina essa crise, com a instauração do parlamentarismo e a posse de João Goulart no cargo de presidente da República, no momento seguinte, os militares que foram postos para fora do governo, que tinham feito a chamada junta militar, iniciam imediatamente a organização de uma resistência ao governo Goulart. E esses militares passam a ter boas relações com o EUA, inclusive recebem substanciais recursos para a eleição de 1962, o senhor aborda isso no seu livro. Eu queria que o senhor explicasse qual foi a intenção do governo americano de financiar os candidatos que claramente tinham acabado de sair de uma empreitada absolutamente anti-democrática.

Lincoln Gordon: Com relação ao primeiro período, logo após a renúncia de Jânio Quadros, eu não tenho informações. Kennedy enviou meu nome para confirmação no Senado um dia antes da renúncia. Pelas mensagens que recebemos e as conversas que tive aqui, nossa embaixada ficou surpresa, acho que o Congresso também, o Congresso daqui, assim como a opinião pública. Todos se surpreenderam. Eu estava em Washington, nas audiências do Senado, elas não foram muito longas, fui aprovado por unanimidade, sem muito questionamento e líamos os telegramas da embaixada diariamente. Não tínhamos embaixador aqui, meu predecessor havia saído, mas tínhamos um ótimo encarregado de negócios, que depois foi cônsul-geral em São Paulo. Na época do golpe de 1964 ele era cônsul-geral. Niles Bond.

Paulo Markun: Bom sobrenome, bom sobrenome, Bond, James Bond, nesse caso Niles Bond [risos]

Lincoln Gordon: Niles Bond, exato. Ele não tem nada a ver com o outro Bond. Já havia passado quando cheguei na segunda semana de outubro, e fiquei feliz que já tivesse passado, mas me restaram algumas preocupações a respeito de uma possível guerra civil mais adiante, porque parece que quase houve enfrentamentos entre unidades militares, principalmente o III Exército do Rio Grande do Sul e I ou II Exércitos do Norte. Conforme me disseram, o acordo do parlamentarismo foi para evitar isso. Acharam que Goulart poderia voltar com poderes restritos. O primeiro-ministro, que foi Tancredo Neves, seria o detentor do poder. Quando cheguei, acho que foi no dia nove de outubro, a primeira coisa que perguntei a Niles Bond foi: “Que tipo de regime parlamentarista era esse?” Ele disse que Jango havia dito numa festa no Rio: “Se alguém acha que vou ser uma rainha da Inglaterra, é bom pensar melhor”. Então comecei a falar com membros do gabinete. Eu não falava com Tancredo Neves, mas fazia muitas reuniões com Goulart. Tinha mais contato com Dantas, ministro das Relações Exteriores, e Walter Moreira Salles, ministro da Fazenda. Esses eram os dois contatos principais, mas eu falava com todo o gabinete. Nas primeiras reuniões com o gabinete, recebia pedidos para projetos da Aliança para o Progresso.

João Batista Natali: O senhor permite embaixador, apenas para que nós não atrasemos, eu vou reiteirar a pergunta que o Markun fez, a embaixada americana financiou candidatos brasileiros que concorriam a postos eletivos em 1962, e essa revelação o senhor faz, obviamente que o senhor não diz que o senhor a fez pessoalmente. Então, o que estava por trás disso? Eu só estou puxando a pergunta que o Markun fez. 

Lincoln Gordon: Ele me fez uma pergunta sobre 1961 e outra sobre 1962; eu estava na primeira, mas vou responder a segunda. Eu lamento isso, como disse depois, mas, durante a campanha de 1962, havia um movimento no Congresso para um projeto de lei a respeito da remessa de lucros. Os empresários americanos viram isso como um movimento contra eles, mas o original era aceitável, razoável, não impediria investimentos aqui. No entanto, uma emenda foi proposta pelo grupo do PTB, o partido trabalhista, delineando um projeto de lei muito mais rígido, que poderia fazer com que investimentos privados da Europa ou dos Estados Unidos não viessem acontecer. Na verdade, só era permitida a remessa de parte do capital. Se os lucros fosse maiores, não seriam incorporados ao capital, embora o dinheiro viesse a ser investido no Brasil. Isso significava que aquele número era um bloqueio ao lucro, e não era um número alto. Não atrairia novos investimentos e provavelmente desencorajaria os que já existiam. Achei que seria ruim, não só para os executivos americanos, que não eram minha prioridade. Minha prioridade era o sucesso da Aliança para o Progresso. O investimento estrangeiro no governo Kubitschek ajudou muito a economia brasileira. Isso tinha que fazer parte da Aliança para o Progresso, além de fundos públicos. Era uma ameaça à continuação dos investimentos. Numa reunião em São Paulo, na Câmera do Comércio dos EUA, os executivos perguntaram se deveriam investir nas eleições. Eu disse: “Isso vai contra nossas políticas. Vocês têm parcerias com brasileiros. Se sua empresa quiser financiar algum candidato, deixe que eles façam isso”. A questão era se as empresas em geral deveriam investir. O governo americano tinha um precedente importante para isso, no início do pós-guerra na Itália, quando investimos muito numa eleição importante. Os historiadores concordam que o efeito foi decisivo para impedir a vitória do comunismo. Eram comunistas mesmo, não apenas nacionalistas. Isso me vinha à cabeça. Estava envolvido no Plano Marshall, que estava começando, e o chefe da CIA me perguntou se seria uma boa idéia e, devido à questão da remessa de lucros, eu achei que seria. No fim, o resultado da eleição não foi influenciado pelo nosso investimento. A liderança política no Congresso em 1962 não era muito diferente do Congresso eleito em 1958.

Sebastião Velasco e Cruz: Embaixador, a respeito exatamente do que o senhor acabou de mencionar me ocorre a seguinte pergunta: como o senhor comenta no livro, o senhor desde 1961 tinha conhecimento da existência de pequenos grupos dispostos a conspirar pela derrubada do governo Goulart em 1961. Em 1962, às vésperas de uma eleição muito importante, o senhor recomenda um financiamento para certos grupos de políticos conservadores, de oposição. Não passava pela sua cabeça, não lhe ocorria nenhuma conexão possível entre esses políticos que estavam recebendo financiamento e os grupos que aquela altura conspiravam pela derrubada do Goulart? Esta é uma pergunta pontual, mas eu gostaria de fazer uma observação mais geral a respeito do seu livro, que na realidade me pareceu que não é um livro, são dois. Um livro bastante abrangente e competente sobre a evolução social, econômica e política brasileira, onde o senhor fala como observador. Um observador situado é como poderia ser. E no segundo livro sobrou um episódio onde o senhor não fala como observador, mas como participante. Há uma dimensão biográfica muito importante, muito significativa. E o que me chamou a atenção na leitura é que nesta segunda parte, que é a parte mais interessante para o leitor brasileiro porque tem as suas memórias e uma documentação muito rica, nesta segunda parte, a impressão é de que o tempo, sua idade, 38 anos, 40 anos, não produziu nenhum efeito, isto é, não afetou sua memória. Eu tinha quinze anos nessa época, inicio de 1964, e quando leio as suas páginas a respeito da crise, a respeito dos personagens, a respeito do Goulart eu sou transportado àquela época, a minha adolescência, porque ouço os mesmos chavões, as mesmas categorias. Hoje, o Goulart do livro, quarenta anos depois, aparece como naquela ocasião aparecia, como alguém que estava interessado em tomar o poder e construir uma ditadura. Na época se dizia sindicalista, república sindicalista, era essa a expressão, era essa a propaganda da direita. E o senhor certamente tinha algum contato mais intenso com as pessoas que viam a situação daquela forma, mas o seu livro dá umas centenas de evidências de que esta visão é insustentável, um ditador em preparação que tem um envolvimento pessoal que o senhor registra com o presidente da potência que eventualmente seria objeto de hostilidade dessa ditadura como Goulart tinha. E a entrevista do Goulart com o Robert Kennedy é uma coisa patética. Ele faz uma análise da situação e deixa muito claro uma coisa que a análise histórica desse período já demonstrou de forma cabal. O Goulart estava imprensado entre uma direita que desde o início de 1961 o rejeitava como presidente legítimo do país. Não por acaso, tentou impedir a sua ascensão. E Goulart tinha muito pouco espaço, e o espaço foi se reduzindo cada vez mais. Então, isso está evidente no livro. A entrevista dele com o Robert Kennedy é uma coisa impressionante, enfim ele trata o Robert Kennedy como um interlocutor, é uma relação simétrica e recebe como resposta, enfim, uma repreensão de alguém que se porta como um senhor. Naquela ocasião eu até compreendo que isso não chamasse a sua atenção, mas quarenta anos depois? Mas, voltando à pergunta. Em 1965, o senhor menciona no livro, eu estou completamente de acordo, uma grande tragédia, o Ato Institucional Número Dois, eu gostaria que o senhor falasse um pouco sobre o que foi este período de 1964 a 1966 até o momento em que o senhor , enfim, deixou a ...

Lincoln Gordon: Não posso deixar que os telespectadores acreditem que concordo com o que você disse sobre aquele período. Você não entendeu a transcrição da conversa com Kennedy e não entendeu a nossa visão durante o governo Goulart, sobretudo no primeiro ano. Nós não participamos da solução do Congresso para a crise que se deu após a renúncia. Foi uma crise brasileira que nós acompanhamos, mas da qual não participamos. Não tentamos apoiar os ministros militares que queriam impedir Goulart de voltar. Ficamos muito felizes quando o governo constitucional foi retomado, na verdade, com a emenda sobre o Parlamentarismo. Quero deixar isso claro. Então chegamos ao governo Castelo Branco, de 1964 a 1966. O livro mostra que eu tinha muito apreço por Castelo. Achava e continuei achando, depois de ler coisas sobre ele, inclusive algumas biografias, pena que ele não viveu para escrever suas memórias, mas ele queria restaurar o governo constitucional. A Constituição de 46 foi melhorada, mas o sistema era essencialmente o mesmo, e ele queria isso, se possível, em 1965 no máximo em 1966. Foi obrigado pela “linha dura”  a acrescentar um ano. A questão do Ato Institucional número dois foi uma tragédia quase tão ruim quanto o preâmbulo ao primeiro Ato Institucional. Não quis dedicar muito espaço a isto no livro, mas aqui posso dizer que, para mim, aquele preâmbulo foi motivo para renúncia. Falei com a minha equipe, mas ela me pediu para não renunciar. Então, por que eu renunciei? Porque o preâmbulo ao Ato Institucional dizia que o poder não vinha do povo, que era o ideal jeffersoniano [referência ao terceiro presidente americano Thomaz Jefferson, 1743-1826. Foi ainda um pensador iluminista e participou ativamente do início da Revolução Francesa, em 1789] e também a minha filosofia política, mas dos três ministros militares. Assim como diziam os chineses naquela época, o poder vinha das armas. Para quem crê na democracia, o poder não vem das armas, ele vem dos votos do povo. Eu acredito que essa seja a melhor forma de governo. Minha equipe demorou para me dissuadir da renúncia. Quando veio o AI-2, eu não estava no Brasil, estava nos EUA, fazendo discursos sobre o Brasil e os EUA. Li a respeito do AI-2 [Atos institucionais] nos jornais e nos telegramas. Foi um grande choque. A idéia da existência de outro Ato Institucional era terrível. Ter um Ato Institucional era uma coisa, mas um segundo indicava que haveria muitos outros. Em vez de voltar à democracia, quando Castelo Branco queria fazer isso, eles estavam caminhando para uma ditadura absoluta. Até então, o Congresso funcionava. Nem sempre fazia o que o presidente pedia, embora ele estivesse ali graças a um golpe militar, então, a idéia de retomar às instituições democráticas não era tão absurda. Assim que voltei encontrei Juracy Magalhães, que era ministro das Relações Exteriores. Ele havia sido embaixador em Washington. Eu o conheci em 1959, nós nos entendíamos muito bem, e ele sabia que eu estaria muito consternado. Ele me descreveu as reuniões do alto comando militar, que levaram àquele acontecimento. Devo dizer que assim começou um processo de redução das minhas esperanças para a rápida restauração do governo constitucional. A idéia de que, de alguma forma, o governo americano, nosso exército ou qualquer um, algum diplomata ou membro do governo, pudesse ser favorável a isso é totalmente errada.

Paulo Markun: Eu queria voltar justamente a esse tema da janela que o senhor fala, da rara segunda chance que o Brasil tem, ou teve na sua opinião, iniciada com o plano real. Eu creio que para muita gente que acompanha o cenário brasileiro aqui do Brasil, realmente o início do plano real parecia uma segunda chance e a oportunidade do Brasil navegar em direção ao Primeiro Mundo. Aliás, isso começou na eleição do presidente Fernando Collor, quando essa foi, esse foi o principal slogan de campanha do presidente Collor, muito embora não tenha sido a sua prática efetiva no governo. E o senhor menciona no livro uma série de condicionantes econômicas, sociais e políticas para que esta segunda chance se desenhe. Eu queria que o senhor resumisse quais são essas condicionantes, quer dizer, além desta estabilização econômica, que mais perspectivas fazem com que o Brasil tenha, na visão do senhor, essa segunda chance? 

Lincoln Gordon: Existem dois tipos de políticas econômicas e elas têm a ver com duas coisas. Uma delas é o tratamento eficaz da balança de pagamentos, sobretudo ampliando as exportações. Este ano houve bons estímulos, e durante a crise da dívida também, mas sem sustentação. Acho que isso exige uma abordagem mais eficaz do custo Brasil, redução dos preços de frete e dos custos de porto. Também exige uma transformação nos hábitos mentais das empresas brasileiras. Vi isso acontecer nos EUA. Foi só depois da Segunda Guerra Mundial [1943-1945]. Antes disso, os EUA eram um mercado tão grande que os fabricantes objetivavam o mercado doméstico e, se fosse possível, nomeavam um responsável por exportações, que ia descobrir para onde poderia vender. No final dos anos 1950 e nos anos 1960, isso mudou. O comércio internacional fazia parte da maioria das empresas americanas. Essa transformação ainda não aconteceu no Brasil. Aconteceu em alguns casos. A empresa aérea em São José dos Campos é o melhor exemplo [Embraer], mas é preciso haver muitas outras, não só uma, e ainda não há. Isso no aspecto de negócios e economia. As políticas econômicas devem aumentar os investimentos brasileiros. Boa parte do capital brasileiro é financiado por estrangeiros. Sou a favor do investimento estrangeiro direto, que traz tecnologia e outras vantagens, como acesso a mercados, mas o investimento de portfólio não deveria ser um elemento tão forte na balança de pagamentos. Isso acontece porque não há economia suficiente no Brasil, não há formação interna de capital. Isso se deve a falhas da estrutura tributária. Se verificássemos as queixas sobre o governo FHC, a falta de uma reforma tributária foi um problema grave. Alguns outros terão de ser sanados por Lula, esperamos que nos primeiros anos de governo. As outras questões são sociais e políticas e envolvem a necessidade de preparar a população para fazer parte das economias contemporâneas, esse padrão de desempenho econômico do primeiro mundo, e isso envolve, acima de tudo, educação. Foi só no segundo mandato de FHC que toda criança entre sete e 14 anos teve acesso à escola. Fiz uma comparação, num discurso que faz parte do livro e que fiz a um grupo de executivos ontem, apontando a diferença entre a Coréia e o Brasil. Em 1960, a renda per capita coreana era 70% da brasileira. Em 2000 ou 2001, era quase quatro vezes maior. Acho que 3,8 vezes maior que a brasileira. Isso não aconteceu com ajuda estrangeira ou algo assim. Foi porque eles modernizaram sua economia do jeito correto, e isso foi possível porque, na Coréia, todos completam o ensino fundamental, todos completam o ensino médio e muitos completam os estudos universitários. Vemos os efeitos disso na economia, na nova leva de indústrias de comunicação e computação. O que o Brasil fez? A Lei de Informática. “Vamos proteger o mercado mesmo que o custo seja alto.” Nesse mercado, a tecnologia mudava a cada seis meses, e o Brasil não tinha pessoas treinadas para isso. Veja o número de patentes anuais na Coréia, o número de pessoas em instituições de pesquisa e desenvolvimento, e o número nas grandes empresas, de coreanos trabalhando em pesquisa e desenvolvimento. Ciência de alto nível. O Brasil fabricava algumas peças que eram muito caras, incentivando o contrabando por diversas empresas insatisfeitas. Os coreanos já estavam produzindo chips, o que exige tecnologia de ponta. A questão não é apenas econômica, é sócio-política, e isso eleva a qualidade da democracia. Essencialmente, um país do Primeiro Mundo é um país de classe média. Classe média alta, classe média e classe média baixa, mas não há uma classe baixa, nem uma classe alta muito significativa. Criamos esse grupo nos anos 90, mas não é uma classe dominante, uma classe alta feudal. Espero que esse tipo de coisa se torne parte. Lamento que não tenha havido mais progresso nessa área, mas é possível. O Brasil é uma democracia consolidada, não há perigo de um retrocesso, e me parece que o rumo deva ser esse. Acho que a eleição de Lula como presidente não deve ser lamentada porque, tendo saído da classe trabalhadora, ele deve se voltar mais para essas fraquezas do programa de desenvolvimento dos últimos dez anos.

Andréas Adriano: Mr. Gordon o senhor fala muito, o senhor estava falando agora de desenvolvimento econômico e essas são palavras do senhor presidente, desenvolvimento econômico tem a ver com comércio exterior, e nós estamos por esses dias discutindo Alca [Área de Livre Comércio das Américas]. Eu queria que o senhor analisasse isso, o futuro das negociações da Alca não só do ponto de vista de diplomata, mas também do ponto de vista de economista, considerando alguns fatores, ontem mesmo o vice-representante comercial americano Peter Allgeier disse que a Alca vai sair com ou sem o Brasil, o Brasil se quiser, entra depois. Há umas três semanas atrás, o chefe dele, Robert Zoellick disse que se o Brasil não quiser entrar na Alca, em palavras resumidas, ele podia fazer comércio com a Antártica. É uma postura agressiva, é uma postura não muito comum na diplomacia, mas que certamente eu imagino que levam em conta a militância anti-Alca que existia no PT até outro dia. Agora a questão é: desenvolvimento e comércio não combinam muito bem com protecionismo, e protecionismo tem sido uma das marcas do governo Bush. O senhor mencionou a Embraer. Por pressão, por lobby do governo americano, o governo da Colômbia está a ponto de cancelar, ou já cancelou a compra de 30 aviões da Embraer. Quer dizer, ao mesmo tempo que puxa, defende o livre comércio, o governo americano toma atitudes protecionistas e os casos são muitos numerosos para citar aqui.

Paulo Markun: Contra tudo que voa, frango no Canadá...

Andréas Adriano: É verdade, então eu queria que o senhor dissesse que espaço tem um país periférico, emergente, junto a um governo que claramente trata todas as questões domésticas, sei lá, dos metalúrgicos da Pensilvânia, num plano muito acima das relações internacionais sendo que o comércio exterior é uma das poucas formas que um país como o Brasil tem de crescer. Estão usando isso agora com a balança comercial que está servindo de certa forma para aliviar a situação do balanço de contas correntes.

Lincoln Gordon: Você sabe que eu faço parte do partido democrata [Faz oposição ao Partido Republicano. Foi fundado em 1836 por Andrew Jackson, depois da separação política com Thomaz Jefferson, do partido Republicano-Democrata. No século XIX, o partido apoiava a escravidão nos Estados Unidos e hoje é considerado um partido com tendências de esquerda liberal]. Esses comentários não fazem sentido. A Alca sem o Brasil, a maior economia latino-americana, o maior país latino-americano em todos os aspectos, não seria a Alca. O protecionismo na administração atual é surpreendente. De maneira geral, e isso eu admiro no Partido Republicano, eles defenderam mais a abertura comercial do que os democratas, o que eu lamento. As medidas que você mencionou foram muito sofridas. Meus colegas da área de economia da Brooking escrevem muito sobre o lado negativo desse protecionismo. Esperamos exercer alguma influência. A administração Bush pretendia, nas últimas eleições nos EUA, manter maioria na Câmara e recuperá-la no Senado, e isso eles conseguiram. Conseguiram, em parte, graças aos subsídios agrícolas, que vão contra o que foi prometido antes da eleição, vão contra políticas saudáveis e o tipo de mercado agrícola no qual acreditamos. Nesse aspecto, também pressionamos a União Européia para reduzir os subsídios agrícolas para depois fazer a mesma coisa. É incoerente e é uma política ruim. Será que isso vai mudar como parte das negociações da Alca? Não sei. Fiquei chocado com as declarações de Zoellick. Ele é um representante comercial muito capaz e, até agora, parecia ter bastante tato diplomático. É um representante muito compenetrado e eu estava esperançoso. Quanto às perspectivas, a menos que a economia mundial melhore elas não são boas a curto prazo. Para mim, o ano de 2005 não é uma data definitiva. Os presidentes determinaram a data, mas podem se reunir de novo, reconhecer as dificuldades e adiar para 2007 ou 2008. Às vezes me pergunto se o Brasil não deveria pressionar mais nas negociações globais. Numa das reuniões, houve um acordo de alcance mundial para reiniciar as negociações a partir da agricultura. Nessas negociações, o Brasil e os EUA estariam juntos, tentando reduzir os subsídios na Europa. Isso deve significar a redução dos nossos próprios subsídios. Eles teriam de ser reduzidos mesmo.

Vicente Adorno: Mr Gordon, isso parece muito mais fácil de dizer do que fazer. Agora mesmo recentemente, a União Européia firmou o pé que não vai retirar os subsídios agrícolas e a gente continua sempre com essa impressão de que o Brasil, digamos assim, é um estranho no ninho, ele tem condições de entrar no Primeiro Mundo, como o senhor aponta aqui, acho até com um pouco mais de otimismo do que muitos brasileiros, mas esbarra sempre nesta questão: como que nós vamos conseguir desmontar todo esse sistema? Eu estive há pouco tempo na sede da União Européia e com todas as pessoas que eu conversei, me disseram, qualquer pessoa na Europa que se atreva a retirar subsídios agrícolas estará cometendo um suicídio político, tanto que na França mesmo já declararam em alto e bom som: “Nós não vamos retirar os subsídios” e o Brasil e outros países não vão poder nunca competir com alguém que tem condição de colocar até 80 bilhões de dólares por ano de subsídio. Como é que a gente vai resolver isso?

Lincoln Gordon: O que você disse sobre a União Européia está certo, mas existe a disposição em muitos países da Europa, sobretudo na Alemanha que paga a maior parte das contas, e existe o comprometimento, em parte político, de admitir um grupo de países do leste europeu, em particular a Polônia, que é um grande país agrícola. Eles não podem subsidiar agricultores poloneses na mesma escala em que subsidiaram os franceses.

Vicente Adorno: E os poloneses têm medo que os alemães comprem toda terra deles, é o que eles dizem. Eles têm até medo de entrar na União Européia por causa disso. Talvez os alemães, que são os vizinhos mais próximos e mais poderosos, possam comprar toda terra deles. Inclusive o próprio estatuto da terra teria que ser modificado para se adaptar a esta condição na União Européia. E acho que entra outro impasse, eles não vão abdicar desta situação e essa coisa vai se perpetuar. O tempo todo vai se falar: “vamos insistir para que se retire os subsídios” e ninguém vai retirar.

Lincoln Gordon: Nada dura para sempre. Essas pressões devem ser mantidas na EU [União Européia]. Esse é um dos papéis da OMC [Organização Mundial do Comércio]. Não sei quando recomeçam as negociações, mas se eu fosse negociar pelo Brasil faria força para prosseguir com isso. O Brasil tem excelentes representantes comerciais e em quantidade suficiente para negociar na Alca e também na OMC. É um privilégio. Eu continuaria as pressões nos dois pólos. Imagino uma situação em que haja progresso global e as pessoas não se interessem muito pela Alca. Com sucesso no mundo todo, por que privilegiar o ocidente? Agora estão pensando numa União Pan-Americana, como a União Européia. Não estamos falando de consolidação política, como os europeus, nem sabemos se vai acontecer, mas houve progresso nesse sentido, com a moeda e a liberdade de imigração, que foi limitada para os novos membros, a Turquia, por exemplo, mas não está parada. Não seja tão pessimista.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Embaixador, eu queria lhe fazer uma pergunta. O ministro da Agricultura do Brasil declarou, hoje, que o livre comércio é bom para escrever livros de texto na universidade, mas na prática, a vida é diferente, na verdade, o que há é comércio administrado. Se nós olharmos, o senhor falou da Coréia e eu vou me referir à China, são dois países que executaram, se permite a expressão, políticas não mercantilisticas, no sentido de agressivamente aumentar as suas exportações e proteger as suas próprias empresas ou seu mercado interno da penetração de importações, que são dos países mais bem sucedidos. E o Brasil caiu no conto do vigário de que se abrisse a economia unilateralmente, espontaneamente, poderia, na verdade, forçar os seus produtores a ganhar competitividade e ter uma participação maior no mercado externo, isso se revelou uma falácia, senão uma armadilha, ajudada é claro por uma insensata abertura financeira que o senhor aponta no livro corretamente. Então, como é que o senhor vê esta afirmação do nosso ministro da Agricultura?

Lincoln Gordon: Quero comentar o que você disse. A China foi aceita na OMC e há condição para isso. Sim, muitos saíram, mas muitos ficaram. Será diferente.

Luiz Gonzaga Belluzzo: Eles entraram depois, porque eles arrumaram o negócio e entraram com a conivência do Congresso americano.

Lincoln Gordon: O Brasil teve muita abertura depois de 1990. Uma coisa boa que [Fernando] Collor fez foi a redução das barreiras para a importação, que às vezes eram restrições quantitativas. O Brasil se beneficiou dessa abertura, ela contribuiu para o crescimento do país nos últimos dez anos. Menor do que deveria, mas não foi zero. A economia brasileira melhorou em conseqüência disso. O setor industrial é mais diversificado hoje.

Luiz Gonzaga Belluzzo: É discutível isso do ponto de vista estrutural, bom, mas não vamos amolar o telespectador com essa coisa.

Lourival Sant’Anna: Embaixador como é que o senhor imagina a relação, a química pessoal  entre o Lula e o Bush. Eles estão em pólos ideológicos opostos, mas há algumas coincidências entre eles também, quer dizer, ambos não são muito intelectualizados, não gostam muito de ler, e, além disso, o Bush talvez aprecie o aspecto de o Lula ser o self-made man [expressão estadunidense para designar pessoas de classe baixa que ascenderam socialmente] um homem que de uma certa maneira realizou o sonho americano. O que especularia para nós aqui este a respeito deste encontro?  

Lincoln Gordon: Não sei como será. Tenho pensado da mesma forma que você.  As origens dos dois são opostas. Lula  é de uma família pobre, felizmente veio para São Paulo e pôde estudar. Se tivesse ficado no Nordeste talvez não tivesse estudado. Ele trilhou o seu próprio caminho. Bush era... como é que se diz? Ele era um playboy até se converter ao cristianismo e se interessar por política. Foi um executivo de sucesso, porque o tio e o pai ajudaram-no a comprar um time de beisebol, que depois ele vendeu com lucro, mas não foi sua atuação que lhe trouxe sucesso. Ele tinha habilidade política, ou não teria sido governador do Texas. Desde o dia 11 de setembro do ano passado ele tem estado muito bem nas pesquisas de opinião, o que afetou a eleição do Congresso este mês. Vejo uma possibilidade de acontecer o que você disse. Sendo ambos não intelectuais, mas políticos bem-sucedidos, eles podem ter mais coisas em comum do que poderíamos imaginar. Espero que Bush diga coisas boas sobre o programa de Lula para combater a fome, que pode comover Bush. Um dos poucos tópicos legislativos que interessaram a Bush foi a melhora da educação pública. Nesse assunto, ele e Lula estarão de acordo e isso é bom. Se não entrarem em discussões internacionais, esse encontro pode ser proveitoso.

João Batista Natali: O senhor me dá licença, o Markun está fazendo sinal que nós estamos chegando ao final e eu tomaria a liberdade de fazer uma pergunta como se eu fosse o repórter de uma revista feminina dessas revistas sentimentais mensais. Se nós voltássemos para o período de 1961 a 1966: o que o senhor fez que o senhor se arrepende? O que o senhor nunca teria feito? O que o senhor fez e o senhor não teria feito hoje com a experiência que o senhor tem?

Lincoln Gordon: Uma coisa que eu já disse que não faria seria financiar candidatos para o Congresso em 1962. Em linhas gerias, durante o regime Goulart, não tenho grandes arrependimentos. Lamento que as coisas tenham acontecido daquela forma, mas dizer que isso foi fruto de ações americanas eu acho que é errado. Eu sei que é errado. Nós preparamos ações de prevenção, a força-tarefa naval foi uma idéia minha. Se foi uma idéia ruim, assumo a culpa, se foi boa, recebo os créditos, mas felizmente os navios só saíram de lá na manhã de 21 de janeiro e hoje temos provas incontestáveis disso. Há uma conversa gravada entre George Ball, sub-secretário de Estado, convocado para auxiliar, e o presidente Johnson. Ball afirma que havia participado de uma reunião com o general responsável pelo hemisfério Sul, que tinha vindo do Panamá, e eles decidiram que a força-tarefa naval deveria partir rumo ao Brasil. Os navios só chegariam em dez dias. Ninguém sabia de nada, nenhum brasileiro sabia. Eu não me arrependo disso. Vendo o telegrama publicado pela primeira vez...Eu me arrependo de uma coisa. Após o golpe, por exemplo, fiz meu discurso anual na Escola Superior de Guerra e comparei a revolução aqui com a crise dos mísseis em Cuba, uma mudança importante a favor do “mundo livre” na Guerra Fria, e acho que exagerei. Se fosse fazer isso de novo, eu seria mais delicado. Acho que foi favorável, mas não acho, pelo menos a curto prazo, que um golpe janguista, que para mim seria a alternativa, levaria a uma relação como a de Cuba com a URSS. A meu ver, e escrevi sobre isso no livro, Goulart não era comunista, não queria esse tipo de relação com a URSS, mas as políticas seriam hostis a investimentos externos, haveria fuga de divisas e a balança de pagamentos seria afetada negativamente. O Brasil enfrentaria problemas sérios, porque precisava de importações. Nesse caso, talvez Khrushchev [Nikita Khrushchev, 1894-1971, foi premiê da União Soviética entre 1958 e 1964.] tivesse o ímpeto de partir para o resgate do país, se tivesse meio para isso, e precisaria ter. Vejam o que ele fez em Cuba e o que poderia fazer aqui. Lembrem que ele disse que nos enterraria, batendo o sapato na mesa na ONU. As revelações dos arquivos soviéticos são interessantes. Enquanto ele dizia que nos enterraria, parece que as lideranças russas, ele inclusive, percebiam que não converteriam a Europa Ocidental, que não destruiriam os Estados Unidos, que era importante que não houvesse uma guerra nuclear, e isso se tornou cada vez mais importante, com as negociações bilaterais para o desarmamento e controle de armas nucleares. Ainda bem. O que Fidel Castro quis de fato romper, naquele momento crítico e os russos disseram não.

Paulo Markun:Embaixador, muito obrigado pela sua entrevista que foi eu acho que reveladora pela franqueza, pelas lacunas e principalmente por a gente ter a clara noção de que realmente o mundo mudou. Eu gostaria de agradecer muito a sua presença, recomendar de maneira expressiva o livro que é realmente é importante e muito interessante e dizer que é extremamente bem escrito, agradecer aos nossos entrevistadores e a você que está em casa e dizer que na próxima segunda-feira, às dez e meia estaremos aqui com mais um Roda Viva. Uma ótima noite e uma boa semana e até segunda.

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